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MELGAÇO, DO MONTE À RIBEIRA

História e narrativas duma terra raiana

MELGAÇO, DO MONTE À RIBEIRA

História e narrativas duma terra raiana

VILAS, PODER RÉGIO E FRONTEIRAS

melgaçodomonteàribeira, 17.06.23

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desenho a. sousa  paradise tatoo

 

VILAS, PODER RÉGIO E FRONTEIRA:

O EXEMPLO DO ENTRE LIMA E MINHO MEDIEVAL

 

(…) o ponto fulcral de qualquer estratégia régia que pretendesse fomentar o desenvolvimento de núcleos urbanos, assentava, sobretudo, na atribuição da carta de foral. Era com a outorga desse texto que se marcava a emergência de um espaço destacado das áreas rurais envolventes conferindo-lhe uma individualidade regida por normas próprias, consignadas por escrito, em que se estabeleciam os parâmetros da divisão de poderes e de réditos fiscais entre o rei e a comunidade aí instalada, fixando-se ainda os direitos e deveres desta última em relação ao monarca. Para contemplarem as vilas de Entre Lima e Minho, Afonso III e D. Dinis retomaram o texto foralengo que tinha sido concedido a Valença por Sancho I, o qual, por sua vez, e como já foi anteriormente explicitado, se filiava no chamado foro breve de Salamanca. Com esta escolha, os monarcas pretendiam uniformizar sob as mesmas condições todos os núcleos urbanos da região, o que até implicou a substituição do foral outorgado por Afonso Henriques a Melgaço, o qual, como se sabe, reproduzia o que vigorava na localidade galega de Ribadávia (49).

 

(49) A substituição do texto concedido por Afonso Henriques não agradou aos moradores de Melgaço que pediram a Afonso III para revogar o foral que lhes concedera em 1258. O rei acedeu ao seu desejo nos inícios de 1260, através de uma carta em que lhes confirmava o foral outorgado por seu bisavô e confirmado por seu pai, Afonso II, em 1219. Nessa altura, o monarca instituiu o pagamento de uma renda anual de mil soldos leoneses pagos em três prestações, uma no dia de Todos os Santos, outra no dia de Páscoa e a última a um de Julho. Confirmava-se ainda que a manutenção do castelo competia aos moradores, os quais deviam indicar filium de algo qui faciat Mihi menagium de ipso castello de Melgazo. Para além destas medidas, determinava-se a interdição da presença na vila e seu couto de nobres e reservava-se a cobrança de direitos régios na circulação do vinho. Como se pode constatar, nas suas linhas gerais, e apesar de aceder ao desejo dos seus súbditos, Afonso III não deixava de inserir Melgaço na estratégia mais geral que pretendia empreender no Entre Lima e Minho, cujos objectivos se pormenorizam no texto. O foral concedido pelo rei a Melgaço, bem como a confirmação à doação de Afonso Henriques e de Afonso II encontram-se em TT, Ch. Afonso III, l. 1, fl. 50.

 

VILAS, PODER RÉGIO E FRONTEIRAS:

O EXEMPLO DO ENTRE LIMA E MINHO MEDIEVAL

Amélia Aguiar Andrade

Dissertação para doutoramento em História da Idade Média, apresentada à Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa

Lisboa, 1994

 

HISTÓRIA DOS MUNICÍPIOS

melgaçodomonteàribeira, 14.05.22

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MELGAÇO: SENTINELA AVANÇADA

 

Melgaço é de todos os municípios portugueses o que se situa mais a norte e mais profundamente penetra na Galiza. Não são muito claras as circunstâncias históricas em que foi outorgado o seu antigo foral. É, porém, evidente que existiu um processo negocial e os hiatos verificados no decorrer do mesmo serão até responsáveis por que a datação ficasse ambígua (1183-1185).

Alguns documentos do antigo Cartulário de Fiães dão conta do movimento que acompanhou a erecção do município. Em 30 de Junho de 1185, os juízes e o concelho de Melgaço fizeram um acordo com o Abade do mosteiro de Fiães sobre a construção da nova igreja paroquial. No entanto, o projecto de construção da igreja não foi avante, talvez pela incapacidade do mosteiro, há posta em dúvida num dos documentos anteriores: “sit facta ecclesia ab abbate et conventu si tamen potuerint”. Em Abril de 1187, fazia-se um novo acordo, desta vez entre “omnes homines de Melgazo tam viri quam mulieres” e o arcediago Garcia, em que ambas as partes se comprometiam a ajudar-se mutuamente na edificação do templo “tali pacto ut facias illam et edifices nobiscum te adiuvantibus et de necessarii ecclesie tibi ministrantibus donec sit perfectam et consumatam”.  Dali a cinco anos o templo estava concluído, conforme consta de um acordo, de Abril de 1205, entre o arcediago e o abade de Fiães, sobre o serviço na igreja de Melgaço, o qual é assinado, em representação do concelho, pelos juízes Paio Garcia e João Rodrigues.

As negociações relativas ao foral decorreriam sob as ordens de D. Sancho I, associado à governação nos últimos anos da vida de seu pai, D. Afonso Henriques. O rei povoador estaria já a preparar as acções militares que planeara para os primeiros anos do seu reinado na fronteira do Minho, se não para a estender, pelo menos para a consolidar, e interessar-lhe-ia garantir o apoio do activo grupo de migrantes que, descendo pelas margens do rio, avançara mais para ocidente que outros, nos caminhos que prolongavam a estrada que atravessava o norte da Península e veio a ser conhecida pelo nome de estrada de Santiago.

O modelo que os moradores propuseram ao monarca foi o de Ribadávia, povoação que se localizava nesse caminho. A carta de foro desta comunidade foi outorgada em 1164 e reproduzia a que tinha sido concedida a Allariz e iria ser comunicada a outros lugares. A sua mais remota referência é o foral de Sahagún.

 

HISTÓRIA DOS MUNICÍPIOS

(1050-1383)

António Matos Reis

Livros Horizonte, Lda.

Lisboa, 2006

pp. 330-332