UM EXÍLIO ESCUSADO E VIOLENTO
Brasão da Casa do Rio do Porto
D. MARGARIDA MARIA ESTEVES
Nasceu na Rua Direita em 3 de Janeiro de 1895 e no baptizado foram padrinhos Joaquim do Carmo Álvares de Barros e Maria do Carmo Álvares de Barros, solteiros, da vila e tios maternos da baptizanda.
Na vila casou em 21 de Setembro de 1918 com Ernesto Viriato dos Passos Ferreira da Silva, filho de D. Maria Beatriz da Silva Valente, falecida em Braga no mês de Novembro de 1940, e secretário de finanças neste concelho, cujo porvir foi um encadeado de triunfos sucessivos todos eles devidos à sua inteligência fulgurante e ao seu carácter impoluto.
Ferreira da Silva é republicano desde os bancos de liceu de Braga, pois na quadra estudantil já esteve filiado na Liga Académica Republicana e no Centro Republicano Dr. Manuel Monteiro, esse jurista que na velha terra dos Arcebispos foi uma das glórias portuguesas quer no campo político quer no campo das letras.
Quando estava em Melgaço filiou-se no Partido Republicano Português e aí foi um dos presidentes da respectiva Comissão Municipal Republicana como foi um dos sócios fundadores dos Bombeiros Voluntários de Melgaço.
Também ao tornar-se evidente a necessidade da luta sem desfalecimento pelo engrandecimento deste torrão e de cara levantada combater a prepotência e arbítrio de um político despótico e intolerante, embora Ferreira da Silva já não pertencesse aos quadros do funcionalismo melgacense, a sua acção sentiu-se na orgânica do semanário Melgacense, cujo primeiro número saiu à publicidade em 21 de Fevereiro de 1926.
Em 1925, quando ainda se encontrava em Melgaço, foi nomeado Governador Civil do distrito de Viana do Castelo, cargo por ele exercido até à revolta de 28 de Maio de 1926, ano em que seu nome foi indicado por Braga para disputar nas eleições daquele ano um dos lugares de deputado.
Chefiava a Repartição de Finanças de Vila Nova de Famalicão quando rebentou a revolta do 3 de Fevereiro de 1929 e como nesses dias foi acusado de nela participar, ausentou-se da sede do concelho e em casa de um amigo daquela região minhota se conservou escondido das vistas dos Argos situacionistas.
Em Monção e num conciliábulo de autoridades políticas, contudo, foi ele apresentado ao respectivo Ministro do Interior como representando um grande e grave perigo para a situação política de Melgaço e como a autoridade local não garantia o vencimento da eleição enquanto o mesmo estivesse livre de peias, logo ali foi fixada residência na vila de Sines àquele grande amigo da nossa terra.
Esse escusado exílio violento fixa-se por esta carta:
«Meu querido Augusto
Impedido provisoriamente de continuar na direcção efectiva de o Melgacense venho rogar-te a subida fineza de, na minha auzencia, fazendo o sacrifício de me substituíres, com absoluta liberdade para lhe imprimires a orientação que achares conveniente aos interesses da nossa linda terra e à causa da República de que és valeroso e decisivo defensor.
As dificuldades nas comunicações exigem de ti mais este sacrifício e conto antecipadamente com a tua aquiescência, tão certo estar da tua boa amizade, que muito me honra e da tua dedicação que sinceramente admiro.
Os leitores e assinantes de o Melgacense só terão a lucrar com a substituição, o teu nome e o teu passado garantem a defesa dos interesses de Melgaço e a propagação desassombrada da doutrina republicana, de que és um dos melhores e mais corajosos apóstolos.
Se mo consentirem, escreverei regularmente as cartas de longe onde penso continuar o apostolado da democracia a par do estudo crítico dos problemas mais instantes da vida do concelho pugnando como sempre pelo seu desenvolvimento. Que me perdoem o cometimento, para o qual conto apenas com o entusiasmo da minha mocidade e com a minha fé imperecível no triunfo da causa sagrada a que me devotei. Na ribalta política há altos e baixos… É na adversidade que se conhecem os homens e se revelam os caracteres. É na luta que os espíritos se fortalecem e se afirma a coragem moral. Respondo por mim. Hoje como hontem, seguro dos meus actos e firme na minha ideologia, é grande, ardente, imperecível a minha fé na justiça, que a todos julgará friamente e implacavelmente.
Agradece-te a publicação desta carta o teu
Correligionário e amº devotado e obrig.mo
Sines, 18-1-928
Ferreira da Silva
Pouco depois de acabar esta triste e inútil situação de violência inteiramente escusada Ferreira da Silva abandonou a carreira burocrática e em 1929 assumiu as funções de Delegado da Administração da Companhia Hidro-Eléctrica do Varosa e em 1931 foi nomeado seu director, como mais tarde o foi da Chenop, isto é, da Companhia Hidro-Eléctrica do Norte de Portugal.
A faceta mercantil deste funcionário estatal de outrora e que o coração se encarregou de fazer melgacense devotado, outros triunfos mostra, porquanto em 1939 foi proposto para Presidente do célebre Clube dos Fenianos, de 1940 a 1944 exerceu com brilho as funções de 1º Secretário do Ateneu Comercial do Porto e em 1945 foi eleito Presidente da Direcção dos Bombeiros Voluntários Portuenses, para aqui se não falar detidamente do seu secretariado e da sua presidência do Rotary Clube do Porto, onde Ferreira da Silva deixou uma obra notável toda cheia de bem fazer.
Filhos: D. MARIA IVONE ESTEVES FERREIRA DA SILVA
O MEU LIVRO DAS GERAÇÕES MELGACENSES
Volume I
Augusto César Esteves
Edição da Nora do Autor
Melgaço 1989
pp. 453-456