É NATAL
BOAS FESTAS
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BOAS FESTAS
Às e aos que nos honram com a sua visita desejamos um
O PRESÉPIO AUTARCA DE MELGAÇO EM 1983
A Câmara Municipal,
teve uma ideia feliz,
pois armou este Natal
um presépio colossal
nas trazeiras da Matriz.
Coisa assim, nunca se viu,
tão bonito e tão real,
pois com gosto reuniu
e assim distribuiu
figuras ao natural.
A Teresa é Nossa Senhora,
o Solheiro é S. José,
e quem nasce nessa hora
e entre as palhinhas chora,
Alberto de Sousa, o Bé.
A dar calor ao menino
com seu carinhoso alento
com amor e com carinho,
o Luís faz de boisinho
e o Tóninho de jumento.
O Jorge, o Moura e o Gi,
três Reis Magos, quem diria,
montados nos três camelos
da Junta de Freguesia.
Ventura, Carvalho e Zeca
são os pastores, pobrezinhos
que levam como carneiros
os do lixo e os cantoneiros,
e mais outros, coitadinhos.
O Presépio ainda tem
figuras evocativas,
mas a gente sabe bem
que são na Câmara também
apenas, decorativas…
Natal de 1983
FAIJ
Antiga "Pensão 27" (1° prédio) na rua Velha - Melgaço
Melgaço, 24 de Dezembro de 1973, 22.30 horas.
A vila de Melgaço nunca perecia tanto como naquela noite : os comércios fechavam mais cedo e os cafés trancavam as portas às 8 da noite, o mais tardar. Os habitantes da Vila tornavam-se imperceptíveis até ao dia seguinte.
O céu estrelado e a temperatura bastante agradável para a estação tinham favorecido a formação de um ligeiro nevoeiro.
Havia uma dezena de minutos que eu me fora juntar ao Chancas ao cunhal do Hilário (que era um espaço defesa), o ponto de encontro nocturno da juventude melgacense do meu tempo. Eu, ele e o Manel Mareco tínhamos marcado encontro ali, depois de cearmos. Havia muito que nos desabituáramos de ir para a cama antes da meia-noite.
Para os nossos pais, e consequentemente para nós, o Natal era um dia ordinário ao qual não atribuíamos o carácter festivo que a generalidade, abusivamente, lhe prestava. Os móbeis eram múltiplos e intrínsecos às nossas famílias.
Apareceu o Manel e, entre cigarradas, continuámos a falar de tudo e de nada. De repente, ouvimos dizer :
— Com que então também vos aborrecíeis na casa ?
Era o Júlio, que vinha de Eiró, onde a mãe vivia. Como nós, e, em parte, por motivos análogos, não acordava qualquer importância àquela festividade. Encostou-se.
Retomámos a nossa conversa estéril serenamente. E ali permanecemos uma trintena de minutos até que o Júlio perguntou :
— Hoje não há nenhum café aberto, pois não ?
— Acho que não – respondeu o Manel.
— Está aberto o « 27 » – afirmou o Chancas.
— Tens a certeza ? – duvidámos.
— Ai, eu não sei ? Ando com um pito de Monção que trabalha ali, caraças !
— Então vamos para lá ! Sempre se está melhor a beber uns copos, não ? – propôs o Júlio.
Concordámos com ele e dirigimo-nos para o « 27 ».
Não havia ninguém. Abancámos ao balcão, à entrada. Foi o pito de que o Chancas falara, a Armanda, que nos atendeu. Pedimos uma caneca de tinto e tigelas. Realmente estava-se bastante melhor do que no cunhal do Hilário. À medida que os minutos passavam, mais apreciávamos o tinto e mais nos agradava conversar.
Pouco faltava para que o badalo do sino da Matriz martelasse as doze pancadas nocturnas quando entrou na pensão um homenzinho que mais parecia um duende. O aspecto simplório contrastava com a cortesia e a afabilidade de que deu prova ao cumprimentar-nos e ao dirigir-se à moça: desejava telefonar para os Arcos de Valdevez. A rapariga pôs o contador a zero e indicou-lhe o telefone ao fundo do balcão.
Indiferentes, ouvimo-lo falar a uma mulher e a uns rapazes um tempo indeterminado. A família, certamente. Quando acabou, e a jovem, depois de verificar o contador, lhe disse quanto devia, o homenzinho quase gritou :
— Cento e setenta escudos, minha menina ? Ai, meu Deus, é quase tanto como o que eu ganho no mês ! Nunca pensei que fosse tão caro !
Virámos o olhar para o homem. A sua saudação tinha despertado o nosso respeito, mas esta jeremiada deixava-nos desconcertados. Silêncio. Continuou a lastimar-se ininteligivelmente. Então o Júlio disse-lhe gentilmente:
— Venha cá, amigo. Você o que faz ?
— Sou caseiro da Dona ****** , no Louridal – respondeu, meio confuso.
— E quanto lhe paga ?
— Ó meu rico sinhor nim chega a trezentos escudos !
— Tem família ?
— Tenho, sim sinhor, uma mulher e quatro filhos nos Arcos qu’ a Dona ***** não quer qu’ os traga.
Novo silêncio.
— Quem paga o telefonema sou eu – disse por fim o Júlio, dirigindo-se à empregada – Traga uma tigelinha para o nosso amigo – e deu-lhe duas palmadinhas amistosas nas costas – que vai beber uma pinguinha connosco.
O Júlio, sentado, era tão grande como ele.
Transtornado, incapaz de pronunciar uma palavra, o homenzinho tirou um lenço amarrotado do bolso e limpou os olhos.
António El Cambório – 2011.