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MELGAÇO, DO MONTE À RIBEIRA

História e narrativas duma terra raiana

MELGAÇO, DO MONTE À RIBEIRA

História e narrativas duma terra raiana

MELGAÇO, ENTREVISTA A UM EMIGRANTE

melgaçodomonteàribeira, 30.03.24

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estacionamento em agosto na vila  anos 1980

ENTREVISTA

 

Nome: Entrevistada número 2

Idade: 29 anos

Género: Feminino

Profissão: Licenciada em Direito

País de Acolhimento: França

 

Inv: Porquê é que emigrou?

Id: Os meus pais ‘tão em França, e, eu nasci lá, sou francesa e portuguesa ao mesmo tempo. Felizmente, os dois países deixam haver dupla nacionalidade.

Inv: A situação política portuguesa, nomeadamente, a guerra colonial pesaram na sua decisão?

Id: Não sei, para os meus pais…, isso é do tempo deles. Mas, como ‘tão sempre a dizer mal de Portugal, é bem possível.

Inv: E o regime fascista do Estado Novo?

Id: Devias ter escolhido uma pessoa mais velha para fazer a entrevista.

Inv: Porque não se dirigiu para as antigas colónias portuguesas?

Id: Olha, nos dias de hoje, não seria má ideia. Quando entramos nas perguntas do picanço?

Inv: É rápido, não te preocupes.

Inv: Como imaginava a sociedade de acolhimento, antes de emigrar?

Id: Pois, essa só se for Portugal, eu, a bem dizer emigrei para Portugal. Sou francesa e passava mais tempo na França. É normal que sinta isso. Sou advogada e não posso exercer cá, se não fossem os meus pais a trabalharem ‘tava tramada, mas quero ficar cá, em Portugal, tenho que fazer o exame na Ordem. De Portugal conhecia Melgaço, era a imagem que tinha. Há dois meses ‘tive em Lisboa, no Algarve e no Alentejo, é muito bonito.

Inv: Conhece algumas artimanhas usadas pelos emigrantes para dar “o salto”?

Id: Em França? Nem sim nem não. Não tenho nada contra a França. Na faculdade, como sou loira e alta, quando dizia que era portuguesa não acreditavam. Na minha faculdade, que eu saiba, era a única portuguesa. Na França não se liga tanto como cá de onde vimos, há muita mistura. Os portugueses, em França, portando-se bem, não são notados. O problema deles é que se portam sempre bem. E os outros, os árabes, os asiáticos ficam com os direitos todos, passam-lhes a perna. Nem com a União Europeia se notou diferença, falam em direitos, mas não os dão. Quem gosta dos portugueses é o Le Pen. Esse é um hipócrita. Há uns anos chamou os portugueses de porcos, incluindo o presidente de Portugal e, nas eleições, precisa dos portugueses. Os emigrantes não sabem lutar pelos seus direitos.

Inv: Alguma vez se sentiu descriminada no país de acolhimento?

Id: São os mais velhos que falam disso, mas só falam disso nas férias, em França não falam, sentem vergonha. E, em Portugal, quase se gabam.

Inv: A sua integração no país de acolhimento foi difícil ou fácil? Poderia descrever algumas peripécias?

Id: Nasci lá, nunca senti nada disso, acho que os muçulmanos são descriminados. Na França, é proibido enviar currículos com o nome e fotografia porque eles não são empregados. Os portugueses não são descriminados, acho que são consentidos, se se portarem bem. Mas, há problemas com os portugueses, há portugueses a viverem muito mal. Mas, a isso ninguém liga, nem cá nem lá, desde que trabalhem e se considerem franceses, tudo bem.

Inv: São conhecidas as disputas (picanços) entre emigrantes e residentes, por exemplo, durante as férias, era realizado um jogo de futebol entre emigrantes e portugueses, qual nem sempre acabava da forma disciplinar mais correcta. Poderia descrever outras formas de “picanço”?

Id: Isso ainda existe, nas discotecas. Em Monção na (nome da discoteca) há sempre problemas, aqui, não há discotecas.

Inv: Como explica esse comportamento, por parte dos residentes? Ou seja, na sua opinião, qual seria a razão dos residentes” picarem” os emigrantes?

Id: Só os parvos é que picam os emigrantes. Às vezes, mandam uma boca, mas isso é tudo. Só os parvos é que vão mais longe.

Inv: Sendo portuguesa, alguma vez se sentiu descriminada ou mal tratada, em Portugal, pelo facto de ser emigrante?

Id: Só nas bocas, o resto, evito os sítios com essas pessoas parvas.

Inv: Durante as férias, quando o número de emigrantes era superior ao de residentes, os emigrantes e residentes frequentavam locais públicos diferentes. Na sua opinião, qual era a razão para tal comportamento?

Id: É o que acontece nas discotecas com os mais novos. Talvez porque só falam francês. É muito fácil assim.

Inv: Como explica o facto dos residentes, durante as férias, se reunirem somente entre eles?

Id: É a mesma coisa, mas ao contrário, quando era mais nova, nas discotecas, os rapazes de cá, vinham falar connosco e os rapazes emigrantes tinham ciúmes, na altura, até era giro, mas é realmente uma estupidez.

Inv: Em espaços públicos, por exemplo, num café, alguma vez foi “olhada de lado” pelos residentes não emigrantes?

Id: Pois, é… é bem assim. Explico: porque os portugueses nunca se juntaram, não têm força.

Inv: Como pode explicar esta afirmação normal entre os emigrantes: “Em França somos portugueses, em Portugal somos franceses”?

Id: Claro, sou francesa, mas é cá que me sinto melhor. Na França, as pessoas são mais isoladas, aqui, é mais fácil conhecer as pessoas, fazer confiança com elas. Foi por isso que, eu, vim para Portugal.

Inv: Acha que adquiriu formas de estar, de viver, do país de acolhimento? Quais?

Id: Em algumas coisas sim, noutras não. A sociedade francesa é mais fria, não querer saber das pessoas.

Inv: Acha que os residentes teriam a ganhar se adoptassem também essas práticas?

Id: Antigamente, reparava que, às vezes, não gostamos dos emigrantes e não ligava a isso. Mas, como ‘tou cá, às vezes, vejo que alguns emigrantes, realmente, não são normais.

Inv: Acha que os residentes tinham razão quando diziam que os emigrantes eram todos uns convencidos e uns arrogantes?

Id: E…

Inv: Como explica o facto de que Portugal, sendo o país dos descobrimentos espalhados pelos cinco continentes, “obriga-se” os portugueses a passarem pelas dificuldades de quem emigrava?

Id: É a história, nós somos emigrantes.

(Fecho da entrevista)

OS EFEITOS DO VAIVÉM DA EMIGRAÇÃO CONTINENTAL:

UM ESTUDO DE CASO EM MELGAÇO

Joaquim Filipe Peres de Castro

Universidade Fernando Pessoa

Faculdade de Ciências Humanas e Sociais

Porto, 2008

MELGAÇO NA EMISSORA NACIONAL

melgaçodomonteàribeira, 10.06.23

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VOZ DE PORTUGAL

(08-09-1960)

 

LOC (locutor) – Programa dedicado pela Emissora Nacional aos portugueses dos Estados Unidos da América do Norte, bons portugueses que na grande pátria onde vivem e lutam e sonham nunca esquecem a terra onde nasceram.

(música)

LOC – “Voz de Portugal” é a voz dos heróis, na evocação do passado; é a voz da terra, na lembrança da paisagem; é a voz dos poetas que fizeram versos em louvor de Portugal; é a voz das tradições e a voz das cantigas. “Voz de Portugal” é uma fala de amor e de saudade, para todos os portugueses distantes, mas que têm a pátria sempre perto do coração.

(música)

 

MELGAÇO, OS SEUS ENCANTOS E OS SEUS PROGRESSOS

 

Situada no extremo mais setentrional do País, a vila de Melgaço peca pela distância a que se encontra e só por isso, talvez, não usufrui da fama que, pelas suas múltiplas e variadas belezas naturais, bem merecia, por si e por toda a região circundante. Pode asseverar-se, com plena justiça, que, na gloriosa exuberância do jardim viçoso que é todo o Alto Minho, os foros de Melgaço constituem um canteiro privilegiado de encantos.

Pelos caminhos adustos da serra até ao pitoresco Castro Laboreiro; pela estrada sinuosa que leva até à fronteira de São Gregório, paralela ao ténue fio de água que é o rio Minho lá ao fundo, nas cavas da montanha; para as bandas do Peso (onde brotam fontes de saúde) por entre renques de cerrada arborização; para qualquer lado que se desviem os passos, a paisagem sublima-se numa grandeza surpreendente e dominadora.

Presentemente, estão em curso obras e melhoramentos de que nos limitaremos a dar ligeiros tópicos, os suficientes para se poder avaliar a importância da actividade camarária. No que diz respeito a estradas municipais, está em curso a construção do segundo lanço da estrada da sede a Alcobaça, por Fiães; foi a concurso a obra para a abertura da estrada da Senhora de Lurdes a Sá (Paços); e está a proceder-se ao levantamento dos projectos para as estradas de Várzea Travessa a Rodeiro (Castro Laboreiro) e de Castro Laboreiro a Portos. Neste momento, estão a decorrer os trabalhos relacionados com o abastecimento de água aos lugares de Aldeia de Cima (Paderne) e de Maninho (Alvaredo).

O plano de reparação e de construção de edifícios escolares continuam a merecer particular zelo. Já foi adjudicada a construção das escolas de Adofreire (Castro Laboreiro), Além e Peso (Paderne) e de Corga (Remoães) e faz-se a aquisição dos terrenos onde vão ser erguidos os novos edifícios escolares de Crasto (Rouças) e da própria vila. A assistência é, por sua vez, um campo de acção que a municipalidade trata com especial desvelo.

A estância hidrológica do Peso, com toda a maravilha da sua paisagem e dos seus recantos frondosos, é bem o centro de atracção desta zona do Alto Minho – também por constituir um aprazível local de repouso onde as comprovadas virtudes curativas das suas águas minerais têm merecido a bênção de muitos doentes que ali procuraram alívio para os seus achaques.

Com mais alguns melhoramentos que se projectam – o engrandecimento do Peso e uma pousada na vila – depressa Melgaço conquistará um lugar de relevo, aliás bem merecido, no plano turístico nacional.

(música)

 

LOC – A Emissora Nacional apresentou o programa “Voz de Portugal”, dedicado aos portugueses dos Estados Unidos da América do Norte. E deles se despede à velha maneira da gente portuguesa, com muitas saudades, tantas – que só à vista terão fim.

MELGAÇO NA ARMADA EM 1624

melgaçodomonteàribeira, 03.07.21

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 azulejo de manuel igrejas - pormenor

FIDALGOS PORTUGUESES QUE INTEGRARAM A ARMADA DA RESTAURAÇÃO DA BAHIA DE 1624

 

PEDRO CÉSAR D’EÇA

Nota: Pedro César d’Eça integrante da Armada da Restauração da Bahia de 1624, serviu também na África e ficou cativo, custando o seu resgate 46 mil cruzados.

Filho de Luiz César de Menezes, Provedor dos Armazéns, Comendador da Ordem de Cristo, no tempo dos reis D. João III e D. Sebastião, homem muito rico, e de D. Cecília d’Eça ou D. Cecília de Castro, filha de Fernão de Castro, Alcaide Mor de Melgaço. Este Luiz César de Menezes, é irmão do General Vasco Fernandes César, Provedor dos Armazéns e Armadas do Reino, portanto tio do outro Luiz César de Menezes, que também integrou a Armada da Restauração da Bahia de 1624.

Pedro César d’Eça, deixou geração do seu casamento com D. Jerónima de Castro, filha de Cristóvão Falcão de Sousa, Governador da ilha da Madeira.

Finalmente, Pedro César d’Eça e seu sobrinho Luiz César de Menezes, são primos próximos de Francisco de Mello e Castro, que também os acompanhou na Armada da Restauração da Bahia de 1624.

RUY BARRETO DE MOURA

Nota: Outro fidalgo cuja identificação fica muito difícil pela falta de maiores informações.

Cronológicamente há possibilidades de ser um Ruy Barreto Rolim ou de Moura Rolim, que serviu na Índia e foi comendador de Castro Laboreiro. Filho de Manuel Barreto Rolim e de Jerónima Esparragoza de Sousa; neto paterno de outro Ruy Barreto, Estribeiro Mor do rei D. Manuel, Comendador de Azambuja, e de Rodão e bisneto de Jorge Barreto e de D. Leonor de Moura, origem do seu sobrenome Moura.

Com geração de seu casamento em Goa com D. Catarina, senhora nobre, criada e adoptada por sua avó D. Maria d’Eça.

 

Retirado de https://familysearch.org

 

SOPRANO À MINHOTA II

melgaçodomonteàribeira, 24.08.19

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Benfiquista e bom patrão

Foi no bar que Abel conheceu Diene Amorim, uma brasileira com quem tem dois filhos. Hoje o casal vive em Bridgewater, numa casa de 315 metros quadrados que comprou há nove anos por 655 mil dólares (cerca de 517 mil euros), mas durante anos viveu num apartamento modesto por cima do restaurante. Os dois vestem-se bem, embora discretos. Abel conduz um AudiA4 com oito anos e Diene uma carrinha Volvo. Os filhos frequentam uma escola pública e vão todos os fins de semana à catequese na igreja portuguesa de Nossa Senhora de Fátima. Os vizinhos dizem que o casal é boa gente. Todas as manhãs, Abel estaciona no parque do Portucale, que transformou em restaurante em 2011. As obras terão custado centenas de milhares de dólares, mas o português comentou com conhecidos que apenas o tinha feito para cumprir um desejo da mulher. Antigos funcionários dizem que é o melhor patrão que tiveram, que paga sempre a horas e ajuda quando têm muito movimento. Prefere estar no escritório, mas vem para a sala quando joga o Benfica, de que é adepto ferrenho e pelo qual chegou a ir a Portugal para acompanhar jogos importantes. Terá este homem, que ninguém critica, sabido que estava a movimentar dinheiro da máfia através de esquemas ilegais do jogo, agiotagem e tráfico de droga? Terá descoberto a origem do dinheiro e sido proibido de abandonar o negócio? Ou sabia de tudo e preferiu continuar a lucrar?

Um ano depois de assinar contrato com Puccillo, a sua companheira comprou um serviço de troca de cheques, na zona norte da cidade. Abel nunca contratou esta empresa, continuando a preferir os serviços do italiano. Num dia fraco, movimentava entre 20 a 50 mil dólares. Nos dias bons, chegava a 400 mil. O dinheiro ficava pouco tempo no restaurante. Assim que chegava, o português agarrava no telefone e em minutos chegavam homens de Mercedes, que saiam de envelope na mão.

No bairro circulava todo o tipo de rumores. Nunca se falou em máfia, mas muitos comentavam que algo ilícito se passava entre aquelas paredes. Especulava-se que Diene tinha comprado o negócio em North Newark para encobrir irregularidades, mas a brasileira nunca foi acusada. Durante anos, todos os boatos se desvaneceram, nunca se concretizando numa queixa às autoridades. Entretanto, o negócio continuava a crescer.

 

Malas de dinheiro e assédio policial

O dinheiro era entregue a Abel, todos os dias, por funcionários de Puccillo. Alguns clientes recordam o momento da entrega, quando um carro de cor escura estacionava junto à porta, os funcionários pediam aos clientes que ninguém saísse, um homem entrava com uma mala, dirigia-se ao escritório na cave e saía. Tudo acontecia em segundos. A operação aconteceu centenas de vezes, durante anos, sem qualquer falha. Até à manhã de 19 de Maio de 2011.

Nessa data, um ex-polícia saiu do carro e dirigiu-se para o Portucale segurando uma mala. No caminho, alguém disparou. O homem estava armado e respondeu. Foi atingido de novo e caiu de joelhos. Nesse momento, um segundo assaltante disparou, atingindo-o no queixo. O homem acabou no passeio junto à entrada de uma loja de bebidas. Um dos assaltantes fugiu, o outro agarrou na mala, entrou num carro e conduziu umas dezenas de metros. Devido aos ferimentos, chocou contra um semáforo. Quando a polícia chegou, estava a perder a consciência e a mala continuava no carro. No interior, a polícia descobriu 400 mil dólares. Em minutos, o local estava cheio de agentes. No mesmo dia, Abel começou a ser investigado.

Polícias à paisana visitaram o restaurante. O português foi seguido e as suas comunicações podem ter estado sobre escuta. Convencido que estava protegido pelo contrato que tinha assinado com Puccillo, continuou a trocar cheques durante mais de um ano e meio. Só em dezembro de 2012, quando a polícia o interrogou, é que contratou um advogado, o reputadíssimo especialista em crimes económicos Michael Critchley, e fechou atividade. Tinham-se passado 25 anos desde que tinha trocado o primeiro cheque.

Segundo a acusação, em três anos e meio, Abel ajudou a lavar 400 milhões de dólares, perto de 315 milhões de euros, e cobrado comissões de nove milhões. Dos três por cento que cobrava, guardava um por cento. O resto do dinheiro pertencia a Puccillo, que ficaria com uma parte e dava outra a Rodriguez, Tuzzo e Alberti. Pelos crimes de que é acusado, Abel arrisca uma pena de 20 anos.

 

Pesadelos e registos em Elm Street

Nos últimos anos investiu com sucesso no imobiliário. Na semana passada, as autoridades congelaram as suas contas bancárias, o edifício do restaurante, dois prédios na mesma rua e a casa da família. Mas o empresário terá, pelo menos, outro prédio e dois parques de estacionamento em Elm Street, um segundo bar em Newark e um restaurante na Florida, que poderão estar no nome de outras pessoas e empresas.

Em 2013, por saber que estava a ser investigado, mudou algumas propriedades de nome. De acordo com os registos fiscais do condado de Essex, consultados pela VISÃO, o prédio no número 127 da Elm Street, por exemplo, passou a 21 de junho para o nome de uma empresa com o nome Union Street Realty, pelo preço de 400 mil dólares (um valor 80 mil dólares abaixo do que Rodrigues tinha pago em 2004). A Union Street Realty tem sede no número 129, a morada do restaurante Portucale. No mesmo dia, Rodrigues vendeu a esta empresa o prédio do número 125 por 500 mil dólares (menos 50 mil euros do que o valor pago em 2004).

Quando Abel foi detido, o juiz definiu uma caução de 400 mil dólares. No dia seguinte, a companheira entregou 40 mil dólares e uma garantia de 360 mil para o libertar. Esteve preso menos de 48 horas. Em liberdade, garante que apenas trocou cheques e nunca se envolveu com a máfia. Na quinta de manhã, 23, estava de volta ao Portucale, que não chegou a fechar, anunciando sempre em cartazes a festa que, esta sexta-feira, 31, vai encher o espaço para celebrar o Dia das Bruxas. Abel continuou a viajar depois de saber que estava a ser investigado. Este verão, passou 6 semanas em Portugal com a mulher e os filhos. Além de Melgaço e da mãe, visitou amigos de norte a sul. Foi a quarta viagem desde 2012 e também esteve no Brasil. Podia ter fugido a qualquer momento. Qualquer especialista o teria aconselhado a pedir cidadania norte-americana, para evitar a deportação caso seja condenado, mas o emigrante também decidiu não o fazer. Abel quer enfrentar a justiça. Está convencido de que o seu sonho americano não terminou.

 

Da Visão online em 11/11/14

 

SOPRANO À MINHOTA I

melgaçodomonteàribeira, 17.08.19

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A história exclusiva de Abel Rodrigues, o emigrante de Melgaço cujo restaurante em Newark terá servido para a máfia nova-iorquina lavar 400 milhões de dólares.

 

Alexandre Soares, em Newark (artigo publicado na Visão 1130, de 30 de outubro 2014)

Quinta feira, 6 de Novembro de 2014

 

Na madrugada de 21 de Outubro, perto das seis da manhã, Abel Rodrigues acordou com o som da campainha. Na sua casa em Bridgewater, no estado de Nova Jérsia, Estados Unidos, abriu a porta e, ainda no escuro, descobriu sete agentes da polícia armados. A mulher já estava do seu lado quando lhe leram os direitos, mas os filhos, um casal de nove e onze anos, dormiam. O casal ouviu a lista de crimes de que o português era acusado: falsa declaração de rendimentos, troca ilegal de cheques, extorsão, lavagem de dinheiro e associação criminosa. Abel foi algemado e levado para o carro-patrulha enquanto tentava tranquilizar a mulher. Três anos e meio depois do início, chegava ao fim a operação Punho Cerrado, que envolvera quatro agências especializadas e cerca de 35 agentes. Com o fim da investigação, chegava também o fim do sonho americano do emigrante minhoto. Uma história digna da premiada série Os Sopranos, cuja ação se passa também no Garden State.

Abel não foi surpreendido. Vizinhos, clientes e antigos funcionários dizem que o português já esperava este dia desde que, em dezembro de 2012, a polícia foi ao seu restaurante Portucale, em Newark, e levou computadores, caixas registadoras e documentos. Com a voz tranquila, Abel mostrou escrituras e contratos. Insistiu que a sua atividade era legal. A polícia discordou e ele passou a esperar o seu regresso. Mas nunca imaginou que, quando o momento chegasse, seria acusado de associação criminosa com os Genovese, a família mais poderosa da máfia de Nova York.

 

De São Paio aos cheques no Rio Douro

Abel acabou na prisão de Morris County lado a lado com Charles Tuzzo, de 80 anos, e Vito Alberti, 55, dois membros dos Genovese. Encontrou também Domenick Puccillo, 56, o seu parceiro de negócios e Manuel Rodriguez, 49, que o tinha apresentado a Puccillo anos antes. No mesmo dia, a procuradoria de Nova Jérsia deu uma conferência de imprensa anunciando os detalhes da operação. “A nossa mensagem para a máfia é: enquanto existirem, vamos continuar a enviar-vos para a prisão”, avisou o procurador John J. Hoffman, minutos antes de libertar as fotos de Rodrigues e dos outros acusados. A notícia atravessou logo o Atlântico. Jornalistas foram bater à porta da mãe de Abel, de 83 anos, que vive sozinha em Melgaço, e perguntaram-lhe pelo filho mafioso. O minhoto acredita que, se o pai ainda fosse vivo, teria morrido nesse momento.

Abel nasceu no lugar de Real, em São Paio, há 52 anos. Começou a trabalhar ainda criança, ajudando o pai na lavoura. As duas irmãs emigraram para França e, pouco depois, também ele abandonou o País. Emigrou para Punto Fijo, na Venezuela, com 20 anos. Um colega da construção falou-lhe dos EUA, dizendo que se ganhava bom dinheiro. Em outubro de 1983, Abel chegava ao bairro de Ironbound, em Newark, onde se concentra parte da comunidade portuguesa. Arranjou trabalho na construção, mas a obra parou meses depois devido ao inverno. Acabou como empregado de balcão do Rio Douro, um café português, na Elm Street.

Foi neste local que trocou o primeiro cheque. Por ordem do patrão, recebia cheques de emigrantes indocumentados, que não podiam ter conta de banco, e de pessoas que não tinham dinheiro na conta para cobrir o salário dessa semana. Embora ilegal, era uma atividade comum. Dezenas de estabelecimentos no bairro faziam o mesmo.

 

As comissões e o negócio com don Puccillo

Em 1987, um bar de espanhóis chamado Escorial, do outro lado da rua, foi posto à venda. Abel comprou-o por 88 mil dólares (69 mil euros). No início, tinha apenas um funcionário, e abria das sete da manhã às três do dia seguinte. Dormiu muitas noites na cave, para aproveitar cada hora de sono. Continuou a trocar cheques, a maioria a galegos. Quando alguém lá chegava e só pedia para trocar o cheque, fazia-os esperar e beber algumas cervejas, para dar lucro à casa. Só começou a cobrar comissão depois de receber vários cheques sem cobertura. A comissão não era fixa e variava entre um e três por cento. A atividade, lucrativa, manteve-se durante anos.

Em 2007, os bancos mudaram os seus protocolos. Começaram a recusar trocar cheques endereçados a terceiros, sobretudo quando eram elevados. Foi nessa altura que o italiano Manuel Rodriguez apareceu no bar, perguntando a Abel se ainda estava no negócio. Os dois homens já se conheciam, porque Manuel era dono de outro bar da cidade, o Guitar Bar. Abel partilhou as suas dificuldades e o homem respondeu que tinha uma solução. Podia apresentá-lo a Domenick Puccillo, que tinha um negócio licenciado de troca de cheques, e muito, muito dinheiro. Abel aceitou a ajuda. Assinou um contrato com Puccillo, o mesmo que viria a mostrar à polícia, anos depois, quando lhe inspecionaram o restaurante. O mesmo contrato que lhe disseram que não era válido.

Puccillo tinha ligações à máfia, mas Rodrigues pode nunca o ter sabido. Um dirigente da polícia de Newark garante que a máfia teve uma presença forte na cidade durante décadas, mas que a sua influência é hoje reduzida. Existe em áreas como o porto comercial e em negócios como o lixo e máquinas de jogo. Raras vezes a sua presença se traduz em episódios de violência. Além disso, tem uma organização hierarquizada, em que um nível não contacta com o outro. Mesmo assim, terá Abel imaginado como é que os sócios tinham acesso a quantias tão elevadas? Terá perguntado pela origem do dinheiro que transacionava?

Com Puccillo na retaguarda, o negócio do português cresceu. Abel montou um escritório nas traseiras e destacou alguns funcionários para lidar com estes clientes. Às suas mãos começaram a chegar cheques de 100 mil dólares. Segundo a acusação, o empresário trocava estes valores sem pedir identificação ou manter registo da transação, permitindo aos clientes escapar ao escrutínio do estado. Empresas de construção brasileiras e portuguesas recorriam ao serviço, assim como negócios que recolhiam cheques menores e depois os trocavam em conjunto no Portucale. A operação tornou-se um negócio de milhões.

 

MELGACENSES NA I GRANDE GUERRA (E EM OUTRAS GUERRAS DO SÉCULO XX)

melgaçodomonteàribeira, 15.12.18

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Foi há pouco mais de cem anos que os primeiros soldados do contingente que Portugal enviou para combater em França na I Guerra Mundial chegaram à Flandres. Em África, já combatiam os alemães desde 1914. Com base nos dados de que dispomos, de Melgaço partiram para a Flandres mais de setenta homens, oriundos das diversas freguesias. Estes homens foram autenticamente “roubados” às suas vidas e obrigados a ir para uma guerra para a qual não estavam preparados. Paderne, com catorze homens, Penso com doze homens e Vila, com catorze homens, são as freguesias melgacenses que mais contribuíram em termos de número de efetivos. Estes homens da nossa terra, feitos soldados, tinham todos – à data do embarque – idades entre vinte e dois e vinte e sete anos completos (nascidos entre 1891 e 1895), à exceção dos oficiais e sargentos que eram um pouco mais velhos.

 

MELGACENSES NA I GRANDE GUERRA

(E EM OUTRAS GUERRAS DO SÉCULO XX)

Valter Alves

Joaquim A. Rocha

Edição de Autores

Melgaço 2018

 

VALTER ALVES. Filho de Anselmo Alves (1937-1990), funcionário da Repartição de Finanças de Melgaço, e de Elisa Maria Afonso (1938-1993), doméstica. Neto paterno de Francisco Alves e de Maria Teresa Alves; neto materno de Manuel Gaspar Afonso e de Albertina dos Anjos Sérvio. Nasceu em São Paio de Melgaço a 25/4/76. Estudou na escola primária de São Paio e na então escola C+S de Melgaço até aos dezassete anos de idade; depois, devido à morte dos pais, seguiu para Cinfães do Douro, para casa do seu irmão, onde permaneceu até 2002. Licenciou-se em Geografia (Ramo Educacional), na Faculdade de Letras da Universidade do Porto. É Pós Graduado em Gestão dos Riscos Naturais. Em 2018 morava em Vila Nova de Gaia e era professor de Geografia na Escola Básica e Secundária de Lousada Norte. Casou em 2003 com Carla Alves.Paralelamente à atividade docente, desenvolve investigação histórica, cujo produto tem sido publicado no blogue – Melgaço, entre o Minho e a Serra -, onde divulga notícias históricas, e outras estórias sobre o concelho de Melgaço. Pai de Luís Pedro Alves.

                                

JOAQUIM AGOSTINHO DA ROCHA nasceu em Cevide, Cristóval, Melgaço, onde residiu até aos seis anos de idade. Depois foi para a Vila de Melgaço, terra de sua mãe, Maria Leonor da Rocha. Permaneceu ali até aos vinte anos, altura em que ingressou no serviço militar. Cumpriu cerca de um ano na “Metrópole” e quase dois anos na Guiné-Bissau. Em finais de 1967 regressa e fixa a sua residência em Lisboa. Em finais de 2000 transfere-se para Braga, onde ainda vive. Quanto a estudos: saiu de Melgaço com a 4ª classe mais dois anos do Curso Elementar de Estudos Agrícolas, portanto com a equivalência à sexta classe, ou 2º ano dos liceus. Na capital do país fez o Curso Comercial e o Curso Complementar de Contabilidade e Gestão de Empresas (Técnico de Contas). Fez depois algumas disciplinas no Liceu e Ano Propedêutico, permitindo-lhe ingressar na Faculdade de Letras, onde completou o 2º ano do Curso de Línguas e Literaturas Modernas (Estudos Portugueses). Devido a incompatibilidades de horários, completpu o Curso na Universidade Autónoma de Lisboa (Luís de Camões) com a média de 16 valores. Quanto a empregos: foi empregado de escritório, contabilista, bancário, bibliotecário, professor… Dedica-se atualmente ao estudo da História e Cultura de Melgaço, e também ao estudo da Genealogia, ou seja, à biografia dos melgacenses em geral.

 

SAN PAYO - UM FOTÓGRAFO DE SÃO PAIO

melgaçodomonteàribeira, 16.07.16

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«SAN PAYO – RETRATOS FOTOGRÁFICOS»

 

Exp. SEC – IPM – Arquivo Nacional de Fotografia

Museu do Chiado, 1995

comis. Vitória Mesquita e José Pessoa

Cat. com textos de António Barreto (SP: a arte do retrato, a sociedade e a política), Raquel Henriques da Silva (O retrato fotográfico e o retrato na pintura. San Payo e a arte portuguesa, 1920-1950), e os comis. (Estudo do trabalho do fotógrafo Manuel Alves San Payo (1890-1974), na sequência da doação do espólio do artista por parte da família.)

No Expresso, escreveu Jorge Calado: “Retratos e Fotografias”, Revista, 25 Nov. 1995, pp. 120-126

A exp. teve por base o espólio doado pelos filhos do fotógrafo, em 1990, ao Arquivo Nacional de Fotografia (departamento do Instituto Português de Museus que aguardava ainda em 1995 a sua institucionalização formal – que não chegou a ocorrer, devido à criação do CPF em 1996/97

notas:

MUSEU DO CHIADO 4-11-1995

O Arquivo Nacional de Fotografia, entidade informal ou serviço do Instituto Português dos Museus (alguém irá finalmente dar-lhe agora existência legal e estatuto condigno?), revela um dos espólios que recebeu e conserva. Retratista (apenas retratista, o que é raro num fotógrafo), San Payo gozou de uma fama imensa que se justifica pela exacta correspondência entre o autor e o meio social que retratou. A retrospectiva corre o risco de reeditar o mito, sobre algum desconhecimento de outras realidades nacionais e internacionais. A exposição e a obra têm méritos; a iniciativa é um contributo positivo para o levantamento da história da fotografia e do gosto nacionais. Mas impõe-se proceder a revisões mais rápidas do passado, certamente mais abrangentes e comparativas que as produções monográficas.

 

MUSEU DE ÉVORA 14-9-1996

Reapresenta-se em Évora a exp. «San Payo – Retratos Fotográficos», inaugurada em 1995 no Museu do Chiado e já este ano levada a Melgaço, terra natal do fotógrafo que foi um dos mais famosos retratistas de Lisboa, desde meados dos anos 20.Partindo da tradição picturialista, San Payo (1890-1974) cultivou o «retrato de arte» com uma assinalável competência profissional, sendo a sua obra um notável indicador dos gostos dominantes da sociedade nacional e de uma certa prática social da fotografia. A mostra foi organizada pelo Arquivo Nacional de Fotografia (departamento do Instituto Português dos Museus que aguarda a sua institucionalização formal no quadro da reorganização do Ministério da Cultura), com base no espólio que lhe foi doado pelos filhos do fotógrafo em 1990, e constitui mais um passo significativo no levantamento do património fotográfico nacional.

Retirado de:

http://pt.scribd.com/doc/92766773/Fotografias-antigas-algumas-historias