Saltar para: Posts [1], Pesquisa [2]

MELGAÇO, DO MONTE À RIBEIRA

História e narrativas duma terra raiana

MELGAÇO, DO MONTE À RIBEIRA

História e narrativas duma terra raiana

MELGAÇO, FILMES DO HOMEM

melgaçodomonteàribeira, 22.06.24

924 b film homem 2016.jpg

FILMES DO HOMEM: O FESTIVAL DE DOCUMENTÁRIO REGRESSA A MELGAÇO

Florbela Alves

1.08.2017

SETE – VISÃO

Vai para a 4ª edição o Filmes do Homem cuja temática anda à volta do cinema etnográfico e social. Eis sete (boas razões) para não perder este festival gratuito, entre esta terça-feira, 1, e domingo, 6, em Melgaço.

1 – O FESTIVAL

Organizado pela Câmara Municipal e a Associação Ao Norte, o Filmes do Homem – Festival Internacional de Documentário de Melgaço começou há quatro anos, com a intenção de divulgar o cinema etnográfico e social, refletindo sobre temáticas como a identidade, memória e fronteira. O festival teve como ponto de partida o Museu de Cinema de Melgaço Jean Loup Passek, que guarda o espólio do realizador francês, fundador do Festival De La Rochelle, conselheiro para o cinema do Centre Georges Pompidou, falecido em dezembro último.

2 – OS FILMES EM COMPETIÇÃO

São 24 filmes candidatos ao Prémio Jean Loup Passek: 15 filmes concorrem ao prémio de melhor longa-metragem internacional, nove à melhor curta ou média-metragem internacional e sete ao galardão de melhor documentário português, com um valor monetário de três mil, mil e quinhentos e mil euros, respetivamente. O festival, lembra Carlos Viana, da Associação Ao Norte, tem vindo a ter “um número cada vez maior de candidaturas”. Este ano recebeu 600 propostas – “um número interessante uma vez que não é um festival generalista”, sublinha – tendo sido selecionados filmes de Portugal, Finlândia, Alemanha, Argentina, Espanha, Reino Unido, Estados Unidos, França. A maioria são exibidos, gratuitamente, na Casa da Cultura, havendo ainda projeções ao ar livre nas freguesias de Castro Laboreiro, Cristóval, Alvaredo, além das galegas Arbo e Padrenda. O júri é constituído por André de Oliveira e Sousa, Graça Castanheira, Iris Zaki (vencedora da melhor curta-metragem 2016 com Women in Sink), Rodrigo Areias e Sérgio Rizzo.

3 – AS EXPOSIÇÕES

Há quatro exposições que inauguram durante o festival e permanecem, em Melgaço, durante os próximos meses. Em Festa, patente na Casa da Cultura até dia 31 de agosto, as fotografias de João Gigante percorrem um ano de festividades tradicionais em Castro Laboreiro. “É uma pesquisa visual por este território e pelas pessoas que nele habitam”, descreve-se. Ainda na Casa da Cultura, a fotógrafa e cineasta filipina Venice Atienza inaugura O Pão Nosso de Cada Dia, a lembrar a carrinha branca que entrega o pão em diferentes aldeias. No mesmo dia, na Praça da República, mostra-se Encontro, de Diogo Marques Santos, construída a partir de arquivos fotográficos das famílias de cada uma das pessoas fotografadas. A última exposição, A Idade de Ouro do Cartaz de Cinema Polaco, comissariada por Bernard Despomadères, inaugura no domingo, 6, mas continuará patente durante quase um ano, no Museu de Cinema de Melgaço Jean Loup Passek.

4 – AS NOVIDADES

Pela primeira vez, o festival organiza um encontro sobre a literacia para o cinema, que servirá de análise sobre o funcionamento do serviço educativo do museu. O Kino Meeting decorre na sexta-feira, 4, no Solar do Alvarinho, e conta com intervenções de Abi Feijó (Casa Museu de Vilar, Lousada), Ana Camps (Filmoteca da Catalunha, Barcelona, Espanha) e, entre outros, Roberta Zendrini (Museo Nazionale del Cinema, Torino, Itália). Outra novidade serão os Encontros Arraianos de Cinema (4 e 5 ago), que incluem a apresentação do livro Arraiano entre os Arraianos, de Xosé Luís Méndez Ferrín. O objetivo, lembra Carlos Viana, é “fomentar o diálogo entre as fronteiras através do cinema”.

5 – RESIDÊNCIAS ARTÍSTICAS

A secção Plano Frontal recebe, este ano, 12 alunos finalistas de cursos de cinema oriundos de todo o país, que, ao longo desta semana, realizam quatro documentários sobre a região numa residência cinematográfica. Também a fotografia contará com uma residência artística com três alunos a trabalharem esta região sob a orientação de Pedro Sena Nunes.

6 – SALTAR A FRONTEIRA

Nos anos 60 milhares de portugueses emigraram para França numa viagem clandestina à procura de um novo futuro. No fim de semana de 5 e 6 de agosto, sábado e domingo, reconstitui-se esta viagem através de um programa que inclui a exibição de vários filmes, tanto em Melgaço como em Lamas de Mouro, onde será exibido o filme Fronteiras, do espanhol Rubén Pardiñas (6 ago, 10.30).

7 – LEMBRAR JEAN LOUP PASSEK

Inaugurado em 2005, o Museu de Cinema Jean Loup Passek, instalado no antigo edifício da Guarda Fiscal, é um tributo ao cineasta francês que encontrou em Melgaço uma segunda casa, região que conheceu durante as filmagens dum documentário sobre a emigração, na década de 70. Esta será a primeira edição do Filmes do Homem após a morte do cineasta e crítico francês, em dezembro de 2016, aos 80 anos.

FILMES DO HOMEM – FESTIVAL INTERNACIONAL DE DOCUMENTÁRIO DE MELGAÇO

924 d 11093931cidade_pequena_diogo_costa_amarante.

cidade pequena  - diogo costa - amarante

924 c 11093767rosas_de_ermera_luis_filipe_rocha.jp

rosas de ermera - luis filipe rocha

 

MUSEU DE CINEMA DE MELGAÇO JEAN-LOUP PASSEK

melgaçodomonteàribeira, 04.05.24

922 b mus cinema.jpg

MUSEU DE CINEMA DE MELGAÇO: UMA COLEÇÃO A NÃO PERDER

Jorge Montez

O francês em itálico tem aqui uma razão de ser particular. É que o museu vive da coleção particular de um francês que se apaixonou pelo concelho mais a norte de Portugal. Jean Loup Passek doou a importante coleção de uma vida ao município ainda em vida e ajudou a construir o espaço que merece a visita de todos quantos passam pela vila.

A sala de exposição permanente exibe uma fantástica (não há que ter medo dos objetivos) coleção de lanternas mágicas, fenaquistiscópicos, zootropos e praxinoscópios. São nomes esquisitos para aparelhos que foram as grandes atrações dos salões elegantes e das feiras da França do século XIX.

Antes dos irmãos Lumiére terem inventado o cinematógrafo e promovido uma exibição de pequenos filmes a 28 de dezembro de 1895 no Grand Café de Paris, já as imagens em movimento atraíam multidões e a imaginação de inventores.

Até então, recorria-se a placas de vidro pintadas que, ao serem passadas, criavam a ilusão de movimento. O efeito era sempre semelhante, mas consoante o aparelho, o material utilizado variava. Tanto podia ser o vidro, como bandas ou discos.

Tudo isto se pode apreciar no Museu de Cinema de Melgaço. A coleção de Jean Loup Passek espanta não apenas pela qualidade e quantidade, como também pelo excelente estado de conservação dos objetos, nomeadamente as placas de vidro, que estão pristinas.

Se pensarmos que a maioria deste material andava de terra em terra e era exibido em feiras, fica o espanto de serem exibidas num tal estado que muitas parecem nunca ter sido utilizadas. Por isso, a lanterna mágica foi um dos 7 objetos com história que selecionamos entre Melgaço e Castro Laboreiro.

O Museu de Cinema de Melgaço alberga ainda uma exposição temporária que é mudada anualmente. Atualmente, está em exibição uma mostra de cartazes de cinema polacos, que aconselhamos vivamente.

Jean Loup Passek passou a sua vida adulta a colecionar objetos relativos ao cinema e teve o cuidado de zelar pelos objetos. Os cartazes, por exemplo, nunca terão sido enrolados, o que permite agora apreciar em toda a plenitude o trabalho dos artistas plásticos e gráficos que os conceberam.

UM FRANCÊS COM CORAÇÃO PORTUGUÊS

Jean Loup Passek (1936-2016) foi um nome importante no panorama cinéfilo francês. De ascendência russa, começou por se dedicar à poesia, mas rapidamente fez da sua paixão pelo cinema o seu modo de vida, tendo sido o concelho para a sétima arte do Centre de George Pompidou, diretor editorial do Dictionnaire Larousse du Cinéma, fundador e diretor do festival de La Rochelle e o criador do prémio Camméra d’Or do Festival de Cannes, para primeiras obras.

Foi um acaso que fez com que o homem de “espírito eslavo e nacionalidade francesa” ficasse com um “coração português”.

Nos anos 70 estava a fazer um documentário sobre a emigração e conheceu nas obras de ampliação metropolitano parisiense dois portugueses. A conversa correu bem e António Souto e António Alves convidaram-no para jantar em casa.

Desse encontro fortuito nasceu uma forte amizade e mais tarde um verdadeiro amor pelo nosso país. Jean Loup foi convidado para conhecer a terra de António Souto e apaixonou-se por Melgaço e pelas paisagens e montanha de Castro Laboreiro. Apaixonou-se pela gastronomia minhota e pelas gentes que o receberam como um dos seus.

E com o tempo, a paixão transformou-se em amor, de tal forma que Jean Loup Passek mudou-se definitivamente para Melgaço, tendo ainda construído uma segunda habitação na Nazaré.

Vendo que o tempo lhe fugia, o francês com coração português decidiu doar a sua coleção ao município de Melgaço, com a obrigatoriedade de que fosse exposta de forma permanente. Nasceu assim o Museu de Cinema de Melgaço Jean Loup Passek. A abertura oficial foi a 29 de abril de 2005, na presença do colecionador que afirmou, em declaração ao Público: “Estou contente. É um verdadeiro milagre que o museu tenha podido nascer aqui, em Melgaço. Ninguém me propôs nada de concreto em França. Gastei o meu dinheiro a comprar isto tudo, e não queria que a colecção ficasse em França. Sinto-me um pouco egoísta. Para mim, Portugal é que é importante”.

Melgaço ganhou assim um equipamento de excelência com uma das mais importantes coleções mundiais de objetos da pré-história do cinema. Mas durante os 50 anos que dedicou a recolher objetos, Jean Loup Passek interessou-se não apenas pelas lanternas mágicas e cartazes, mas também por fotografia, livros, câmaras e tudo o que de alguma forma estivesse relacionado com o cinema.

A coleção parece não ter fim e por isso se vão fazendo exibições temporárias. O Museu de Cinema de Melgaço Jean Loup Passek é, verdadeiramente, a não perder.

 

http://portugaldelesales.pt/museu-cinema-melgaco-nao-perder

922 c museu cinema interior.jpg

 

JEAN-LOUP PASSEK 1936-2016

melgaçodomonteàribeira, 12.12.20

20 b jean-loup passek x.jpg

 

MORREU JEAN-LOUP PASSEK, O CINÉFILO FRANCÊS EM QUE BATIA UM CORAÇÃO PORTUGUÊS

 

EM 2005, INAUGUROU EM MELGAÇO UM MUSEU DO CINEMA RECHEADO COM O ACERVO RECOLHIDO AO LONGO DA VIDA. NASCIDO EM FRANÇA, CINÉFILO CURIOSO, DESENVOLVEU ACTIVIDADE NO FESTIVAL DE CANNES, NO DE LA ROCHELLE E NO CENTRO POMPIDOU. DIZIA TER “ESPÍRITO ESLAVO, NACIONALIDADE FRANCESA E CORAÇÃO PORTUGUÊS”.

 

Mário Lopes

5/12/2016

 

Começou a chegar até nós quando, no início dos anos 1970, animado pelo espírito do cinema-verité registava um conjunto de obras para a ampliação do metro de Paris. Os operários que ali filmou eram portugueses, e Jean-Loup Passek cimentou com alguns deles uma amizade que o levaria, anos depois, quando já tinha duas casas em Portugal, em que se refugiava durante parte considerável do seu tempo, a afirmar ter “espírito eslavo, nacionalidade francesa e coração português”.

Em 2005, este historiador, crítico, programador e colecionador de cinema, com percurso ligado ao Festival de Cannes e ao La Rochelle, ao Centro Pompidou e ao prestigiado Dictionnaire du Cinéma das edições Larousse viu inaugurado o Museu de Cinema de Melgaço, a vila do Alto Minho onde tinha residência (a sua outra casa portuguesa encontrava-se em Pataias, Nazaré). Ali depositou o seu valioso acervo de memorabilia cinéfila, recolhida ao longo de toda a vida.

Jean-Loup Passek, morreu na madrugada deste domingo, aos 80 anos, revelou ao PÚBLICO fonte familiar. Em Setembro, a Cinemateca prestou-lhe homenagem com a programação de um ciclo de filmes e com uma exposição de cartazes do cinema clássico francês e da escola gráfica da Polónia, país de onde a sua família era originária (ou melhor, “de origem polaca ou russa conforme as vicissitudes da história” dizia). Na sessão inaugural, a 9 de Setembro, em que não pode marcar presença por motivos de saúde, foi-lhe atribuída a Medalha de Mérito Cultural do Governo de Portugal.

No texto de apresentação do ciclo – que contou com a presença, em Lisboa, do seu amigo de muitas décadas Marin Karmitz -, destacava-se a existência no seu trajecto de “uma óbvia coerência e duas ou três linhas de força”. São elas: “dar a ver, dar a conhecer, contra cânones estabelecidos, gavetas ou fronteiras históricas”. Foi o que fez, por exemplo, no Centro Pampidou, onde ocupou o cargo de Conselheiro de Cinema entre 1978 e 2001, sendo responsável por grandes retrospectivas de cinematografias menos conhecidas, como as do cinema checo, húngaro, turco, grego, indiano, chinês ou português.

A primeira homenagem em França a Manoel de Oliveira, em 1975, foi da sua responsabilidade, e a única retrospectiva de António Campos fora de Portugal aconteceu igualmente por sua iniciativa. Homenagem e retrospectiva surgiram no festival de La Rochelle, de que foi director em 1973 e 2001 (enquanto isso, coordenou a categoria Caméra d’Or do festival de Cannes, que distingue primeiras obras).

Nascido em 1936, em Boulogne-sur-Seine, Jean-Loup Passek licenciou-se em História e Geografia na Sorbonne, em Paris. A ligação afectiva e profissional ao cinema ficou garantida quando preferiu assistir a Citizen Kane, de Orson Welles, em vez de marcar presença nas provas do concurso de professorado. A aproximação a Portugal chegou, por sua vez, através da relação estabelecida com a comunidade imigrante portuguesa em Paris, junto da qual criou amizades que se mantiveram para o resto da vida.

Em 2005, quando da inauguração do Museu de Cinema de Melgaço, dizia ao PÚBLICO: “Estou contente. É um verdadeiro milagre que o museu tenha podido nascer aqui, em Melgaço. Ninguém me propôs nada de concreto em França. Gastei o meu dinheiro a comprar isto tudo, e não queria que a colecção ficasse em França. Sinto-me um pouco egoísta. Para mim, Portugal é que é importante”, destacou, referindo que toda a sua vida foi gerida “por sentimentos”. E por um olhar sempre interessado no que o mundo guardava para mostrar. Como afirmou certo dia, “sou pela curiosidade total”.

Reagindo à notícia da sua morte, a Câmara Municipal de Melgaço lamentou, em comunicado, o desaparecimento de “um amigo da terra”. “É indiscutível a amizade que nos unirá para sempre. Jean-Loup Passek será para toda a eternidade lembrado como um grande Amigo de Melgaço”, refere a autarquia.

Também o Ministro da Cultura prestou o “devido reconhecimento” ao trabalho da divulgação do cinema, e em particular do cinema português, realizado pelo historiador e crítico francês. Em comunicado enviado à Agência Lusa, Luís Filipe Castro Mendes sublinhou não esquecer “a generosidade de Jean-Loup Passek e a responsabilidade que representa o legado” de um homem cujo amor por Portugal “nos fez herdeiros do seu acervo, colecção que esteve na base da criação do Museu de Cinema de Melgaço”.

O funeral de Jean-Loup Passek realiza-se na sexta-feira de manhã, às 10.30, da Igreja de Saint-Germain-des-Prés para o cemitério do Pére Lachaise, em Paris.

 

Publicado em: Público de 5 de Dezembro de 2016

 

publico.pt