A Notária - Galiza
TAINADA NA NOTÁRIA
PARA O TEU ARQUIVO:
Anteriormente ao Lucas, o Regedor da Vila era o João Cândido de Carvalho, mais conhecido por João Braga, dono do prédio e pensão, ao lado do Lucas, esquina da Feira Nova. A filha única deste casal, a Lourdinha, casou com o Gasparinho (Lopo) filho do Albertinho de Galvão, pais do major Pereira de Castro. Quem deu a Regedoria ao Lucas (Rodolfo Amadeu Fernandes) foi o professor Abílio quando este era Presidente da Câmara. Eram muito amigos; o João Braga já estava bastante idoso e doente. A propósito, ocorreu-me uma cena desagradável que lembrou outra ainda pior.
A primeira: eu havia tomado uma gasosa na adega do Lucas (não a gasosa pirolito com esfera de vidro como tampa, mas outra com a tampinha de lata). Achei de ser engraçado, enchi a garrafa com água e coloquei a latinha novamente com habilidade. Dias depois essa água foi cair na boca do prof. Abílio. Causou um tremendo mal estar e uma bronca do Lucas que me serviu de lição.
A outra cena aconteceu com teu pai Carriço e colegas (Carlota & Cia.). Num domingo de pasmaceira, alugaram o carro do Pires e foram dar um passeio à Notária, do outro lado de S. Gregório. Fizeram uma tainada num café-taberna. Às tantas, mestre Carriço, irreverente, brincalhão que só ele, resolveu mijar dentro de uma garrafa de gasosa, colocar a tampa e disfarçadamente com a participação dos colegas, colocá-la entre as garrafas cheias no engradado. Poucos minutos depois essa garrafa foi cair nos lábios dum carabineiro. Exaltadíssimo, o homem (autoridade) soltou todos os impropérios que conhecia e queria matar todo o mundo. A balbúrdia foi grande e geral. Antes que se esclarecesse a autoria do crime, o Papá Pires fez que pagassem a conta e caíssem fora num abrir e fechar de olhos. Escaparam ilesos.
Quem contou esta passagem foi o velho Pires.
Rio, 20 de Fevereiro de 1995
Correspondência de Manuel e Ilídio
MANUEL IGREJAS, 1995
A COÇA
Os rapazes de Monção, quando havia baile em Melgaço, causavam grande sensação por se apresentarem arrumadinhos, engravatados e penteados com brilhantina, ao contrário dos rapazes de Melgaço que vestiam quase a mesma roupa com que andavam no trabalho.
Naquela época, a diferença de hábitos entre as duas vilas era grande; mercê do comboio em Monção havia mais modernismo.
O pessoal de Monção sabia disso e tirava partido aproveitando todas as oportunidades que se apresentassem para diminuir a gente de Melgaço.
Um domingo, apareceram na nossa vila duas camionetes a que chamavam excursão, cheias de rapazes de Monção fingindo visita de turismo. A dada altura, organizaram-se em marcha, exibindo aqueles bonequinhos em cima de uma cana que accionados por um arame batem um no outro (acho que se chamavam macaquinhos, não me lembro) e cantavam uma modinha da época que se adaptava a menosprezar a nossa gente. Para que!...
Os rapazes de então, entre eles o tio Emiliano, tio Ilídio (teu avô), Abel Barrenhas, Roberto Cuco e outros caíram de pau em cima deles, os debochados monçanenses, aplicando-lhes uma coça que ficou memorável nos anais da nossa terra. Fugiram atabalhoadamente todos rebentados e a partir daí os ânimos ficaram acirrados.
Qualquer encontro entre habitantes das duas vilas terminava em pancadaria.
Durou anos.
Quando eu era garoto, ainda se comentava esse glorioso acontecimento e já deviam ter passado vinte anos.
Rio, 6 de Fevereiro de 1997.
Correspondência entre Manuel e Ilídio