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MELGAÇO, DO MONTE À RIBEIRA

História e narrativas duma terra raiana

MELGAÇO, DO MONTE À RIBEIRA

História e narrativas duma terra raiana

LENDAS DO VALE DO MINHO - MELGAÇO

melgaçodomonteàribeira, 09.10.21

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CAMINHANDO PELO MUNDO DO FANTÁSTICO

NO VALE DO MINHO

 

OS SETE FILHOS PÁSSAROS

 

‘’Uma mãe tinha sete filhos que tinham uma «fada»: transformavam-se em pássaros. Dizem que é de serem sete rapazes que leva a ter essa fada; outros transformam-se em lobisomem.

A mãe queria tirar a fada a esses filhos, mas não sabia como. Ela passava dias, semanas e até meses sem ver os pobres dos filhos, pois eles andavam pelos ares, astros, como os pássaros! A mãe sabia que eles se transformavam em pássaros, que tinham aquela fada, pois… sei lá, talvez viessem bater com o bico nos vidros das janelas…

Um dia foi a uma senhora entendida, contou-lhe, e perguntou-lhe como é que podia tirar essa fada aos filhos. E dizia: Eu queria quebrar esta fada aos meus filhos... Eles sofrem tanto e estão desgraçados! Ela disse-lhe: Olha! Para quebrares a fada aos teus filhos tens de fazer grandes sacrifícios. Tu cortas junco (vais aos regatos, aos rios), muito junco, e trazes para casa. Depois secas esse junco e fazes sete croças (…). A mãe tinha que fazer sete croças para os sete filhos que tinha. Mas tens que fazer essas sete croças sem falar, comer ou dormir! Agulha sobre agulha, trabalho sobre trabalho, tu não podes fazer mais nada até acabares as sete croças.

E ela pôs-se a fazer as sete croças, a tricotá-las. E não falava… só tricotava… só tricotava… As pessoas passavam e perguntavam sobre o que ela estava a fazer. Mas ela não podia responder, para não falar e assim respeitar o mando da bruxa. Até que, depois de muito tricotar, quando tinha a última croça quase pronta, as pessoas continuavam a falar para ela… (sabe que na aldeia é assim!). E já suspeitosas de tanto silêncio queriam condená-la à morte, que era o que faziam naquele tempo às bruxas. Foram contar ao rei: Assim... Assim…, há aqui na aldeia uma mulher que tricota, tricota, mas não fala… Pois não podia ser coisa deste mundo todo aquele trabalhar, trabalhar, sem falar e sem comer… O rei queria mandar matar a mulher!

Estava a pobre da mãe a acabar de tricotar as croças quando chegou o rei, com as suas autoridades, para a mandar matar. Só lhe faltavam sete malhas para acabar a última croça. Mas os filhos viram o que se estava a passar, e começaram a vir ter com a mãe. Ela viu os filhos a começar a vir; apanhou as croças e começou a metê-las naqueles pássaros. E assim que metia as croças eles ficavam homens! Quando chegou à última, à que faltavam sete malhas, meteu-a no filho, mas ele ficou com sete penas no ombro… que eram as sete malhas que faltavam.

O rei viu que era uma penitência e desistiu da sentença, pois a mãe ia dizendo, no fim: Eu não podia falar porque queria salvar os meus filhos com esta penitência!”.

 

Informante: Melgaço, Conceição 62 anos.

 

Álvaro Campelo

Revista Antropológicas nº 6, 2002

Projectos do Centro de Estudos de Antropologia Aplicada – CEAA

 

Encontrei o mesmo tema da lenda na Trilogia de Sevenwaters de Juliet Marillier, romance que recorda o passado Celta da Irlanda, publicada em Portugal pela Livraria Bertrand em Fevereiro de 2004.

Como não acredito em coincidências, a recolha efectuada pelo professor Álvaro Campelo vem confirmar a nossa ascendência: somos Celtas.

Ilídio Sousa