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MELGAÇO, DO MONTE À RIBEIRA

História e narrativas duma terra raiana

MELGAÇO, DO MONTE À RIBEIRA

História e narrativas duma terra raiana

CASTRO LABOREIRO DE RELANCE

melgaçodomonteàribeira, 05.08.23

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Retiro estas notas de um acervo de papéis que me restaram de uma breve estadia de três semanas em Castro Laboreiro, no ano de 1977, entre Maio e Junho, a expensas da Secretaria de Estado do Ambiente e com a colaboração da Direcção do Parque Nacional da Peneda-Gerês. Devem ser entendidas como impressões onde o esforço de objectividade uma e outra vez pôde ter sido ofuscado pela emoção do seu autor. Em todo o caso, há um propósito de contribuir para o melhor conhecimento de certos aspectos da realidade camponesa do Noroeste serrano de Portugal. A traços largos, são aqui bosquejados os perfis da família e da comunidade; alguns dos factores morais e materiais que estimulam a emigração do homem; a condição da mulher que, na ausência do homem, assume sozinha as tarefas da casa e do campo; algumas transformações locais do casario e os factores que esboçam atitudes e posições hierarquizantes.

 

CASTRO LABOREIRO DE RELANCE

Luis Polanah

Minia

2ª Série, Ano II, nº 3

1979

 

JEAN-LOUP PASSEK 1936-2016

melgaçodomonteàribeira, 12.12.20

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MORREU JEAN-LOUP PASSEK, O CINÉFILO FRANCÊS EM QUE BATIA UM CORAÇÃO PORTUGUÊS

 

EM 2005, INAUGUROU EM MELGAÇO UM MUSEU DO CINEMA RECHEADO COM O ACERVO RECOLHIDO AO LONGO DA VIDA. NASCIDO EM FRANÇA, CINÉFILO CURIOSO, DESENVOLVEU ACTIVIDADE NO FESTIVAL DE CANNES, NO DE LA ROCHELLE E NO CENTRO POMPIDOU. DIZIA TER “ESPÍRITO ESLAVO, NACIONALIDADE FRANCESA E CORAÇÃO PORTUGUÊS”.

 

Mário Lopes

5/12/2016

 

Começou a chegar até nós quando, no início dos anos 1970, animado pelo espírito do cinema-verité registava um conjunto de obras para a ampliação do metro de Paris. Os operários que ali filmou eram portugueses, e Jean-Loup Passek cimentou com alguns deles uma amizade que o levaria, anos depois, quando já tinha duas casas em Portugal, em que se refugiava durante parte considerável do seu tempo, a afirmar ter “espírito eslavo, nacionalidade francesa e coração português”.

Em 2005, este historiador, crítico, programador e colecionador de cinema, com percurso ligado ao Festival de Cannes e ao La Rochelle, ao Centro Pompidou e ao prestigiado Dictionnaire du Cinéma das edições Larousse viu inaugurado o Museu de Cinema de Melgaço, a vila do Alto Minho onde tinha residência (a sua outra casa portuguesa encontrava-se em Pataias, Nazaré). Ali depositou o seu valioso acervo de memorabilia cinéfila, recolhida ao longo de toda a vida.

Jean-Loup Passek, morreu na madrugada deste domingo, aos 80 anos, revelou ao PÚBLICO fonte familiar. Em Setembro, a Cinemateca prestou-lhe homenagem com a programação de um ciclo de filmes e com uma exposição de cartazes do cinema clássico francês e da escola gráfica da Polónia, país de onde a sua família era originária (ou melhor, “de origem polaca ou russa conforme as vicissitudes da história” dizia). Na sessão inaugural, a 9 de Setembro, em que não pode marcar presença por motivos de saúde, foi-lhe atribuída a Medalha de Mérito Cultural do Governo de Portugal.

No texto de apresentação do ciclo – que contou com a presença, em Lisboa, do seu amigo de muitas décadas Marin Karmitz -, destacava-se a existência no seu trajecto de “uma óbvia coerência e duas ou três linhas de força”. São elas: “dar a ver, dar a conhecer, contra cânones estabelecidos, gavetas ou fronteiras históricas”. Foi o que fez, por exemplo, no Centro Pampidou, onde ocupou o cargo de Conselheiro de Cinema entre 1978 e 2001, sendo responsável por grandes retrospectivas de cinematografias menos conhecidas, como as do cinema checo, húngaro, turco, grego, indiano, chinês ou português.

A primeira homenagem em França a Manoel de Oliveira, em 1975, foi da sua responsabilidade, e a única retrospectiva de António Campos fora de Portugal aconteceu igualmente por sua iniciativa. Homenagem e retrospectiva surgiram no festival de La Rochelle, de que foi director em 1973 e 2001 (enquanto isso, coordenou a categoria Caméra d’Or do festival de Cannes, que distingue primeiras obras).

Nascido em 1936, em Boulogne-sur-Seine, Jean-Loup Passek licenciou-se em História e Geografia na Sorbonne, em Paris. A ligação afectiva e profissional ao cinema ficou garantida quando preferiu assistir a Citizen Kane, de Orson Welles, em vez de marcar presença nas provas do concurso de professorado. A aproximação a Portugal chegou, por sua vez, através da relação estabelecida com a comunidade imigrante portuguesa em Paris, junto da qual criou amizades que se mantiveram para o resto da vida.

Em 2005, quando da inauguração do Museu de Cinema de Melgaço, dizia ao PÚBLICO: “Estou contente. É um verdadeiro milagre que o museu tenha podido nascer aqui, em Melgaço. Ninguém me propôs nada de concreto em França. Gastei o meu dinheiro a comprar isto tudo, e não queria que a colecção ficasse em França. Sinto-me um pouco egoísta. Para mim, Portugal é que é importante”, destacou, referindo que toda a sua vida foi gerida “por sentimentos”. E por um olhar sempre interessado no que o mundo guardava para mostrar. Como afirmou certo dia, “sou pela curiosidade total”.

Reagindo à notícia da sua morte, a Câmara Municipal de Melgaço lamentou, em comunicado, o desaparecimento de “um amigo da terra”. “É indiscutível a amizade que nos unirá para sempre. Jean-Loup Passek será para toda a eternidade lembrado como um grande Amigo de Melgaço”, refere a autarquia.

Também o Ministro da Cultura prestou o “devido reconhecimento” ao trabalho da divulgação do cinema, e em particular do cinema português, realizado pelo historiador e crítico francês. Em comunicado enviado à Agência Lusa, Luís Filipe Castro Mendes sublinhou não esquecer “a generosidade de Jean-Loup Passek e a responsabilidade que representa o legado” de um homem cujo amor por Portugal “nos fez herdeiros do seu acervo, colecção que esteve na base da criação do Museu de Cinema de Melgaço”.

O funeral de Jean-Loup Passek realiza-se na sexta-feira de manhã, às 10.30, da Igreja de Saint-Germain-des-Prés para o cemitério do Pére Lachaise, em Paris.

 

Publicado em: Público de 5 de Dezembro de 2016

 

publico.pt

 

 

 

 

 

 

TEMPOS MODERNOS

melgaçodomonteàribeira, 24.03.20

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TEMPOS MODERNOS

 

Gigantes de papel, cópias balofas,

Olhai, gente bondosa, não toqueis!

 

As sombras dos heróis de falsa guerra,

Maltratam o saber dos cultos mestres,

Não toqueis!

Há perigo no tocar, tende cuidado!

Os gigantes de papel, estátuas balofas,

Trazem nódoa maculada… verborreia…

Figurinos do saber… e nada sabem…

Mui famintos do poder… e tudo podem.

 

DO SUBLIME AO GROTESCO

                  POESIAS

João Vilas

ANCORENSIS

2000

p.76

 

SARAMAGO 2

melgaçodomonteàribeira, 30.11.19

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As meninas de Castro Laboreiro II

 

Vai agora o viajante iniciar a grande subida para Castro Laboreiro. Melgaço está a uns trezentos metros de altitude. Castro Laboreiro anda pelos mil e cem. Vence-se este desnível em cerca de trinta quilómetros: não é íngreme a ascensão. Mas é inesquecível. Esta serra da Peneda não abunda em florestas. Há maciços de árvores, aqui, além, sobretudo próximo dos lugares habitados, mas na sua maior extensão é penedia extreme, mato de tojo e carrasqueira. Não faltam, claro está, nas terras ainda baixas, grandes espaços de cultivo, e nestes dias de fim de Outono a paisagem trabalhada pelos homens tem uma doçura que se diria feminina, em contraste com a serra ao fundo que vai encavalando montes sobre montes, qual mais áspero e bruto. Mas esta terra tem uma coisa numca vista que por muitos quilómetros intrigou o viajante, pouco experiente de andanças viajeiras, como logo se verá. Estava o Sol de maneira que batendo nas encostas distantes despedia brilhos, grandes placas luminosas, ofuscantes, e o viajante moía o juízo para saber o que aquilo era, se preciosos minérios assim revelados, se apenas o polido de lascas xistosas, ou se, imaginações fáceis, seriam as divindades da Terra a fazer sinais umas às outras para se esconderem dos olhares indiscretos.

Afinal, a resposta estava à beira da estrada por onde seguia. Pelas fendas das rochas ressumbrava água que, embora não correndo em fio ou em toalha, mantinha húmidas certas pedras, onde, dando o sol de jeito, se acendia um espelho. Nunca tal o viajante vira, e tendo decifrado o mistério foi gozando pelo caminho o atear das luzes, que depois se apagavam e ressurgiam à medida que a estrada fazia e desfazia curvas e portanto se alterava o ângulo de reflexão do Sol. Esta é uma terra grande e descampada, separam os montes grandes vales, aqui não podem os pastores gritar recados de encosta para encosta.

Castro Laboreiro chega sem avisar, numa volta da estrada. Há ali umas casas novas, e depois a vila com o seu trajo escuro de pedra velha. Bons de ver são os botaréus que amparam as paredes da igreja, restos românicos da antiga construção, e o castelo, nesta sua grande altura, com a única porta que lhe ficou, a do Sapo, alguma coisa daria o viajante, para saber a origem deste nome. Não requer grandes demoras a vila, ou requere-as enormes a quem tiver ambições de descoberta, ir, por exemplo, àquelas altas pedras, gigantes em ajuntamento, que ao longe se levantam. No céu, de puríssimo azul, atravessa um rasto branco de avião, recto e delgado: nada se ouve, apenas os olhos vão acompanhando o lento passar, enquanto, obstinadamente, as pedras se apertam mais umas contra as outras.

Está quase a despedir-se, veio por causa do caminho, da grande serrania, destes altos pitões, e correndo agora em redor os olhos, já distraídos, dá com duas meninas que o miram, com sério rosto, suspendendo as atenções que davam a uma boneca de comprido vestido branco. São duas meninas como nunca se viram: estão em Castro Laboreiro e brincam à sombra de uma árvore, a mais nova tem o cabelo comprido e solto, a outra usa tranças com uns lacinhos vermelhos, e ambas fitam gravemente. Não sorriem quando olham a máquina fotgráfica, quando assim se mostra o rosto tão aberto, não é preciso sorrir. O viajante louva, em pensamento, as maravilhas da técnica: a memária, infiel, poderá renovar-se neste rectângulo colorido, reconstituir o mometo, saber que era de tecido escocês a saia, crespas as tranças, e as meias de lã, e o risco do cabelo ao meio, e, descoberta inesperada, que uma outra bonequita havia caído lá para trás, acenando com a mão, com pena de não ficar de corpo inteiro na fotografia. O destino nem sempre ordena mal as coisas. Para ver a Igreja da Nossa Senhora da Orada e as meninas de Castro Laboreiro, teve o viajante de andar cem quilómetros, números redondos: tenha agora coragem de protestar quem achar que não valeu a pena. E tome lá, como acrescento e contrapeso, os gigantes de pedra, o macaco de Melgaço, o avião no ar, os espelhos de água, e esta pequena ponte de pedra solta, só para gente pedestre e gado miúdo.

 

VIAGEM A PORTUGAL

José Saramago

Editorial Caminho

1995

pp. 83-85

 

 

Publicado por: https://edoc.site/viagem-a-portugal-pdf-free.html

SARAMAGO 1

melgaçodomonteàribeira, 23.11.19

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AS MENINAS DE CASTRO LABOREIRO I

 

Até Melgaço desfruta-se de uma paisagem agradável, mas que não sobressai particularmente sobre o que é comum encontrar no Minho. Qualquer destas bouças faria figura de preciosidade paisagística em terras menos avantajadas de mimos, mas aqui os olhos tornam-se exigentes, nem tudo os contenta. Melgaço é vila pequena e antiga, tem castelo, mais um para o catálogo do viajante, e a torre de menagem é coisa de tomo, avulta sobre o casario como o pai de todos. A torre está aberta, há uma escada de ferro, e lá dentro a escuridão é de respeito. Vai o viajante pé aqui, pé acolá, à espera que uma tábua se parta ou salte rato. Estes medos são naturais, nunca o viajante quis passar por herói, mas as tábuas são sólidas, e os ratos nada encontrariam aqui para trincar. Do alto da torre, o viajante percebe melhor a pequenez do castelo, decerto havia pouca gente na paisagem em aqueles antigos tempos. As ruas da parte velha da vila são estreitas e sonoras. Há um grande sossego. A igreja é bonita por fora, mas por dentro banalíssima: salve-se uma Santa Bárbara de boa estampa. O padre abriu a porta e foi-se às obras da sacristia. Cá fora, um sapateiro convidou o viajante a ver o macaco da porta lateral norte. O macaco não é um macaco, é um daqueles compósitos animais medievos, há quem veja nele um lobo, mas o sapateiro tem muito orgulho no bicho, é seu vizinho.

Logo adiante de Melgaço está Nossa Senhora da Orada. Fica aà beira do caminho, num plano ligeiramente elevado, e se o viajante vai depressa e desatento passa por ela, e ai munha Nossa Senhora, onde estás tu? Esta igreja esta aqui desde 1245, estão feitos, e já muito ultrapassados, setecentos anos. O viajante tem o dever de medir as palavras. Não lhe fica bem desmandar-se em adjectivos, que são a peste do estilo, muito mais quando substantivo se quer, como neste caso. Mas a igreja de Nossa Senhora da Orada, pequena construção românica decentemente restaurada, é tal obra-prima de escultura que as palavras são desgraçadamente de menos. Aqui perdem-se olhos, registos fotográficos que acompanhem o jogo da luz, a câmara de cinema, e também o tacto, os dedos sobre estes relevos para ensinar o que aos olhos falta. Dizer palavras é dizer capitéis, acantos, volutas, é dizer modilhões, tímpano, aduelas, e isto está sem dúvida certo, tão certo como declarar que o homem tem cabeça, tronco e membros, e ficar sem saber coisa nenhuma do que o homem é. O viajante pergunta aos ares onde estão os álbuns de arte que mostrem a quem vive longe esta Senhora da Orada e todas as Oradas que por esse país fora ainda resistem aos séculos e aos maus tratos da ignorância ou, pior ainda, ao gosto de destruir. O viajante vai mais longe: certos monumentos deveriam ser retirados do lugar onde se encontram e onde vão morrendo, e transportados pedra por pedra para grandes museus, edifícios dentro de edifícios, longe do sol natural e do vento, do frio e dos líquenes que corroem, mas preservados. Dir-lhe-ão que assim se embalsamariam as formas; responderá que assim se conservariam. Tantos cuidados de restauro com a fragilidade da pintura, e tão poucos com a debilidade da pedra.

De Nossa Senhora da Orada, o viajante só escreverá mais isto: viram-na os seus olhos. Como viram, do outro lado da estrada, um rústico cruzeiro, com um Cristo cabeçudo, homenzinho crucificado sem nada de divino, que apetece ajudar naquele injusto transe.

 

VIAGEM A PORTUGAL

José Saramago

Editorial Caminho

1995

pp. 82, 83

 

Publicado por: https://edoc.site/viagem-a-portugal-pdf-free.html

 

PORTUGAL DE PERTO

melgaçodomonteàribeira, 14.09.19

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Os últimos dias da minha viagem foram de solidão invernal. Era já fim de Novembro de 2010 e poucas pessoas habitavam quer a zona da serra da Peneda quer o planalto, em Lamas de Mouro ou Castro Laboreiro. Quando alcancei o Santuário de Nossa Senhora da Peneda às cinco da tarde, vindo do Soajo, não encontrei ninguém. O hotel ao lado do Santuário fechara para remodelação. À porta da igreja, uma vaca pastava pachorrenta, só incomodada mais tarde por uma cadela que teimou em me acompanhar.

Em Lamas de Mouro e depois em Castro Laboreiro, um vento gélido fustigava a montanha e havia quem já previsse neve para o fim-de-semana seguinte. Na manhã do meu último dia de viagem, escolhi uma estrada estreita assente em território português mas virada para a Galiza para chegar a Cevide, a última etapa. Lembro-me que ainda suportei pedras de granizo e chuva muito fria. Era domingo e os altifalantes da Igreja de Cristóval emitiam indiferentes a missa para os dois lados da fronteira.

Ironia do destino, em Cevide, freguesia de São Gregório (*) e concelho de Melgaço, terminei a viagem a conversar com antigos contrabandistas, um português e outro galego, amigos de longa data. Recordaram a passagem de bananas, café e arroz ainda nos anos de 1980. O fim da actividade ditou a desertificação do local, mais uma terra marcada pela emigração. «Isto aqui morreu, aqui não há futuro…», desabafava o ex-contrabandista Manolo, em Frieira, do outro lado da fronteira. Na ponte internacional, Mário Olímpio, meu anfitrião em Cevide, apontava para o meio do rio Minho: «Estás a ver, ali mesmo no meio do rio? Ali é a linha de fronteira.»

 

(*S. Gregório não é freguesia. Cevide e S. Gregório pertencem à freguesia de Cristóval)

 

 

VIVER O MINHO

melgaçodomonteàribeira, 10.08.19

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O que mais me impressionou, no Minho, foi este relevo extraordinário, composto por montes bem delineados, cobertos de vegetação luxuriante onde, a cada curva da estrada, vos espera um rosto que vos sorri de modo diferente e vos convida a prosseguir a visita com cada vez mais curiosidade e paixão.

O acolhimento, a vida sadia e simples mas simultaneamente dura dos Minhotos, fizeram com que eu sentisse necessidade de partilhar convosco todo este néctar cultural e humano de uma das mais antigas regiões de Portugal.

Tal como eu, descobri ao longo do meu itinerário, todo o calor do Minho.

 

O autor

 

 

VIVER O MINHO

HISTÓRICO – ARTESANATO – GASTRONOMIA

 

Autor: VéGé

 

Edição: autor

 

1992

 

MELGAÇO AMIGO

melgaçodomonteàribeira, 22.06.19

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MELGAÇO

 

Melgaço é aquele abraço

Sem fronteiras,

Que desliza por vinhedos,

Fragas e ribeiras,

Acenando à Galiza

E sussurrando ao Minho seus segredos…!

 

Vem, Amigo,

Sentir porque choram de frio

As margens do rio em pleno inverno!

 

Descobrir a natureza em pranto,

Naquelas almas serranas

Vestidas de negro, imaculadas de branco!

 

Partilhar do gesto fraterno.

Quando a Serra desce às portas da Ribeira

Para abraçar a Vila em dia de feira!

 

Escutar a Canção do Emigrante,

Na hora longa da partida

E num curto instante de chegada!

 

Percorrer as pedras da velha calçada,

De Fiães a Castro Laboreiro,

De Paderne até à Orada!...

 

Melgaço… feito de pedra morena,

Torre de Menagem

Legenda da coragem de Inês Negra!...

 

Mais, muito mais.

Do que mil e uni matizes

Pintados em paisagem natural,

Melgaço, Amigo,

É luta, caminho raízes.

Pedaço deste nosso Portugal!

 

Retirado de: VIAGENS

Francisco José Carneiro Fernandes

ANCORENSIS – Cooperativa de Ensino, C. R. L.

Vila Praia de Âncora

2000

 

NÉCTAR DE MELGAÇO

melgaçodomonteàribeira, 08.06.19

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TRIBUTO AO ALVARINHO SOALHEIRO

 

- Teremos futebolistas leitores – disse ela, com uma gargalhada profunda, baixa, provavelmente causada por fumar Marlboro, mas que, raios, me fez encher o peito e arrepiar a espinha. Comemos o caranguejo, bebemos mais cerveja e falámos de livros, filmes, actores, celebridades, droga, fama, sucesso e eu mandei vir uma lagosta grelhada e Luísa disse que pagava um vinho verde Soalheiro Alvarinho 96, que foi o mais brioso de quantos verdes eu tinha bebido na vida. Mandámos vir outra garrafa e bebemo-la em golos faiscantes, e duas horas e meia depois de termos chegado saímos do ar condicionado para as ruas quentes e vazias, sem trânsito, sem gente, com as árvores ainda mergulhadas no silêncio da sesta.

 

Último Acto em Lisboa

Robert Wilson

Edição Gradiva

2000

p. 314

 

ESTÁ NA HORA DO REGRESSO A CASA

melgaçodomonteàribeira, 23.03.19

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antigo escudo de melgaço

 

ACHADOS

 

Não sabendo eu explicar a razão pela qual os arqueólogos portugueses, ou outros, nunca se interessaram por Melgaço, à excepção da freguesia de Castro Laboreiro, que nos últimos anos tem sido palco de investigações nesse domínio, não quero contudo deixar de lado o assunto. E a verdade, apesar dessa ausência, aqui e ali ao acaso, vão aparecendo objectos de antanho, os quais logo desaparecem como por bruxedo!

Escreveu Figueiredo da Guerra no “Correio de Melgaço” nº 31 de 5/1/1913: Da idade do bronze apareceram em (Novembro de) 1906, na Carpinteira, S. Paio, em esconderijo subterrâneo (quando se arrancava um pinheiro numa bouça), cinco machados de cobre, tipo morgeano (…), que nós classificamos como modelo grande do Minho. Da mão do nosso amigo Serafim Neves, onde os vimos, passaram ao Dr. José Leite, indo aumentar a colecção oficial de Lisboa.

No adro da igreja do mosteiro de Paderne existia desde tempo imemoriais uma curiosa lápide ornamentada; os paroquianos admiravam o par, representado toscamente, e o comentavam a seu modo. Era nada menos que um cipo luso-romano agora lajeando o pavimento, e tendo na parte superior um nicho com duas figuras, homem e mulher, dando as mãos; no rectângulo inferior e também abaixo dele, a inscrição, que diz: «Fulana, de cem anos, e seu companheiro Valus, filho de Arda, de 50 anos, aqui estão sepultados. O companheiro Pento mandou fazer este monumento.» Este padrão, tão cobiçado pelo Director do Museu Etnográfico de Belém, acabou por seguir para lá em 1906.)

No “Arqueólogo Português”, volume XII, 1907, o Dr. José Leite de Vasconcelos escreveu: «Junto da igreja de Paderne… existia… uma pedra lusitano-romana… ocupa hoje lugar de honra no Museu Etnológico…»

No Notícias de Melgaço, nº 224, de 4/3/1934, escreveram: «Numa propriedade ultimamente adquirida por Avelino Júlio Esteves, perto da nova avenida em construção, em volta das antigas muralhas desta Vila, e quando se procedia a um desaterro para a construção dum prédio, foram encontrados seis sarcófagos, abertos em Piçarra, saibro duro e espesso, calculando-se uma idade de 700 anos. Naquele local existiu em tempos uma capela, que foi demolida. O achado tem sido muito visitado por curiosos, inventando cada qual, a seu belo prazer, interessantes lendas, que a falta de espaço não nos permite reproduzir.»

Leite de Vasconcelos levou alguns desses achados, e ainda bem, para os museus da cidade, de outro modo ter-se-iam perdido. Na década do 90 do século XX, quando se rasgava a estrada Monção a Melgaço, os trabalhadores encontraram diversos objectos de longa idade. Os curiosos logo apareceram e levaram tudo que viram e tinha, do seu ponto de vista, algum valor comercial. (Sobre este assunto ver Jornal de Melgaço, nº 48, de Maio de 1994, Jornal de Melgaço, nº 55, de Janeiro de 1995, Voz de Melgaço nº 1054, de 1/7/1996, Jornal de Melgaço, nº 114, de Maio de 2000, jornal de Melgaço, nº 123, de Março de 2001).

 

 

Dicionário Enciclopédico de Melgaço I

Joaquim A. Rocha

Edição do autor

2009

pp. 22, 23