RIOS, REGATOS E CORGAS MELGACENSES
O MOURO E OUTROS RIOS
Este rio que, segundo li não me recorda já onde, em tempos antigos se teria chamado Urgedo – de urze, que corre entre matagais desta ericácea – nasce também no sítio do Gavião Grande, perto de Alcobaça; atravessa a antiquíssima povoação de Lamas do seu nome, onde, um tudo nada a jusante, junto à vetusta, típica e pitoresca ponte romana, recebe as águas de dois ribeiros, que de poente para nascente lhe vem ao encontro, cujas fontes são, respectivamente, na Portela do Lagarto e na Chã dos Fetos (cume da montanha 1216 metros de altitude).
Daqui, descrevendo um grande círculo no sentido Sul-Norte-Poente, na sua margem esquerda, molha as freguesias de Parada do Monte e Gave, e, na direita, as de Cubalhão e Cousso, recolhendo como tributários mais importantes em terras de Melgaço o Regato de Cubalhão e o Medoira(?) o Mourim(?) de Parada do Monte. A partir de Tangil, ruma novamente directa e francamente ao Norte, indo confluir no Minho, junto a Ceivães povoação outrora chamada Mouro de Juzano; isto é: Mouro de Baixo, ou de Jusante, em oposição a S. Pedro de Um ou Mouro hoje Riba de Mouro freguesia que se nenhuma vez se denominou Mouro de Susano… chamou-se Cima de Mouro, isto em oposição a Mouro de Baixo. Os chamadiços Riba de Mouro e Ceivães, ou melhor Seivães, como se escrevia no século passado, ainda não ganharam patina, pois são de origem recente, e significam: Riba = margem, e Seivães = seivas, verduras, etc. Como se vê, crismas com seu que de poesia; mas, cem por cento, acertados.
O rio Mouro é riquíssimo em trutas, mas também aqui los aficionados não deixam por pé em ramo verde a estes tão saborosos salmonídeos.
O Folia – Da arquisecular ponte romana da Folia recebeu este rio o seu crisma; não obstante abundarem documentos oficiais onde se chama regato de Remoães…
É ele formado, junto ao balneário das Termas, por dois regatos a saber: ao da esquerda, que nasce em Pomares, Paderne, chamam-lhe Lages ao passar por Crastos e Peso no sítio deste nome; e o da direita, que nasce por cima da Rasa de S. Paio, tem o nome de Lavandeiras no Pontilhão e suas proximidades, e Martingo a partir de Cortinhas. In Águas Minero-Medicinais de Melgaço, o prof. Charles Lepierre chama-lhe Ribeiro de Bouça Nova, porém onde ele foi buscar esta denominação não sei. Deste é seu principal tributário (no inverno que no verão o seu caudal é bem aproveitado para regar as terras…) a Corga de Pontizelas, e a partir do Pontilhão até ao pavilhão das Termas ou seja precisamente por onde há menos de cem anos corria a desviada Corga de Varzielas limita as freguesias de prado e Paderne, e daqui até à sua foz, que dista 900 metros e tem, a cota de 85 ditos, a última é de Remoães.
Por último, vejamos agora o Pontepedrinha, assim denominado da ponte de pedra do mesmo nome ponte que também crismou o local.
Este rio, cuja foz é no sítio chamado Freijoas donde sai a famosa represa de Fontenlas, que a tradição diz ter sido delineada e cavada por dois irmãos de Remoães, para fertilizar terras da sua freguesia é também formado com água de dois regatos, confluentes nas Várzeas: o S. Lourenço e o Bulegães, ou Regato da Vila, como vulgarmente é mais conhecido.
Destes cursos de água, o primeiro, o S. Lourenço, tem as suas respectivas fontes em Cavaleiro Alvo e em Loviô; deste lugar até ao Porto do Carro, extrema as freguesias de Rouças e S. Paio; dali até à Ponte de S. Lourenço, aquela e a de Prado, e daqui até à Pontepedrinha esta e a da Vila. É um dos mananciais mais fertelizantes do concelho de Melgaço, donde sai um ror de represas, entre as quais as mais importantes são as do Escourido, em S. Paio; a de Canles, em Roucas, e a de Alça-pernas em Prado. E é também o que mais moinhos faz mover, pois para cima de vinte destes engenhos tenho eu conhecimento, não incluindo os arruinados e desaparecidos.
Quanto ao segundo e último Rio do Porto, Bulegães, Mejanços, ou Souto dos Loiros, como lhe chamou José Augusto Vieira, no seu Minho Pitoresco, ao passar por Cavaleiros, ou ainda S. Mamede, como se denomina em certo documento do século XIII (prova provada que a ermida deste Santo já existia no monte do mesmo nome naquela época…) quanto ao segundo e último, dizia, nasce em Fiães, por cima do Outeiro da Loba (771 metros de altitude), onde em 18 de Julho de cada ano, comparecem os respectivos utentes da Vila, Roucas e Chaviães, para aí tomarem conta, e dividirem entre si em partes iguais, durante o período chamado das sete semanas, as águas do Ranhadouro.
De todos os cursos de água do concelho, é este o que desde sempre mais sarilhos e discórdias tem provocado, até com dares e tomares na justiça; e, isto pelo simples motivo de «na casa onde não há pão todos ralham e ninguém tem razão». Quero dizer: o seu caudal é insuficiente para regar a área que dele depende, o que se podia remediar com a construção de duas ou três albufeiras, onde se julgasse mais conveniente. A sugestão aí fica…
Como pude e soube, cheguei ao fim. Releio agora tudo quanto fica para traz e chego à conclusão de que bom serviço prestaria à nossa terra quem limasse as muitas arestas e suprimisse as grandes deficiências destes meus pobres e despretensiosos linguados.
- Júlio Vaz Apresenta Mário
- Júlio Vaz
Edição do autor
1996
Pág.s 84, 85, 86