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MELGAÇO, DO MONTE À RIBEIRA

História e narrativas duma terra raiana

MELGAÇO, DO MONTE À RIBEIRA

História e narrativas duma terra raiana

O CRUZEIRO DE MELGAÇO

melgaçodomonteàribeira, 14.07.18

20 b2 - cruz s. julião.jpg

cruzeiro de são julião

 

CRUZEIROS

 

 

No pequeno alfoz da sua freguesia quatro cruzeiros houve outrora Melgaço e embora alguns tenham sido mudados de local, ainda hoje todos se conservam erectos à veneração dos fiéis. Um, e é o principal por mais lindo, mais trabalhado e mais artístico, tem a forma do Piedade, pois numa das faces da cruz está esculpida a imagem de Cristo crucificado e na outra a de Nossa Senhora com o filho morto deitado no regaço. Representa o descimento da cruz. A coluna esbelta, elegante, está lavrada com alguns primores de arte e na base tem esculpida a figura da morte, representada por caveira humana.

Ignora-se infelizmente o nome do artista lavrante e o do quem lhe encomendou ou pagou o primoroso trabalho, pois no referido monumento nem a mais escassa informação se colhe. Em 1779 estava erguido no Campo da Feira de Fora, junto de uma morada de casas, cuja escadaria exterior dificultava a passagem das procissões à sua volta. Depois foi mudado para o Campo da Feira de Dentro e ficou mais ou menos no centro do largo.

Daqui o transferiu a junta de paróquia em 1867 para o adro da capela de São Julião, onde ainda hoje se conserva exposto à veneração de todos os fiéis, tendo sido declarado há anos monumento nacional. É este o cruzeiro da vila.

Assim foi conhecido sempre e ainda hoje essa designação tem e lhe pertence. Vem de longe, do século XVII, se é que não foi trabalhado nos fins do século XVI por qualquer daqueles artistas trazidos à terra pelo juiz de fora Gil Gonçalves Leitão para fazerem muitas coisas aqui não havidas e talvez nem sonhadas.

E isto se avança porque este cruzeiro estava situado no Coto da Pedreira, que era monte baldio pertencente à Câmara do termo, ali à entrada das Carvalhiças, e outro cruzeiro assim não havia. De mais a mais quando em 1703 Frei Domingos Gomes de Abreu quis erguer uma capela em honra de Nossa Senhora da Pastoriza escreveu em requerimento estas palavras, aliás com aparência de serem descabidas ao intento: «…quer este fazer-lhe a capela no Coto da Pedreira desta freguesia por ser lugar público onde costumam irem os clamores desta vila não havendo neste lugar mais do que uma cruz…»

Mas esta cruz era o cruzeiro da vila. Quem o diz nesse processo organizado na Mitra bracarense são os sucessivos párocos da vila então no uso do múnus de cura de almas: o P. João Dias dos Santos e o P. António Soares Falcão.

Aquele fá-lo por estas palavras: «…Digo que ao sítio vamos com as ladainhas aonde está o Cruzeiro desta vila fora da muralha…»

E este assim o diz: «Pretende o instituidor edificar a capela de que fez promessa no sítio chamado o Coto da Pedreira, que fica extra muros desta vila, onde está um cruzeiro ao qual vão em procissão nas ladainhas…»

Ora como a capela da Nossa Senhora da Pastoriza ocupou o sítio do Cruzeiro e as obras da construção, por circunstâncias várias, só vieram a fazer-se entre 1725 e 1727 esta obra nova acabou por impor a mudança do cruzeiro. Foi, possivelmente, por esta época que o Cruzeiro da vila veio das Carvalhiças para o local assinalado por documentos conhecidos, mas muito mais recentes: o Campo da Feira de Fora.

 

Publicado em NM de 18/3/1956

 

Obras Completas: Augusto César Esteves

Nas páginas do Notícias de Melgaço

Volume I Tomo 2

Edição Câmara Municipal de Melgaço

2003

pp. 551, 552