«A RUA DA ESTRADA» E «VIDA DO CAMPO»
A Rua da Estrada emerge sobre os escombros da dupla perda da «cidade» e do «campo». Da cidade, ficou a representação comum de uma sociedade plural e intensa num território densamente construído e com limites definidos, um «interior» confinado, rodeado pelos espaços ditos naturais, da floresta ou da agricultura. Do lado de fora, guarda-se a imagem de um espaço rural, habitado por visões do mundo fechadas sobre si e sobre poderosas identidades. Nada mais falso. As transformações dos campos são tão radicais como as transformações das cidades. Hoje, a urbanização progride a um ritmo avassalador e já não está exclusivamente dependente da aglomeração e da proximidade física. As infraestruturas percorrem territórios imensos que tornam possível um sem número de padrões de localização, construções e formas de organização social. O urbano é um «exterior» desconfiado e instável, por contraposição à imagem da cidade amuralhada.
A Rua da Estrada é a imagem perfeita desta metamorfose. Mais do que lugar, ela emerge como resultado da relação, do movimento. O fluxo intenso que a percorre é o seu melhor trunfo e a sua própria justificação. Sem fluxo não há troca nem relação, génese primordial da velha cidade. Dizia alguém explicando as manobras de sedução que praticava para tornar o seu negócio visível para quem vai na estrada: O problema é fazê-lo parar.
Álvaro Domingues (Melgaço, 1959), geógrafo, formou-se na Faculdade de Letras da Universidade do Porto em 1981. É professor da Faculdade de Arquitectura da Universidade do Porto.
A RUA DA ESTRADA
Autor: Álvaro Domingues
Edição: Equações de Arquitectura
Dafne Editora
Patrocínio: ESTRADAS DE PORTUGAL, SA
Porto, 2009
Vida do Campo – Um livro feito de retratos de um país composto de mudança.
A brincar costuma dizer: «Fui primeiro a Paris do que a Lisboa». Poderia ser sobranceria, ou até sinal de um certo cosmopolitismo bacoco. Mas não. É apenas a sua forma de desmistificar algumas ideias feitas, enraizadas na sociedade nas últimas décadas, fruto da propaganda do Estado Novo e das idealizações turísticas do século XXI. Melgaço, onde nasceu em 1959, «nunca foi, nem é, esse mundo remoto e desligado da terra como muitas vezes é pintado». Dessa terra, no limite norte de Portugal, lembra, partiu o primeiro autocarro semanal para Paris. E nos seus tempos de criança era tão frequente falar-se da «próxima vaca que ia parir», como da «atualidade da Nova Caledónia», onde morava um conterrâneo.
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Texto publicado no JL 1081, de 7 de Março de 2012
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