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MELGAÇO, DO MONTE À RIBEIRA

História e narrativas duma terra raiana

MELGAÇO, DO MONTE À RIBEIRA

História e narrativas duma terra raiana

OS PINTARROXOS III

melgaçodomonteàribeira, 06.03.13

 

 

   No dia seguinte foi a tia a primeira a subir ao andar superior e observar as avezinhas. Ela não fora a favor de prender os pássaros e, sem saber porquê, sentia um aperto no peito. Alguma coisa lhe dizia que algo não iria acabar bem.

   Botou a cabeça fora da janela para olhar os passarinhos que, estranhamente, estavam quietos e calados. O choque foi violento. Uma sensação esquisita lhe arrepiou a espinha e por momentos ficou paralisada.

   Os três filhotinhos jaziam no chão da gaiola, mortos. Refez-se do impacto e chamou o marido. O espanto deste não foi menor.

   O facto não era novidade, mas, sem saberem explicar, o caso lhes provocava mal-estar. Mandaram chamar os sobrinhos para presenciarem o sucedido e para que lhes servisse de exemplo no decorrer de suas vidas. Afinal, privar alguém de sua liberdade a troco de nada, ainda que um passarinho, não tem significado.

   E não foram só os três passarinhos; o caso foi bem mais trágico.

   Os rapazes acharam os corpos dos pais pintarroxos lá em baixo, no chão, no meio das ervas. Incrível, fora um suicídio colectivo! Na gaiola, ao lado dos filhotes mortos, um resto de ervas venenosas confirmavam a tragédia. Os pais, desesperados ao ver os filhos encarcerados sem possibilidade de libertá-los, optaram pela atitude extrema: mataram-nos e suicidaram-se.

   Numa terra onde poucas coisas aconteciam, aquele incidente banal tomou foros de sensacionalismo. Não era a primeira vez que acontecia semelhante coisa entre animais, o povo sabia disso e era até tema de seu folclore, de suas histórias.

   Mas aquele caso correu de boca em boca e as pessoas mais velhas, aquelas sempre propensas a profetizar desgraças, diziam da tragédia ornitológica: “É mau agouro, alguma coisa ruim vai acontecer!”

   Dito e feito!

   A vida do tio Emiliano começou a desandar.

 

(continua)