ENCONTRO COM INÊS VII
Chegou sem salamaleques, um olá, um beijo a jacto, sentou-se, sorriu e atirou:
— Já que és tão curioso, hoje vou falar de mim.
Não fiquei de boca aberta porque ainda não a tinha fechado desde que ela apareceu e da minha boca saiu qualquer coisa com está bem.
— Quando os trons se ouviram já andava tudo num virote.
Fico de boca aberta a olhar para aquele rosto, envolvido em cabelos negros, que começava uma conversa parva, sem pés nem cabeça, mas que eu tanto sentia e amava. O coração serrano bateu mais forte e aí a pergunta saiu:
— Onde estiveste? Que foi feito de ti, este tempo todo?
— Nada que te diga respeito. Andei por onde andei, estive com quem estive …
— E eu aqui a dar voltas à cabeça …
— O problema foi ou é teu. Eu segui o meu caminho, andei por terras de Portugal. Nada nos liga. Nada me liga a nada e se falo contigo é porque gosto do timbre da tua voz.
— Muito obrigado!
— Não tens de quê.
— Agora fala-me dos trons; li isso há tempos escrito por um cronista.
— Do Mestre?
— Não, de el-rei D. João.
— Isso é o que tu julgas porque rei era na corte, em Lisboa.
— Afinal, sabemos bem do que falamos.
— Sabemos? Eu não sei do que falas. Falei de trons e de reis porque estudo História na Faculdade. Bom, vamos ver o rio?
— Não. Contigo não vou, porque …
— … o rio é tão largo que me faz lembrar o mar que nunca existiu na minha terra.
(continua)