ENCONTRO COM INÊS III
Inês pouco falou. Um comentário ou outro. E eu preso pelo trinado da sua voz. Na minha estratégia, conversa e mais conversa era coisa que não faltava, mas o sim e o não, o por vezes e talvez que saíam da sua boca faziam-me pensar.
Que tinha nascido em Melgaço foi coisa que nunca escondi, minhoto 100%, anti-mouro quanto baste e amigo do amigo, tal qual meu pai me ensinou.
— Estou a gostar do passeio e da companhia, mais ainda de te ouvir.
Cântico do Zeca, lua cheia por entre o casario fazendo esquecer o fumo dos escapes, um sorriso para todos os loucos pobres da cidade, uma promessa de amor sempre cumprida, era o que eu sentia.
Junto ao rio perguntou:
— És mesmo de Melgaço?
— Sou. Nasci dentro daquelas muralhas que os homens, mais que o tempo, têm derrubado. Com aquelas pedras foram construídas as casas de meus avós e tantas outras na nossa Vila. Porquê, Inês?
Do rio já vinha uma aragem fresca e ela, levantando-se, espreguiçou-se com um sorriso.
— Nada. Havemos de voltar aqui, mas por hoje chega que a noite está a arrefecer.
Um beijo na minha face, um sorriso e Inês voltando as costas, desapareceu na noite com os cabelos dançando ao som de uma valsa que só ela ouvia.
Quando nos voltámos a encontrar nem taft-taft, nem mosca existiam.
O meu sorriso e o brilho nos olhos de Inês eram o mundo.
Voltámos ao rio.
— Não gosto deste rio. É grande como o mar … nunca gostei do mar.
— Então porque vens aqui?
— Nas águas do rio reflecte-se a minha alma, as montanhas com neve, o verde, verde da Primavera …
Inês calou-se e eu sorri. Na verdade, sempre soube que a conhecia.
— E, no Verão, o amarelo de …
— Não digas mais. Vamos só olhar o rio.
— Quem és tu?
— Sou a Inês.
Fiquei desarmado, mas a ansiedade no meu rosto fez com que o seu sorriso se alargasse cada vez mais e, beijando-me na face à laia de despedida, “disparou”:
— Quem sabe, talvez um dia te conte a minha história.
Os seus cabelos voltaram a dançar e ela desapareceu na noite.
(continua)