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MELGAÇO, DO MONTE À RIBEIRA

História e narrativas duma terra raiana

MELGAÇO, DO MONTE À RIBEIRA

História e narrativas duma terra raiana

ENCONTRO COM INÊS I

melgaçodomonteàribeira, 06.03.13

 

Antigo café Gelo - Rossio

 

 

    Era uma vez! …

   Eu gostava que assim fosse mas infelizmente só nas histórias dos outros  acontece. Eu, simples mortal, a penar em Lisboa, não tive direito a um começo assim mas verdade seja dita ainda bem que tal não aconteceu.

    A vontade de rir é enorme. Porquê? …

    Mulher, tão simplesmente.

    O que terá esta mulher de igual e de muito, muito diferente das outras para ser mais do que uma conhecida, uma íntima, e não a conhecer de lado nenhum, tirando as duas ou três vezes que a vi sentada à mesa do café?

    Este café continua a encher-me a cabeça com o “taft-taft” da ventoinha. O fumo do 20º. ou do 30º. cigarro, meu e dos outros, um nevoeiro de cortar à faca. Sinto-me bem neste café por isso aguento. Aguento todos os dias, mesmo quando não quero, quando estou chateado, quando estou contente, mesmo quando estou … eu. Este é o meu café.

    O empregado que serve a “bica” faz-me lembrar a mosca que não deixa de aborrecer o parceiro da mesa ao lado. Se calhar é o laço! O laço que o empregado usa é parecido com uma mosca. Só asas e sem pernas. É pena não haver próteses para as moscas, assim o laço do empregado não era confundido com as moscas. Ou já viram um laço de muletas ou coisa do género?

    O laço, a mosca, o empregado e, já agora, as muletas. Se não levam a mal, as muletas são de pau. De pau, madeira, pau, mesmo pau.

    Só o barulho do “taft-taft” é que já chateia. E o empregado à volta da mesa, que clientes é coisa que não há.

    Chegou a hora dela entrar. Certinha. E se a ventoinha já me tinha dito, há muito tempo, para me ir embora agora era dar à sola e espairecer noutro lugar.

    Não foi por ela que fiquei, muito menos pelo barulho da ventoinha e da mosca nem falar.

    Olhei-a! …

    Falar nem pensar. Não a conhecia. Esperar mais uns dias…

    Poderá dar ou não, mas como sempre fui homem de coragem, resolvi: é amanhã. Pomos tudo em pratos limpos, porque se for loiça de Sacavém temos negócio.

    É já hoje o amanhã prometido. Acabar o jantar, esfregar as mãos com um sorriso de deuses e nem a mosca do empregado nem o “taft-taft” da ventoinha seriam deste mundo.

    Táctica escolhida pelo caminho: andar devagar que hoje sou eu o 2º. a chegar.

    Carros, rostos, montras, pés, cigarro e mais cigarros, tornar longo um caminho curto chega a ser doloroso.

    Agora é que é … já vejo a mosca do empregado, já ouço o barulho da ventoinha … entro com qualquer pé e … e … nada. Ela não veio! … Em seu lugar veio a “bica” e a mosca ou a mosca e o empregado. Empregado com “bica” e mosca. Sei lá … Bebi a “bica” e o barulho da ventoinha gozava comigo.

 

(continua)