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MELGAÇO, DO MONTE À RIBEIRA

História e narrativas duma terra raiana

MELGAÇO, DO MONTE À RIBEIRA

História e narrativas duma terra raiana

O SANO II

melgaçodomonteàribeira, 06.03.13

 

 

    De quando em vez encontrava patrício e como as saudades apertavam, isto de estar sempre ao serviço, bebiam uns finos na Brasileira ou no Piolho, aquelas estudantezinhas, faziam o circuito ao burgo com jantar ou ceia conforme a hora – e nisso fazia questão que ninguém pagasse – acabavam num bom bar com elas sentadas no colo e até de mama de fora quando a despesa esticava; nessas alturas, colegas ou amigos tinham que pagar a brincadeira, até porque ele não vivia só de funcionário com crachá.

    Mas nunca esqueceu o cozido ou a lampreia da casa paterna – não fosse o Fifi um pai – com o tinto dos padres de Rouças, que melhor nas redondezas não há.

    E nessas ocasiões era vê-lo, depois de atestar com duas ou três pratadas, a barriga empinada, a beber o bagaço ao domingo na vila; arrotava e atirava: - estás bom, meu…

Nem nos velhos filmes do Pelicano se arranjava bófia igual, com cartão no bolso e pistola à cinta. A conversa se não era sobre o almoço, batia certinha nas aventuras nocturnas da grande cidade.

    Orelha e salpicão e presos a dar c'um pau.

    Um depois de almoço de domingo, o Carlos Republica, olho de lince e velho compincha dos tempos do colégio e dos serões em Cavaleiros – sentado no Central – vê o Sano a estacionar a caranguejola que só servia p’rá vila e bailes até S. Martinho; puxa de mortalha e enrola um cigarro com o tabaco que sacou da onça do tio-avô, conceituado relojoeiro com banca na vila.

    Acender só quando Sano entrou e logo apanhou com uma bufarada em cheio na cara.

Insultado na sua dignidade, até profissional, levanta a mão e quando ia a sair um c*ralho..., vê que é o Carlos Republica, inclina a cabeça numa confidência e sopra-lhe ao ouvido para todo o mundo ouvir:

    — É boa mas é nacional!

    Perspicácia de judite.

    O Carlos República era o único que não fumava erva na vila, pelo menos daqueles que tinham passado pelo pouco antes e pouco depois do vinte e cinco e suas consequências.

    O resto da história é como aqueles Westerns italianos que o Pelicano passava; mesmo com cortes, o final era sempre o mesmo. Gargalhadas.

    Não voltei a ver o Sano, mas trinta e pico anos depois, sou confrontado com um manuscrito, devidamente identificado e não reconhecido em notário, do qual apresento cópia, não sendo eu possuidor do original.

    Era esse documento composto por várias páginas, das quais destaco a numero três, prova provada que Sano nascera para ser judite. Rezava assim a missiva:

 

(continua)