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MELGAÇO, DO MONTE À RIBEIRA

História e narrativas duma terra raiana

MELGAÇO, DO MONTE À RIBEIRA

História e narrativas duma terra raiana

O SANO I

melgaçodomonteàribeira, 06.03.13

 

 

   O Sano… o Sano é afilhado do Fifi…, rapaz novo é certo, mas com grande ouvido para bons conselhos do padrinho. Bons… é como diz o outro. E se um era bufo da pide…, o outro só podia dar em bófia.

   Bem, afilhado seria – se procurarmos nos registos baptismais –, mas há quem diga que filho, ou do Fifi ou do velho padre Armando, que não os reconheceu todos porque as leiras não chegavam de herança e o Fifi só fazia raparigas; um terceiro não seria de desdenhar. Adiante…

   Certo, é que filho de um e afilhado de outro, desde cedo teve queda p’rá retórica, bom comer e beber e safar-se naquela terra de Deus e do contrabando.

   Com a morte do padre seu protector, sendo homem forte, atarracado e de pouco cabelo, passado nas sortes, ficou ao cuidado do padrinho Fifi, já devidamente compensado para o efeito.

   Tropa no RI8 em Braga, apadrinhado por major e coronel, ao que Fifi não era alheio porque português é bom, mas na Espanha é mais barato.

   Bufo no quartel, via os outros partirem p’rá guerra e ele ficar, consciente que é na retaguarda que tudo se decide, como lhe dizia o padrinho, na hora do copo e confidências. Nas armas não se distinguiu, tirando as faxinas e outros castigos menores e o ódio profundo dos camaradas que não gostavam de graxas e língua comprida; quando regressou da tropa, quase três anos passados e o posto de soldado, o padrinho falou, suplicou e até – Deus nos valha – chantageou para arranjar poiso para o Sano. Chantageou é como quem diz, que os gajos do posto do Peso arrancavam o ultimo segredo a um seixo do rio se preciso fosse, mas deixou no ar um bom aproveitamento do rapaz, de confiança em Deus e no Chefe, na Ordem e Autoridade e …

   Conversa de Fifi, porque nem tudo o que ao Sano falava chegava aos ouvidos da DGS, porque se chegasse, tanto um como o outro estavam entalados, viessem elas de que lado viessem. E entre secretas e militares… valha-nos Santa Rita.

   Foi na noite da cidade, entre p*tas e azeiteiros, bófias, carteiristas e arrombadores que Fifi arrumou a vida do Sano, sem esquecer os dividendos que daí lhe poderiam advir.

   E foi na judite onde o Sano arranjou telha.

   Deixou a Calçada e o padrinho, fixou-se no Porto, três semanas em pensão residencial da Alferes Malheiro e logo de seguida madame pelo braço, que a escola não foi só p’ra levar carolos e pontapés no cu, manducar francesinhas no Mucaba em Gaia e acabar a noite no Lanterna.

   De quando em vez uma rusga às p*tas – primeiro avisava a Lisete – outras aos carteiristas nos eléctricos, umas ceias com os azeiteiros da zona, assim corria a vida de Sano policia, agente da criminal.

 

(continua)