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MELGAÇO, DO MONTE À RIBEIRA

História e narrativas duma terra raiana

MELGAÇO, DO MONTE À RIBEIRA

História e narrativas duma terra raiana

O CONTRABANDO POR AeC

melgaçodomonteàribeira, 20.07.24

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1Consistindo o contrabando em transacções, era incontestável que a natureza e a relevância do que se traspassava fazia, impreterivelmente, que, como na sociedade, o contrabando se dividisse em classes.

O contrabando, como é sabido, é o resultado das fronteiras. Contrabandos houve, há e haverá muitos e, consequentemente, variegados. Hoje as fronteiras são movediças, mas o tráfico, de outras formas e de outros produtos, persiste em quantidades incomparáveis às daquela época.

Mais de quarenta anos antes do petate da banana e utilizando as mesmas veredas – rios Minho e Trancoso e raia seca –, alguns temerários do concelho de Melgaço começaram a enriquecer graças ao contrabando de volfrâmio, ouro, café Sical...

Com o fim da Segunda Guerra Mundial, Salazar que, por ideologia deixara andar, regulou o volfrámio. A Confederação Helvética tornou-se o destino relevante do ouro. A origem das somas consideráveis vindas do estrangeiro passou a ser vistoriada. Para justificar a procedência dos capitais, os contrabandistas melgacenses dominantes, compraram uma padaria, uma pastelaria e uma ourivesaria em Tanger, Marrocos, nessa altura protectorado francês. Os gerentes eram o Alexandre Araújo Lopes e o Manuel Lourenço. As revoltas de 1954 obrigaram-nos a regressar a Portugal, onde os negócios continuaram.

Em 1958, um deles, o Artur Teixeira, o cambista melgacense mais conhecido, por intermédio do Alexandre Araújo Lopes, de S. Gregório, concedeu um empréstimo de 400 000 escudos – o equivalente a 1 milhão de pesetas na altura – a Antonio Piña Antón, um próximo de A Notaria que tinha uma modesta empresa de autocarros. Foi o primeiro empresário da Península Ibérica a efectuar, em 1973, a primeira ligação internacional de autocarro ; saíam de Ponte de Lima com destino a Paris e vice-versa. Os seus clientes eram os emigrantes portugueses e espanhóis

A meio dos anos 60 do século XX, Manuel José Domingues (Mareco), Manuel Rodrigues (Manecas), Alexandre Araújo Lopes, Artur Teixeira e Manuel Lourenço (Manuel da Garagem) eram indivíduos que possuíam fortunas colossais.

Deste bando de contrabandistas de colarinho branco, o Alexandre, uns anos mais novo, foi o postremo sobrevivente, depois do desaparecimento dos quatro associados no meio dos anos 70 do mesmo século. No início dos 80, ainda transpunha vários dias por semana a ponte da Frieira no seu BMW, sempre com a única filha ao lado que, certamente, lhe servia de latíbulo.

Ninguém estava seguramente a par das suas actividades, mas qualquer zé-ninguém de S. Gregório apostaria que a especulação monetária e os metais preciosos não tinham deixado de ser a sua distracção. Segundo um vizinho da rua Verde, em S. Gregório, onde o Alexandre residia, era frequente ver entrar na sua casa indivíduos de maletas na mão a certas horas da noite. O Alexandre era o maior provedor de pesetas e de outras moedas.

Estes indivíduos constituíram a classe alta do petate no concelho de Melgaço.

Uma pequena parte dos comerciantes situados na raia eram a classe média. Aos rendimentos provenientes das vendas nas lojas juntava-se o do contrabando de café e de tabaco americano de contrabando – o tabaco americano chegou a Espanha em 1971 – e que continuou até pouco depois do 25 de abril de 1974. O Jonjom, o Carminé Coelho e o Zé do Rita eram os principais. O segundo e o terceiro davam-se ao luxo de passar a veniaga de dia.

Na base, havia sobretudo mulheres que faziam um contrabando de subsistência e social. Levavam um ou dois quilos de café, toucinho e traziam azeite.  

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rota do contrabando - em s. gregório