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MELGAÇO, DO MONTE À RIBEIRA

História e narrativas duma terra raiana

MELGAÇO, DO MONTE À RIBEIRA

História e narrativas duma terra raiana

UM PASSEIO POR MELGAÇO

melgaçodomonteàribeira, 16.03.24

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AQUI AVISTA-SE O PONTO Nº 1 DE PORTUGAL. ATÉ LÁ, VAI SER SEMPRE A SUBIR E DEPOIS SEMPRE A DESCER, MAS O QUE IMPORTA MESMO É O CAMINHO

Mariana Falcão Santos - texto

10 ago 2020

É na capital do rafting que um passeio de UMM pela montanha nos ajuda a perceber melhor o que é que torna a terra mais a norte de Portugal tão especial. Entre caminhos vertiginosos e as paisagens pintadas de verde banhadas pelo Minho, as surpresas que Melgaço tem guardadas não são só para os que têm sangue na guelra.

O convite inicial prometia um passeio de moto4, pelas montanhas da vila de Melgaço. Um contratempo logístico mudou o meio de transporte para um modelo de todo-o-terreno que ficou conhecido nos anos 80, um UMM. À priori, já sabíamos que nos esperava uma viagem por terreno atribulado.

“Não via um destes há anos” foi uma das primeiras frases dita pela nossa equipa. Quem nos ia conduzir montanha acima era Paulo Faria responsável pela Melgaço Whitewater, uma das empresas que se dedica à dinamização de atividades outdoor na zona. Professor na Escola Superior de Desporto e Lazer e formado em Desportos da Natureza, há três anos que se dedica a apresentar as potencialidades da vila a quem tem curiosidade de conhecer.

Esperava-nos um percurso de média montanha e campo, com início no centro histórico de Melgaço. A vila tem uma área envolvente superior a 230 quilómetros quadrados e conta com cerca de 9 mil habitantes. Em anos normais, por esta altura, muitos portugueses, muitos espanhóis – que Espanha é já ali – mas também de outras paragens. Visitantes que ali chegam atraídos por um binómio que casa na perfeição: uma imensa natureza a explorar e um vinho que dá nome à rota da região. Como dirá o nosso guia, Paulo Faria, “vir a Melgaço e não beber Alvarinho é como ir a Roma mas não ver o Papa” – mas isso são outras histórias.

A viagem começou com a promessa de que, passando o cliché, o que veríamos ao chegar ao destino valeria a pena – mesmo que o percurso fosse atribulado. Mas, até chegar ao destino, a história de Melgaço começou a ser contada ainda em estradas de alcatrão. Lá fora, à medida que íamos saindo em direção à periferia da vila, as casas, alinhadas numa disposição pouco orientada, eram maioritariamente constituídas por pedra, e, como em qualquer ambiente rural, havia uma história daquelas que passa de boca em boca que o ajudava a explicar.

Em tempos, ali, em Melgaço, houve um mosteiro, o Mosteiro de Santa Maria de Fiães, onde residiam monges. Os mais antigos da terra contam que o monumento foi destruído por populares que posteriormente utilizaram as pedras do mosteiro para fazer as suas próprias casas. Mas até chegarmos ao local que serviu de casa a muitos devotos, esperava-nos um caminho de terra pela zona montanhosa. Já lá vamos.

Dos dois lados da estrada, vegetação de tons inimagináveis de verde tapa-nos qualquer tipo de visão. Não são precisos muitos minutos para percebermos que neste trilho de média montanha em UMM uma das premissas é acreditar. Acreditar que apesar de uma mata densa que pouco ou nada faz adivinhar haver caminho, ele existe – e se vale a pena!

Ajuda muito ter alguém que conhece as montanhas de Melgaço como a palma da mão. Não é por acaso que Paulo Faria faz o que faz e tem a empresa que tem, mesmo que também haja quem opte por explorar caminhos íngremes e apertados de forma autodidata – o que nem sempre corre bem.

O percurso pode ser feito de três formas: Moto4, Buggy ou UMM, consoante o nível de adrenalina, conforto e autonomia procurado, mas a última opção é a mais confortável na hora de passar entre lençóis de mato que se atravessam pelos caminhos e que apenas são abertos com a perícia de um condutor experiente ao volante de um “bicho” que é dotado para estas missões.

Os trilhos que hoje em dia servem para passeios turísticos foram noutros tempos os sítios mais procurados de passagem de contrabando entre Espanha e Portugal. Ladeados pelo rio Minho, eram os atalhos que atravessavam a montanha. “Há várias povoações, especialmente na zona perto do rio que se formaram devido às trocas entre países e contrabando. Somos uma zona de contrabandistas e não temos problema nenhum em dizê-lo”.

O contrabando é uma marca desta terra, não uma cicatriz. As gentes e os locais fizeram a sua história – e as suas famílias em muitos casos – nessas vidas em que a troca de produtos, então ilegal, de um lado e do outro da fronteira, era parte do dia-a-dia. De Espanha traziam bananas e chocolate, de Portugal havia quem levasse sabão e café. Do cimo de um dos muitos miradouros encontrados pelo caminho conseguimos ver que há alguns percursos alternativos que a vegetação farta não consegue esconder – o que indica que por ali passaram e continuam a passar pessoas entre um lado e outro.

sapo.pt

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