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MELGAÇO, DO MONTE À RIBEIRA

História e narrativas duma terra raiana

MELGAÇO, DO MONTE À RIBEIRA

História e narrativas duma terra raiana

CAPELA DE NOSSA SENHORA DE MONSERRATE I

melgaçodomonteàribeira, 25.09.21

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QUANDO DEUS QUER

 

Quando Deus quer e o homem tem fé e sentido de gratidão, podem nascer as obras mais surpreendentes. É o caso da capelinha da Senhora de Monserrate, assim mesmo capelinha, porque surgiu muito pequena, talvez em consonância com a carteira de quem a encomendou. Chegaram-me duas versões, ambas belas e ambas como tributo ao amor, a Deus e sua Mãe, que fizeram o milagre, à família do homem ou da mulher de fé que confiaram nos desígnios do Criador. As duas versões da origem da capelinha são verosímeis, outras poderá haver, o povo é profícuo em acrescentar pontos ao que se conta, e como os que poderiam dar testemunho estão em vias de desaparecer, ficamo-nos por aqui.

Eis a história de um pai que muito sofreu para criar os sete filhos com que a Natureza o presenteou e à sua mulher. Foi há muito tempo, a data poderá precisar-se mas não faz falta para apreender o que importa. Um após outro, com alguns que não vingaram pelo meio, foram nascendo os sete filhos de um casal que vivia num lugarejo no planalto dos montes do Laboreiro, nos contrafortes da serra da Peneda. Todos homens. Ao fim do terceiro ou quarto, começou a instalar-se o desejo de que uma menina aparecesse para trazer o seu encanto à fratria que os pais não viam parar de crescer. A mãe deixava-se aconselhar por mulheres mais entendidas, que sabiam como fazer para conceber uma menina, atentando às luas, aos meses, à própria maneira de se entregar ao homem. Os conselhos de nada resultaram, até porque as crianças se instalavam no ninho materno sem que a vontade dos progenitores tivesse algum papel, a natureza e só a natureza é que mandava.

À medida que cresciam e ganhavam autonomia, os rapazes começaram a largar as saias da mãe, a asa protetora do pai. A terra era muito pobre, as courelas escassas para garantir os meios para uma subsistência digna a tanta boca. A pouco e pouco partiam, voltavam, tornavam a partir, como todos os homens empreendedores da terra. Alguns casaram e constituíram a sua família, alargando de modo significativo o núcleo da família de origem. Quando se juntavam na casa dos pais, apesar do número sempre a crescer, a mãe não se cansava de lembrar os tempos idos em que os sete filhos se sentavam à mesa e todos partilhavam o muito ou o pouco que havia para comer. Os tempos mudavam, noras e netos e netas contribuíam em número, descontração e alegria para transformar cada encontro numa festa, mas à medida que os anos passavam aumentava a nostalgia do casal em relação à ausência de um ou outro filho. Era bem receber notícias e saber que pelo Natal ou pela festa da Senhora dos Milagres os ausentes se fariam presentes, mas havia um vazio que permanecia.

A mulher viu-se tomada por uma febres que não lhe deram tréguas durante dias, caiu na cama e todos julgaram que era chegada a sua hora. O homem, seu confidente privilegiado, sentiu como sua a saudade da sua companheira, fez apelo à sua fé mais profunda, rogou pela recuperação da enferma e fez a promessa da sua vida: mandaria construir uma capela em honra de Nossa Senhora se juntasse os sete filhos na sua casa. Não se atrevia a juntar à promessa o voto de a mãe poder abraçá-los a todos em simultâneo antes de se entregar ao Criador, mas era esse o seu propósito mais firme, que guardava só para si, receoso que a partilha do mesmo desse azar ou que mostrassem pena dele.

Deus ou Nossa Senhora, ou os dois em conluio, atenderam as preces deste pai e marido extremoso, sem igual, e a sua cara-metade afugentou as sezões que a deixaram muito debilitada mas de pé. O susto de quase a terem perdido chegou aos filhos ausentes quando da doença que a acometeu e a vontade de responderem com a sua presença aos desejos dos pais fez caminho. Por ocasião da festa da Senhora dos Milagres, os sete irmãos marcaram presença na casa onde tinham nascido. Um deles só chegou ao pôr do sol, mesmo a tempo de ocupar o seu lugar à mesa do jantar. Coube-lhe a ele, por delegação do pai, a oração que antecedia a refeição. A que se seguiu foi o pai que a disse e logo de seguida anunciou que o seu maior desejo estava cumprido, as suas preces tinham chegado ao céu, só lhe restava pagar a promessa: construir a capelinha em honra de Nossa Senhora.

 

(continua)

GUERRA DA RESTAURAÇÃO EM MELGAÇO

melgaçodomonteàribeira, 18.09.21

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 moinho em lamas de mouro 

PORTUGAL RESTAURADO

 

ANNO 1641. SUCESSOS DE ENTRE DOURO & MINHO DE Q HE GOVERNADOR DAS ARMAS D. GASTÃO COUTINHO.

… passaremos a referir os sucessos da Provincia de Entre Douro & Minho. Logo que El Rei se acclamou, elegeu por Governador das Armas desta Provincia a D. Gastão Coutinho, nomeando-o do seu Conselho de Guerra. Na de Africa se havia exercitado os primeyros annos; depoys, vindo para Lisboa, se embarcou em alguas Armadas, & tinha conseguido, em todas as occasiões q se offerecéram, opinião de muyto valeroso. Nos primeyros dias de Janeyro partiu de Lisboa, chegou ao Porto, passou logo a Braga, onde se deteve alguns dias, & desta Cidade partiu para Viana, Villa a mays occidental da fronteyra de Galiza, & hu dos mays deleytosos lugares de todo o Reyno, banhando-a o Mar Oceano & o Rio Minho. Os seus moradores já não ignoravam os exercicios militares, nem os assombrava o estrondo da artilharia, ganhando valerosamente aquella fortaleza a os Castelhanos, como fica referido. Logo q D. Gastão chegou à fronteyra, a correu toda de Viana atè Melgaço: hua das attenções mays precisas q deve observar hu Governador das Armas, porque sem grande conhecimento da Provincia q governa, he quasi impossivel acertar as disposições necessarias nas occasiões que se lhe offerecem. Nesta jornada fez Dom Gastão alistar toda a gente de Entre Douro & Minho: achou muyta & valerosa com poucas armas & menos disciplina. Elegeu os officiaes mays praticos q pode descobrir, levantou trincheyras a Caminha, Villa Nova de Cerveyra, & Valença. Assistindo à fortificação da ultima, o rodeáram alguas balas de artilharia de Tuy, Praça de Armas dos Galegos, q divide de Valença o Rio Minho com pouca distancia de hua a outra parte. Os moradores de Salvaterra deram principio a o rompimento: quizeram impedir huns barcos, q hiam para Monção; os moradores desta Villa os defendéram, conduzindo-os a ella, & estimulados deste excesso levantáram hua plataforma junto ao Rio, & pondo nella tres peças de artilharia, as disparáram com prejuizo das casas de Salvaterra, situação da outra parte do Rio, como em seu lugar diremos. Nestes dias andando em Melgaço rondando as sintinelas junto do Rio o Capitão de Infantaria Francisco de Gouvea Ferraz, estimulado de ouvir da outra parte do Rio a hu soldado Galego alguas palavras contra o decoro del Rei, se lançou impetuosamente a o Rio, & passando-o a nado, se achou da outra parte sem opposição porq o Galego medroso do seu valor se retirou, antes q elle chegasse, podendo facilmente tomar vingança da sua ousadia: tornou da mesma sorte a voltar para Melgaço, & logrou o merecido aplauso da sua resolução. De Janeyro até Julho se passou de hua & outra parte sem mays empresa, que estes primeyros ameaços de guerra. Em Julho quando se rompeu a guerra em Alentejo, conhecendo El Rey q menear as armas só para a defensa era multiplicar o perigo, & que a paz q desejava, se havia de conseguir fazendo guerra, ordenou aos Governadores das Armas de todas as Provincias, q entrassem em Castella. Não dilatou D. Gastão a obediencia, deu logo ordem a frey Luis Coelho da Silva Cavalleyro da Ordem de S. João, q com a gente de Viana, embarcada em hua galeota, duas lanchas, & alguns barcos, passasse a queymar a Villa da Guarda, situada junto do Mar defronte de Caminha. Mandou a D. João de Sousa Capitão Mór de Melgaço, q entrasse no mesmo tempo pela ponte das Varzeas, Antonio Gonçalves de Olivença pelo Porto dos Cavalleiros, por Lindolfo Manoel de Sousa de Abreu, & pela Portella de Homem Vasco de Azevedo Coutinho. Todas estas entradas se executáram em lugares muyto distantes huns dos outros, & toda esta gente não levava mays disposição q a do seu valor: porèm ignorar os perigos q buscava, a fazia mays resoluta, achando fortuna favoravel, que costuma porse da parte dos temerarios.

 

HISTORIA DE PORTUGAL RESTAURADO

D, Luis de Menezes, Conde da Ericeyra

Anno de M. DC. LXXIX

 

https://books.google.pt

INVESTIGAÇÕES ARQUEOLÓGICAS DO PALEOLÍTICO EM MELGAÇO

melgaçodomonteàribeira, 11.09.21

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OCUPAÇÕES PLEISTOCÉNICAS DA MARGEM ESQUERDA DO BAIXO MONHO (MIÑO/MINHO 2)

OBJETIVOS E PRIMEIROS RESULTADOS DE UM PROJETO TRANSFRONTEIRIÇO

 

No concelho de Melgaço, os trabalhos até agora realizados no âmbito do projeto Miño/Minho 2, concentraram-se essencialmente na chamada Veiga de Remoães. Para a sua concretização contámos também com o inexcedível apoio do respetivo Município e da União de Freguesias de Prado e Remoães.

As sondagens efetuadas em 2016 na jazida das Carvalhas, parcialmente alargadas em 2017, permitiram detetar numa área relativamente pequena diferentes indústrias líticas de cronologia paleolítica integradas em distintos contextos sedimentares. Basicamente foi possível identificar a presença de uma indústria acheulense num depósito fluvial associado à colmatação de um antigo caudal do rio Minho, que suporta a hipótese da existência de um paleomeandro no local. Lateralmente, este terraço fluvial, que se eleva entre os 10 m e 15 m sobre o leito adjacente do rio, surge interestratificado com depósitos de vertente que integram vestígios arqueológicos similares e que se desenvolvem na encosta que delimita a poente a plataforma que prolonga o Monte de Prado. Na margem oposta, o canal é delimitado por uma plataforma granítica em cuja superfície se identificaram depósitos residuais de inundação que se associa uma indústria lítica em que se destaca a presença mais significativa de produtos de debitagem. Um pouco mais para sul, numa sondagem aberta nas imediações da Quinta da Veiga foi ainda possível recolher vestígios de uma indústria acheulense com peças talhadas ligeiramente eolizadas, cujo real contexto sedimentar ainda se encontra por estabelecer.

No concelho de Melgaço assinala-se ainda a existência de uma outra jazida acheulense, localizada na vertente meridional do Monte Crasto, na freguesia de Penso, a uma altitude próxima dos 230 m. Os materiais foram aí recolhidos pelo Sr. José Cardoso, morador na freguesia, quando se procedeu no local a trabalhos de revolvimento do subsolo saibroso para a criação de uma pequena área de lazer. As peças, com as arestas de talhe muito boleadas, foram-nos cedidas para estudo pelo seu descobridor, estando também prevista a realização no local de sondagens que permitam definir melhor as condições de jazida em que se encontravam integradas.

Assinale-se ainda que no decurso da campanha de trabalhos de 2016 se recolheram amostras de sedimentos na jazida de Pedreira 2, em Monção, e na jazida das Carvalhas, em Melgaço, para a obtenção de datações por OSL, cujos resultados se aguardam. As amostras foram recolhidas por Lee Arnold e Martina Demuro, da Universidade de Adelaide, na Austrália, que irão proceder ao seu processamento laboratorial no âmbito de um projeto de datações em jazidas pleistocénicas ibéricas.

Num primeiro e preliminar balanço dos trabalhos realizados ao longo dos dois primeiros anos de desenvolvimento do projeto Miño/Minho 2, pode afirmar-se que os dados coligidos testemunham claramente a importância arqueológica da margem esquerda para o estudo do Paleolítico do Baixo Minho, justificando plenamente o objetivo originalmente delineado de se vir a desenvolver tal estudo associando de forma integrada ambas as margens.

Mesmo se os resultados obtidos têm levado a uma reprogramação dos trabalhos, concentrando-se esforços nas intervenções desenvolvidas em algumas jazidas localizadas numa pequena área repartida entre os concelhos de Melgaço e Monção, o número de jazidas já identificadas e as problemáticas a elas associadas permitem reformular de forma inovadora o nosso conhecimento sobre o Paleolítico da região, sendo também certo que o estudo das coleções de materiais líticos talhados entretanto recolhidos e que se encontra já a ser desenvolvido não deixará de reforçar tal situação.

 

João Pedro Cunha-Ribeiro, Sérgio Monteiro-Rodrigues, Alberto Gomes, Eduardo Méndez-Quintas, José Meireles, Alfredo Pérez-González, Manuel Santoja

 

Eduardo Méndez-Quintas

Universidade de Vigo

2017

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INFLUÊNCIA GALEGA NO ROMÂNICO EM MELGAÇO

melgaçodomonteàribeira, 04.09.21

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fiães

EL CAMINO DE SANTIAGO Y SU INFLUENCIA EN EL

ALTO MINHO

La asistencia a peregrinos sempre ha estado muy presente en el Alto Minho como se demuestra en la donación de Ordoño II a la iglesia de Correlhã (Ponte de Lima) en la que se manifiesta sobre la conveniência de alienar ciertos bienes para atender a las necesidades de pobres y peregrinos “pro subsídio pauperum et peregrinorum”. Las cartas de couto de Afonso Henriques al monasterio de Paderne (Melgaço) (1140) y Vila Nova de Muía (Ponte da Barca) (1140) recogen también esta vacación asistencial.

Sin embargo, pese a la estrecha relación con Santiago de Compostela a través del Camino, desde el punto de vista artístico, podemos decir que es más importante la influencia tudense que la compostelana, ya que no podemos considerar la existencia de una influencia directa, sino a través de Tui, cuya catedral presenta influencias de la parte más antigua de la obra compostelana y sus capiteles se relacionarían com el taller compostelano de Platerías y la girola santiaguesa, en este sentido, cabe mencionar un capitel que ya comentamos con anterioridade el de las aves apicadas bebendo de una copa cuyo origen es claramente compostelano.

Por otra parte, en la antigua iglesia monástica de São Salvador de Paderne (Melgaço) encontramos una portada que Ferreira de Almeida considerada vinculada al estilo mateano, hecho que se hace muy patente por la decoración floral y geométrica pero que tanbién la pondría en relación con fachadas cistercienses galegas como por ejemplo la de Santa María de Armenteira (Meis, Pontevedra) en el âmbito diocesano compostelano.

 

ECOS ORENSANOS EN EL ALTO MINHO

 

En la parte de la margen izquierda del Minho, en su zona más oriental, cuya escultura fue ampliamente estudiada por Lúcia Rosas encontramos iglesias cuya influencia gallega proviene de Ourense.

Destacan los motivos cruciformes en los tímpanos de las portadas que presentan relación en sus características y en su labra con las iglesias de la terra da Limia, território fronterizo entre Ourense e Portugal que también fue objeto del conflicto fronterizo medieval con las ocupaciones del território por parte de Teresa de Portugal y de su hijo Afonso Henriques.

Dos iglesias monásticas del municipio de Melgaço, la ya citada São Salvador de Paderne y la cisterciense de Santa María de Fiães, presentan una decoración de tipo ourensano. En el primer caso esta aparece en la portada occidental del brazo lateral norte del transepto, solución coincidente con la del monásterio ourensano de Santa Cristina de Ribas de Sil (Parada de Sil, Ourense). Esta decoración consiste en una cornisacon decoración de bolas sustentada por arquillos ciegos y que aparece también en las cornisas del triple abside de Santa María de Fiães y que tendria su origen en la Ribeira Sacra ourensana donde apareceria a finales del siglo XII mientras que en Portugal apareceria en el signo XIII.

Por lo tanto, cabe concluir que en el caso de la influencia ourensana esta tiene una doble vertiente: por un lado la influencia limiana que proviene de la orilla derecha del Lima y por otro la influencia de la arquitectura monástica ourensana de la región de los ríos Miño y Sil, conocida como Ribeira Sacra, no olvidemos que el Miño es un punto de unión entre Galicia y Portugal, y la relación de Teresa de Portugal con esa zona ourensana para lo que cabe mencionar el controvertido diploma fundacional del Monásterio de Montederramo de 1124.

 

Margarita VÁZQUEZ CORBAL

Doctora en Historia del Arte de la Universidade de Santiago de Compostela