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MELGAÇO, DO MONTE À RIBEIRA

História e narrativas duma terra raiana

MELGAÇO, DO MONTE À RIBEIRA

História e narrativas duma terra raiana

A LENDA DO PEDREGAL DE IRIMIA

melgaçodomonteàribeira, 31.07.21

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AS FEITICEIRAS DE ARBO E MELGAÇO

“Quem atravessar o rio Minho em Melgaço há-de levar na boca um seixinho para durante a viagem não poder falar se as feiticeiras se meterem com ele” (Leite de Vasconcelos 1931, 70 en Alonso Romero F 1996, 75).

Vamos que para atravesar o río en Arbo e Melgaço o mellor é levar unha pedriña, un coio pequeno na boca para non poder falar en ningún caso.

As feiticeiras amedoñan ás personas dunha e doutra beira que cruzan o río Miño, sexan pescantíns, barqueiros ou calquera tipo de xente, que deben levar coios entre os dentes para asi non repostar ás súas palabras enmeigadas. Son fermosas e poden engailar os mozos, que os levan profundidades e xa se sabe.

O parecer estas feiticeiras aparecen exclusivamente no río Miño.

O parecer cando alguén abre a boca para falar métense por ela cara o cerne do corpo da víctima, respostando esta crenza á medieval que cría  na entrda dos diaños e certos intres de xantar e do falar. Daquela a alma podía ser posuida por eles, ata ser expulsada por certos medios como os exorcismos, en diversos santuarios cristiáns.

O parecer tamén actuaban contra as embarcacíons e a pesca. Para actuar neste caso dábanlle unha tunda cun pau a rede e repetian: Ah desgraciada! Toma! Toma!. Si o volver a botar a rede esta flotaba é que a feiticeira inda estaba na rede, volvian a facer o mismo cambiando as palavras por: Sae de aqui, filla de puta!. (Alonso, E. 1984, 353).

 

Retirado de: www.rios-galegos.com/lendafeiticeiras.htm

CASTELO DE MELGAÇO POR CARLOS A. BROCHADO DE ALMEIDA III

melgaçodomonteàribeira, 24.07.21

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(continuação)

De acordo com a documentação disponível há três momentos em que se fala da cerca e das obras que nela se faziam. Em 1205 o documento é taxativo quanto ao facto de já haver um muro e uma porta. Como a obra era demorada, digamos que terá começado nos primeiros anos de reinado de D. Sancho I, provavelmente após a sua passagem pela terra, facto que nos é relatado pela Inquirição de 1258 “veo Rey don Sancio Iº a Melgazo, et filou Sancta Maria da Orada porá si, et deu a Feaes por ela Figueiredo et C. maravedis”. A ser válida esta hipótese, como pensamos que o seja, então a primeira fase da construção do muro da vila ocorreu praticamente em simultâneo com o levantamento da torre de menagem e logo após a conclusão dos torreões que defendiam a cerca do castelo. Estes estão adossados à muralha e a dois deles encostam, por sua vez, os arranques do muro da vila.

O segundo momento está expresso no pacto, que em 1245 foi celebrado entre o abade João de Fiães, os juízes João Pires de Caveiras e Miguel Fernandes, mais o concelho de Melgaço, isto é, as autoridades máximas que superintendiam no burgo. No texto do acordo – “ut abbas et Conventus cum hominibus suis quibus in presenti et de certero in hereditate ipsius monasterii in canto villeniostre fuerint faciant decem et octo brazas de muro in illa parte nostre ville ubi modo est apoteca sua secundum naturam et formam quam nos fecimus et fecerimus in circuitu ipsius ville per totum. Et si murum quod fecerint ceciderit semper teneatur monasterium ipsium reparare in propriis expensis, sed si forte habitatores eius dem villa in propriis expensis murum fecerint lapidibus quadratis in circuitu per totum et turres in turrem quam iam dictus abbas instanti incipiendam promittit – há, como aliás já foi notado, diversos pontos a reter e a saber: o muro da vila foi feito por três entidades distintas: o concelho, o convento de Fiães e o rei.

Quem começou a defender o burgo foi o concelho, isto é, as autoridades que na altura ali exerciam jurisdição. O Convento de Fiães continuou a expensas suas a dita obra, porque tal empresa também os favorecia. Ali, no couto e na própria vila tinham propriedades – metade da igreja de Santa Maria da Porta e uma adega – e não era nada salutar às suas finanças que, em caso de novo ataque, houvesse devastação nas suas propriedades. É evidente que o concelho concedeu ao mosteiro e aos homens das suas herdades algumas isenções, mas a necessidade de começar a obra rapidamente – “instanti incipiendam promittit” – era bem demonstrativa da real necessidade que havia em completar-se o circuito defensivo do burgo. Onde não havia ainda o muro, a defesa assentava na natureza do próprio terreno, completada por obras menores que poderiam incluir uma estacaria de madeira, terra e mesmo pedra miúda, longe da solidez de uma verdadeira muralha em pedra como aquela que estava em construção.

O segundo aspecto a reter relaciona-se com a dimensão dos trabalhos acordados entre o mosteiro e os homens do concelho. Segundo o acordo, o abade João comprometia-se a realizar dois tipos de trabalhos distintos: construção e reparação. A construção incluía nada mais que dezoito barças de muro, algo que traduzido para as medidas actuais, equivale a 32,91m. A reparação, essa far-se-ia sempre que a parte construída pelo mosteiro caísse – não especifica se por causas naturais ou se devido à guerra – e sempre a expensas dos frades. O terceiro item respigado deste acordo é de longe o que mais dúvidas suscita. O texto informa que se os moradores da vila fizerem o muro e as torres de pedra quadradas, de iguam modo o terá de fazer o mosteiro no troço que lhes estava atribuído, tal como a torre que o dito abade prometia começar imediatamente.

Várias são as leituras que se podem inferir desta passagem.

A primeira é que o concelho construiu a parte inicial do muro com pedras não quadradas, isto é, em alvenaria, mas aventava a hipótese de o poder vir a fazer. É esta a opinião de Bernardo Pintor, mas não a nossa, porque tendo presente os restos arqueológicos que ainda subsistem junro à torre do castelo acreditamos, que desde o início a muralha foi integralmente feita em silhares de cantaria, num aparelho pseudo-isódomo, muito semelhante, se não mesmo igual, aquele que ainda subsiste entre a Porta de Baixo e a torre próxima ao antigo edifìcio da Guarda Fiscal. O que muito provavelmente os homens do concelho quiseram dizer ao mosteiro, foi que a construção e reparação do muro teria de obedecer ao modelo escolhido pelas autoridades do burgo, já que elas eram as responsáveis pela sua defesa desde  a altura em que o rei D. Sancho II transferiu para a sua responsabilidade tal encargo. A contrapartida era a obrigação de indicar um cavaleiro fidalgo, natural do reino, de boa reputação, para ser investido como alcaide.

A segunda é que o abade de Fiães tinha também de erguer uma torre. Mas qual? Como no muro da vila não parece que as tenha tido – a defesa fazia-se com balcões assentes em matacães – só resta a possibilidade de estarem a referir-se a uma das três da cerca do castelo. Provavelmente à torre próxima ao quartel da Guarda Fiscal que mostra ter um aparelho em tudo semelhante à do muro que se lhe adossa.

A terceira observação relaciona-se com a torre que o abade prometia iniciar de imediato. O texto diz que prometia começar, não que havia começado. Mas se realmente anunciou a construção de uma torre na cerca da vila, esta só pode ser uma que estaria voltada a Sul, à Alameda de Inês Negra e que numa gravura de 1758 aparece representada com o traço interno interrompido. A confirmar-se esta nossa observação, então ficávamos a saber que a parte do muro da vila erguida pelo mosteiro de Fiães foi o troço meridional, aquele que na actualidade está voltado à praça Hermenegildo Solheiro e à Alameda de Inês Negra.

De acordo com este raciocínio a primeira fase corresponde ao troço compreendido entre a torre do castelo voltada à Praça da República e a Praça Hermenegildo Solheiro, a segunda ao troço meridional, incluindo a terceira, todo o pano oriental e o setentrional, espaço que incluía a Porta de Baixo aquela em que está a inscrição datada de 1263.

A terceira fase da construção do muro da vila corresponde ao troço ocidental, aquele que inclui a Porta de Baixo e todo o pano que se estende até à torre B do castelo. Foi da responsabilidade do rei, tal como o aventa a inscrição comemorativa colocada junto à Porta de Baixo.

A epígrafe que se distribui por três silhares graníticos, metidos na parte exterior da muralha, do lado direito da porta que, pelo lado oriental, dá acesso à Rua Direita tem a opinião de Mário Barroca a seguinte leitura: IN TEMPORE: REGIS : ALFONSI : / : PORTUGALIE : MAGISTER : FERNANDUS : COM/POSUIT : MURUM : ISTUN : ERA : Mã : CCCãã :

MARTINUS : GO(n)CALVIZ : CASTELARIUS : / : DomiNI : REGIS : CIRCUNDAVIT : HANC : VILLAN : / IN (h)AC : PARTE

No ano de 1263 reinava em Portugal o rei D. Afonso III, irmão de D. Sancho II que se viu obrigado a abdicar no ano de 1245 por imposição do clero português que obteve a simpatia actuante do Papa. Foi política deste monarca mandar elaborar as Inquirições Régias de 1258 e no caso específico de Melgaço concedeu-lhe um novo foral, mas os moradores, vendo agravadas as suas contribuições, reclamaram e foi-lhes restaurado o anterior que vinha do tempo de D. Afonso Henriques. No tocante à inscrição está por demais claro que o rei ordenara a conclusão da obra à custa do erário régio. Era castelão ou alcaide do burgo Martinho Gonçalves. O construtor ou empreiteiro (mestre) foi um homem de nome Fernando.

Tal como os castelos também as cercas românicas eram de pequena dimensão e de formato sub-circular. As suas aberturas eram mínimas, como convinha a uma defesa passiva, reforçada pela espessura dos muros e dos terreões adossados, quando os havia. Não é o caso de Melgaço, onde estes foram substituídos por balcões assentes em matacães, tendo cada um deles – nos que subsistiram – quatro aberturas cada.

A proibição de construir-se junto dos muros da vila é algo que pertencia aos tratados militares de então. Afonso X recomendava que casas e outros tipos de construção fossem erguidos a uma distância de 4,5m da face interna dos muros das cercas dos burgos e castelos. A autorização só era concedida na condição de, em tempo de guerra, tais construções serem demolidas.

Exemplos de casas encostadas à face interna do muro da vila não faltam em Barcelos, Viana do Castelo, Monção ou Ponte de Lima. Por seu lado Melgaço não fugiu à regra. As casas encostaram, sempre que puderam, mas há sítios onde isso não aconteceu. O melhor exemplo do respeito pela distância entre o muro e as casas de habitação está ainda hoje patente na Travessa da muralha, junto da Porta de Baixo e num outro espaço, junto da Porta da Rua do Carvalho, que só em tempo recente é que foi tapado pelo acrescento da casa que foi Quartel da Guarda-Fiscal na vila de Melgaço.

 

PORTUGALIA

Nova Série, Vol. XXIV, 2003

 

A “COURAÇA NOVA” DA VILA DE MELGAÇO

RESULTADO DE UMA INTERVENÇÃO ARQUEOLÓGICA NA PRAÇA DA REPÚBLICA

 

Carlos A. Brochado de Almeida

 

CASTELO DE MELGAÇO POR CARLOS A. BROCHADO DE ALMEIDA II

melgaçodomonteàribeira, 17.07.21

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(continuação)

 

A hipótese, consistente, de ter sido o rei D. Afonso Henriques a mandar construir o castelo – a concretização é que poderá não ter sido na sua vigência – alicerça-se no texto da Carta de Couto concedida pelo rei D. Sancho I ao mosteiro de Longos Vales, situado no actual concelho de Monção e que a crítica, apesar de algumas incertezas, tende a colocar no ano de 1199. Diz o referido documento que o rei coutava o dito mosteiro de “São João de Longavares juntamente com o herdeiro D. Afonso II e os restantes filhos e filhas em remição dos seus pecados e pello amor de Deus, pella torre que Dom Pêro Periz, prior do dito mosteiro com seus frades nos fes em Melgaço”.

De acordo com aquele texto, não restam dúvidas que em 1199 já havia uma torre em Melgaço mandada construir a expensas do mosteiro de Longos Vales. Por este facto não compreendemos a surpresa demonstrada por Bernardo Pintor – a não ser que desconhecesse o texto da Carta de Couto do Mosteiro de Longos Vales – pela presença do prior do dito mosteiro na Inquirição feita em 1258 à vila de Melgaço, onde participou conjuntamente com outras figuras civis e religiosas, nomeadamente os abades dos mosteiros de São Salvador de Paderne e de Santa Maria de Fiães. Os motivos que conduziram até Melgaço o prior do dito mosteiro seriam os mesmos dos restantes: interesses económicos na região.

As razões do interesse do mosteiro de Fiães, conhecemo-las devido à documentação que se conservou, como saberíamos a de Paderne e mesmo as de Longos Vales, apesar de este se localizar bem mais distante, caso conhecêssemos o paradeiro de seus cartórios. O abade de Fiães tinha por ali casas e herdades, dele dependia, alternadamente, a apresentação do pároco da paróquia de Nossa Senhora da Porta – o outro patorno era o concelho ou câmara de Melgaço – e tinha, sobretudo, grandes interesses em Nossa Senhora da Orada.

De Paderne sabemos menos, mas posteriormente, no reinado de D. Pedro I, este mosteiro tinha na vila de Melgaço umas casas que haviam pertencido a “Domingu Eannes pera teer en ellas seu pam e seu vinho”. Tal propriedade foi objecto de uma demanda judicial e, por esse motivo, o rei acabaria por dar razão ao mosteiro, ficando ele com a liberdade de as usar como bem entendesse, desde que pagasse o foro que lhe era devido. Aliás, seria este mesmo monarca quem viria a confirmar, a 6 de Novembro de 1358, os previlégios anteriormente outorgados ao concelho de Melgaço.

Do Mosteiro de Longos Vales desconhecemos os seus verdadeiros interesses, mas se os frades haviam construido a dita torre, porque motivo assim haviam procedido? Certamente porque ali tinham propriedades que precisavam de ver protegidas e assim colaboravam na política de defesa seguida pelo rei ou porque, precisando de pagar favores reais concedidos noutros pontos do Minho, colaboravam na defesa de um burgo recentemente dotado, pelo rei, de uma Carta de Foral que a elevava à categoria de concelho.

A primeira referência à vila de Melgaço defendida e rodeada com um muro ou cerca, data de 1205. Naquela altura, mais especificamente a 13 de Abril o arcediago da Terra de Valadares, D. Garcia Nunes, juntamente com André Garcia “ut seviat ipse Andreas mihi” faziam um acordo com o abade de Fiães relativo à posse da igreja que se ideficava junto à porta da mesma vila: “ipsam ecclesiam de Melgazo que est edificata prope portam ipsius ville”.

À luz deste documento fica bem claro que em 1205 – governava então D. Sancho I já desde 1185 – a cerca já estava em construção, nomeadamente o troço nascente, voltado à Praça da República e Rua Hermenegildo Solheiro, muito provavelmente porque esta era a zona menos defensável sem o apoio de meios artificiais. De acordo com o texto, naquela data já havia uma porta no muro, justamente na traseira da capela-mor da igreja de Santa Maria. A sua construção era de tal maneira necessária e significativa para a população do burgo que acabou por marcar a própria designação oficial da paróquia que passou a chamar-se Santa Maria da Porta.

Respingando na bibliografia da especialidade, a maioria dos autores que se têm debruçado sobre este tema, são de opimião que a obra de cercar o burgo resultou das desavenças político-militares ocorridas no reinado de D. Afonso II, entre este monarca e suas irmãs, situação que levou o exército de Leão a entrar no Minho nos anos de 1211 e 1212 e a devastar a região. Seria, para Bernardo Pintor, este o motivo principal que teria levado o monarca a mandar cercar a vila de uma muralha, mas não o diz com total convicção, porque a certo ponto levanta a hipótese de ela já existir e os leoneses terem-na destruído. Na sua esteira, com argumentos semelhantes viria Mário Barroca a reiterar a hipótese de ter sido o rei D. Sancho II o autor da construção do muro da vila de Melgaço. De acordo com a sua argumentação “o início da construção da muralha de Melgaço remonta, pelo menos, aos tempos de D. Sancho II”. Opinião semelhante teve Augusto César Esteves. Para este estudioso de Melgaço as desavenças entre D. Afonso II e suas irmãs motivaram o ataque a uma Melgaço que mal defendida “com panos de fraca cortina em terra, possivelmente sem obras defensivas capazes de aturarem cerco de semana ou meia dúzia de escaladas contínuas” assim ficaria até ao reinado de D. Sancho II. Para este autor as obras realizadas em tempo do rei D. Sancho II foram parcelares, porque a parte voltada ao mosteiro de Santo António das Carvalhiças só foi feita no tempo de D. Afonso III, em 1163.

Que a cerca começou a ser erguida pelo lado nascente e antes de 1205 é algo que para nós é um dado adquirido. Pacífica é também a ideia de que uma obra daquela envergadura não podia ter sido construída em dois tempos, mesmo que os fundos abundassem. Não foi o caso, porque a obra foi feita a expensas de várias instituições e demurou a concretizar-se mais de meia centena de anos. Deveria estar concluída em 1263, ou próximo disso e não em tempo do rei D. Dinis como aventou César Esteves.

 

 

(continua)

 

O CASTELO DE MELGAÇO POR CARLOS A. BROCHADO DE ALMEIDA I

melgaçodomonteàribeira, 10.07.21

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A CONSTRUÇÃO DO CASTELO E DO MURO DA VILA

 

É voz corrente ter sido o rei D. Afonso Henriques o mentor da ideia que conduziu à construção do castelo que defendia a povoação a quem havia concedido foral, no pressuposto que um burgo de fronteira, dotado de tal honra, não poderia existir sem a correspondente componente militar. É certo que as demais povoações raianas do Minho, elevadas à categoria de vila e concelho, tinham o seu castelo, mas também não é menos verdade que a concessão de uma tal prerrogativa não implicava, logo, o seu amuralhamento.

O Castelo de Melgaço foi construído no ponto mais saliente e defensável da povoação e esta, numa primeira fase, ficou fora dos planos defensivos arquitectados para o sítio. Algo semelhante terá acontecido com Monção e Valença e sucedeu, indubitavelmente, com Vila Nova de Cerveira. O rei D. Dinis quando, em 1320, instituiu ali uma póvoa mandou construir um castelo, mas a povoação, incluindo a sua igreja – dedicada a S. Cipriano – ficou deliberadamente de fora. A sua fortificação só viria a acontecer na altura das Guerras de Aclamação, como antes  já o havia sucedido a outras vilas de fronteira e a outras não tão expostas, casos de Viana, Ponte de Lima e Barcelos, cercadas com “muros” ao longo da segunda metade do séc. XIV.

É voz corrente que o Castelo de Melgaço é obra do primeiro rei de Portugal. Em defesa desta tese há certos argumentos, alguns deles dignos de atenção.

Foi efectivamente D. Afonso Henriques quem promoveu Melgaço ao conceder-lhe Carta de Foral. A sua outorga, se outra motivação não fizesse, legitimou uma pequena aglomeração com características urbanas, localizada num espaço entre o Minho e o Lima, num ponto onde começava a aceitar-se que por ali passava a linha de fronteira entre dois reinos. O segundo argumento, sendo de carácter militar, não é menos importante. Ele deriva do facto do rei conhecer pessoalmente o território e de saber da importância que o burgo tinha para a defesa do espaço que lhe ficava na retaguarda, mormente as linhas de penetração que davam acesso ao Lima e mais para Sul a duas cidades de capital importância para as aspirações independentistas dos nobres portucalenses: Braga e Guimarães. De acordo com o texto da Carta de Couto concedida ao mosteiro de São Salvador de Paderne – “istum fretium et servitium fuit datum quando tomavit dominus rex Castellum de Laborario” – o rei D. Afonso Henriques conduziu pessoalmente uma ofensiva que visava retomar e retomou o Castelo de Castro Laboreiro. Tudo aconteceu em 1141 quando Afonso Henriques invadiu a Terra de Toronho, território fronteiriço à linha do Minho e que tinha Tuy como principal ponto de referência. Esta acção bélica levou à invasão do Minho e à consequente tomada do Castelo de Castro Laboreiro pelos leoneses, à data, uma estrutura roqueira assente sobre os escombros de uma velha povoação da Idade do Ferro, pois somente no reinado de D. Dinis é que o castelo ganhou a forma que ainda hoje ostenta.

Não havendo no Foral de Melgaço nenhuma alusão ao castelo ou a qualquer outra estrutura de carácter defensivo, sendo igualmente omissos, a este respeito, os vários documentos do tempo de D. Afonso Henriques pertencentes ao Cartulário de Fiães, será foi deste monarca que partiu a ordem para a construção do castelo? Bernardo Pintor, um estudioso criterioso da realidade medieval de Melgaço, duvida e, pelo menos, em duas passagens expressa-o claramente: “Dizem alguns autores que D. Afonso Henriques levantou em 1170 o castelo. Documentos a provar ainda os não vi e nem sei que os haja” e “dizem alguns autores que este rei levantou o castelo que foi apoiado pelo Prior do Mosteiro de Longos Vales, mas não encontrei referências documentadas”.

As dúvidas, muito legítimas, de Bernardo Pintor assentam no facto de não haver na documentação alusões claras e directa acerca da actuação do rei em Melgaço neste campo e também porque no texto do Foral não há qualquer referência à figura do alcaide, que tinha um papel eminemtemente militar e superintendia ao castelo, sendo unicamente mencionado o vigário do rei, cujo cargo era funcionalmente administrativo e fiscal.

Os defensores da tese que o castelo nasceu com o rei D. Afonso Henriques beberam a informação num documento – a denominada Carta de Foral concedida por Afonso Henriques a Castro Laboreiro – que a crítica moderna dificilmente aceita como autêntico. Neste texto e a propósito dos limites de Castro Laboreiro dizia-se que o seu território confrontava com o antigo castelo de Melgaço que o Rei Ramiro havia edificado para repelir os inimigos que infestavam o Alto Minho e Portugal.

Mas qual dos reis com o nome de Ramiro?

O primeiro com tal nome, Ramiro I, reinou entre 842 e 850. Durante o seu curto reinado a Galiza sofreu violentas incursões dos Normandos e dos Muçulmanos, estes enviados pelo emir Abdal-Rahman II. O segundo era filho de Ordonho II que morreu em 924. Os seus três filhos vieram a revelar-se contra o primo Afonso Froilaz, sucessor de Froila, que havia sucedido no cargo a seu irmão. Os três, vencedores, acabaram por repartir o reino entre eles, cabendo a Galiza a Sancho Ordonhes e o território mais ocidental, isto é, o Condado Portucalense, a Ramiro II. Este rei, que governou com uma certa violência contra familiares e apoiantes, desenvolveu uma política de consolidação do Condado Portucalense ao atribuir a liderança a Vímara Peres.

Ramiro II morreu em 951 e sucedeu-lhe o filho Ordonho III que morreu em 956. A este viria a suceder o irmão Sancho I e a este o filho Ramiro III que reinou até 984, entre a contestação dos opositores e campanhas defensivas contra as razias dos Normandos e os ataques dos Muçulmanos. Será, aliás, poucos anos depois, em 988, que Almançor desencadeará uma das mais violentas incursões à Galiza, tendo saqueado e incendiado Santiago de Compostela.

Se tal texto fosse verídico fazia reportar a construção do Castelo de Melgaço claramente a um período pré-nacional e pré-românico, mais concisamente ao séc. IX. Naquela época ainda não existia a política de construir castelos junto a povoações ou de as situar no interior de cercas defensivas. É o período dos castelos de montanha, de refúgio episódico, por altura das algaras mouriscas. É o tempo do aproveitamento das altas e densas penedias, muitas das vezes dos velhos castros da Idade do Ferro. São inúmeros os exemplos espalhados pelo Entre-Douro-e-Minho e, no caso concreto de Melgaço, não faltam alusões a castelos pré-românicos, os tão propalados castelos roqueiros.

Se o documento fosse fiável o território de Castro Laboreiro estender-se-ia até muito próximo da vila de Melgaço, mais concretamente até ao Monte de São Mamede, que os textos apelidam de “mons Cotaro”, sítio onde nós suspeitamos que se localizava o castelo roqueiro responsável pela defesa e refúgio das populações que estavam dele “subtus mons”, encontrando-se entre elas a “villa” de Cavaleiros.

Se o documento fosse considerado pela crítica actual como autêntico, teríamos provavelmente de deslocar o castelo roqueiro do seu habitat natural para o morro onde viria  a constituir-se a futura povoação. Não porque a colina onde está o castelo actual não reúna as necessárias características defensivas – o espaço em redor do castelo está topograficamente alterado e alteado – mas porque as suas condições de defesa estão mais de acordo com uma política militar de defesa passiva vigente na época românica que com a anterior, assente na defesa ocasional de um território com base numa população dispersa e sem características de ajuntamento, à moda dos futuros burgos.

Apesar do peso de todas estas considerações é possível que a ideia de construir um castelo em Melgaço tenha partido de D. Afonso Henriques, porque ali havia um burgo merecedor de Carta de Foral e por isso mesmo necessitado de protecção militar. Por um lado tornava-se necessário defender uma região, cada vez mais entendida como fronteira entre regiões que recentemente tinham alterado os laços políticos que os uniam.

 

(continua)

 

MELGAÇO NA ARMADA EM 1624

melgaçodomonteàribeira, 03.07.21

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 azulejo de manuel igrejas - pormenor

FIDALGOS PORTUGUESES QUE INTEGRARAM A ARMADA DA RESTAURAÇÃO DA BAHIA DE 1624

 

PEDRO CÉSAR D’EÇA

Nota: Pedro César d’Eça integrante da Armada da Restauração da Bahia de 1624, serviu também na África e ficou cativo, custando o seu resgate 46 mil cruzados.

Filho de Luiz César de Menezes, Provedor dos Armazéns, Comendador da Ordem de Cristo, no tempo dos reis D. João III e D. Sebastião, homem muito rico, e de D. Cecília d’Eça ou D. Cecília de Castro, filha de Fernão de Castro, Alcaide Mor de Melgaço. Este Luiz César de Menezes, é irmão do General Vasco Fernandes César, Provedor dos Armazéns e Armadas do Reino, portanto tio do outro Luiz César de Menezes, que também integrou a Armada da Restauração da Bahia de 1624.

Pedro César d’Eça, deixou geração do seu casamento com D. Jerónima de Castro, filha de Cristóvão Falcão de Sousa, Governador da ilha da Madeira.

Finalmente, Pedro César d’Eça e seu sobrinho Luiz César de Menezes, são primos próximos de Francisco de Mello e Castro, que também os acompanhou na Armada da Restauração da Bahia de 1624.

RUY BARRETO DE MOURA

Nota: Outro fidalgo cuja identificação fica muito difícil pela falta de maiores informações.

Cronológicamente há possibilidades de ser um Ruy Barreto Rolim ou de Moura Rolim, que serviu na Índia e foi comendador de Castro Laboreiro. Filho de Manuel Barreto Rolim e de Jerónima Esparragoza de Sousa; neto paterno de outro Ruy Barreto, Estribeiro Mor do rei D. Manuel, Comendador de Azambuja, e de Rodão e bisneto de Jorge Barreto e de D. Leonor de Moura, origem do seu sobrenome Moura.

Com geração de seu casamento em Goa com D. Catarina, senhora nobre, criada e adoptada por sua avó D. Maria d’Eça.

 

Retirado de https://familysearch.org