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MELGAÇO, DO MONTE À RIBEIRA

História e narrativas duma terra raiana

MELGAÇO, DO MONTE À RIBEIRA

História e narrativas duma terra raiana

1974, POLÍTICA EM MELGAÇO

melgaçodomonteàribeira, 25.04.20

25 abril 115 - política de 1974 em melgaço (1).j

dr. antónio durães

 

UMA CARTA DO SR. DR. ANTÓNIO DURÃES

 

Ex.mo Snr.

Director do «Notícias de Melgaço»

Dr. Abel Augusto Vaz

 

Ao ler, no número de 10 do corrente, do quinzenário de que V. Ex.ª é ilustre Director, o apelo «CAVE (isto é, CAUTELA em língua portuguesa) Junta de Salvação Nacional» fiquei impressionado, e creio que com justificado motivo.

Porque dele se poderá, ou mesmo deverá depreender que V. Ex.ª admite que da mudança dos «quadros dirigentes» - no nosso caso local, da Câmara Municipal – o «poder» teria a possibilidade de cair «nas mãos de criminosos, ladrões ou corruptos administradores do antigo regime, ou de seus cúmplices ou de quem notoriamente estará interessado em destruir ou sonegar as provas dos condenáveis actos daqueles».

Eu não sei a quem V. Ex.ª se terá querido referir ao aventar esta possibilidade, tanto mais que os «administradores do antigo regime» eram, sem dúvida seus correligionários políticos, visto terem sido nomeados Presidentes da Câmara Municipal, pelos governos, que tiveram como essencial, mesmo como exclusivo apoio e sustentáculo político, a União Nacional depois chamada Acção Nacional Popular, de cuja Comissão Concelhia V. Ex.ª foi PRESIDENTE, até à sua extinção pelo Movimento das Forças Armadas, de 25 de Abril.

Não sei nem isso me interessa.

Interessa-me sim, o ver admitido por V. Ex.ª, e não sei por mais qual leitor do seu Jornal, a possibilidade da Junta de Salvação Nacional, ou o Governo que lhe suceda, encobrirem actos que V. Ex.ª classifica de criminosos, impedindo a sua averiguação e merecida punição, como o fizeram os governantes daquele antigo regime, por V. Ex.ª apoiado e defendido até à sua extinção, encobrimento que V. Ex.ª põe a nu, e bem claro, no artigo do mesmo número do seu jornal, intitulado «O Tema».

E interessa-me porque não admito essa possibilidade e não desejaria que menos atento leitor fosse levado a admiti-la, embalado pelas suas aliciantes palavras.

Estou certo que todos aqueles que forem DEMOCRATAS conscientes, e não se proclamem como tais, apenas por interesses pessoais, não admitem, como eu, tal possibilidade.

E esta certeza é-me dada até pela isenção e imparcialidade demonstrada no telegrama, de que fui primeiro signatário, enviado àquela Junta Nacional, e em que pedimos a substituição da Câmara Municipal de Melgaço «por uma comissão presidida por digno Oficial do Exército ou da Marinha, que faça ou promova rigoroso inquérito às violências e delapidações de que é publicamente acusada».

Não quisemos que algum mal intencionado, ou sem escrúpulos, viesse mais tarde dizer que o inquérito realizado fora parcial, ou «encobridor», orientado por ódios, ou amizades, que não tem cabimento na descoberta da VERDADE.

Não sei se V. Ex.ª compreenderá isto, não sendo DEMOCRATA, e habituado como estará aos métodos do regime, que nos esmagou durante quasi meio século, e V. Ex.ª serviu como destacado elemento do grupo político que apoiou e sustentou esse regime, até à sua extinção. Mas não me caberá a mínima culpa nessa incompreensão, e já que todos os DEMOCRATAS conscientes e sinceros tão facilmente o compreendem.

Não me atrevo a pedir a V. Ex.ª a publicação desta carta no seu Jornal, embora me fosse grata, para, e pelo menos, despertar a atenção de quem tenha lido as palavras de V. Ex.ª menos atenta e cuidadosamente delas tirando conclusões distorcidas.

Mas, não posso deixar de me reservar o direito de dar conhecimento dela a quem entender, ou de a tornar pública pelos meios de que possa dispor.

O que não deverá impedir que me subscreva,

Melgaço, 15 de Maio de 1974

De V. Ex.ª

atenciosamente

António Durães

(Obs.: O seu jornal do dia 10 só ontem recebido por mim)

A Voz de Melgaço, 541, 1 de Junho de 1974

 

 

 

VAMOS TODOS FICAR EM CASA