VASCO DE ALMEIDA, O SENHOR CULTURA DE MELGAÇO
UM LUGAR ONDE NADA ACONTECIA…
A novena e a penicilina surtiram efeito, o Zéca do Aurélio estava fora de perigo. O júbilo foi grande entre a população! O doutor Suíça acrescera mais um ponto no seu já famoso curriculum de médico. Mais algumas semanas e o rapaz voltou às suas actividades: participar no comércio do pai e administrar o Rápido Futebol Clube de que era o presidente da directoria.
A mãe do médico, a dona Teresa Pedreira faleceu. O funeral foi muito concorrido mercê do prestígio do filho. Causou assertivas críticas a atitude do Amílcar da Lucrécia. Na hora em que o préstito passou na rua do café do Hilário ele estava jogando bilhar. Como podia fazer uma coisa daquelas? Comentava o povo. Não acompanhar o funeral da mãe de quem lhe salvara a vida? Inquirido, vendo a burrice que fez, a Amílcar desculpou-se dizendo não ter calçado apropriado, só tinha aqueles ténis brancos e achou que não ficasse bem.
O Vasco tinha escrito uma nova peça e arregimentava os elementos para a encenar. Escalava os rapazes e raparigas com reconhecido pendor artístico por já terem participado em espectáculos anteriores. Era mais uma revista satirizando os acontecimentos da vida local com diálogos e canções.
Personagem principal era o Vasco Almeida, reconhecido como intelectual autodidacta. Com apenas a instrução primária, adquirira, entretanto, grande bagagem cultural, através de leituras e do convívio da penitenciária com expoentes literários e científicos de oposição ao governo. Desde cedo, o Vasco mostrara-se um garoto à frente dos seus colegas. Quando moço aprendeu a dirigir automóveis e foi motorista particular de um médico na vizinha vila de Monção. De ideias políticas avançadas envolveu-se em organizações clandestinas de tendência comunista. O regime político do país titulava-se Estado Novo Corporativo, administrava não permitindo oposição, cerceando a liberdade de expressão e opinião de intelectuais que pregavam o regime democrático. A ideologia comunista que fomentara a guerra civil em Espanha, tinha seus adeptos que sorrateiramente envolviam os descontentes com a situação política de Portugal.
Com as economias que tinha mais a ajuda dos correligionários, comprou, o Vasco, um automóvel Morris, novo, e foi ser motorista de praça, autónomo. Na clandestinidade, os oposicionistas do regime tramavam uma revolução que seria comandada por Paiva Couceiro, oficial do exército, monarquista, ex-governador de Angola, exilado em Espanha. Foi o Vasco escalado para em seu carro transportar o chefe revolucionário desde a fronteira da Galiza até determinado ponto em Portugal. Na noite aprazada, certificados que a estrada estaria desguarnecida, foi empreendida a marcha “libertadora”. No concelho de Valença, decorridos alguns quilómetros em Portugal, a estrada foi bloqueada por membros da Polícia de Vigilância e Defesa do Estado, fortemente armados que abortaram a marcha dos revoltosos. O Vasco, como os demais, foi recolhido à Penitenciária do Porto. Um flagrante daqueles resumiu-se a processo sumário com vários anos de detenção.
No cárcere, foi vítima de torturas para lhe arrancarem a identidade de outros elementos e planos da organização, coisas que ele desconhecia. Os maus-tratos danificaram-lhe os dentes, afectaram-lhe a vista, passando a andar de óculos, também os pulmões foram atingidos donde resultou uma asma crónica. Emagreceu, envelhecendo prematuramente. Em contra partida, ganhou vastos conhecimentos em todas as áreas da ciência, no convívio com os outros detidos.
Aconteceu um facto inusitado que desanuviou, em parte, aquela vida de reclusão.
Uma das moças do apostolado que ministravam o conforto na prisão apareceu grávida. Era solteira e não tinha namorado. Confessou que fora o Vasco, na prisão, o co-autor daquela infelicidade. A administração do presídio submeteu o condenado a interrogatório sobre o caso. O Vasco justificou-se explicando o óbvio: ele não saíra da prisão, fora a rapariga que o visitara e ele não a forçou a nada. Acontecera naturalmente entre duas pessoas carentes, ela no vigor da sensualidade, e ele sem contacto feminino há muito tempo. Os juízes compreenderam as circunstâncias e o caso ficou por isso mesmo. A rapariga desenvolveu a gestação no seio familiar que lhe deu todo o apoio e até lhe arrumaram um namorado com quem casou mais tarde e assumindo o Vasquinho, nome dado à criança.
Expiado o tempo da condenação voltou o Vasco à liberdade, comprometendo-se a não se insurgir contra o status-quo, porém mais doutrinado em socialismo e comunismo.
A Zinda, esposa do Vasco, após o regresso deste, ao que contavam as más-línguas, provocou um aborto, com consequências funestas e faleceu.
Aquela rapariga que a ele se entregara na prisão, soube do falecimento da esposa e escreveu-lhe: propunha-se a abandonar o marido e o segundo filho, que dizia “vítima de uma contracção sexual”, e juntar-se ao Vasco. Ele não respondeu!
Os filhos mais velhos do Vasco, António e Francisco, já tinham ido procurar a própria vida; as duas raparigas, Maria Teresa e Elza, conseguiram, com o auxílio das senhoras Teixeiras, internar-se no Instituto Postigo do Sol, no Porto, onde se educaram até à maioridade e posteriormente emigraram para o Brasil.
Manuel Igrejas
PARA TODOS OS AMIGOS QUE NOS VISITAM, UM BOM 2020
foto câmara munipal de melgaço
27/12/19
EMIGRANTE RECONSTRÓI ALDEIA NATAL NO GERÊS
NOTÍCIA NA SIC E EXPRESSO
EX-EMIGRANTE RECONTRÓI A ALDEIA NATAL EM CASTRO LABOREIRO
Ficamos a saber que Castro Laboreiro fica no Gerês, Lamas de Mouro deve ficar ao lado de Penela e Melgaço é uma freguesia de Mértola. Tanta ignorância de quem tem por missão informar. Tenham vergonha, sejam profissionais, senhores "jornalistas".
Ilídio Sousa, editor do blog Melgaço, do monte à ribeira