CHUVADA EM AGOSTO
Caminhos e Fronteira na Serra da Peneda
Alguns exemplos nos séculos XV e XVI e na actualidade
Suzanne Daveau
Muito forte era na serra, nos anos 70, a marca da emigração para França, sobretudo em Castro Laboreiro. Construíam-se, durante o Verão, vivendas vistosas nas brandas que dominam a vila. Os emigrantes invadiam a montanha durante as suas vacanças, que aproveitavam para celebrar festas e alegres casamentos. No dia 30 de Agosto de 1976, pude ver autocarros carregadíssimos, que se preparavam para deixar a praça central de Melgaço em direcção a diversos pontos de França. A Peneda parecia-se então mais com um anexo afastado de França do que com a ponta avançada de Portugal para norte.
Durante a noite de 28/29 de Agosto de 1976 caiu em Castro Laboreiro uma forte chuvada, que inundou o andar térreo da nova pensão, obra de emigrantes, vistosamente instalada a pouca distância da antiga vila, num lugar baixo para onde convergiam vários caminhos murados. Os donos da pensão, desenraizados da realidade serrana, ignoravam que o clima da Peneda já não é mediterrâneo e incluiu abundantes chuvadas ocasionais no Verão. Ignoravam também as consequências práticas dos pormenores topográficos do lugar. Depois de um dia de muito trabalho, onde tinham servido um banquete de casamento, acordaram sobressaltados em plena noite, no momento em que a água alagava as suas camas e tinha já afogado o motor dos carros de numerosos hóspedes.
A peregrinação ao Santuário de Nossa Senhora da Peneda, em Setembro, é outro acontecimento que mostra quanto a vida da serra mantém relações estreitas com as regiões periféricas. Teria o maior interesse o estudo aprofundado da sua origem e evolução, bem como do seu raio de acção, em Portugal e na Galiza. Provavelmente as ligações detectadas no século XV com os habitantes das bacias galegas a leste da serra, ter-se-ão prolongado até hoje, através desta importante romaria, que se fazia outrora a pé, mas sobretudo de carro, nos anos mais recentes.
Revista da Faculdade de Letras – Geografia
I série, vol. XIX, Porto, 2003, pp. 81-96
Retirado de: http://ler.letras.up.pt/uploads/ficheiros/308.pdf