CRÓNICA ESQUECIDA D'EL REI D. JOÃO II
(…)
Chegou a Lisboa uma delegação de judeus espanhóis, dirigidos pelo velho e respeitado D. Isaac Aboab, o último Gaon de Castela e que já fora mestre de Abravanel.
Vinha acompanhado de trinta rabinos dos mais ilustres de Castela, o bom velho, e solicitou ao Rei a sua clemência e a entrada dos judeus de Castela em Portugal. Os trinta rabinos ficaram alojados no Porto e o Monarca deu as garantias necessárias porque viu na situação um bom negócio. É assim em política. O Rei necessitava, para a expansão e as viagens marítimas, de dinheiro, artífices e gente que trabalhasse a parco soldo em troca da vida. O Porto, os trinta rabinos, pagariam à municipalidade cinquenta maravedis anuais e calcetariam à sua custa a Rua de S. Miguel, os outros cerca de sessenta mil cruzados de ouro e outros ainda oito cruzados de ouro (isentos os recém-nascidos). Entrariam os de Placença por Olivença, Arronches, Castelo-Rodrigo, Bragança, Melgaço… O Rei reuniu-se na sua mui amada Sintra com o Conselho onde alguns dos seus membros recusaram a entrada dos judeus e, como seria de esperar, as próprias comunidades portuguesas de judeus também se opuseram a que os irmãos de Castela entrassem a fronteira porque era impossível ao país aguentar tal intromissão sem problemas. Onde se acoitaria tanta gente? A imigração em massa traria grandes desgraças! Pois bem, respondeu o Rei: seria só por oito meses! Depois partiriam. Far-se-ia uma escolha e navios especialmente contratados seriam cheios dessa malvada gente e eles, os espúrios da terra, levados para os portos que escolhessem…
Crónica Esquecida d’El-Rei D. João II
Seomara da Veiga Ferreira
Editorial Presença
Lisboa, Maio, 1996
P. 241