A FILHA DO CAPITÃO
(…)
“Calma”, pediu Baltazar, sempre concentrado num documento. Passou os olhos pelas letras, fungou, murmurou sons imperceptíveis e, após mais uma eternidade a decifrar o texto, captou finalmente o sentido. “Diz aqui que temos direito a trinta dias de licença.”.
Um murmúrio de satisfação encheu o abrigo, todos se entreolharam e sorriram. Já se imaginavam no Minho, com a família, a ajudar na lavoura, a banharem-se no Cávado, no Este, no Lima, a dançar o vira, a cavar a terra, a apanhar a uva, a encherem os espigueiros, a comer um cozido regado com um verde de Melgaço, mas que grande narça iriam apanhar na primeira noite entre os seus.
“Um mês”, repetiu Vicente, sonhador.
“Ah se eu me apanho no Minho, a cheirar os carvalhos e os teixos do Gerês, ou a respirar aquele ar das brandas, lá no alto da serra, nunca mais me põem os olhos em cima”, sentenciou Baltazar, cerrando as pálpebras com sentida nostalgia. “Que categoria. Escondo-me lá no mosteiro de Pitões e a tropa que se pine.”
A Filha do Capitão
José Rodrigo dos Santos
Edição Gradiva
31ª Edição Junho 2016
- 424, 425