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MELGAÇO, DO MONTE À RIBEIRA

História e narrativas duma terra raiana

MELGAÇO, DO MONTE À RIBEIRA

História e narrativas duma terra raiana

GUERRILHA EM MELGAÇO NO SÉCULO XIX - II

melgaçodomonteàribeira, 26.09.15

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azenha

 

(continuação)

 

Dias antes perseguido outra vez pela tropa, fôra ele encontrado no caminho de São Bento do Cando, em 11 de Julho. Apanhada a guerrilha de surpresa, pode ela, contudo, escapar-se das garras da força pública, mas deixou ficar no sítio vários objectos e um cavalo, que a tropa apreendeu.

Este insucesso foi também imputado ao cirurgião e, para salvar a vida, remiu-o pagando uma segunda indemnização: 99$800 reis.

Mas como a tal luta de morte não acabara ainda, nos primeiros dias de fevereiro do ano seguinte o Comandante da 4ª Divisão Militar, com o conhecimento e aplausos do Governo de Sua Magestade a Rainha, anunciou às autoridades locais que, brevemente, uma força militar sob o comando do Major de Caçadores 4, José de Figueiredo Frazão «vai occupar esse Concelho, o de Monsão e Valladares, com o importante fim de conseguirem o extermínio ou dispersão da Quadrilha de salteadores que tantos males tem causado aos seus infelizes habitantes, e de que é chefe o malvado Cangostas.»

Poucos dias volvidos sobre este aviso, Paderne foi ocupada por trinta baionetas da Ordem, de propósito mandadas por autoridades superiores para efectuarem o extermínio da fera humana.

Por este mesmo tempo, no monte de Montrigo, na própria freguesia de São Paio, casualmente vieram à fala Tomaz Codeço e Manuel de Caldas e dessa conversa saiu o empréstimo de cinco libras de ouro, feito por aquele para este governar a sua vida.

Em março de 1838 «com muita violência e ameaças de vida» foram-lhe ainda exigidos mais sessenta alqueires de milho.

Não contente com este canastro, segundo parece sempre aberto para fornecer de brôa os guerrilheiros, em 26 de agosto recebeu o Tomaz das Quingostas cento e cinco mil reis por um cavalo, que lhe levara o Izidoro, alferes de voluntários e, em 17 de Outubro, uma clavina, entregue pelo Caldas na sua própria casa ao buscador Caetano Manuel Meleiro, da Granja.

Como sempre o Caldas de Real foi o bode expiatório; por aquele cavalo apreendido pelo alferes de voluntários tinha-lhe sido pedida avultada indemnização de 207$800 reis e para tanto lhe não pagar «se valeu de alguns amigos que o compuzeram pella quantia de sento e sinco mil rs e huma clavina de vallor de sinco mil rs.»

Roubado, perseguido, procurado de dia e de noite, o cirurgião Caldas resolveu sair de São Paio e refugiou-se na vila, porque o Tomaz era «Homem destemido, ladrão e matador, que roubaba de dia e de noite e quando se lhe não desse ou fezesse o que elle queria logo entimava a penna de vida e assim o executava» e «depois de indultado se fez mais temível cometendo mortes e vários roubos como foi na romaria da Sr.ª da Peneda em 7 de setembro de 1838, Riba de Mouro, andando em todo o monte temível, muito armado e com a cometiva da sua quadrilha que a todos ameação e todos temiam pellas suas dezordens.»

Mas se tudo isto se articulou no tribunal, nos mesmos autos se escreveu, que entre Tomaz Codeço e o Cirurgião tinha havido toda a familiaridade e bom entendimento e, por vezes, dos dinheiros do Tomaz se valeu o Caldas nas suas aflições e ainda hoje se pode ler num papel esta passagem:

 

«P, que o A, antes de fallecer o filho da Re Tomaz Joaquim Codeço foi por elle demandado e afinal fizerão por intervenção de Pessoas na prezença das quaes já mais o A, podia recear máos tratamentos e ahte nesse tempo o filho da Re andava andava com a guia que lhe passou o Conde das Antas e tanto respeitava a Ley que para haver o que o A, Manuel José de Caldas lhe devia, o chamou à Justiça e o fez citar para as acçõens competentes.»

 

E antes do Tomaz das Quingostas chamar ao juízo conciliatório o cirurgião Caldas, diligências se fizeram para tirar a corda da garganta deste devedor, como ressalta desta carta:

 

   «Quingostas 19 de Abril de 1838

                Il.mo Sñr. Juis

 

Dezejo a sua saude geralmente a tudo o quanto lhe pertence a ?? he ofreço no seu serbiço &

                Il.mo Sñr

 

No dia de onte findou o nosso contrato com o serujião i por isso Rogo a V S.ª o favor de me não pedir mais por semelhante patife; por isso antes quero que V S.ª fique com elle de o tal maroto; para quem entende bai isto. Fico pronto para tudo o quanto lhe prestar

   Sou seu v

                           Thomaz Joaquim Codeço

  1. S. os trinta mil reis que recebi ficão a comta da obrigação que tenho delle.»

 

E esta carta entende-se, ligando-a com a tentativa de conciliação feita na Casa e Quinta da Cerdeira em 9 de Junho de 1838 perante o cidadão Joaquim Thomaz Correia Feijó, juiz da paz e órfãos no círculo das freguesias de São Paio, Vila e anexas, diligência a que não compareceu Manuel José de Caldas.

A morte levou Tomaz das Quingostas sem lhe dar tempo para fechar as contas com os fornecedores da sua casa, nem com os credores e como seu pai, José Codeço, já tinha falecido, herdou-lhe os bens a mãe, a quem todos eles foram pedir a liquidação dos débitos.

Aceite a herança a título de inventário, foi no tribunal que se ajustaram as contas, tendo os jurados reduzido ao justo valor várias das verbas pedidas.

Pequena quantia foi reclamada pelo crédor Dom Pedro Vasques de Puga, da Casa e Quinta da Moreira, na Galiza e apenas 63$940 reis foi a soma exigida por António Luís Pereira, negociante, do lugar dos Moinhos, da freguesia de Paderne, proveniente de vários fornecimentos feitos ao Tomaz das Quingostas, tais como maços de cigarros, caixas de fósforos, queijo, bacalhau, 15 kilos de açúcar, verbas de dinheiro emprestado, como 1$440 e 2$400 reis, um tinteiro e areeiro de louça, um par de luvas de troçal de sêda preta e outro de seda azul, chumbo de caça, uma importância de fogo paga ao fogueteiro de Santa Cristina, 14$000 reis, a maior verba lida nesta conta.

 

(continua)

 

 

GUERRILHA EM MELGAÇO NO SÉCULO XIX - I

melgaçodomonteàribeira, 23.09.15

51 c2 - cast lab.jpgterras castrejas

 

      PORQUE A LENDA DO TOMAZ DAS QUINGOSTAS ESTÁ FEITA…

 

 

«P. que no anno de mil e oitocentos e vinte e seis o A. Francisco José Pereira, e sua molher, ainda viva, Ana Maria d’Araujo, temendo-se das Guerrilhas que naquella Época ameaçavam esta Villa, aonde chegarão a entrar por vezes, derão a guardar ao Reverendo Manoel José Esteves, do logar da Sella, do concelho de Valadares, toda a mobília e trastes preciosos, que possuião.

  1. que tendo o ditto Padre Manoel José Esteves, os dittos trastes e mobília do A. em sua caza Thomaz Joaquim Codeço, filho da R. assuciado com huns facinorosos ladrons e destemidos, de propósito e cazo pençado se forão na noute de 17 para 18 do mez de Fevereiro do anno de 1827 a caza do ditto Padre Manoel José Esteves, e sem que este podesse resistir a tanta força Armada lhe roubou o ditto Thomaz toda a mobília e trastes constantes da Relação junta, que requerem se leia as Testemunhas; e para que o mesmo Thomaz não acabasse de roubar o mais que ali existia pertencente aos AA. teve o mencionado Padre de dar ao mesmo Thomaz em moeda corrente a quantia de 34$080 reis que o A. dezembolçou para endemenizar o Padre.
  2. que além disso em 12 de Maio de 1828 veio o dicto Thomaz a casa do A. e o constrangeo a que lhe deçe da sua Loja as fazendas e dinheiro constante da mesma Relação; tornando-lhe a pedir em 25 de Fevereiro de 1836 cinco côvados de Baeta que o A. teve de Comprar, e lha remeteo pelo mesmo portador que a veio pedir e buscar; emportando tudo na quantia de 280$100 reis preço em que os AA. o estimão, ou por aquillo que se liquidarem respeito a mobília e trastes».

 

Não apurei a causalidade, mas o Tomaz das Quingostas foi preso para as cadeias da Relação do Porto e essa prisão só podia ter sido efectuada depois de 1828.

Saído «das cadeias do Porto em 1832 pela entrada do Senhor D. Pedro naquela cidade» e, na verdade todos os historiadores daquele período da luta fratricida confirmam terem as forças desembarcadas em Pampelido, à sua chegada ao Porto, aberto as prisões e soltado os presos, indultando-os assim, veio o Tomaz para São Paio, sem aguardar para a escápula a caricata aventura de Carlos Napier.

Sua mãe tinha no lugar de Baratas uma casinha onde fôra feito, dizia-se, o património do primo do seu filho, o P.e Manuel António Pereira Codesso, morador no lugar do Cruzeiro, mas comprada pelo seu marido era ainda solteiro.

O Tomaz, ao chegar à terra, fôra-se logo com machadas e verrumas, cravos e martelos à referida casa e, à valentona, lhe cravará as portas, ficando até, alegou o padre, dentro fechadas umas suas sobrinhas.

Com este acto de violência parece ter atemorisado muita gente e especialmente aquele clérigo, pois sempre ele se disse receoso de perder a vida às mãos do parente.

Perde-se-lhe a pista no resto daquele ano, mas não repugna a suposição de ter gasto esses meses na formação de uma guerrilha ou a reorganisar a malta de facinorosos e atrevidos ladrões, acusada como já existente nos tempos anteriores à prisão.

Perto das Baratas vivia o Cirurgião de Real, Manuel José de Caldas, casado e com filhos, a prestar os seus serviços por aquelas redondezas em troca das avenças dos fregueses, quase todas em milho, e por isso havia bom passadio no seu lar.

Ora em Janeiro de 1834 o Tomaz das Quingostas exigiu do cirurgião quarenta e sete alqueires e meio de milho e em Julho do ano seguinte mais cincoenta alqueires e tres quartos.

Pouco dias antes desta última data a Prefeitura do Minho iniciara a caça ao Homem, oficiando aos sub-inspectores de Melgaço e Monção para lhe ser feita guerra de morte, com «a suspeita que sejão um fermento de guerrilha notrindo rellaçõens com os faciosos do reino vizinho» e no princípio do último trimestre deste mesmo ano secundara a caça o Governo Civil de Viana, mas confessando, abertamente, haverem-se «tornado infructíferas todas as medidas adoptadas para este fim, pelo auxílio que os mesmos Povos dão a este chefe, fazendo-se por isso tão cúmplices como os referidos Salteadores…»

Tomaz das Quingostas nem assim transferiu o seu quartel general para outra região, mas os acontecimentos políticos desenrolados no país e, sobretudo no distrito, dele distraíram as atenções dos diversos dirigentes da nação, durante o ano de 1836.

Á vontade, portanto, o Tomaz continuou a campear em Melgaço e em 7 de Maio de 1836 fez ao cirurgião Caldas a nova exigência de setenta e dois alqueires de milho e, como tantos não havia em casa, levou-lhe o rol das avenças e foi cobrar a maior parte do cereal à casa dos próprios fregueses.

O Tomaz das Quingostas foi então perseguido pela tropa e, desconfiando do cirurgião, considerando-o único espia dos seus actos, recebeu em agosto como indemnização: um cavalo, levado das Baratas pelo seu companheiro bem conhecido pela alcunha «O Casal de Sante» e em outubro um touro, tangido desde ali pelo João Ferreiro, de Baratas.

 

(continua)

 

MELGAÇO EM ALEXANDRE HERCULANO

melgaçodomonteàribeira, 19.09.15

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De uma forte garantia a favor da immunidade doméstica é exemplo singular o que estatue a carta municipal de Melgaço, concelho imperfeito da sexta formula. A residência de qualquer vizinho era coutada  em seis mil soldos, isto é, ficava equiparada ao solar dos mais illustres cavalleiros de linhagem e, afora o coutamento, quem nella entrasse à força tinha de dar a rejiriação de quinhentos soldos ao dono da casa. Vê-se, além disso, que Melgaço é uma terra própria para o tráfico e que se pretende desenvolver alli o génio commercial. Os productos da lavoura dos vizinhos ou os que estes comiirarem, as fazendas e roupas em que mercadejarem, o commercio de gado, todos os objectos, em summa, sobre que fizerem entre si transacções, quer em feira quer fora della, serão absolutamente livres de impostos. A portagem a que ficam sujeitos os mercadores estranhos é moderada; mas se trouxerem pannos ou outros tecidos (traparia) são obrigados a vender por atacado, deixando aos da terra a venda a retalho, e só nos dias de feira lhes é lícito a venderem tanto de um como de outro modo.

 

 

Retirado de:

Historia de Portugal desde o começo da monarchia até ao fim do reinado de D. Afonso III

 

Alexandre Herculano

 

http://www.archive.org/details/historiadeportugal

 

RIOS DE MELGAÇO

melgaçodomonteàribeira, 16.09.15

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O PARQUE NACIONAL DA PENEDA – GERÊS TEM UM “NOVO” E EXCELENTE ATRACTIVO

 

Melgaço juntou-se aos vizinhos galegos para criar a primeira reserva fluvial da Europa nos Rios Trancoso e Laboreiro.

 

Abel Coentrão

03/11/2014

Jornal Público

 

Já se sabia que o Parque Nacional da Peneda-Gerês (PNPG) tem um certo carisma, que lhe advém de um certo magnetismo que nos atrai para as suas paisagens de montanha. Mas Carisma é também o acrónimo, em castelhano, para Qualidade Ambiental das Reservas Naturais Fluviais Internacionais do Meio Aquático, o projecto galaico-português que transformou os rios Trancoso e o Laboreiro na primeira reserva fluvial europeia.

 

O Trancoso e o Laboreiro são dois rios pequenos, de montanha: o primeiro está no Parque do Xurés e é um afluente do Rio Minho, de 13,6 quilómetros de extensão; o segundo está no PNPG, tem 8,4 quilómetros e é um afluente do Lima, ao qual se junta na Albufeira do Lindoso. Para além de servirem, em grande parte dos seus troços, como (antiga e porosa) fronteira entre Portugal e Espanha, mantêm muita da biodiversidade que outros cursos de água, em zonas mais povoadas, já perderam. O que explica a vontade transnacional de investir cerca de dois milhões de euros, grande parte dos quais de fundos comunitários, em acções que valorizassem ainda mais essa qualidade ambiental e permitissem uma maior fruição deste património natural.

 

Em termos práticos, o projecto terminou em Setembro, mas não se ouviram “foguetes”, apenas uma pequena notícia da Lusa em Portugal e uma longa e entusiástica explicação na página do Ministério do Ambiente Espanhol, sobre o resultado de um trabalho de dois anos, levado a cabo pela Confederação Hidrográfica Minho-Sil, da Galiza, que convidou a antiga Administração Regional Hidrográfica do Norte (ARH), e os municípios de Entrimo, Padrenda e Melgaço para este projecto no qual o município português investiu 250 mil euros. Dinheiro que acrescenta outra fonte de interesse a esta zona mais setentrional do PNPG.

 

O parque já está classificado como Reserva da Biosfera da Unesco. Abriga espécies de fauna e de flora que o resto do país viu desaparecer e o Laboreiro, que atravessa a conhecida vila de Castro Laboreiro e as suas brandas, as antigas aldeias de verão dos pastores, está integrado no território desta que é a única área protegida de carácter nacional. E esta localização ajuda a perceber, segundo o chefe de divisão de Obras e Serviços Urbanos de Melgaço, Humberto Gonçalves, as reticências da gestão do PNPG a algumas componentes do projecto, como a abertura de caminhos de acesso ao rio, que acabaram por não se concretizar.

 

O plano de Ordenamento do PNPG impede a abertura de novos caminhos, permitindo apenas a limpeza e requalificação de trilhos existentes, e desde que estes não ponham em causa valores naturais protegidos. Ou seja, se a componente de intervenção na qualidade da água, pela eliminação de alguns pequenos focos de poluição, foi atingida, a componente ligada à fruição destes espaços só parcialmente foi concretizada. Teve de ser abandonada a intenção de criar acessibilidades a alguns pontos mais belos do Laboreiro, explicou o responsável pelo projecto na Câmara de Melgaço. Ainda assim, foi possível construir alguns acessos, noutros pontos, tal como aconteceu no Trancoso.

 

Apesar destes percalços, o projecto foi considerado um sucesso. Em Setembro, numa sessão de apresentação das conclusões do mesmo, na Galiza, o presidente da Confederação Hidrográfica do Minho-Sil, Francisco Marín, destacou que, através do Carisma, “pela primeira vez na Europa administrações de diferentes países puseram-se de acordo para proteger e valorizar rios partilhados”. E, acrescentou, esta iniciativa promove o desenvolvimento deste território periférico e das suas populações, outrora unidas pelas cumplicidades do contrabando.

 

Melgaço pretende agora dar continuidade a este projecto, promovendo-o, quer do ponto de vista ambiental, quer em termos turísticos. O concelho é uma das entradas para o Parque Nacional da Peneda-Gerês – através da porta de Lamas de Mouro – e compensa a distância a que está do resto do país com uma diversidade de paisagens, quase todas elas em Rede Natura 2000. Seja no vale do Minho, com as margens pontuadas pelos vinhedos de alvarinho, quer na montanha, entre as casas graníticas de Castro Laboreiro ou da branda da Aveleira, cujas casas de pastores estão a ser adaptadas ao turismo em espaço rural, está bem presente o papel do homem na definição deste território. Uma presença que, ainda assim, conseguiu não estragar dois pequenos rios internacionais.

 

MELGAÇO, O SANTO PRETO

melgaçodomonteàribeira, 09.09.15

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A CAPELA DE S. BENEDITO

 

ORIGENS

 

 

No bairro da Calçada, subúrbios da vila, em frente da encruzilhada formada pelos caminhos para Fiães e para Eiró, de Rouças, e ainda pela velha estrada romana para Puente Barjas, precisamente no sítio onde esta, mudando de direcção, parece dizer adeus às vetustas muralhas da vila, levantou-se em recuados tempos uma boa moradia de casas, quase circundada por campos de rega e lima. Nela morou Leão José Gomes de Abreu, recebedor das sisas e director do correio em Melgaço, mulher e seus dois filhos, o frei Bernardo de Nossa Senhora da Orada e Tomás José Gomes de Abreu, por constitucional preso nas cadeias de Lamego, e nas mesmas falecido em pleno governo de D. Miguel, corria Dezembro de 1832.

Casando este com D. Constança Teresa de Araújo Lima houve muita prole e nesta se contou a senhora D. Maria Benedita Júlia Gomes de Abreu, nascida em 3 de Março de 1800, falecida em 12 de Setembro de 1876, jazendo os seus restos mortais no Convento da Pedreira, a princípio simples hospício dos frades capuchos da província da Conceição. Pois foi esta senhora a grande devota do Santo Preto, seu padroeiro na corte celestial.

Por muito tempo, em tosco oratório de madeira seguro por ganchos de ferro entre as varandas da casa, abertas na fachada do norte, D. Maria Benedita o teve exposto à veneração dos fiéis por ali deambuladores.

Às noites a luzinha de azeite ardia sempre na sua frente até ser apagada pelo vento ou o óleo se extinguir na lâmpada, pois no seu coração nunca esta excelente senhora deixou arrefecer a crença no bom e grande patrocínio deste santo brasileiro. Depois, quando morreu ela, São Benedito passou a ter outro estremado devoto na terra.

 

FUNDAÇÃO

 

Das mãos de D. Maria Benedita passou a imagem de S. Benedito para as de seu herdeiro e sobrinho José Cândido Gomes de Abreu, cujo nome esmalta a Câmara e o Tribunal, o comércio e a lavoura, e brilha como astro de primeira grandeza na história de Bem Fazer. Foi ele o fundador do Hospital da Santa Casa da Misericórdia e quem mais trabalhou por fazer brilhar a igreja desta Confraria.

Pois José Cândido Gomes de Abreu, entre os bens deixados por sua tia recebeu aquele pequeno oratório de São Benedito e fiel à memória da morta, interpretando-lhe o seu maior desejo, quando chegou a oportunidade, mesmo ao lado da casa, no recanto norte, a nascente de um dos seus campos, a rasar com a nova estrada real, fez erguer para S. Benedito uma pequenina mas elegante capela, de pedra lavrada, com altar em forma de nicho gracioso.

A porta de ferro, gradeada, sustenta uma caixa forrada para a recolha das esmolas dos caminheiros. Talvez para outros lhe seguirem as pisadas, no frontispício da capela fez gravar em placa marmórea: Mandado construir por José Cândido Gomes de Abreu – 1882.

O tempo consumiu as primitivas cores da pintura da imagem e José Cândido mandou-a retocar e reincarnar de novo em 1894.

Por morte do fundador da capela ficou ela pertencendo ao Dr. Alfredo Cândido Pinto Alves, bacharel formado em Direito pela Universidade de Coimbra e hoje residente em Vila do Conde. Alienou-a, porém, pouco depois.

 

23 – 5 – 1951

 

                                      (Publicado em Notícias de Melgaço de 28/11/1956)

 

Obras Completas: Augusto César Esteves

Nas páginas do Notícias de Melgaço

Edição Câmara Municipal de Melgaço

Volume I Tomo 2

2002

pp. 538, 539

 

O RECUPERADOR DE TEMPO

melgaçodomonteàribeira, 05.09.15

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O autor, numa escrita verosímil de sobriedade e transparência, e com breves episódios, ocorridos entre o campo e a cidade, conduz o leitor, em crescendo de curiosidade à forma como o homem, enquanto ser existencial, caminha ao alcance do “Recuperador do Tempo”.

Através do protagonista da obra, Osvaldo, que ofuscado por um passado de vivências de leviandade, vive o presente, numa luta constante, revendo o tempo perdido, em seu benefício e do meio que o circunda. Paulatinamente, em contacto com a natureza e com as pessoas que lhe são fiáveis, abandona o mundo de futilidades, outrora por ele adotado, e consegue pôr em prática, com atitudes e comportamentos fidedignos, alcançado o tão desejado “Recuperador”.

Osvaldo “não recupera os tempos de juventude, física e reverente, mas o seu espaço temporal de equilíbrio (…) alguém superior no universo lhe desobstruíra o caminho da vida terrena, tendo apenas de seguir os sinais de corpo e alma. Ladeado de pessoas que lhe queriam bem, construiu um mundo à sua medida, eximo a entraves de uma vida plena.”

Valera-lhe, deveras, o conselho do amigo nórdico: “Não vale a pena perder tempo com coisas que não chegam a ser coisa alguma.”

 

Quito Arantes, nasceu em Luanda a 9 de Julho de 1960 e reside em Portelinha, Castro Laboreiro.

 

MELGAÇO NA LITERATURA GALEGA

melgaçodomonteàribeira, 02.09.15

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         O CAPITÁN GALEGO 

 

A xeografia galega de Álvaro Coristanco é, fundamentalmente, ourensá e raiana, moi limitada espacialmente e restrinxida ao sur de Galicia. Como xa indicamos anteriormente, Sernin sitúa o nacemento, a infancia e a adolescência de Álvaro no pobo ourensán de Sobrado, a duas horas de cabalo da fronteira portuguesa. En torno a Sobrado, terán importancia no relato os pobos de Maceda, Ribadavia, Carballiño, Allariz e por suposto Ourense. Coa excepción de Maceda, que o autor situa a tres kilómetros de Sobrado, o resto das distancias son bastante aproximadas e as descricións cheas de verismo. Así, põe exemplo, a gran importancia de Ribadavia na vida de Álvaro vén dada pola estación de ferrocarril, describindóse no texto con exactitude as liñas de tren galegas e aquelas que unen Galicia coa meseta; as que xa non son tan realistas son as precisións temporais, pois o noso protagonista, un apaixonado das locomotoras, realiza traxectos de ida e volta entre distancias imposibles de cubrir nunha xornada. En tren, en autobus, a cabalo ou a pé móvese Álvaro polo sur de Ourense e o norte de Portugal, citándose no texto os topónimos lusos de Castro Laboreiro e Melgaço, así como tamén o de Coimbra. Aparecen mencionados no texto lugares galegos moi emblemáticos, como por exemplo, o porto de Vigo, ou os matadoiros de Vigo e Redondela.

 

O CAPITÁN GALEGO de André Sernin

Por: María Lopo

 

Retirado de:

UNIÓN LIBRE – CADERNOS DE VIDA E CULTURAS – EDICIÓS DO CASTRO – MEMORIA ANTIFASCISTA DE GALICIA

 

http://www.unionlibre.org/artigos/artigosmemoria.htm#capitan