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MELGAÇO, DO MONTE À RIBEIRA

História e narrativas duma terra raiana

MELGAÇO, DO MONTE À RIBEIRA

História e narrativas duma terra raiana

O NASCIMENTO DAS MURALHAS DE MELGAÇO

melgaçodomonteàribeira, 26.07.14

 

Construção da Alameda

 

 

Em 1245, foi outorgado um acordo entre o Mosteiro de Fiães e o concelho (= câmara) de Melgaço, estabelecendo o quinhão do mosteiro na manutenção das muralhas. Deste documento depreende-se que a fortificação era ainda de alvenaria e se pensava em muralha de cantaria silhar por ser mais resistente aos ataques inimigos.

 

Diz o documento em linguagem dos nossos dias:

 

 

PACTO ENTRE O ABADE E O CONCELHO DE MELGAÇO

 

 

   Precioso tesouro para memória é a escritura que a questas tira motivos nascidos das más intenções dos homens, pondo-lhe obstáculos. Por esta razão, saibam os presentes e os vindouros que nós o Abade João e o convento de Fiães de uma parte, e os juízes João Pires de Caveiras e Miguel Fernandes e concelho de Melgaço da outra, fazemos entre nós acto e acordo estável, avaliado em cem soldos, assinado para nós e nossos vindouros, válido perpetuamente, a saber: que o Abade e Convento, com seus homens que de presente e de futuro estiverem nas propriedades no mesmo mosteiro no couto da nossa vila, façam dezoito braças de muro naquela parte da nossa vila onde agora está a sua adega, segundo a natureza e forma que nós fazemos e viermos a fazer em todo o circuito da mesma vila. E se cair o muro que fizerem, sempre o mosteiro tenha de o reparar à sua custa convém saber: se por acaso os moradores da mesma vila, à sua própria custa, fizerem o muro de pedras quadradas em todo circuito e torres do mesmo, igualmente os mesmos devem fazer no mesmo troço a eles demarcado, apenas com uma torre que o já dito Abade promete começar imediatamente. E por este muro e continência que nos fazem os já ditos Abade e Convento, nós perdoamos e dispensamos tanto pessoas como bens dos homens que morarem nas suas herdades no couto da referida vila que não venham ao serviço da sobredita vila a não ser por sua vontade. Se, porém, algum vizinho da referida vila ou outro homem tiver alguma herdade que deva satisfazer foro à mesma vila, da mesma satisfaça o dito foro e não da herdade do mosteiro sobredito se nela morar. Os homens que morarem no couto da mesma vila em herdades do referido mosteiro pagarão direitos e multas como os outros que morarem nas herdades dos bons vizinhos no mesmo couto. Da mesma forma o serviço de petições e comedorias. A parte que ousar proceder contra este pacto e concessão, se avisada não corrigir dentro de nove dias, o que cometer quantas vezes fizer outras tantas seja obrigado perante a outra parte ou quem suas vezes fizer, à pena atrás imposta, continuando o pacto em sua validade. E para que tudo isto, não caia em dúvida mandamos apor em testemunho o selo do Abade e Concelho. Feito o pacto na vila de Melgaço. Era M.CC.LXXX.III. Mês de Fevereiro. Reinante o rei D. Sancho II. Tenente de Valadares Martinho Gil. Na Sé de Tui o bispo L(ucas).

   Os que foram presentes e testemunhas: monges de Fiães: abade João, prior Gonçalo Pais, Martinho Moniz, Pedro Martins, Pedro Garcia, Pedro Pires, Fernando Pires, João Fernandes; clérigos: João Mógo, Vicente Mourão, Rodrigo Mendes; leigos de Melgaço: Lourenço Rodrigues, João Hospedeiro, Fernando Dias, Rodrigo Pires, Rodrigo Mendes de Corugeiras, Domingos Joanes,Rodrigo Joanes, Lourenço Martins, Pedro de Bria. Escrivão Munho Soares, monge de Ursaria.

 

 

Obra Histórica

Padre Manuel António Bernardo Pintor

Edição do Rotary Club de Monção

2005

pp. 126-127

 

50 ANOS

melgaçodomonteàribeira, 19.07.14

 

 

    Este singelo livro, dedicado à história da minha paróquia e da minha vida, foi elaborado para comemorar as minhas « Bodas de Ouro » sacerdotais. Cinquenta anos passados, desde o dia 8 de Julho de 1945, data da minha ordenação sacerdotal, ao serviço de Deus e da Igreja!

    Faço este trabalho com enorme prazer e, acima de tudo, ele é um acto de acção de graças ao Senhor por me ter conservado a vida e a saúde para o poder servir e louvar.

    Não posso deixar de expressar aqui o meu apreço e a minha amizade aos meus bondosos paroquianos e à Comissão Organizadora desta manifestação pública de estima pelo seu velho Pároco, num momento tão festivo e tão importante na sua vida sacerdotal: as suas « Bodas de Ouro ».

    Constitui esta manifestação também uma verdadeira homenagem ao Sacerdócio de Cristo e, ao mesmo tempo, a uma das terras mais belas deste país e às suas gentes.

    Que Deus a todos abençoe e encha de alegria são, por último, os meus sinceros desejos.

    Que o busto deste velho pároco agora colocado num recanto da Residência Paroquial a olhar para a Igreja Matriz de Castro Laboreiro perpetue, pelos séculos fora, a grandeza da fé dos seus filhos e o amor à terra que os viu nascer.

 

 

50 anos – ao serviço da Igreja e de Castro Laboreiro

 

Padre Aníbal Rodrigues

 

1995

 

CASTELO DE CASTRO LABOREIRO

melgaçodomonteàribeira, 12.07.14

 

Porta do Sapo – Desenho do livro Melgaço Estância Termal

 

CASTELO DE CASTRO LABOREIRO

 

HISTÓRIA

 

Antecedentes

A região foi ocupada desde a pré-história, conforme o demonstram os monumentos megalíticos abundantes no planalto a nordeste de Castro Laboreiro.

Embora não haja informações históricas abundantes, a ocupação deste sítio parece ligar-se ao traçado das diversas estradas romanas que aqui possuíam pontes para a travessia dos rios da região (ribeiro do Barreiro, o rio Laboreiro, o rio Cainheiras, o rio do Porto Seco e outros). Pinho Leal, afirma ser mais certo que o castelo seja atribuível aos romanos. (“Portugal Antigo e Moderno”, 1873)

O castelo medieval

À época da Reconquista cristã da Península Ibérica, Afonso III de Leão (848-910) doou o domínio de Laboreiro, na primeira metade do século X, ao conde D. Hermenegildo, avô de São Rosendo, por este ter vencido Witiza, um chefe local que se havia revoltado. Durante o domínio do conde, o castro existente (e que lhe deu o nome) terá sido adaptado a castelo, voltando, posteriormente, ao domínio muçulmano.

Em 1140, D. Afonso Henriques, futuro Afonso I de Portugal (1143-1185) conquistou a povoação de Laboreiro aos Leoneses, fazendo reparar a sua defesa (1145), (Guerra, 1926:672) que passava a integrar a linha fronteiriça dos domínios de Portugal. Embora se desconheçam os detalhes dessa defesa, ela estaria concluída, conforme inscrição epigráfica, sob o reinado de Sancho I de Portugal (1185-1211). No início do reinado de Afonso II de Portugal (1211-1223) foi arrasado quando da invasão por tropas do reino de Leão (1212).

A povoação foi elevada a vila por carta de foral outorgada por Afonso III de Portugal (1248-1279) passada em Lisboa a 15 de Janeiro de 1271. Um dos seus privilégios, concedido por vários reis e séculos mais tarde confirmado por João V de Portugal (1706-1750), era o de não se recrutarem aqui soldados. Vila e sede de Concelho entre 1271 e 1855, Laboreiro foi pertença do condado de Barcelos até 1834, bem como comenda da Ordem de Cristo desde 1319. Sob o reinado de Dinis I de Portugal (1279-1325), por volta de 1290 o castelo foi reconstruído, quando adquiriu a actual feição. Por esta época, a alcaidaria de Laboreiro e a de Melgaço encontravam-se unidas, a cargo da família Gomes de Abreu, de Merufe. Posteriormente, Fernando I de Portugal (1367-1383) doou esta alcaidaria a Estêvão Anes Marinho (1375), que pouco tempo a conservou. (Guerra, 1926:672)

No século XIV, após a conquista de Melgaço, João I de Portugal (1385-1433) pôs-lhe presídio, e utilizou Laboreiro como base para deter as incursões das forças castelhanas oriundas da Galiza. (Op. cit., p. 672)

Em 1441 o alcaide-mor de Melgaço e Laboreiro, Martim de Castro sob queixa de agravar os moradores daqueles lugares foi chamado à Corte, e não mais voltou a exercer esses cargos. (Op. cit., p. 672)

No reinado de Manuel I de Portugal (1495-1521), o castelo encontra-se figurado por Duarte de Armas, no seu “Livro das Fortalezas” (c. 1509), podendo-se observar as muralhas reforçadas por cinco torres de planta quadrangular. Ao centro, a torre de menagem, também de planta quadrangular, precedida por outra construção, com a cisterna a norte. Isolada, em plano inferior, a vila. Este soberano outorgou-lhe o Foral Novo, passado em Lisboa a 20 de Novembro de 1513, passando a denominar-se Castro Laboreiro.

Da Guerra da Restauração aos nossos dias

Durante a Guerra da Restauração da independência portuguesa (1640-1668), o castelo recebeu guarnição escolhida (1643), dele partindo as forças portuguesas que dois anos depois (1645) saíram a talar os campos espanhóis, saqueando as povoações vizinhas. Em Maio de 1666 tropas espanholas sob o comando do Mestre de Campo General D. Baltasar de Rojas y Pantoja, conquistaram o castelo de surpresa, após quatro horas de batalha. Tendo deixado como Governador da praça D. Pedro Esteves Ricarte, este rendeu-se sem resistência a D. Francisco de Sousa, 5º conde do Prado, sendo acusado de se ter vendido aos interesses portugueses. (Op. cit., p. 673)

Findo o conflito, ao contrário do parecer do engenheiro militar Michel de L’Ècole, em 1671 Afonso VI de Portugal (1656-1683) decidiu conservar os castelos de Lapela e de Castro Laboreiro.

Com o fim da Guerra de Sucessão espanhola (1702-1713), com a paz de 1715 o castelo foi desguarnecido. (Op. cit., p. 673)

Nas “Memórias Paroquiais” (1758) encontra-se brevemente descrito: (Castro Laboreiro) Somente tem um castelo antiquíssimo e se acham as casas que dentro em si tem, adonde habitavam os soldados e o governador do mesmo, todas arruinadas e sem portas e também se acha arruinada parte da muralha do dito castelo”.

Ainda nesse século, entre 1766 e 1778, foi utilizado por José António Freire de Andrade, 2º conde de Bobadela, Governador das Armas da Província do Minho, para recolher homens e mulheres que se recusavam a apresentar os seus filhos recenseados para o serviço militar. Passaram por essa detenção cerca de 400 pessoas no período. Freire de Andrade encarregou do governo castrense a Manuel de Araújo Machado, o segundo do nome. (Guerra:1926:673)

Os últimos governadores do castelo pertenciam à casa da Amiosa, em Valadares, no concelho de Monção.

- Manuel de Araújo Machado, o Velho, enviuvou e professou no Convento Beneditino de Cela Nova, na Galiza, ainda no reinado de D. João V;

- Manuel de Araújo Machado, o Novo, sobrinho e genro do anterior, obteve despacho para governar Castro Laboreiro em 1746, com a patente de Sargento-mor de Infantaria, abandonando o cargo de Mestre Sala na Corte, gozando do novo cargo até falecer em 1779, aos 79 anos de idade. (Op. cit., p. 673)

No contexto da Guerra Peninsular, foi guarnecido e artilhado com quatro peças (1801). (Op. cit., p. 673) Com a paz, voltou a ser desguarnecido, iniciando-se o seu processo de abandono e ruína.

Encontra-se classificado como Monumento Nacional pelo Decreto nº 33.587, publicado no Diário do Governo, I Série, nº 63, de 27 de Março de 1944.

Na década de 1970 foram promovidos trabalhos de prospecção arqueológica, que revelaram testemunhos de ocupação do período da Alta Idade Média.

Entre 1979 e 1981 tiveram lugar trabalhos de limpeza e consolidação do monumento.

Em 2005 a Câmara Municipal de Melgaço procedeu a obras de valorização do acesso ao castelo.

Actualmente subsistem alguns panos de muralha aparelhados e um portal de arco de volta perfeita, a chamada Porta do Sapo.

 

 

Ler mais:

              http://fortalezas.org

  

ZARAGATA NA FRONTEIRA

melgaçodomonteàribeira, 05.07.14

 

Portocarreiro

  

UMA FESTA COM FINAL INFELIZ

 

   Como nos anos anteriores, a 11/8/1935, domingo, temperatura acima dos 30º, realizou-se a festa da Senhora da Vista no lugar de Portocarreiro, freguesia de Fiães, concelho de Melgaço. A capela estava muito bem arranjada, os mordomos capricharam, embora tivessem de pôr algum dinheiro do seu próprio bolso. O orador sagrado foi o jovem padre fenalense, António Luís Vaz, nessa altura prefeito e professor no Seminário de Braga. A música esteve a cargo da Banda dos Bombeiros Voluntários de Melgaço, cujo regente, Manuel Rodrigues de Morais, natural de Paderne, vinha ganhando fama merecida, e da Filarmónica de Paços. Tudo estava a correr lindamente, mas chegando a tardinha houve zaragata. O vinho que os vendeiros puseram ao dispor dos festeiros tinha-se esgotado. O calor e o álcool actuaram naqueles cérebros incultos e brigões. O cronista ouviu os relatos e depois contou para a posteridade no Notícias de Melgaço nº 282, de 18/8/1935: «À noite, quando o povo debandava, deu-se um incidente triste. Começara o barulho entre portugueses e espanhóis. Alguém nos disse que o começo foi devido a palavras menos respeitosas de uns para com os outros. Trocadas poucas palavras, já o sangue jorrava. Um guarda-fiscal, o senhor Manuel Lourenço, que se dirigia para a ponte, viu os feridos já da parte de Portugal e agarrou-os para os defender da fúria dos espanhóis. Quando praticava este acto, uma invasão de galegos, superior a cinquenta pessoas, avançava contra os feridos, e já pisavam cinco metros de território português. O guarda Lourenço, vendo isto, clamou – “a Espanha ainda não declarou guerra a Portugal; por isso, galegos para Espanha e portugueses para Portugal.” Os espanhóis não obedeceram, obrigando o guarda a disparar três tiros. Foi o bastante para os galegos se porem em fuga para Espanha. O guarda Manuel Lourenço colocou-se então no meio da ponte e não consentiu que houvesse comunicação de portugueses com galegos. Os outros guardas-fiscais, que andavam em serviço, ouvindo os tiros acorreram ao local para ajudar o colega a restabelecer a ordem. Os ânimos estavam exaltadíssimos. Encontravam-se naquele local para cima de duzentas pessoas, segundo nos informaram. A acção dos guardas foi enérgica, e rápida, e a ordem foi restabelecida. É justo salientar e louvar neste momento a acção da guarda-fiscal do posto de Portocarreiro, de um modo especial a Manuel Lourenço, para quem, em nome da Junta de Freguesia, pedimos um voto de louvor da parte dos seus superiores. Dizemos que deve ser louvada a guarda porque evitaram o derramamento de muito sangue e mortes. Não só repeliram os galegos, mas ainda abateram o ânimo de alguns portugueses que se encontravam exaltados, facto este que os carabineiros não imitaram, segundo nos contam. Aquando da entrada das cinquenta pessoas galegas em território português, dizem que um carabineiro, de pistola empunhada, auxiliava, e caminhava à frente dos seus compatriotas. Oxalá reine sempre a paz entre portugueses e galegos, para bem e tranquilidade dos povos raianos.»

   Chamo a atenção dos leitores para o facto de não haver nessa altura GNR em Melgaço.

   Infelizmente, no ano seguinte, 1936, dar-se-ia uma guerra civil em Espanha, a qual duraria três longos anos, morrendo e ficando ferida imensa gente.

 

DICIONÁRIO ENCICLOPÉDICO DE MELGAÇO, III VOLUME

(em preparação)

 

                                                                  Joaquim A. Rocha