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MELGAÇO, DO MONTE À RIBEIRA

História e narrativas duma terra raiana

MELGAÇO, DO MONTE À RIBEIRA

História e narrativas duma terra raiana

NA TERRA DE INÊS NEGRA

melgaçodomonteàribeira, 13.07.13

 

 

« Na Terra de Inês Negra » é título que demarca, per si, o âmbito geográfico dos assuntos que são tratados. Queremos, no entanto, assinalar, também, a limitação no tempo: abarca factos do último século.

Melgaço, desde a época medieval até ao século XIX, tem bons trabalhos, saídos das penas de Manuel Bernardo Pintor, Doutor José Marques e Dr. Augusto César Esteves (1).

Entendemos, por isso, que deveríamos debruçar-nos sobre o último século.

Não se estranhe que no primeiro capítulo – « O que o rio Minho não separou » – se faça a ligação da Galiza com o Alto Minho, em cuja zona se situa Melgaço. Faço-o como elemento indispensável ao conhecimento da nossa terra após dezenas de anos em que a emigração das duas margens do rio Minho pode vir a alterar hábitos, costumes, tradições e afinidades que eram riqueza desta zona luso-galaica, e que importa registar num momento em que as « novidades » trazidas pela Comunidade Europeia nos eliminam as fronteiras permitindo-nos um convívio mais íntimo e frequente.

Afora esta inserção, todos os demais capítulos do « Na Terra de Inês Negra » abordam realidades locais do último século.

Desejamos oferecer à Terra-Mãe o nosso preito de gratidão e de saudade, quando a neblina desce do alto da serra a envolver-nos para o « adeus » da despedida…

Nascido em Fiães entre o rio Trancoso e o mosteiro secular cisterciense, no lugar da Adedela, ali cresci em ambiente maravilhoso de uma maravilhosa família, onde ao calor da lareira bebi, com o leite materno, as lições que me guiam.

Lugar incrustado na serra, ali funcionava a escola primária frequentada por jovens de várias freguesias, donde saíram alunos que honraram a cultura e a educação recebidas.

Como lembro, saudoso, a casa que os pobres, em quantidade, demandavam nos anos vinte e trinta e ali se « hospedavam » e a « hospedagem » incluía refeição e dormida, que a família lhes proporcionava!

Recordo as visitas semanais dos parentes, que, após a missa na capela do Sagrado Coração, passavam pela nossa casa em visita e convívio familiar!

Não olvido os encontros das férias nos quais participavam os numerosos alunos que frequentavam o liceu e o seminário!

De frente, para a Galiza, serrana e áspera, contemplo a ascensão do sol a anunciar-nos a chegada da noite, que, nas tardes de Inverno, nos empurrava para a « sala de estar » que era a lareira. E vivo, ainda, a visita Pascal, o Compasso, que, depois de nos abençoar em nossas casas, reunia a todos os habitantes do lugar na eira comum para, ali, beijarem a cruz com um beijo celestial e humano que nos congraçava a todos.

Tantas vezes, nas minhas viagens por terras longínquas, o meu coração e a minha alma corriam saudosos à casa paterna… a casa da Adedela, onde aprendi a amar a Deus, a Família, a Pátria, e a respeitar todas as convicções políticas.

É que essa pequena-grande casa recebeu e agasalhou políticos de vários quadrantes.

Sobre João de Almeida lê-se em « A Voz de Melgaço » (2): « Faleceu em Lisboa este notabilíssimo fidalgo que em horas difíceis da política esteve na Adedela, em casa do saudoso padre João Vaz, a estudar planos militares em que haveria de intervir como um dos chefes mais categorizados » (3).

Na vigência do Estado Novo, dois estudantes universitários de Aveiro, fugidos à repressão, agasalharam-se na casa da Adedela, donde os senhores da mesma os acompanharam à vizinha Galiza, confiando-os ao carinho do prestigiado e influente pároco de Monterredondo.

E, na casa da Adedela, esteve em fins de 1937 o advogado António de Araújo para, junto do padre João Vaz, buscar agasalho para Paiva Couceiro, que, vindo do exílio forçado nas Canárias, pretendia entrar em Portugal.

Os senhores da Casa eram católicos, monárquicos e salazaristas. Mas praticaram, sempre, as exigências de amizade, e respeitavam as preferências políticas dos demais.

Foi a pensar em tudo isto, não obstante o local isolado e serrano em que nasci, que decidi escrever este livro só com temas da minha terra natal.

 

Esclareço o leitor que estranhe haver trazido para este livro um capítulo cuja matéria se desenrola na cidade de Braga com o arcebispo de então D. Francisco Maria da Silva.

« Actualização », livro de que sou Autor, aborda o problema dos Seminários em Portugal.

Fui o único sacerdote português que estudou o problema a esse nível. Sou de Melgaço…

Aconteceu que bispos, catedráticos, sacerdotes e a crítica se pronunciaram sobre esse trabalho. E deste conjunto resulta um juízo objectivo sobre o livro que me apraz ressaltar, ao mesmo tempo que da análise de sacerdotes se depreende como se processavam, nessa altura, as relações Padre-Bispo o que é, também, muito importante para o estudo da vida eclesial nessa época.

 

Os derradeiros capítulos do « Na Terra de Inês Negra » referem-se a Castro Laboreiro com trabalhos que me não pertencem e, ainda, a temas da pré-história.

Nos anos quarenta, essa vila castreja pôde sonhar com ser a aldeia mais portuguesa de Portugal. Hoje, até o sonho se desfez. Ruiu com as casas castrejas.

Ora Castro Laboreiro, se tivesse mantido as suas características, seria, hoje, uma zona privilegiada de estudo e de turismo nacional e internacional. Para que os Melgacenses, as novas gerações, possam ter um retrato do que era Castro Laboreiro e do « crime » que ali se cometeu, arquivamos trabalhos de valor, que ajudarão não só a conhecer a nossa terra, mas também a recriar a alma castreja que ressuscite a histórica vila.

Arquivamos, ainda, algumas notas da pré-história. Finalmente, como fecho deste modesto trabalho, inserimos, para conhecimento e orgulho dos melgacenses, a leitura do Brasão do Concelho.

Estes últimos textos são precedidos de um breve mas notabilíssimo capítulo que titulei: « Herói Melgacense ». É uma página formosa e brilhante que perpetua, nos nossos dias, a imortal Inês Negra.

A Melgaço, terra secular e nobre, de nobres gentes e de valentes soldados, ofertamos, ao por do sol da nossa vida, este pedaço do nosso coração.

 

(1)E no ano de 1991: « O VI Centenário da Tomada do Castelo de Melgaço ».

(2)« A Voz de Melgaço » de 15 de Janeiro de 1950.

(3)O estudo era sobre a incursão de Paiva Couceiro.

 

Melgaço, Casa do Cerdedo, 28 de Janeiro de 1993

 

NA TERRA DE INÊS NEGRA

 

Autor: P.e Júlio Vaz

 

1993