O MENSAGEIRO DO CONDE
Convento das Carvalhiças e capela da Senhora da Pastoriza
CAPELA DA SENHORA DA PASTORIZA
FUNDAÇÃO
« ... havendo respeito a estar vago o posto de capitão da Companhia de Infantaria da Ordenança da freguesia de S. Paio, de Remoães e Várzea, da vila de Melgaço, por promoção de Matias de Sousa e Castro, Capitão dela ao posto de sargento mor da mesma ordenança, e a Domingos Gomes de Abreu me representar que indo ao Reino de Galiza por ordem do conde de Atalaia Governador das Armas da Província do Minho a negócio que podia ser útil a meu serviço aonde fez o que se lhe ordenou, de que resultou ser preso e metido nas minas do Castelo de Castro, onde esteve cinco dias, e daí foi remetido ao castelo de Santo António da Corunha donde foi levado preso e manietado e acompanhado de sete soldados a cavalo e outros tantos de pé ao de Cárcere Real, aonde lhe deram tratos e o sentenciaram a que não entrasse mais nos domínios de Espanha, fazendo muitas súplicas, para conseguir liberdade; e que também acompanhara o Governador da dita vila de Melgaço no rebate que nela houvera em 10 de Maio do ano passado de 1704 com sua pessoa e criados; e que fora também reconhecer o inimigo que vinha lançar ponte à barca nova de Valadares, animando o povo para defesa da passagem... »
Esta singela e brilhante apresentação do fundador da Capela de Nossa Senhora da Pastoriza aparece assim feita pela filha de D. João IV, a senhora « Dona Catarina, por graça de Deus Rainha de Inglaterra, Escócia, França e Irlanda, Infante de Portugal, como Regente destes Reinos, no impedimento de meu irmão, o Senhor Dom Pedro, por graça de Deus Rei de Portugal e dos Algarves, Senhor da Guiné, etc. » na carta patente passada em 19 de Agosto de 1705 ao fogoso capitão de ordenanças nascido em Melgaço. Falando-lhe de vitórias e de amarguras, e lembrando-lhe os dias fulgurosos de glória e os sombrios dos tratos de polé, a Regente fez dele um segundo Prometeu, gravando-lhe no cérebro um outro abutre – a lembrança do passado no cárcere da Corunha. A noite, as horas silenciosas da noite, traziam-lhe à mente a obrigação contraída com a Mãe de Deus na Corunha, numa das horas de mais abatimento e de maior temor; o dia esplendoroso mais os cuidados inadiáveis da vida quotidiana faziam-lhe, porém, esquecer o compromisso tomado.
A memória, contudo, nunca o deixou olvidar nem os trabalhos passados nem as angústias sofridas no Reino da Galiza pelo mensageiro do Conde da Atalaia.
Uns e outros tinham penetrado fundo no seu peito e amarfanhado o seu coração; queimavam-lhe ainda o cérebro quando em 1707 dirigiu este requerimento a Dom Rodrigo, Arcebispo Primaz: « Diz o Capitão Domingos Gomes de Abreu, Cavaleiro Professo da Ordem de Cristo, e familiar do Santo Ofício na vila de Melgaço, que no ano de 1703 foi mandado pelo Conde da Atalaia ao reino da Galiza a certo negócio de serviço de sua Majestade que Deus guarde de que resultou prendê-lo o governador de Vigo em sua Casa metendo-o nas minas do Castelo de Castro, onde o teve cinco dias e daí o passaram a Corunha ao Castelo de Santo António e de lá o passaram a Cárcere Real para lhe darem questão de tormento, e vendo-se nestas aflições invocou e chamou para seu amparo a Nossa Senhora da Pastoriza, por ter ouvido dizer os inumeráveis milagres que naquela terra fazia, e tinha feito, prometeu-lhe fazer uma capela na sua terra, se ela permitisse vir ele para ela, e como alcançou da Senhora o que lhe pediu como pecador, quer este fazer-lhe a Capela no Coto da Pedreira desta freguesia por ser lugar pouco onde costumam ir os clamores desta vila não havendo neste lugar mais do que uma cruz e ser o lugar que ele com individuação elegeu no tempo que fez a promessa, que farão cinco meses e cinco dias até que por decreto especial foi degradado para fora dos Estados de Espanha, com a pena de vida, prevendo o cómodo da parte para a dita capela, a quer fazer à sua custa e pôr-lhe os ornatos necessários e nomear-lhe bens livres dízimos a Deus que valham melhor de dois mil cruzados que serão postos por avaliação de louvados pelo que – Pede a V. Ilustríssima, informado desta verdade do sítio, lhe conceda licença para fazer a dita capela, por ter já a pedra disposta e com esta concedida mereça V. Ilustríssima a protecção da dita Senhora em permitir o voto prometido
E.R.M.»
(Publicado no Notícias de Melgaço em 15/1/56)
Obras Completas: Augusto César Esteves
Nas Páginas do Notícias de Melgaço
Edição Câmara Municipal de Melgaço
Volume I Tomo 2
2002
Pág.s 438, 439