MALES QUE VÊM DE LONGE
É alvarinho uma videira das antiquíssimas e tradicionais nas latadas da sub-região vinícola de Monção, constituída por aquele concelho e o de Melgaço, mas para a gente do centro e sul do país é recente a descoberta do bom vinho fabricado com as suas uvas. Eu não sei mas, segundo dizem por aí, o alvarinho é um vinho alcoólico e saboroso e a sua boa fama vai crescendo à medida que os dias passam e o seu comércio se expande nos mercados lá de baixo. Ora se apenas nós cá de cima temos o exclusivo do fabrico deste vinho verde, nós e os de Monção não podemos nem devemos tolerar a sua falsificação com vinhos maduros, quer sejam da Bairrada, quer quejandos, nem o seu comércio nos mercados dos vinhos verdes, e muito bem procedeu, por isso, o Diário do Minho em lançar o seu grito de alerta por já nos nossos próprios mercados aparecer quem apenas forneça dessa vinho importado em garrafões. O meu vinho branco bebe-se todo num jantar de festa; não é pois, o interesse, que possa advir-me da sua venda, quem me está aconselhando a escrever estas linhas de protesto contra um comércio tão ignorante como ganancioso. Guia-me a pena neste momento mais altas aspirações e uma é evitar ao governo da nação mais uma dificuldade a solucionar em breve nos campos de Melgaço, se isto continuasse e a outra apontar o errado caminho trilhado pelo comércio local. Por isso dirijo estas palavras, politicamente à Câmara do meu concelho, para ela lembrar ao sr. governador civil quão fácil é perderem-se eleições sem os votos dos lavradores num concelho de vinicultores como este; corporativamente, ao Grémio da Lavoura a cujas mãos experimentadas de Ascensão Afonso deixo entregue o caso sem a mais preocupações me cansarem o espírito; e comercialmente aos negociantes de pouca compreensão, para ponderarem bem as consequências dos seus actos de comércio, a fim de não se verem, dum momento para o outro, envolvidos num processo, em que pesadas indemnizações se pedem, por concorrerem para o descrédito dum vinho de região demarcada ou não sofrerem uma ofensiva dos viticultores da terra, cuja consequência possível, se não certa, seria a fuga da freguesia e a quebre do crédito comercial.
E se por aqui me deixar ficar agora, sem retocar o quadro com tintas claras ou escuras, não se vá entender, que não aprovo e secundo estas palavras de Diário do Minho: «Entretanto, força é estudar o caso e procurar uma solução.»
E como se trata dum jornal orientado por padres, na companhia do P. António Vieira vou fechar este artigo, lembrando aqui as suas palavras: Dá duas vezes, quem dá depressa. Nada de demoras, pois.
(Publicado em Notícias de Melgaço de 31/5/1959)
Obras Completas: Augusto César Esteves
Nas páginas do Notícias de Melgaço
Edição Câmara Municipal de Melgaço
Volume I Tomo I
2003
Pág. 73, 74