Saltar para: Posts [1], Pesquisa [2]

MELGAÇO, DO MONTE À RIBEIRA

História e narrativas duma terra raiana

MELGAÇO, DO MONTE À RIBEIRA

História e narrativas duma terra raiana

AUGUSTO CÉSAR ESTEVES III

melgaçodomonteàribeira, 08.03.13

 

 

1. A escrita ao serviço da identidade local e nacional

 

Esse testemunho merece toda a nossa atenção e engloba parcelas importantes da tua actividade como melgacense preocupado com a sua terra e o seu país, como cidadão politizado e decidido a uma intervenção pública constante, como jurista e como eterno e incansável aprendiz de historiador e monografista local.

Membro da geração do primeiro decénio de novecentos, interventiva como se infere, por exemplo, da greve académica de 1907, e influenciada, à semelhança de algumas gerações anteriores, pelo romantismo, pelo naturalismo literário, pelo positivismo (Ordem e Progresso), pelo socialismo utópico e pelo republicanismo, Augusto César Esteves não destoou do quadro geral em que podemos inseri-lo. Quer como jurista, quer  como intelectual e cidadão politizado reflectiu as preocupações sócio-políticas do seu tempo e acompanhou as sucessivas tendências e alterações mundiais com espírito simultaneamente crítico e atento. Mas fez isto tudo, saindo o mínimo possível de Melgaço e este traço merece destaque porque em certa medida proporcionou que, a partir sobretudo da década de quarenta, intensificasse a recolha de informação histórica e trabalhasse o caudal crescente de dados a fim de firmar créditos como o único monografista sistemático do seu concelho natal.

A passagem por Braga e sobretudo por Coimbra, num período curto de viragem político-institucional – a instauração da Republica em 1910 - , foi importante para a sua postura ideo-política e para o seu perfil de intelectual progressivamente seduzido e embrenhado nos estudos históricos (desde o período medieval até ao séc. XIX). Militou no Partido Republicano Português/Partido Democrático (1911-1926) liderado por Afonso Costa e após 1919 pelo Eng. António Maria da Silva, embora não tenhamos ainda podido colher na imprensa regional vestígios claros desse seu militantismo partidário, vindo depois a situar-se na barricada dos que opondo-se ao Estado Novo não podiam hostilizá-lo se queriam continuar com o emprego público e a residir onde desejavam. Em contrapartida, é mais fácil compreender e explicar as linhas de força que orientaram o publicista e o historiador amador de Melgaço.

Temos mais de um milhar de páginas escritas em que estas facetas complementares se derramam e evidenciam. Merece, aliás, destaque a dedicatória à sua mulher com que abre o primeiro livro impresso: Esmeralda/ Porque nem tu receias a linda rival, nem eu temo se aniche no teu peito o ciúme provocado por esta amante, para mim tão cara e feiticeira, avalia tu própria os meus novos amores, lendo com atenção estas páginas ligeiras, escritas quase todas a teu lado. /Para isto t’as ofereço e confiadamente, as deponho no teu ragaço, beijando-te a mão. / Teu/ Augusto 1. E logo a seguir, sob o título Conversemos, deixou gravados os propósitos que o levaram a escrever, anos antes, os artigos sobre história local nas páginas do jornal Notícias de Melgaço destinadas aos seus patrícios: Mas como o Autor não aspira à imortalidade apetecida pelo historiador ou pelo purista da língua, pois se contenta com as honras de pequeno cabouqueiro da história local, votado a carrear elementos, para outros, mais tarde, sáfaro e ingrato, inicia-se mesmo assim a publicação de Melgaço e as Invasões Francesas.

Os valores republicanos que perfilhou – um exacerbado nacionalismo e patriotismo de matiz regionalista, um claro apego à liberdade, à democracia e à justiça social e um indelével intransigência moral – emergem claramente da sua prosa de publicista e da pena do publicista saíram a “tinta” e as cores políticas e ideológicas mescladas, sempre, com a defesa intrépida dos interesses locais. Significa isto que o político, o ex-militante republicano e o cidadão zeloso de seus direitos e dos seus conterrâneos perpassa nas páginas históricas tecidas num estilo com concessões frequentes ao subjectivismo literário e ao constante remoque moralista, social e político. Não é, assim, possível separar o publicista do monografista, mas é deste que nos temos de ocupar porque ele se agigantou e deixou obra.

 

 

(continua)

 

ENTRUDO EM MELGAÇO NOS ANOS 30

melgaçodomonteàribeira, 08.03.13

 

Desenho de Manuel Igrejas

 

 

O CARNAVAL EM MELGAÇO

 

 

    Aquele verão estava gostoso e os anos trinta até um pouco mais de sua metade, eram fáceis de viver. Corriam suaves e até com uma certa abastança. Naquelas paragens, quem não encontrasse trabalho no lugar era só dar um pulo a Espanha e fácil arranjaria onde ganhar dinheiro. Por lá havia um surto de progresso, construção civil, estradas e caminhos de ferro. E os melgacenses se baldeavam para a Galiza ou um pouco além e, ao fim de alguns meses, voltavam com dinheiro no bolso que gastavam na terra. Diziam até que eles só vinham à terra para fazer mais um filho. E além de dinheiro traziam novos conhecimentos sobre seus ofícios que, em contacto com artífices de outras paragens, adquiriam. Também traziam novos costumes e hábitos que enriqueciam a cultura local.

    Uma demonstração de abastança fora o carnaval daquele ano. Os bailes tinham sido mais requintados com muita gente se fantasiando e, a novidade, o baile infantil à fantasia. No dia 20 de Janeiro, era o início do Carnaval e quem o anunciava era o Amadeu Rato. Vinha de Corçães, ele e os filhos da Maria Penica, rapazes e raparigas, fantasiados com roupas velhas e caras tapadas com pano de saco, fazendo a maior algazarra. Fingiam uns de contrabandistas com sacos às costas, e os outros, de guardas com espingardas de pau correndo atrás dos primeiros. Era uma cheia de rir. As crianças correndo ao lado deles divertiam-se a valer. A brincadeira terminava na taberna que lhes oferecesse vinho de graça.

    Pois nesse ano, o Entrudo teve baile infantil à fantasia. Parece que a ideia partiu do Jacob, o mais competente e habilidoso trolha da região, um grande artista na sua profissão, que andou muito tempo pela Espanha e viu isso por lá. Todas as famílias que tinham crianças aderiram à ideia e os preparativos aconteceram no maior sigilo. Todos queriam fazer surpresa com suas fantasias. Cochichava-se nos cantos, querendo adivinhar o que os outros estavam fazendo. A terça-feira de Entrudo chegou finalmente.

    Era pleno inverno com o costumado frio, mas aquela tarde parecia primaveril. O sol estava radioso e a brisa corria morninha. Até parecia que o tempo queria participar da folia fantasiado de primavera.

    À uma da tarde começaram a chegar ao terreiro, local da concentração, as famílias com as crianças. Para cada criança fantasiada vinha um montão de adultos, a família toda. A vaidade era dos grandes; os pequenos, alguns, vinham até contrariados, com as roupas espalhafatosas que os incomodavam. Rapazes e raparigas, sozinhos ou formando casais, envergavam as mais variadas fantasias. O espectáculo estava realmente bonito. Chegaram os mais esperados, de quem se comentava maravilhas naqueles cochichos de esquina, o Manelzinho do Augusto do Félix e a sobrinha, a Maria da Conceição, filha do Lucas e da Maria Natércia. Tio e sobrinha só faziam diferença entre si de pouco mais de um ano de idade. A expectativa do povo foi satisfeita. O casalzinho estava primoroso. Ele vestido de Marquês de Pombal e ela de Dama Antiga. As roupas haviam sido confeccionadas pelo Augusto do Félix com a colaboração das mulheres da família. A Mia com um vestido longo, até aos pés, muito rodado e armado com arquinhos por baixo da saia, cheio de folhos e rendas, luvas de renda, sapatos brancos de verniz e volumosa cabeleira loura, cacheada até debaixo dos ombros. O Manel, elegantíssimo, numa roupa preta, calça justa até ao joelho, jaqueta debruada de rendas brancas, também a camisa de renda com folhos na gola e na manga, saindo por baixo da manga da jaqueta, cabeleira loira, cacheada e comprida, meias brancas até aos joelhos e sapatos pretos de verniz com grandes fivelas prateadas e rendinhas à volta.

    As cabeleiras, primor de habilidade e paciência, feitas pelo pai e avô dos personagens e penteadas com grande capricho pelo João do Gabriel, barbeiro com pendores de cabeleireiro e que com cosméticos e ferro quente, conseguiu fazer na estopa aquela maravilha de caracóis caindo em cachos.

    Os promotores da festa logo elegeram aquele casalzinho como o mais bonito, as melhores e mais belas fantasias, com aprovação unânime do povo, e por isso deviam abrir o cortejo. Mas o Jacob pleiteou e conseguiu que os seus filhos, o Manuel e o Zeca, vestidos iguais, fantasiados de gaiteiros galegos com gaitas de foles e tudo, fossem os da frente. O cortejo organizou-se desfilando com os gaiteiros soprando desesperadamente as suas gaitas de que saía um som estridente sem nexo e sem compasso, pois eles não sabiam tocar. Em frente, pela Rua Direita, lá foram mais de cinquenta crianças, emproadas, empertigadas, saracoteando a vaidade dos parentes, umas chochas e macambúzias outras. As pessoas grandes, ladeando o cortejo e fazendo grande algazarra, e uma ou outra mulher, volta e meia, entrando no meio das crianças, para compor algum detalhe que não estava a contento, no seu pirralho, tal como faziam nas procissões. As poucas criaturas que ficaram nas casas aplaudiam à passagem. Gente das aldeias também tinham vindo apreciar a novidade.

    Chegados ao Salão Pelicano subiram à sala de cima onde se ia realizar o baile. Daquela multidão que acompanhara o desfile, nem todos entraram. O recinto não comportava. Os que conseguiram entrar acotovelavam-se uns aos outros. A orquestra do Avelino do Peso já estava no estrado que servia de palanque e atacou uma bonita marchinha muito em voga na época, música essa, cujos acordes ainda agora soam na mente de algumas ex-crianças. O que devia ser uma dança virou uma balbúrdia. A meninada, muito novinha, a maioria, não sabia o que era dançar, agarravam-se umas às outras balançando-se, atropelando-se e caindo, para desespero dos adultos que viam as fantasias amarrotar-se. O Jacob e outros promotores entraram no meio tentando organizar a coisa. Aquela confusão. O baile prolongou-se por uma hora e como não havia maneira de dar jeito, resolveram reorganizar o cortejo e voltar para o terreiro onde as crianças poderiam divertir-se à sua maneira sem ter de obedecer ao compasso da música. E assim foi e a miudagem gostou. O Augusto do Félix e o resto da família estavam aborrecidos com o comportamento do Manelzinho. Ele, que normalmente parecia que tinha o bicho carpinteiro, sempre o mais espevitado, nesse dia estava sorumbático e arredio. Não queria brincar e não dizia o que tinha. Seria que se achava por demais bonito e enfeitado com medo que o desfizessem de algum detalhe da sumptuosa fantasia ? Já no desfile repararam que ele andava mansinho, como quem pisa em ovos, com medo de estragar os sapatos…

    E os grandes da família empurravam o rapazinho para o meio dos outros para pular e brincar. Ele ia e voltava. O tio Emiliano resolveu tirar a limpo o que estava acontecendo.

    — Esse rapaz deve ter alguma coisa nas pernas ou nos pés! Vem cá Manel, senta aqui no banco!

    Verificou as calças, as meias, tirou-lhe os sapatos. Ora vejam! Dentro dos sapatos, nas pontas, uns chumaços de papel, que eram usados enquanto novos para manter firmes as biqueiras e haviam-se esquecido de os tirar. Era aquilo o tormento do rapaz!

    Livre dos empecilhos, ninguém segurou o Manelzinho! Parecia uma sardanisca! Dali a pouco a situação estava invertida: os grandes reclamando do rapazinho. A primeira coisa de que se livrou foi a cabeleira.

    Aquele Entrudo famoso durou até ao anoitecer para as crianças. À noite foi a vez dos adultos.

    Foi mais uma página feliz, um bonito retalho na vida daquelas crianças da Vila de Melgaço.

 

                                                                           

                                                                          Manuel Igrejas

 

Publicado em: A Voz de Melgaço

 

AUGUSTO CÉSAR ESTEVES II

melgaçodomonteàribeira, 08.03.13

 

 

Augusto Esteves logo que começou a abrir os olhos para a vida, o que viu?

Qual Buda viu crianças expostas, viu a miséria de caseiros e jornaleiros, viu gente a morar em casas minúsculas, tugúrios inóspitos e horríveis – enfim, viu uma feira de vergonhas, de situações aberrantes e indignas do ser humano. Ele viu tudo isto, porque como o próprio deixou dito: cresci (…)  ao ar livre. E à medida que foi crescendo afastou-se paulatinamente do modelo: viu, tornou a ver, mas seguiu outros caminhos.

As primeiras letras aprendeu-as com o P.e João Nepomuneceno Vaz, sacerdote e professor do ensino primário, doutrinador exímio, um verdadeiro Santo Agostinho em miniatura. Frequentou também a escola de D. Maria Augusta de Passos Brito, professora oficial da instrução primária, nascida em Monserrate, Viana do Castelo, e casada em Melgaço com o proprietário Manuel José da Costa, de São Paio. Augusto César convenceu-se de que com ela perdera ingloriamente o seu tempo. Conviveu muito com seu pai, que o levava a passar serões na Loja Nova e aí se entreteve com os jovens caixeiros, enquanto os adultos falavam da lavoura, da política, de câmbios, de fortunas e azares em terras longínquas, etc.

De Melgaço a Braga é um passo de anão e para lá seguiu em 1899, tendo-se matriculado na segunda classe do Colégio do Espírito Santo. Da cidade dos Arcebispos partiu para Coimbra, onde se graduou bacharel em Direito no ano de 1912.

Ainda jovem teve uma ideia oportuna e generosa: dotar Melgaço de uma corporação de Bombeiros Voluntários. A seu lado, no dia 15 de Maio de 1926, no salão nobre da Assembleia Recreio Melgacense, estiveram os notáveis da terra: Dr. Américo de Freias Coutinho Maltez, juiz de direito na comarca de Melgaço, Dr. Armando António Barbosa, delegado do Procurador da República, Ernesto Viriato Passos Ferreira da Silva, Hermenegildo José Solheiro, Dr. Joaquim de Barros Durães, Dr. Augusto César Ribeiro Lima, Dr. António Francisco de Sousa Araújo, Dr. António Cândido Esteves, médico, Abel José Nogueira Dantas, professor, José Pires Louro de Oliveira, tenente, António Joaquim Esteves, Germano Alves Carabel, Duarte Augusto Magalhães, Manuel José da Costa, padre António Manuel da Cunha e Raul Solheiro Esteves. Todos aplaudiram a excelente ideia e assim nasceram os Bombeiros Voluntários de Melgaço. O primeiro tesoureiro foi precisamente Augusto César Esteves. A Associação foi inaugurada a 14 de Abril de 1929, servindo de madrinha do baptismo do material de incêndios a menina Iracema Mendes de Araújo. Teve como 1º comandante Herculano Arsénio Gomes Pinheiro; 2º comandante Abílio Domingues; e chefe da Banda de Música Manuel Rodrigues de Morais, que fora até aí regente da Filarmónica Música Nova, e que veio a dar que falar por ter conseguido transformar a Banda de Música numa das melhores do Alto Minho.

Augusto Esteves passou alguns anos na contígua vila e termo de Monção, onde exerceu o ofício de advogado e de notário. Transferiu-se depois para o Tribunal Judicial de sua terra natal assumindo funções de Secretário e veio também a acumular cargo de ajudante do conservador do Registo Predial.

Na sua amada terrinha foi homem activo politicamente durante a I  República (1910-1926): administrou o concelho durante algum tempo, presidiu meteoricamente à Câmara Municipal de Melgaço, foi tesoureiro e provedor da Santa Casa da Misericórdia. Interveio sempre que pôde nos assuntos do concelho, mas com o advento primeiro da Ditadura Nacional (1926-193) e depois do Estado Novo salazarista (1933-1974) a sua voz e a sua acção tiveram de ser refreadas, pois as consequências de palavras “mal” ditas reflectir-se-iam inevitavelmente no seu emprego. Perdido este, teria de deixar Melgaço e isso ele não queria de forma alguma. Amava o torrão natal como poucos e era aí que queria passar a sua vida. Inteligente e hábil, soube sempre dosear a sua intervenção, de maneira a não ferir as susceptibilidade daqueles que tinham força e poder, os quais o poderiam prejudicar seriamente. Por vezes até os gabava, louvando a sua “obra”! Aos outros, embora salazaristas, atirava amíude as suas setas, embebidas em suave veneno, com uma ironia à Eça de Queirós, sabendo de antemão que daí não adviriam represálias, apenas comentários mais ou menos felinos, mas cem por cento inócuos.

Ideologicamente era republicano e democrata, mas não socialista e muito menos afecto ao comunismo, não poupando ataques ao regime soviético. Não idealizava igualdades, contudo detestava ver o povo na miséria. Não era um aristocrata, mas o seu lado burguês impelia-o ao convívio com os “grandes”. Pregava e adoptava uma postura humilde e tolerante, mas quando alguém, por maldade, lhe lembrou que a sua esposa nascera de mãe solteira, embora perfilhada posteriormente pelo pai, irritou-se, ferido no deu orgulho, tomando a afronta como grave questão de honra. Era acima de tudo humano com suas contradições, defeitos e virtudes.

Casou no ano de 1914 com Esmeralda Esteves e enviuvou em Dezembro de 1956. Não se pode afirmar que o seu casamento foi infeliz, pelo contrário. Tudo nos leva a supor que o casal viveu em harmonia e felicidade. Porém, essa felicidade foi ensombrada pela morte prematura da filha, Belarmina Cândida, nascida em 1915 e falecida a 10 de Setembro de 1936, solteira e sem geração. O filho Henrique César, nascido em 1917, fez alguns estudos, poucos, empregou-se no Grémio da Lavoura, e aí permaneceu até à aposentação, com magro salário, mantendo-se completamente à margem dos interesses políticos e culturais do progenitor. Casou, já em madura idade, com D. Clementina Rosa e tal como a sua irmã também não deixou geração.

Não tendo quem lhe continuasse o trabalho e a estirpe, Augusto Esteves foi-se refugiando cada vez mais na sua obra. Aí vingou. Nela investiu todo o seu saber, o seu amor pela terra, os seus tempos livres, tirando partido do fácil acesso aos documentos em posse de famílias melgacenses e, sobretudo desempoeirando todos os velhos papéis jazentos sob o efeito letal da indiferença nas Conservatórias, Câmara Municipal, Tribunal, Confrarias, Paróquias, Misericórdia… Abdicou de prazeres mundanos, de descansos merecidos e embrenhou-se na história de Melgaço, tentando dar aos conterrâneos uma visão de conjunto, enaltecendo os feitos dos antepassados, enquadrando-os no todo nacional, pesquisando em alguns importantes arquivos públicos do país (Braga, Coimbra e Lisboa), tudo à sua custa, sem subsídios, sem ajudas. Hermenegildo José Solheiro, aquando da sua passagem pela cadeira do poder local (1926-1931), quis dar-lhe algum dinheiro da Câmara Municipal para custear as investigações, mas Augusto César Esteves, sabendo que os cofres da edilidade andavam quase vazios, não aceitou tal dádiva.

Não era um profissional da investigação histórica, mas um apaixonado pela história da sua terra e nessa condição conseguiu transpor dificuldades e desânimos deixando um testemunho variado, desigual e meritório, que deve estar acessível, em primeira mão, a todos quantos, se orgulhem, como ele se orgulhou, de serem portugueses de Melgaço.

 

(continua)

 

AUGUSTO CÉSAR ESTEVES I

melgaçodomonteàribeira, 08.03.13

 

 

AUGUSTO CÉSAR ESTEVES – O HOMEM, A VIDA, A OBRA…

 

 

O real serve-nos apenas para construir, melhor

ou pior, um pouco de ideal. Talvez não seja

útil para nada mais.

Anatole FRANCE – Le Jardin d’Epicure

 

 

1 – Um português de Melgaço ou o enorme peso das raízes

 

Escrever sobre uma pessoa é fácil ou difícil conforme as perspectivas, os elementos biográficos que tivermos ao nosso dispor, a distância no tempo, a nuvem que o encobriu depois da sua morte, o manto mitológico que se distendeu sobre a sua figura.

Quanto a Augusto César Esteves poder-se-á afirmar, sem grande margem de erro, que para a maioria dos melgacenses ainda vivos, com menos de cinquenta anos de idade, ele não existiu. Nem uma praça, uma rua, nem sequer um beco ou uma travessa, lembravam até 9 de Agosto de 2003 (data em que se fez finalmente justiça) o seu nome, a sua obra, a sua passagem pelo mundo!

Atribuir culpas a este ou àquele, dizer que foi esquecido de propósito, seja pelos políticos, seja pelos críticos, isso seria fugir à verdade, menosprezar o tempo e os interesses individuais e colectivos que estão na origem de tal fenómeno.

Quando Augusto Esteves morreu em 1964 já o concelho de Melgaço estava a sofrer uma transformação profunda, uma metamorfose sem paralelo na sua história. E porquê? Porque em 1961 começou a guerra colonial em várias frentes e os jovens começaram a debandar, tal como sucedeu em todo o país de norte a sul. Os mais novos não estavam preparados ideológica, nem psicologicamente, apesar de toda a doutrinação salazarista, para morrer nas matas africanas. Voltaram-se, por isso, para a França, para a Alemanha, para o Luxemburgo, a Suíça… Alguns anos mais tarde casaram, levaram as esposas, os sogros, os cunhados, toda a gente. O concelho ficou sem imensa gente! A elite, se é que se pode chamar elite a um pequeno grupo de pessoas letradas: o padre, o juiz, o advogado, o notário, o delegado do Procurador da República, o professor do ensino primário, um ou outro comerciante mais culto – foi a pouco e pouco deixando este vale de lágrimas, e os mais novos nem sequer tomaram conhecimento de que existiu na vila um homem que dedicou parte do seu tempo a escrever sobre a sua terra natal. Um homem que nasceu, viveu e morreu cercado e seduzido pelas suas raízes.

Antes dele ninguém escrevera nada que se visse sobre Melgaço. Os padres escreviam o assento de baptismo, de casamento e de óbito, talvez um ou outro sermão para apresentarem na missa, mas crónica, história, estudos genealógicos… nada! Claro que algo se escreveu nos jornais que foram surgindo em Melgaço a partir de 1887, mas os artigos do jornal duravam pouco tempo, eram logo devorados pelo esquecimento, e por incrível que isso pareça, nunca houve uma Câmara, um Pelouro da Cultura que apoiasse a colecta e edição daqueles textos em livro! Tudo, ou quase tudo se perdeu! Restam alguns números na Biblioteca Nacional de Lisboa, a desfazerem-se em pó.

Estamos a falar de Augusto César Esteves. Mas, afinal, quem foi ele?

Nasceu na Rua Nova de Melo, fora das muralhas da vila de Melgaço, onde outrora existira um forte, a 19 de Setembro de 1889 no quarto por cima dos escudos, com apenas sete meses de gestação. Nessa rua, então moderna, tinha seu pai, Francisco António Esteves, mais conhecido por o brasileiro – pelo simples facto de ter sido emigrante no Brasil – comprado a casa do médico Dr. João Luís Sousa Palhares, e que não deve ter sido nada barata, pois ainda hoje se pode considerar uma boa habitação. Ficava pertinho do Hospital da Misericórdia. A sua mãe, prima do pai, chamava-se Belarmina Cândida e era filha de Manuel José Esteves (mais conhecido por Melgaço), emigrante no Brasil, e de Maria Rita Alves.

Augusto Esteves foi filho único de sua mãe, falecida no mesmo ano – a 17 de Outubro de 1889 – em que ele viu a luz do sol. Teve, por isso, que ser amamentado pela Cândida Corujeiras, que também nesse ano dera à luz uma menina, a Idália, e o leite não faltava em seus peitos. Bebiana Cândida salvou-lhe a vida, mas depois o enganido ia-lha levando: desta vez foi o Manuel Zoia quem o salvou com as suas mezinhas (baseadas no trovisco e em outras ervas) perante a descrença e desânimo dos médicos que o viram.

Seu pai nunca mais se casou. Viveu, porém, maritalmente com Teresa Rodrigues, de Paderne, filha de Manuel Boaventura Rodrigues e de Carolina de Jesus Costa Pinto, tendo saído dessa relação Anésia, António Cândido (o futuro médico Esteves) entre outros. E Francisco António Esteves teve ainda geração de Lucrécia das Dores Gomes de Sousa. Assim, Augusto César Esteves, apesar de ser órfão de mãe, teve quatro ou cinco irmãos (os filhos de D. Teresa Rodrigues) reconhecidos pelo progenitor.

No ano de 1889, quando Augusto Esteves nasceu, era Presidente da Câmara Municipal de Melgaço, Baltazar Luís de Araújo de Azevedo, e o Vice-Presidente era José Joaquim Alves de Magalhães – figuras de topo em finais do século XIX ignoradas nos nossos dias. No ano seguinte – 1890 – seria Presidente da edilidade José Cândido Gomes de Abreu, negociante e fundador do Hospital da Santa Casa da Misericórdia.

 

 

(continua)

 

CARTA CONSTITUCIONAL DA MONARCHIA PORTUGUEZA

melgaçodomonteàribeira, 08.03.13

 

 

O INDEPENDENTE.

 

 

N.º  16.       QUARTA  FEIRA   12  DE  DEZEMBRO  DE  1821.  100 réis

 

 

ARTIGOS DE OFFICIO.

 

   Sendo presente a Sua Magestade em contas do Juiz de Fóra e da camara de Melgaço não serem sufficientes as repetidas praticas dos respectivos Parochos aos póvos de Melgaço, do Couto de Fiaens e aos do concelho de Castro Laboreiro, póvos sim mui obedientes, e sinceros, mas indispensavel intimar-lhes, e persuadi-los dos resultantes bens da nossa Constituição Politica, e da devida adhesaõ ao progresso, e estabilidade deste systema, que faz o objecto da nossa Regeneração: Manda El-Rei, pela Secretaria d’Estado dos Negocios de Justiça, que Fr. Bernardo de Nossa Senhora da Orada, religioso Franciscano da Provincia de Portugal, ora residente na dita villa, passe ás ditas povoações, e instrua aquelles habitantes circunstanciadamente, com a maior individuação, e clareza dos bens que resultaõ á naçaõ Constitucional, e por isso de devida adhesaõ, que devem ter a um tal systema: E para o dito religioso ser contado como em deligencia, se expede na data desta a necessaria portaria ao Provincial respectivo. Palacio de Queluz em 6 de Dezembro de 1821. = José da Silva Carvalho. =     

 

   Manda El-Rei, pela Secretaria de Estado dos Negocios de Justiça, participar ao Ministro Provincial dos Religiosos Menores da Provincia de Portugal, que constando a aptidão, talento e moralidade do Religioso Fr. Bernardo de N. Senhora da Orada, o encarregou Sua Magestade de prégar, e instruir no systema constitucional, e suas vantajosas utilidades os povos de Melgaço, do Couto de Fiaens, e os do Concelho do Castro Laboreiro; e a este fim Ordena Sua Magestade, que o dito Religioso seja contado como presente, em quanto se empregar nesta importante diligencia. Palacio de Quéluz, em 6 de Dezembro de 1821. = José da Silva Carvalho. =

 

 

http://books.google.pt

 

AFONSO HENRIQUES E O MOSTEIRO DE PADERNE

melgaçodomonteàribeira, 08.03.13

 

 D. AFONSO HENRIQUES E O ALTO MINHO

 

 

DOAÇÕES A INSTITUIÇÕES ECLESIÁSTICAS

 

 

A 16 de Abril de 1141, D. Afonso Henriques couta o mosteiro de S. Salvador de Paderne, em recompensa pelo auxílio prestado pela abadessa Elvira Serrazins, quando ele foi tomar o castelo de Castro Laboreiro, auxílio esse materializado em: 10 éguas com seus potros; 30 moios de vinho e um cavalo avaliado em 500 soldos e 100 áureos.

Isto significa que terá sido numa das incursões do conde galego, Fernando Anes (Alcaide de Alhariz) que os portugueses perderam o castelo de Laboreiro, que depois, como acabamos de ver, D. Afonso Henriques foi tomar pessoalmente. Na verdade, os ataques do nosso primeiro rei à Galiza eram de vaivém, uma vez que tinha de acudir, por vezes, à fronteira do sul confinante com os mouros.

Na carta de couto do mosteiro de Paderne está explícita a obrigatoriedade de atender convenientemente os hóspedes, os pobres e os peregrinos – “et hospites ac peregrinos recepiant…” o mesmo se verificando na concedida ao mosteiro de Vila Nova de Muía, o que demonstra que D. Afonso Henriques, tal como D. Teresa, não descurou a protecção aos peregrinos e quaisquer outros viandantes…………..

 

A 24 de Outubro de 1173 este mesmo monarca fez uma importante doação ao mosteiro de Fiães, então ainda beneditino, outorgando-lhe todos os bens que ele possuía desde Melgaço até ao termo de Chaviães e de Cótaro até ao rio Minho.

Foi aqui que se veio a construir uma granja do mosteiro e mais tarde se ergueu essa “jóia da arquitectura românica”, que é a capela da Orada.

 

 

Retirado de: D. Afonso Henriques e o Alto Minho

                    Teresa de Jesus Rodrigues

                    Revista de Guimarães, nº 106, 1996, pp. 79-93

                    Casa de Sarmento

                    Cento de Estudos do Património

                    Universidade do Minho

 

 

http://www.cs.uminho.pt

 

HISTÓRIA DA GASTRONOMIA PORTUGUESA

melgaçodomonteàribeira, 08.03.13

 

Festa do Fumeiro - Melgaço

 

 

INFLUÊNCIAS ESTRANGEIRAS NOS LIVROS DE COZINHA PORTUGUESES

 

(SÉCULOS XVI – XIX): ALGUNS PROBLEMAS DE ANÁLISE.

 

 

 

    Inicialmente alguns produtos de determinados locais apareceram indicados em resultado de serem entendidos como especialmente bons. Domingos Rodrigues, autor do primeiro livro de cozinha impresso em Portugal, referiu-se ao açúcar da Madeira, aos mexilhões de Aveiro e ao queijo e farinha do Alentejo (4).

    Lucas Rigaud, num clássico da cozinha portuguesa do século XVIII, salientou os presuntos de Lamego, Montange e Melgaço e os bois da Beira (5).

    Francisco Borges Henriques, autor de um receituário manuscrito da primeira metade do século XVIII, revelou um carácter mais internacional e deu conta de ameixas de Guadalupe, café do Levante, cacau das Índias de Castela, de Curaçau, Martinica e Maranhão, passas de Corinto e peras de Rio Frio.

 

(4) Domingos Rodrigues, Arte de Cozinha, prefácio de Alfredo Saramago, Sintra, Colares, 2001. A primeira edição é de 1680.

 

(5) Lucas Rigaud, Cozinheiro Moderno ou Nova Arte de Cozinha, prefácio de Alfredo Saramago, Sintra, Colares, 1999. A primeira edição é de 1780.

 

Isabel Drumond Braga

 

Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa

 

A TI MARIA E O PADRE

melgaçodomonteàribeira, 08.03.13

 

 

UM PADRE EXALTADO

 

 

   O caso da mãe do Jacob que aludi, foi o seguinte:

   A tia Maria, já idosa, com outras mulheres e a canalha da doutrina (catequese) entre eles eu, frequentavam a novena no mês de Maio, todos os dias à tarde.

   O pároco, na altura jovem, passava por grave crise existencial e problemas de família (um seu irmão casara com a filha de ex-padre e isso era, a seu ver, sacrilégio).

   Devido a esse estado de espírito andava o padre com os nervos à flor da pele aumentando o seu natural temperamento exaltado.

   Numa das novenas, a propósito de gesto ou posição engraçada de um dos rapazes os outros caíram no riso. Riso abafado como convinha na situação. Rir disfarçado nessas ocasiões acorria a miúdo e ninguém dava importância. Nesse dia, porém, a gracinha fora maior e o riso prolongado e um dos rapazes não se contendo riu mais forte. Para quê!... O padre, que estava de costas dirigindo as orações, voltou-se abruptamente descarregando uma série de bofetadas fortes e estridentes na cara do rapaz que estava mais perto. Pegou-o pela orelha e levou-o até à porta expulsando-o.

   A tia Maria, que estava ajoelhada como todos os demais no meio da igreja, pareceu-lhe que aquele rapaz agredido era o seu neto Zeca, Zeca Chatice, por acaso não era, e protestou resmungando em voz baixa, que aquilo não se fazia, etc., etc.. O padre, em altos brados mandou a mulher retirar-se da igreja. Ela obedeceu continuando a resmungar. O acto religioso continuou sem grande ou nenhuma devoção. O facto foi muito comentado e tempos depois o pároco foi transferido. Reminiscências de infância.

 

 

Rio, 31 de Maio de 1996

 

Correspondência entre Manuel e Ilídio

 

O COUTO DE S. JOÃO DE LAMAS DE MOURO

melgaçodomonteàribeira, 08.03.13

 

 

Ao virar da página para um novo milénio comemora-se o primeiro centenário da demanda judicial da Coutada de Soengas, entre as freguesias de Lamas de Mouro e Cubalhão, ambas do concelho de Melgaço, e, na senda das comemorações centenárias, sacudismo a poeira ao alfarrábio avelhentado e do esquecimento desenterramos os nomes e os factos que fizeram a sua historiografia.

Esta acção judicial fez eco nos píncaros nevados da montanha e a sua lembrança continua bem presente na memória do povo, mas já não há vivos daquele tempo e os testemunhos sofreram a erosão dos decénios, tornando-se urgente a procura da verdade que só os documentos escritos podem revelar, para que se faça justiça aos que, na defesa dos seus direitos e do próximo, tomaram o ideal da justiça como bússola permanente da sua acção, e, sobretudo, evitar que mais um documento da historiografia da nossa terra desapareça pela voracidade das traças.

 

 

O COUTO DE S. JOÃO DE LAMAS DE MOURO: SUPLEMENTO HISTÓRICO

 

Autor: José Domingues

 

Edição: autor

 

Patrocínio: CÂMARA MUNICIPAL DE MELGAÇO

 

1999

 

GALIZA, ARBO EM 1905

melgaçodomonteàribeira, 08.03.13

 

Estação de Arbo

 

Fotografia de Guillermo Gonzalez

 

 

GALIZA,  1905

 

    Arbo – Gente do tipo pequeno e provincial rústico; senhores de barbaças negras e lunetas ou óculos, e chapéu mole e fatos largos de aldeia. Galegas feias e fétidas, de botas. Da gare de Arbo vê-se, por cima do rio que muge, uma escapada de culturas que vão até às montanhas; das casuchas da encosta agricultada saem fumos; nas encostas pascem bois; ribas mais próximas, de pinheiros; a água faz ondulações espumantes, quebrando-se nas pedras e muros dos açudes, faz uma pele de réptil, viscosa, bolhosa, verde e respirante. Uma galega que me vê escrever, põe em mim grandes olhos desconfiados. Uma barca a distância, gente do outro lado, à espera de passar. Em Arbo dois ou três chalés. Grande desfiladeiro de rochedos, com pequeno túnel; vinhedos sobre a direita, admirável escapada de vales e de outeiros, de casas e agriculturas, e montanhas. Uma ribeira cuja ponte passamos, confluente do Minho. Rampas de rocha viva. Canaviais nas encostas ou ribas que vão ao rio, grande corrente neste, ínsuas de rochas trágicas, açudes, barcos nos pontos sossegados. Agrava-se o campo. Uma região dura, sem culturas, curta; grande robleda da via-férrea ao rio, verde e de sombra, com grandes quebradas. Desfiladeiro enorme de penedia. Robleda. O rio afasta-se, com açudes, ondeando. Desfiladeiro de rochas. Cai água do alto. Túnel curto: montes, povitos rústicos, quebradas violentas à esquerda, outeiros áridos de rocha, e urze e mato. Da direita, grandes montes escalonados de fincas e vinhas e bosques. Menos rochedos nas margens, mais sossego nas águas. É o Douro, com arvoredos frondosos e vegetação nas terras. De novo margens de penedos, agora enormes e terríveis, alternativamente ocultos e descobertos pelos desfiladeiros que penetramos. A cada momento muralhas a suster a via. Da esquerda, montanhas de pedra, e de vinhedos e de pinhal. Da direita o rio, de margens abruptas, ínsulas de rocha, escarpas piramidais, donde brotam árvores a flux. O rio é todo ziguezagueando entre outeiros de pedra que nós imaginamos ou cortamos por túneis ou desfiladeiros, conforme calha; grandes montanhas altíssimas se adivinham aos dois lados por trás dessas ravinas, ou se vêem, se acaso nos voltamos para trás, a olhar entre dois montes ou desfiladeiros, os anfiteatros verdes, de casas, culturas e igrejotas.

 

 

FIALHO DE ALMEIDA

 

CADERNOS DE VIAGEM. GALIZA,  1905

 

EDICIÓNS LAIOVENTO, SANTIAGO DE COMPOSTELA

 

1ª EDIÇÃO

 

 Retirado de:

 

FIALHO DE ALMEIDA

 

GALIZA, 1905

 

EDIÇÃO DE LOURDES CARITA

 

O INDEPENDENTE

 

2001

 

pp. 80 – 81

 

GALIZA, FRIEIRA EM 1905

melgaçodomonteàribeira, 08.03.13

 

Frieira – Galiza

 

   Frieira, do lado direito. Do esquerdo, do alto duma grande rampa de rocha, cai uma cascata de água que vem duma robleda frondente de cima. Os galegos e gentuças da estação cheiram a esterco e suor, a 20 metros, e infectam, de fora, o wagon onde eu vou. Castanheiros, robles, cimos de pinhais, do lado esquerdo. Do direito, por cima da estação, nova escapada de culturas até aos mais altos montes; e ao rio vêm em promontórios, montes de rocha com casas e cercados, a embarcadoiros onde barcos atracam, de passagem; a margem alcantilada tem casas por cima, com cerrados de vinha, de cujas janelas mulheres fazem adeus. No alto dum outeiro, perto, a igreja com uma torre esguia na frente, e um cemitério com grandes árvores. Esta igreja desafia o raio, está numa montanha de teatro, escalonada de vinha e pinhal, e dela outros cerros partem, alcandorados, áridos, de cristas pedregosas. Rampas de rocha árida da direita, grandes rampas de vinha, imensas, altíssimas, da esquerda. Desfiladeiro de rocha. De ambos os lados montanhas e montanhas de vinha, imensas, totais, em grande extensão, escalonadas até aos cumes. Todo o terreno até ao rio, em bocados pequeníssimos, aproveitado. Robledas, choupos, castanheiros, água, sombra, rusticidade. Outras vezes quebradas e montes incultos, sem pinhal, ou com pinheiros pequenos e cimos diabólicos.

   Extensa região de montanhas áridas. Um grande túnel, povo rústico, mesmos anfiteatros, mesmo tipo de alturas. Novo túnel. O rio agora é muito baixo e profundo – a via-férrea vai de alto, sobre horríveis muralhões sem parapeito. Isto do lado direito. Do esquerdo, ravinas horríveis de rocha. De quando em quando uma fenda na ravina, e ninhos de verdura onde a água cai. Vamos à margem do rio, a pique, num paredão sem rampa, que não finda, e horríveis precipícios de rochedos, altos, de seis andares, nus, ou com pinheiros e robles. A margem do outro lado é rocha a pique, e por cima dela montanhas áridas que depois aparecem de vinhedo e milho, e com povo pequeno na altura. Túnel extenso. Tenho vindo só. A correria tem sido vertiginosa. O rio; grandes desfiladeiros, alternados da muralha a pique sobre a água, e de rampas de grandes árvores. Túnel pequeno. Ouvem-se os gritos dos garotos à margem da via. A paisagem desde os túneis é dura e severa. Cimos áridos – altos montes de erva curta. Atravessamos um rochedo donde cai água. Pontão sobre um ribeiro cantante. Voltam os vinhedos. Um pequeno povo: estação de Frieira, à sombra duma grande montanha a prumo, de rochas e picos sinistros, e com casotas de granito negro, escalonadas entre vinhas, e com pequenas janelas. Passa um comboio de mercadorias, com muitos wagons de sal. O rio agora tem um aspecto espraiado e minhoto, que mal se ouve. Na estação, gentuça de aldeia, pobre, pequena, galegos de guarda-sol, galegas descalças e com cabelos de porco, barbas rapadas. Vales estreitos escalonados de vinha e casuchas, linhos verdes, caminhos de cabras pelos montes. Ribeiros sob arvoredos, altos, de sombra – grande rampa a pique, de rocha, muito alta. Bosques sulcados de caminhos. Pequeno túnel.

   Um bosque de sobreiras novas, robles e pinhos. Têm a cortiça tirada. Bosques de castanheiros. A via faz curvas, como o rio; castanheiros esplêndidos. Rio largo, verde, em curvas, espraiado, ínsuas de areia.

 

 

FIALHO DE ALMEIDA

 

CADERNOS DE VIAGEM. GALIZA,  1905

 

EDICIÓNS LAIOVENTO, SANTIAGO DE COMPOSTELA

 

1ª EDIÇÃO

 

 

Retirado de:

 

FIALHO DE ALMEIDA

 

GALIZA,  1905

 

EDIÇÃO DE LOURDES CARITA

 

O INDEPENDENTE

 

2001

 

pp. 82 – 83

 

GALIZA, POUSA - CRECENTE EM 1905

melgaçodomonteàribeira, 08.03.13

 

Estação de Pousa-Crecente

 

Foto de Guillermo Gonzalez

 

 

GALIZA,  1905

 

 

    Pousa. Todo o caminho percorrido é cultivado de vinhas, ou milho, ou árvores sempre que o terreno o permite: sente-se o galego pobre, tenaz e trabalhador. O país é terrivelmente pedregoso e montanhoso. A voz do rio acaba por cansar. Madeiras de pinho em montes na gare. O que será Pousa no Inverno? Há ravinas de oito e dez andares de altura, entre que o comboio vai, num frio de gelo, sem sol. Oh que vertentes, picos e quebradas! Os campinhos escalonados vão lá riba, com escadas de pedra, paredes de pedra segurando os cordões de vinha latada, que trepam aos mais altos cimos; os fumos desgrenham-se nos pinhais. Nos altos cimos solitários, os pinheiros isolados fazem gólgotas, e tem o ar de cruzes. Que custoso deve ser ir daqueles casais à missa às igrejas dos altos, subindo, descendo, pelo Inverno! É o Douro dez vezes mais agravado e montanhoso. O rio agora sem rochas parece morto e estagnado, com a água palustre em lagunas turvas.

 

 

FIALHO DE ALMEIDA

 

CADERNOS DE VIAGEM. GALIZA,  1905

 

EDICIÓNS LAIOVENTO, SANTIAGO DE COMPOSTELA

 

1ª EDIÇÃO

 

 

Retirado de:

 

FIALHO DE ALMEIDA

 

GALIZA,  1905

 

EDIÇÃO DE LOURDES CARITA

 

O INDEPENDENTE

 

2001

 

pp.81-82

 

ACHEGA À HISTÓRIA DE PADERNE

melgaçodomonteàribeira, 08.03.13

 

 

ESTELA SEPULCRAL ARCAICA DO ALTO-MINHO

 

    Junto da Igreja de Paderne, aldeia do concelho de Melgaço, existia há annos uma notavel pedra lusitano-romana, com uma inscripção e figuras esculturadas, a qual fazia parte do lagedo granitico do adro, e estava pois sendo constantemente profanada e maltratada por quem lhe passava em cima. Por diligencias do meu amigo o Dr. Antonio José de Pinho Júnior, advogado em Monção, e moço illustrado a quem os estudos de archeologia e ethnografia locaes merecem particulares estima, a pedra occupa hoje logar de honra no Museu Ethnologico Português: SECÇÃO LAPIDAR – MINHO.

    Tem de altura 1m,61; de espessura 0m,16; de largura 0m,50. É pois uma estela. Com quanto lhe falte já a extremidade superior, póde esta lapide considerar-se dividida na superfície anterior em quatro segmentos.

    O segmento superior, que, como digo, está incompleto, parece que representa um busto acephalo; duas mãos sustentam adiante do peito, em alto relevo, um objecto indeterminavel, mas muito provavelmente vaso.

    O segundo segmento é constituído por um nicho, encurvado em cima. Nelle se vêem, em baixo-relevo, duas toscas figuras, com feições desiguaes, de pé, sem nada na cabeça, – uma, a da direita, apparentemente do sexo masculino, vestida de roupagem mais curta (simples tunica); a outra, a da esquerda, apparentemente do sexo feminino, vestida de roupagem que chega até quasi aos pés (tunica muliebris); cada uma das figuras tem na mão direita um objecto indecifravel e dá a esquerda á outra figura.

    O terceiro segmento, separado do antecedente por um bordo, contém uma inscripção, que foi gravada no campo depois de um pouco rebaixado, como o terceiro.

    O resto do quarto segmento era destinado a fixar o monumento no solo.

    Os lados da estela são irregulares, e estão em parte quebrados; pelas costas a lapide foi levemente desbastada. A extremidade inferior acha-se tambem falha.

    A tribu romanizada a que pertencia o monumento era, com muita probabilidade, aquella que tinha o seu oppidum num monte que fica a dois passos da igreja parochial de Paderne, e que ainda hoje se chama A Cividade, do latim civitatem; ahi encontrei uma casa redonda, do typo já conhecido noutros castros de Entre-Douro-e-Minho, e varios objectos de pedra (esculpturas) e restos ceramicos, tudo de origem pre-romana. O nome d’esta tribu começava acaso pela enygmatica syllaba Comp – que se le tres vezes na inscripção.

 

Retirado de: O ARCHEOLOGO PORTUGUÊS

 

                     pp. 275-281

 

                     por:

 

                     J. Leite de Vasconcelos

 

http://www.archive.org

 

CASTRO LABOREIRO, POVOAMENTO E ORGANIZAÇÃO DE UM TERRITÓRIO SERRANO

melgaçodomonteàribeira, 08.03.13

 

 

Alexandra Cerveira Pinto Sousa Lima, nasceu no Porto em Fevereiro de 1963. Inicia a sua actividade arqueológica em Mértola e no PARM (Moncorvo), tendo terminado o curso de História, Variante de Arqueologia, em 1985, na Faculdade de Letras da Universidade do Porto. Em 1994 finaliza o Mestrado em Arqueologia na mesma Faculdade, com a defesa de uma Dissertação versando o tema da organização do povoamento em Castro Laboreiro. Foi bolseira da Fundação Calouste Gulbenkian. É desde 1992 colaboradora do Parque Nacional da Peneda-Gerês. O trabalho de investigação que desenvolve centra-se na análise do povoamento, ocupação do espaço e aproveitamento de recursos ao longo dor períodos Medieval e Moderno na área montanhosa do Noroeste português.

 

CASTRO LABOREIRO: POVOAMENTO E ORGANIZAÇÃO DE UM TERRITÓRIO SERRANO

 

Autor: Alexandra Cerveira Pinto Sousa Lima

 

Edição: Instituto da Conservação da Natureza

 

             Parque Nacional da Peneda-Gerês

 

             Câmara Municipal de Melgaço

 

Cadernos Juríz Xurés

 

1996

 

UMA HISTÓRIA MELGACENSE

melgaçodomonteàribeira, 08.03.13

 

 

“LEITURA”

 

 

    Não, não pensem que vou falar de livros! O título sugere-o, eu sei. Trata-se, tão somente, de uma escultura do nosso conterrâneo Acácio Caetano Dias que acaba de ganhar o 1º prémio da Quinzena Cultural Bancária (10ª edição), iniciativa do Sindicato dos Bancários do Sul e Ilhas. O Júri «constituído pelo pintor António Carmo, pelo arquitecto João Santa Rita e pelo pintor A.M. Pinto Carvalho, tendo em conta os regulamentos publicados e os trabalhos apresentados aos respectivos concursos, decidiu:

    b) – No concurso de Escultura, atribuir apenas o primeiro prémio à peça de escultura “Leitura” de Acácio Caetano Dias»…

    Não tive ainda a oportunidade de ver a escultura, nem de falar com o seu criador, mas espero consegui-lo em breve. Disso falarei oportunamente. A peça está exposta no Palácio Foz, em Lisboa, juntamente com outros trabalhos premiados.

    Um conterrâneo com o talento do Acácio é um orgulho para todos os  melgacenses. Ele é um artista nato, um homem que não tendo frequentado Escolas Superiores de Arte é émulo daqueles que tiveram essa possibilidade; é um autodidacta, pois as suas habilitações literárias (1º ciclo) nunca o impediram, nem impedem, de brilhar em várias exposições: Escola de Belas Artes, Hotel Altis, Palácio Foz, Festa da Cultura (Melgaço).

    Acácio nasceu em Prado em 1935. Seu pai, o popular Amadeu «Rato», tinha a profissão de latoeiro. A sua oficina situava-se perto da barbearia e taberna-restaurante do Carlota (quem não conheceu?). Juntamente com a sua oficina coexistia uma outra, de sapateiro, cujo mestre era o Henrique «Abelhão» (isto em 1958, mais ou menos). Nessa altura já o Acácio se encontrava possivelmente em Lisboa, pois em 1959 entra para o Banco Nacional Ultramarino como apontador.

    Os dois, Amadeu e Henrique, formavam um duo impagável no que diz respeito a «malandrices». Não havia cliente que não saísse sorridente com a graça de ambos, mesmo os mais sisudos.

    No Carnaval, o pai do Acácio fazia normalmente parelha com o Sr. António «Trauliteiro» (apesar da alcunha o Sr. António era um homem pacífico, brincalhão, o alvo cavaleiro – S. Jorge – que na vizinha vila de Monção, aquando da procissão do Corpus-Christi matava a Coca, ou Santa Coca, o terrível dragão que afugentava o povo amedrontado).

    Ainda me lembro de ver o «Trauliteiro» dentro de um carrinho de bebé, vestido a rigor e com chupeta na boca, chorando lágrimas comoventes, a ser empurrado pela velha ama (Amadeu «Rato»), pesarosa e convincente. Davam a volta à Avenida, percorriam as ruas da Vila, iam até à Calçada e Loja Nova e depois recolhiam, pois o líquido precioso esperava-os ansiosamente!

    Acerca do pai do Acácio conta-se uma história divertidíssima: o seu irmão, Edmundo «Rato», também latoeiro, um dia recebe na sua oficina um camponês que lhe pede para pôr um fundo a uma lata que consigo trazia, daquelas que se usavam para o sulfato ou a cal. O cliente perguntou quando é que poderia ir buscar a obra e a resposta, carregada de sofisma, não se fez esperar:

    — «Sr. Fulano, não precisa vir buscá-la. Na próxima semana tenho de ir visitar uma pessoa sua vizinha e assim aproveito para lha levar».

    O homem ficou radiante, pois deste modo evitaria perder tempo, tempo esse que necessitava para o amanho das suas terras.

    — «Obrigado Sr. Edmundo. Vai provar uma pinga que lá tenho que é só para os verdadeiros amigos».

    O convite do agricultor veio aguçar ainda mais o apetite devorador do latoeiro. Depois do cliente ir embora apressou-se a falar com o Sr. António «Cerinha», seu vizinho de oficina, e seu irmão Amadeu, acerca de tal convite. Todos eles passaram a língua pelos lábios ressequidos, fecharam os olhos e tiveram a visão do deserto, isto é, começaram a ver o líquido (em lugar da água o vinho do lavrador) a cair de baixas nuvens espessas. As malgas, todas elas do tamanho de alguidares, começaram a encher-se do divino néctar e seus olhos brilharam de sofreguidão e ânsia. O Sr. Amadeu sentenciou:

    — «O vinho só não chega. Terá de ser acompanhado de presunto e broa!»

    A lata parecia nova. Marcaram o dia e a hora e puseram-se a caminho. Dois quilómetros a pé não é brincadeira nenhuma, mesmo naquele tempo. Chegaram extenuados. O aldeão andava a sachar as suas leiras, perto de casa, e quando os viu gritou-lhes com ar bonacheirão:

    — «Ainda bem que vêm a esta hora porque também estou com sede».

    Todos aplaudiram o gracejo e como quem não quer a coisa lá se foram aproximando da adega. Malgas na mão, olhar fixo no presunto que baloiçava ali bem perto, começaram, um por um, a receber da pipa a tão esperada pinga. Depois de já terem despejado três ou quatro malgas, um deles disse ao anfitrião:

    — «Sr. Fulano, um naco de pão não lhe ia mal agora!»

    Isto apanhou o homem de surpresa. Aguardava que eles se despedissem a fim de recomeçar os seus trabalhos. O tempo passava, a torneira sem descanso e agora o pão! Chamou a patroa e pediu-lhe que trouxesse broa para a gente da Vila.

    — «Rico pão, sim senhor!», comentou um dos glutões.

    Outro, aproveitando a deixa, arrisca:

    — «Pão pede algo, talvez presunto!»

    O pobre lavrador estava entre a espada e a  parede, acossado com raposa e lobo. Se recusasse passava por somítico; se aderisse à sugestão ficava sem presunto. Pegou na faca, olhou pela última vez para o presunto que tanto trabalho e cuidados lhe dera e diz-lhe, como falando para um filho que parte para longe:

    — «O teu dia chegou – é o destino!»

    Do desgraçado, duas horas mais tarde, restava apenas um grande osso feio e bruto. Da broa nem um côdea restou! A pipa ficou exausta! Saíram da adega, cambaleando, rindo descaradamente! O cavador, entre pragas, foi-lhes dizendo:

    — Três para uma lata! É obra!

    Que me perdoem aqueles que conhecem a história ao vê-la tão mal narrada. Contei-a como ma contaram, apenas lhe acrescentei um pequenino ponto!

    Saudações amigas a todos os melgacenses.

 

Joaquim A. Rocha

 

Publicado em: A VOZ  DE MELGAÇO  

 

CARNEIROS EM TRANSUMÂNCIA – EMIGRANTES CLANDESTINOS

melgaçodomonteàribeira, 08.03.13

 

 

Ricardo Manuel Ferreira Gonçalves, nascido em 13 de Setembro de 1957 em Ferreiros – Paderne – Melgaço.

Aluno errante, frequentou vários estabelecimentos de ensino, sendo actualmente estudante de Filosofia.

Militante activo do Partido Socialista desde 1974.

Foi aluno e professor na vizinha vila de Monção. Sempre à procura de novos conhecimentos e experiências, acabou por ser professor cooperante em Cabinda na R. P. Angola onde escreveu este livro, portanto na ocasião, ele também era um emigrante.

No regresso visitou diversos países entre eles a Nigéria, a Líbia, a Bulgária e a França.

Foi fundador e é actual Presidente do Grupo Desportivo e do Rancho Folclórico de Paderne – Melgaço. No que sente muita honra.

Este livro é dedicado aos emigrantes, e à entrada de Portugal na C. E. E. só possível pela existência do 25 de Abril. Para que a C. E. E. resulte numa Europa Unida, e num mundo mais livre e melhor.

E vem provar mais uma vez que os emigrantes, sozinhos, num esforço abnegado, entraram primeiro no mercado comum do que o próprio país, que os viu nascer. Mudando com o seu esforço titânico a História de Portugal principalmente nas regiões do interior, que teimavam há séculos em ser zonas de miséria e despersonalização.

Realizando assim a grandiosa epopeia que foi a emigração clandestina.

 

O autor:

 

Ricardo Gonçalves

«Carrola»

 

CARNEIROS EM TRANSUMÂNCIA

EMIGRANTES CLANDESTINOS

 

Autor: Ricardo Gonçalves

 

Capa: Rui Perdigão

 

Edição: Perspectivas e Realidades

Lisboa

 

EDIÇÃO PATROCINADA PELA

 

ASSOCIAÇÃO CULTURAL INÊS NEGRA

 

MELGAÇO, NATAL DE 1983

melgaçodomonteàribeira, 08.03.13

 

 

O PRESÉPIO AUTARCA DE MELGAÇO EM 1983 

 

  

A Câmara Municipal,

teve uma ideia feliz,

pois armou este Natal

um presépio colossal

nas trazeiras da Matriz.

 

Coisa assim, nunca se viu,

tão bonito e tão real,

pois com gosto reuniu

e assim distribuiu

figuras ao natural.

 

A Teresa é Nossa Senhora,

o Solheiro é S. José,

e quem nasce nessa hora

e entre as palhinhas chora,

Alberto de Sousa, o Bé.

 

A dar calor ao menino

com seu carinhoso alento

com amor e com carinho,

o Luís faz de boisinho

e o Tóninho de jumento.

 

O Jorge, o Moura e o Gi,

três Reis Magos, quem diria,

montados nos três camelos

da Junta de Freguesia.

 

Ventura, Carvalho e Zeca

são os pastores, pobrezinhos

que levam como carneiros

os do lixo e os cantoneiros,

e mais outros, coitadinhos.

 

O Presépio ainda tem

figuras evocativas,

mas a gente sabe bem

que são na Câmara também

apenas, decorativas…

 

Natal de 1983

 

FAIJ

 

TRADIÇÕES CASTREJAS

melgaçodomonteàribeira, 08.03.13

 

 

OS OBRADÁRIOS OU ACENDIMENTOS

 

DE CASTRO LABOREIRO

 

  

   Pe. Aníbal Rodrigues

 

   Castro Laboreiro, situado a nordeste do Alto Minho, a uma altitude de 932 metros, distante de Melgaço a 26 quilómetros, inserida no Parque Nacional Peneda-Gerês, é no dizer de alguns etnólogos e historiadores uma espécie de Andorra Portuguesa. Climatericamente incluído no litoral português, é um laço de união entre os valores amenos, bucólicos e verdejantes do Minho e os planaltos despidos e agrestes das terras frias transmontanas. Mercê do seu ancestral isolamento, conservou sempre puras as suas primitivas etnias, sem cruzamentos de outros clãns. A sua vida comunitária desenvolveu-se no decorrer dos tempos coerente com as suas velhas raízes de sangue celta.

   Os documentos que possui são feitos de pedra, anteriores à nossa independência pátria, com a provecta idade de 4.000 e 5.000 anos. Cada pedacinho destes monumentos do passado é uma preciosa relíquia da sua história, que um dia esperamos, se Deus o permitir, expor em livro para todas as pessoas a poderem apreciar. Será um lindo sonho, muito difícil de tornar realidade? Disto ninguém duvidará. A quatro e cinco mil anos de distância, a maior parte dos elementos, que nos poderiam ajudar foram lentamente destruídos pela mão do tempo, permanecendo apenas os monumentos do megalítico ocidental como símbolos e indicativos das civilizações que, há já quarenta e cinquenta séculos respectivamente, tiveram lugar nesta histórica região. Para a maior parte dos ignorantes todos estes grandiosos monumentos pertenceram, segundo o seu critério, aos Mouros que em 710, após a batalha e vitória de Târique, invadiram e conquistaram a Península Ibérica. A passagem dos Sarracenos por Castro Laboreiro é quase imperceptível, devido aos diminutos vestígios deixados. Não se pode dizer o mesmo da civilização romana que nestas elevadas paragens vincou a sua longa estada.

   As numerosas vias romanas com lajedos em bom estado de conservação; as lindas pontes romanas e românicas que ligam as bucólicas margens dos rios e ribeiros; a romanização dos núcleos castrejos, em grande quantidade, que a freguesia possui, dão-nos uma verdadeira imagem da influência e grandeza do Império Romano neste isolado cantinho. Mas a que propósito vem esta introdução, aos obradários, amentas ou acendimentos de Castro Laboreiro? É que é devido às suas origens dolméticas e castrejas que a vida comunitária desta região conservou até aos nossos dias o espírito de união e bairrismo cujo carácter e maneira de ser se manifesta em toda a sua actividade humana. No aspecto social ainda hoje todo o povo castrejo continua a utilizar o mesmo moinho público do lugar para moer o centeio e o milho; o mesmo forno onde coze o pão; as eiras onde debulha o centeio; e a reparar em conjunto os caminhos da povoação.

   Nos baptizados, casamentos e funerais a comunidade castreja comparticipa nas alegrias e nas tristezas de todas as famílias que as constituem. Nos actos e manifestações religiosas não foge ao mesmo espírito de comunidade. Quando algum dos seus membros adoece, toda a população o visita e lhe presta cristãmente o seu auxílio, oferecendo-lhe, além do conforto moral, auxílio financeiro, se é pobre; e ofertando objectos  de estima ou próprios para alimentação das pessoas que não tem saúde. Na ocasião do falecimento desta comunidade um representante de cada família toma parte nos cumprimentos e manifestações  de pesar, desde o velar do cadáver quando se encontra em câmara ardente, até às orações pela alma do mesmo, terminando sempre com a aspersão de água benta sobre os restos mortais da pessoa falecida. No Domingo seguinte ao funeral, o seu agregado familiar comparece na Missa. Logo que esta termina, acende uma vela e assiste à amenta, obradário ou acendimento até ao fim deste, acompanhando com as suas orações os responsos que o Presidente da Assembleia paroquial recita em latim ou português, pela alma do finado, conforme o estatuído no Direito Canónico, na legislação diocesana ou sinodal da Igreja Católica. Mas não é apenas o Presidente da Assembleia Cristã que recita religiosamente aqueles responsos.  Toda a Comunidade paroquial presente toma parte integrante nos responsos e orações juntamente com o Sacerdote. Dá-se assim uma comunhão grande e íntima de vida comunitária e religiosa e, neste acto litúrgico desaparecem os ricos e os pobres, os letrados e ignorantes, os bem colocados na vida e os deserdados da fortuna. A ordem, a procedência são iguais para todos, sejam as pessoas médicos, advogados, engenheiros  ou de qualquer outra profissão. Todos se irmanam aqui no mesmo espírito cristão, e na qualidade de filhos de Deus. São pois as amentas, obradários ou acendimentos uma bela escola da vivência cristã que vale a pena ver.

   As velas acesas são o símbolo da fé que orienta a vida dos cristãos. E é por este motivo que em todos os actos litúrgicos aparecem sempre velas acesas. Já na pré-história dos povos celtas de há quarenta e cinquenta séculos aparecem litogravuras representando o sol com um círculo e muitos raios que dele partem e se difundem pelo mundo.

   Estes desenhos manifestam-nos a sua crença, também…

   O que os fiéis de toda a Igreja Católica fazem apenas no dia dois de Novembro, a comunidade cristã de Castro Laboreiro realiza-o com mais frequência na sua Matriz, nos seus acendimentos, amentas ou obradários, Tanto estas manifestações de piedade pelos irmãos falecidos, como a procissão de defuntos e reza anual, que nesta paróquia têm lugar todos os Domingos do ano, constituem actos litúrgicos que estão dentro do espírito e constituição da própria Igreja de Cristo.

 

Castro Laboreiro, 5-XI-1979

 

CONTRABANDO, A FROTA EM MELGAÇO

melgaçodomonteàribeira, 08.03.13

 

 

A FROTA



   Frota era o termo como se vulgarizou o contrabando. Foi uma invenção do Ná. Em 1940 a guerra mundial estava no auge germânico. A Melgaço chegavam as notícias através dos poucos rádios existentes, dos jornais e principalmente das revistas de propaganda enviadas pelas Embaixadas dos países envolvidos no conflito. Essas revistas eram maravilhosas em aspecto gráfico, coloridas, quase só com fotografias mostrando o progresso dos exércitos dos países em questão. Quem distribuía as revistas inglesas (em língua portuguesa, umas e outras) era o António Reis e o Alfredo Pereira (Pandulho); e as alemãs o Hilário. Este, além de distribuir as revistas expunha nas suas vitrines cartazes e fotografias do cenário da guerra, exibindo o sucesso nazista.

   Nos primeiros anos de guerra, em Melgaço, havia bastantes simpatizantes dos alemães.

   Então, falava-se muito no movimento das frotas marítimas, dos grandes navios, especialmente as frotas (comboios) que atravessavam o Atlântico com suprimentos americanos para os aliados. Os submarinos alemães botavam a pique parte dessas frotas.

   O contrabando em Melgaço era a única actividade do povo; acontecia, vez por outra, para mostrar serviço ou porque não lhes davam a ‘bola’ que esperavam, os guardas-fiscais prendiam as mercadorias. ‘Bola’ era a propina para fecharem os olhos. E este termo derivava da bola de carne com veneno que alguém incomodado dava, secretamente, aos cães vadios ou dos vizinhos para se calarem (morrerem).

   Quando, então, a guarda-fiscal pegava as mercadorias diziam: a Frota de fulano foi a pique. O termo se vulgarizou e passou a designar contrabando em todo o Alto-Minho e pessoas ficaram famosas e ricas como Frotistas.

 

Rio, 31 de Maio de 1996

 

Correspondência entre Manuel e Ilídio

 

LINA FILHA DE PÃ

melgaçodomonteàribeira, 08.03.13

 

 

     Joaquim Agostinho da Rocha nasceu em Cevide, Cristóval, Melgaço, a 12/6/44. Até aos seis anos de idade, viveu no lugar onde nascera; dos seis aos vinte anos residiu na vila da Melgaço, terra de sua mãe e seus avós maternos.

Em Janeiro de 1965, ingressou no serviço militar onde permaneceu até aos finais de 1967, tendo comprido quase dois anos nas matas da Guiné-Bissau. No regresso de África ficou a morar em Lisboa. Trabalhou como empregado de escritório, bancário, contabilista, bibliotecário, professor do ensino secundário…

     Ao longo da vida foi estudando: primeiro tirou o Curso Comercial; depois o Curso de Contabilidade (técnico de contas); mais tarde fez algumas disciplinas do Liceu e o Propedêutico, a fim de ingressar na Faculdade de Letras de Lisboa, completando aí o 2º ano de Línguas e Literaturas Modernas (Estudos Portugueses). Devido a incompatibilidades de horário, terminou esse Curso na Universidade Autónoma de Lisboa – Luís de Camões.

     Em 2001 regressou ao seu Minho, fixando a sua residência na cidade de Braga.

     Dedica-se à investigação na área da História Local e Regional, e à criação literária.

 

MELGAÇO, 16 DE NOVEMBRO DE 1913

melgaçodomonteàribeira, 08.03.13

 

 

AFASTANDO AS «PEDRAS»  DO CAMINHO

 

 

   A ofensiva do Partido Democrático prosseguia. Raimundo Meira aproveitava qualquer ocasião para eliminar a oposição existente e colocar à frente do município pessoas da sua confiança. Em 16 de Novembro de 1913 retira a confiança ao Administrador do concelho de Melgaço. Este apresenta a demissão passados 10 dias.

 

   Exmo. Sr.

 

   Tendo Vexa significado em seu oficio nº 445 de 16 do corrente, que não lhe mereciam inteira confiança as minhas informações oficiais, acerca das obras da pesqueira a que o mesmo oficio se refere, e isto por não serem elas conformes com outras informações particulares, que sem fundamento de verdade foram dadas a Vexa, acerca do mesmo assunto; e não tendo querido Vexa aceitar a justificação do meu procedimento exposto no meu oficio nº 144 de 20 do corrente, tanto que o tal oficio me foi devolvido por ordem de Vexa, como consta do ofício emanado d’esse Governo Civil sob o nº 461, assinado pelo oficial-chefe da 2ª repartição, no qual se diz que fui “incorrecto e inconveniente” para com Vexa, julgo do meu dever, por não poder continuar a merecer a Vexa, a necessária confiança no desempenho das minhas funções a meu cargo, pedir a minha demissão, depositando nas mãos de Vexa, o lugar de Administrador deste Concelho.

 

   Saúde e Fraternidade

 

   Administração do Concelho de Melgaço

 

   O Administrador do Concelho

 

   António Augusto Simão

 

Retirado de:

 

Cartas Portuguesas - A Primeira Republica por Correspondência

 

http://cartasportuguesas.blogspot.com/2005_02_01_archive.htlm

 

«A RUA DA ESTRADA» E «VIDA DO CAMPO»

melgaçodomonteàribeira, 08.03.13

 

 

A Rua da Estrada emerge sobre os escombros da dupla perda da «cidade» e do «campo». Da cidade, ficou a representação comum de uma sociedade plural e intensa num território densamente construído e com limites definidos, um «interior» confinado, rodeado pelos espaços ditos naturais, da floresta ou da agricultura. Do lado de fora, guarda-se a imagem de um espaço rural, habitado por visões do mundo fechadas sobre si e sobre poderosas identidades. Nada mais falso. As transformações dos campos são tão radicais como as transformações das cidades. Hoje, a urbanização progride a um ritmo avassalador e já não está exclusivamente dependente da aglomeração e da proximidade física. As infraestruturas percorrem territórios imensos que tornam possível um sem número de padrões de localização, construções e formas de organização social. O urbano é um «exterior» desconfiado e instável, por contraposição à imagem da cidade amuralhada.

A Rua da Estrada é a imagem perfeita desta metamorfose. Mais do que lugar, ela emerge como resultado da relação, do movimento. O fluxo intenso que a percorre é o seu melhor trunfo e a sua própria justificação. Sem fluxo não há troca nem relação, génese primordial da velha cidade. Dizia alguém explicando as manobras de sedução que praticava para tornar o seu negócio visível para quem vai na estrada: O problema é fazê-lo parar.

 

Álvaro Domingues (Melgaço, 1959), geógrafo, formou-se na Faculdade de Letras da Universidade do Porto em 1981. É professor da Faculdade de Arquitectura da Universidade do Porto.

 

A RUA DA ESTRADA

 

 Autor: Álvaro Domingues

 

 Edição: Equações de Arquitectura

 

Dafne Editora

 

 Patrocínio: ESTRADAS DE PORTUGAL, SA

 

 Porto, 2009

 

Vida do Campo – Um livro feito de retratos de um país composto de mudança.

A brincar costuma dizer: «Fui primeiro a Paris do que a Lisboa». Poderia ser sobranceria, ou até sinal de um certo cosmopolitismo bacoco. Mas não. É  apenas a sua forma de desmistificar algumas ideias feitas, enraizadas na sociedade nas últimas décadas, fruto da propaganda do Estado Novo e das idealizações turísticas do século XXI. Melgaço, onde nasceu em 1959, «nunca foi, nem é, esse mundo remoto e desligado da terra como muitas vezes é pintado». Dessa terra, no limite norte de Portugal, lembra, partiu o primeiro autocarro semanal para Paris. E nos seus tempos de criança era tão frequente falar-se da «próxima vaca que ia parir», como da «atualidade da Nova Caledónia», onde morava um conterrâneo.

…………………………………………………

 

Ler mais em:

 

 Texto publicado no JL 1081, de 7 de Março de 2012

 

 Retirado de:

 

 A VOLTA DO PARAFUSO

 

 voltaparafuso.blogspot.pt

 

«TAINADA NA NOTÁRIA» E «A COÇA»

melgaçodomonteàribeira, 08.03.13

 

 A Notária - Galiza

 

 

TAINADA NA NOTÁRIA

 

 

               PARA O TEU ARQUIVO:

 

 

   Anteriormente ao Lucas, o Regedor da Vila era o João Cândido de Carvalho, mais conhecido por João Braga, dono do prédio e pensão, ao lado do Lucas, esquina da Feira Nova. A filha única deste casal, a Lourdinha, casou com o Gasparinho (Lopo) filho do Albertinho de Galvão, pais do major Pereira de Castro. Quem deu a Regedoria ao Lucas (Rodolfo Amadeu Fernandes) foi o professor Abílio quando este era Presidente da Câmara. Eram muito amigos; o João Braga já estava bastante idoso e doente. A propósito, ocorreu-me uma cena desagradável que lembrou outra ainda pior.

   A primeira: eu havia tomado uma gasosa na adega do Lucas (não a gasosa pirolito com esfera de vidro como tampa, mas outra com a tampinha de lata). Achei de ser engraçado, enchi a garrafa com água e coloquei a latinha novamente com habilidade. Dias depois essa água foi cair na boca do prof. Abílio. Causou um tremendo mal estar e uma bronca do Lucas que me serviu de lição.

   A outra cena aconteceu com teu pai Carriço e colegas (Carlota & Cia.). Num domingo de pasmaceira, alugaram o carro do Pires e foram dar um passeio à Notária, do outro lado de S. Gregório. Fizeram uma tainada num café-taberna. Às tantas, mestre Carriço, irreverente, brincalhão que só ele, resolveu mijar dentro de uma garrafa de gasosa, colocar a tampa e disfarçadamente com a participação dos colegas, colocá-la entre as garrafas cheias no engradado. Poucos minutos depois essa garrafa foi cair nos lábios dum carabineiro. Exaltadíssimo, o homem (autoridade) soltou todos os impropérios que conhecia e queria matar todo o mundo. A balbúrdia foi grande e geral. Antes que se esclarecesse a autoria do crime, o Papá Pires fez que pagassem a conta e caíssem fora num abrir e fechar de olhos. Escaparam ilesos.

   Quem contou esta passagem foi o velho Pires.

 

Rio, 20 de Fevereiro de 1995

Correspondência de Manuel e Ilídio

 

MANUEL IGREJAS, 1995

 

 

A COÇA

 

 

   Os rapazes de Monção, quando havia baile em Melgaço, causavam grande sensação por se apresentarem arrumadinhos, engravatados e penteados com brilhantina, ao contrário dos rapazes de Melgaço que vestiam quase a mesma roupa com que andavam no trabalho.

   Naquela época, a diferença de hábitos entre as duas vilas era grande; mercê do comboio em Monção havia mais modernismo.

   O pessoal de Monção sabia disso e tirava partido aproveitando todas as oportunidades que se apresentassem para diminuir a gente de Melgaço.

   Um domingo, apareceram na nossa vila duas camionetes a que chamavam excursão, cheias de rapazes de Monção fingindo visita de turismo. A dada altura, organizaram-se em marcha, exibindo aqueles bonequinhos em cima de uma cana que accionados por um arame batem um no outro (acho que se chamavam macaquinhos, não me lembro) e cantavam uma modinha da época que se adaptava a menosprezar a nossa gente. Para que!...

   Os rapazes de então, entre eles o tio Emiliano, tio Ilídio (teu avô), Abel Barrenhas, Roberto Cuco e outros caíram de pau em cima deles, os debochados monçanenses, aplicando-lhes uma coça que ficou memorável nos anais da nossa terra. Fugiram atabalhoadamente todos rebentados e a partir daí os ânimos ficaram acirrados.

   Qualquer encontro entre habitantes das duas vilas terminava em pancadaria.

   Durou anos.

   Quando eu era garoto, ainda se comentava esse glorioso acontecimento e já deviam ter passado vinte anos.

 

Rio, 6 de Fevereiro de 1997.

 

Correspondência entre Manuel e Ilídio

 

O BASTARDO V

melgaçodomonteàribeira, 08.03.13

 

 

   Félix continuava a viver do trabalho que aparecia e que dava para se manter, mas também a explorar a terra. Tendo ele o ofício de alfaiate, começou a procurar lugar onde instalar habitação e oficina. Aquando da sua partida de Ourense, Félix foi chamado à madre abadessa que, depois de advertências e recomendações, lhe entregou um pequeno pacote.

   Ajoelhando aos pés da madre, pediu-lhe a bênção:

   — A sua bênção madre.

   — Que Deus te abençoe, meu filho. E agora vai, vai com Deus, meu filho – respondeu a abadessa.

   Félix recuou, fechou a porta e suspirou. O pacote era pesado e algo tilintava lá dentro. Começou a suar quando lhe veio à ideia que ali poderia estar a sua vida. Sentou-se num banco do jardim dos claustros a pensar no que fazer e depois de algum tempo disse para si próprio: - Só és aberto quando Deus Nosso Senhor quiser! Agora sabia o que continha: uma carta de arrependimento – p*ta de m*rda, pensou - que devia ter sido escrita com vinagre tinto, e uma bolsa com umas moedas de ouro. O ofício na palma da mão.

   Fifi foi recebido por D. Zinaido no escritório – Dona Beatriz já há anos que se passara – e deu-lhe conta da sua preocupação:

   — D. Zinaido, o moço é a cara do dr. João, e pela idade que aparenta …

   — Falas-te com ele? – perguntou o senhor.

   — Ouvi mais do que falei, e se quer que lhe diga, tirando a cara, é mais um jovem galego a tentar a sorte por cá – responde Fifi com um sorriso.

   — Olho e ouvido aberto, que eu falo com a Mia e a Antónia e vamos esquecer o assunto. Mais alguma coisa Fifi? – sorriu com escárnio D. Zinaido que já sabia o que vinha a seguir.

   — D. Zinaido, se eu pudesse passar...

   — Na adega? Leva lá um cabaço e poupa-o.

   — Obrigado, D. Zinaido, vossa senhoria é como um pai – fazia vénias o Fifi.

   — Vai, vai e não te esqueças. Olho e ouvido aberto – recomendou o fidalgo.

   Foi a ultima vez que se falou de um assunto que tinha teias de aranha na história da família e preocupava menos que o atraso na floração das cerejeiras.

   A casa foi encontrada; com boa sala que dava para mesa de corte e máquina de costura, quarto e cozinha acanhados.  Uma saltada a Ourense e no regresso, bem atada num carro de bois, uma máquina de costura como nunca se vira por aquelas bandas e abertura ao povo de uma alfaiataria., benzida pelo abade com o Cintran a acolitar. E era ver os dois amigos nos dias de romaria a deslumbrar as moças com seu ar e vestimenta; vestir assim, só os ricos. Era vê-los bem perto do altar na missa de domingo ou a pegar o andor de Santa Maria em noite de procissão. Naqueles seis meses na vila estavam a lançar os caboucos duma nova vida.

   Álvaro, pousou o sacho que trazia ao ombro, passou um trapo pelo rosto suado, encarou o patrão e disse:

   — Patrão, tenho que ir à minha casa.

   — E o trabalho, Álvaro, quem o faz? – retorquiu o patrão de má catadura.

   — Patrão Gabriel, o senhor me desculpe, mas eu vou ainda hoje à minha casa e daqui a dois dias estou de volta. Perdoe, patrão, mas tem que ser – os olhos do homem brilhavam.

   O fidalgo Gabriel, que conhecia como ninguém os seus trabalhadores, sabia que o galego Álvaro estava numa aflição e merecia ser ajudado.

   — Daqui a dois dias aqui – disse o fidalgo virando-lhe as costas.

   Álvaro, galego de Santa Cristina de Valeixo, há anos a trabalhar para a família de D. Zinaido, dirigiu-se para o tanque para se lavar que ao romper do dia tinha que pôr pés ao caminho. Tinha tudo acertado com o irmão, de nome Albano e nomeada Silvano, negociante de peixe que duas vezes por semana carregava o burro em Vigo para alimentar a vila e arredores. Atravessou o Minho de batela, cortou por campos e pinhais e à hora do jantar estava sentado à lareira, a comer um caldo de couves e um naco de pão, a contar à família quem vivia em Melgaço.

   — E todos janotas! – diz Álvaro levantando-se para dar dois passos de dança.

   — Ai é? Amanhã vamos ver como é – gritou como pocessa a irmã Concepção, secundada pela irmã Filomena.

   Estas apresentavam barrigas proeminentes e não paravam de gritar, apontando o dedo ao irmão com ameaças e pragas pelo meio. Galegas de pelo na venta não demoraram a atravessar o rio de batela no Louridal e foram-se instalar na quinta onde trabalhava seu irmão. Quase clandestinas, as irmãs Costas, que sabiam muito bem não serem as únicas que em Santa Cristina se divertiram nas medas de feno ou atrás do canastro com os dois manganas, trataram de lhes deitar a mão. Álvaro passava o tempo de descanso em correria para a alfaiataria e daí para o Regueiro levando novas das irmãs que se resumiam a: - Estou prenha, vem ter comigo.

   Os apelos não tinham resposta e as irmãs não tinham paciência, já que viam a barriga crescer todos os dias.

   Ficar escondidas não era solução, tinham que aparecer.

   No domingo ao fim da missa - na Igreja de Santa Maria do Campo, para os lados da Feira Nova -, quando Félix, já Igrejas, se dirigia com o amigo Cintrão

que não Cintran para o almoço dominical, viram o caminho barrado pelas barrigas da Concepção, depois Conceição, e Filomena Costas.

   — Álvaro, temos cozido para o jantar, somos muitos, mas dá para mais um – disse a sorrir o Félix, enlaçando a cintura prenhe de Conceição.

   Era o primeiro de muitos, dezoito paridos e dez sobreviventes.

 

   O Félix Igrejas, mais tarde, optou pela nacionalidade portuguesa. Recebeu um dia a visita dum cidadão que o convidava a visitar Barcelos, onde alguém desejava conhecê-lo. A mulher dele, Conceição, não deixou ele ir, alegando que talvez quisessem eliminá-lo.

 

 

Para a história ficou a alcunha daqueles bons moços:

 

Os Pinantes de Santa Cristina.

 

 

PARA OS MEUS BISAVÓS FÉLIX E CONCEIÇÃO


O BASTARDO IV

melgaçodomonteàribeira, 08.03.13

  

Conceição Costas

 

      Aldeia pequena mas de terras férteis, com o Minho a passar por perto, milho e vinho em abundância mas também com a pobreza à porta, Félix praticava o seu ofício quando não havia trabalho no campo e Cintran estava sempre ocupado. Muito bem vistos pelo povo pelo trabalho que faziam, mais bem vistos pelas mocetonas galegas, fartas de ver sempre as mesmas caras; e quando Cintran assobiava aquelas muineras que até parecia duas gaitas de foles, até os cães se calavam. Desde Ourense que não viviam tão bem. Para os moços, eram tempos de felicidade, com trabalho, umas patacas e muitas namoradeiras. Hoje uma, depois a outra, até que resolveram que não era a vida que pretendiam e como o povo já falava – não eram cegos, surdos ou mudos -, estava na hora de partir, até porque as irmãs Costas não lhes davam um minuto de descanso. Essas mais que as outras.

      — Para onde? Qual o caminho, por aqui, por ali, por acolá? – riu-se o Cintran.

      — Por aqui! – a cara de Félix mostrava decisão e decisão já tomada – para o rio.

      — O rio? Portugal? – As gargalhadas do Cintran eram tais que as lágrimas lhe humedeceram os olhos – Vamos lá então que pior que isto não pode ser.

      Não sabia, ainda, o Cintran que o rio Minho não divide, antes une as gentes dum mesmo povo. Que Galiza e Alto Minho são irmãos na riqueza, na pobreza, no choro e na alegria. Se um lado é pobre o outro não pode ser rico. È celta.Foi ao romper da aurora que meteram pés ao caminho, uma trouxita na mão que haveres não abundavam, saltaram valados e atravessaram corgas até chegar ao coto de Mourentan onde descansaram, que o sol já ia alto e aquecia naquele inicio de verão.

      — E Portugal? – perguntou o Cintran, sorriso no canto da boca.

      — Andamos um pouco e depois é só atravessar o rio. Vamos preguiçoso… – riu o Félix, dando-lhe uma palmada na perna.

      Na margem do Minho, procuraram águas com pouca corrente e tirando a roupa que tinham vestida, fizeram uma trouxa maior do que a que traziam, ataram-na à cabeça e deslizando nas calmas águas do rio, nadando com prudência, em poucos minutos chegaram à margem contrária.

      Numa língua de areia desfizeram as trouxas e estenderam a roupa nos arbustos para que o sol do meio-dia a enxugasse da pouca água que apanhou.

      Deitados na areia, a descansar da travessia do rio, Félix sorriu:

      — Terras de Portugal! – gritou Félix.

      — Terras de Portugal! – gargalhou Cintran, iniciando de imediato um concerto de gaita de foles de assobio.

      Os moços sabiam da existência de um castelo e uma pequena vila, rodeada de campos cultivados e pequenas aldeias espalhadas pela serra, dos seus passeios que davam pelos montes de Albeios e Crecente, e das conversas que ouviam, morava lá gente com prata. Félix sentia que qualquer coisa o empurrava para aquela terra, algo no seu intimo lhe dizia que aquele era o seu destino; mas o quê? porquê? Cortaram pelos campos, até encontrarem um caminho, pouco empedrado, que subia para a vila. Foi num rápido que se acharam numa praça, junto ao castelo e logo viram que a terra era bem maior do que as aldeias galegas de onde vinham. Havia gente nas ruas e comércio aberto, carros de bois a chiar com o peso da carga, movimento a que não estavam habituados.

      Com uma gargalhada, Cintran, sentenciou:

      — Este é o meu poiso.

      — E não é só o teu – atirou o Félix.

      E foi em Melgaço que fixaram poiso.

      Ao fim de dois dias na vila, já Fifi investigara os dois galegos, que uma das caras lhe era bem conhecida. Na verdade, os moços, não escondiam que queriam trabalho no ofício que conheciam, perguntando um pelas casas ricas da região, mirando a vestimenta dos homens, o outro. Respeitadores, passaram também a ser respeitados, quer pelo trato, quer por não recusarem trabalho proposto. Só as gargalhadas e assobios do Cintran ainda faziam voltar cabeças, a maior parte delas, de jovens prontas para o namorico. Chegou-se a dançar na praça, tal a qualidade do artista. Mas foi pela competência no tratamento dos animais, até aí demonstrada, que foi contratado pelo morgado da Quinta do Regueiro, para os lados de Remoães.

 

(continua)

 

O BASTARDO III

melgaçodomonteàribeira, 08.03.13

  

Félix Igrejas

 

      Dona Beatriz virou-se, com calma, sorriso no rosto:

      — E nem uma palavra!

      — Chamo-me Maria da Fonte da Vila – o rosto já sorridente.

      — Eu sei Mia, sei muito bem, quando terminares vem ter comigo lá baixo.

      Os gritos continuavam, mais pausados, criada e aia a correr com água e panos quentes e os homens na caça, uma batida a um porco bravo, que começou não muito cedo, mas empregou toda a gente da quinta. Se a caçada fosse boa, havia carne e vinho para todos, desses estavam livres.

      Pelo meio da tarde, Dona Beatriz é chamada ao quarto. O choro do recém-nascido enchia o quarto. A aia à volta de Cândida da Luz deu o lugar à sua velha patroa, que acenou à Mia e perguntou:

      — Está tudo bem?

      — Ela é forte, daqui a uma semana já anda a cavalo – acenou com a cabeça, Mia.

Não é cavalo, é carroça, e com o João vou falar eu, pensou Dona Beatriz.

      — Ouves Cândida, logo regressas a casa, do resto trato eu – rematou Dona Beatriz, saindo quarto.

      Mia, Antónia, com a criança embrulhada num xaile, seguiram-na escada abaixo. Entraram no escritório e as ordens seguiram:

      — Antónia, ficas aqui com a criança; tu, Mia, volta ao escurecer – e atirou-lhe uma bolsa para as mãos – vou ver como está a rapariga e já te mando companhia.

      Subiu as escadas e entrou no quarto, sentando-se na borda da grande cama.

      — Como te sentes minha filha? Queres uma canja de galinha, acabadinha de fazer? Tens que te pôr forte – falou com suavidade a velha dama.

      Um gemido foi a resposta

      — Ao escurecer – a voz de D. Beatriz era agora autoritária – sairá desta casa e vai para o Mosteiro de Ourense. Leva um bom enxoval e uma boa carta de apresentação. Não te preocupes que tem o futuro garantido, vai sair dali um mestre, não será um qualquer pé descalço dos campos. Mas isso agora não interessa. Vou mandar subir a aia…, não queres mesmo uma canjinha? – e acaricia os cabelos de Cândida da Luz, antes de deixar o quarto Ao entardecer uma carruagem passa os portões da quinta, dela descendo Fifi, o homem de todos os serviços de Dona Beatriz, o único em quem ela confiava para os serviços mais delicados da família.

      Entrou em casa e logo saiu, acompanhado de dois vultos negros, carregando cada um seu embrulho.

      No interior da carruagem, os vultos transformaram-se em Antónia, com o bebé ao colo e uma mocetona de farto peito, que o alimentaria durante a viagem.

      Fifi já definira a rota e as paragens a efectuar tendo em conta a presença do recém-nascido. Foi já de noite – após dois dias de viagem – que deram entrada na cidade galega, seguindo directamente para o Mosteiro de Ourense.A carruagem parou junto de uma das portas laterais do Mosteiro, envolto na escuridão da noite, e dela desceu Fifi. Puxou a corda da Roda e momentos depois abriu-se um pequeno postigo na porta, pelo qual ele entregou um envelope lacrado. O postigo fechou-se e Fifi começou a andar de um lado para o outro, que a noite estava fria, do rio Minho vinha um nevoeiro gélido. Quando o postigo se voltou a abrir, a um sinal de Fifi, as duas mulheres desceram da carruagem e depositaram os embrulhos à porta do Mosteiro. A criança e o enxoval.

      Entre missas e matinas, cresceu na fé em Deus, Félix Iglésias, nome dado pela abadessa – ou não fosse o enxoval como era. A porteira também costumava baptizar alguns, mas esses, geralmente, sem enxoval. Enquanto cantava loas a Deus, Félix, começou a ser instruído na profissão de alfaiate, logo se destacando por ser um bom aprendiz e ter método de trabalho; acarinhado pelos mestres rapidamente progrediu no ofício que lhe fora destinado. No convívio com os restantes Expostos logo se agradou de um calmeirão que aprendia o oficio de curador de animais, de nome Cintran, um vivaço, sempre alegre e com um assobio melodioso que treinava até à exaustão enquanto tratava dos cascos dos burros. Com o tempo a amizade cimentou-se de tal forma que quando deixaram a Roda dos Expostos de Ourense, completados os 18 anos, decidiram partir juntos.

      Juntos na Roda, juntos para a vida.

      Deixar a cidade e tratar de ganhar a vida com os seus ofícios, era decisão há muito tomada mas logo perceberam que só precisa de alfaiate quem tem roupa e de animais todos eles sabiam. A pobreza era tal, que iam saltando de aldeia em aldeia. Nesta eram pedreiros, na outra havia milho para apanhar, as vindimas vinham a seguir e a refeição era pobre e a paga muito minguada. Fartos de andar aos saltos, resolveram assentar por uns tempos em Santa Cristina de Valeixo.

 

(continua) 

 

O BASTARDO II

melgaçodomonteàribeira, 08.03.13

 

 

      Ensinou-a a cavalgar, levou-a a serras distantes onde o cão do lobo que guardava o rebanho lhe lambia as mãos e abanava o rabo numa critica à sua ausência, e lhe mostrava os domínios da família, à volta da velha torre de menagem, um pouco em ruínas, que atestava o bom sangue português que lhe corria nas veias.

      Cândida da Luz chegava feliz e cansada das caçadas, mas não pálida e melancólica. A doença, há muito que desaparecera e aproximava-se a data da partida. Aí, voltou novamente a doença a Cândida da Luz. João, o Dr. João, tentava tudo, até sangraduras, mas melhoras não havia.

      Um dia, Dona Beatriz, no fim do jantar, pediu a Cândida da Luz que a acompanhasse para lhe fazer um pouco de companhia. Fechada a porta do escritório, onde ninguém entrava sem autorização da velha senhora, em poucas palavras e cara zangada descobriu a doença.

      — Estás prenha minha filha!

      Depois de chorar e lamentar-se, ser consolada e animada, ouviu-se um:

      — Sim… - muito lamuriento e arrastado.

      — O João! - o nome saiu como uma chicotada em rês teimosa.

      — Sim… - voltou a lamuriar a jovem.

      — Tratamos imediatamente do casamento, o mal fica resolvido.

      Aumentou o choro de Cândida da Luz ao ouvir tais palavras.

      — Não gostas do João e ele de ti? – quase gritou a senhora.

      — Não é isso, gostamos muito…, mesmo muito… - soluçou a jovem.

      — Então por que choras? – berrou Dona Beatriz, já farte de choraminguices.

      — Estou prometida a Teodorico, filho do conde de Alviar. Estou perdida, ai Jesus Nossa Senhora, estou perdida – e os soluços enchiam o quarto

      — Não sais do teu quarto que eu vou resolver o assunto - a voz rude da dona da casa fê-la engolir os soluços e desaparecer entre os lençóis de linho.

      Após a ceia, foi deliberado por Dona Beatriz que D. Cândida da Luz apanhara uma doença contagiosa, não podia sair do quarto e só ela, a aia e Mia a podiam visitar.

      — Contigo, João, falo mais tarde – falou com voz dura a velha e rija senhora.

      Depressa partiu mensageiro para Carvalhosa a anunciar o acontecimento, mas também com garantias que não era grave mas contagiosa a doença, e… sempre havia dois médicos em casa.

      Três meses depois, recomposta e com boas cores, D. Cândida da Luz entrava em terras do conde senhor seu pai, onde era esperada pelo garboso D. Teodorico.

      Mia acordou de madrugada com os gemidos de Cândida da Luz. Era para aquele dia, disso ela tinha a certeza. Foi acordar a criada de casa, Antónia, mulher de grande saber e de toda a confiança, que rapidamente se escapuliu pela porta das traseiras ainda mal o sol raiava. Regressou passado um bocado, acompanhada de um vulto negro, pequeno e estreito, que um xaile preto encobria.

      Sem uma palavra, dirigiram-se para o quarto onde Cândida da Luz gemia cada vez mais alto. Sem o xaile, um rosto encarquilhado e escuro, mãos cumpridas e calosas, acercou-se da cama, passou-lhe suavemente a mão pela testa ao mesmo tempo que lhe fazia um sinal da cruz abençoado, pegou-lhe na mão e foi recitando uma ladainha que só ela entendia.

      Pelo fim da manhã, os gemidos já eram gritos, Dona Beatriz entrou no quarto. A aia e a criada afadigavam-se a correr do quarto para a cozinha acarretando panelas de água quente e panos fervidos.

      — Como vai isso, Mia? – perguntou a velha senhora, rosto fechado e olhar faiscante.

      Mia passou as costas da mão pela testa afastando umas ripas de cabelo que lhe encobriam a cara e sorriu:

      — Vai correr bem, senhora – disse com voz gaiata -, ela é nova e forte, daqui a nada está cá fora.

      — Tens a certeza que está bem? – insistiu Dona Beatriz - queres que chame o Dr. Zinaido para ajudar?

      O olhar de Mia chispava quando respondeu:

      — P’ra atrasar! Vossa senhoria sabe quantos estas mãos trouxeram ao mundo?

 

(continua)

 

O BASTARDO I

melgaçodomonteàribeira, 08.03.13

 

 

      Pó e solavancos; o sacrifício da dama e sua aia que seguiam na carruagem serra acima até ao pequeno e histórico lugarejo onde se quedariam por uns tempos para a dama refazer a saúde um tanto abalada pela vida aristocrática que levava em Barcelos, terra de seu nascimento.

      Cândida da Luz de seu nome, nos seus dezoito anos, ouviu sem interesse a decisão de médicos e dos seus pais que o melhor para ela era sair do grande burgo e passar uma temporada num lugar calmo e de bons ares onde, por certo, recobraria da sua palidez melancólica que a cobria como mortalha.

      O lugarejo era distante, muitas léguas a cumprir, mas tinha a vantagem de aí viver o médico D. Zinaido, amigo de longa data e linhagem fidalga, que proporcionaria tudo o que fosse necessário para o restabelecimento de Cândida.

      Como boa cristã e filha, com um simples olhar de esguelha, entreviu o seu próximo destino; um salto no desconhecido, bem longe dos risos e segredinhos que eram o dia-a-dia no palacete familiar, o cheiro bafiento das damas, primas, tias e outras que tais.

      Quando escolta e carruagem pararam no largo empedrado, D. Cândida da Luz condessa por linhagem, entreabriu as cortinas, viu-se perante casa solarenga, de boa pedra, rodeada de vinhedos e pomar, com um fundo de serras onde nos altos picos ainda restavam uns pontos do ultimo nevão.

      Desceu da carruagem, apertou a capa que o ar era frio e com um sorriso tímido apertou as mãos que lhe estendiam; finalmente o seu destino, a casa do médico D. Zinaido, que se propunha recompor a saúde abalada da futura condessa.

      Encaminhada pelas criadas que a aguardavam para o quarto que lhe fora destinado, grande, de largas janelas e uma lareira acesa que lhe reconfortou corpo e alma depois de tão penosa viagem, sorriu, o que há muito não fazia.

      Liberta de capa e rendas, um corpo formoso a condizer com a beleza do rosto, logo foi aplaudida pela criadagem, encorajada pela simpatia que irradiava. Foi de descanso a primeira tarde, à ceia seriam feitas as apresentações.

      Mais tarde foram-lhe apresentadas desculpas pela ausência de Dona Beatriz da Anunciação, mãe de D. Zinaido, e dos filhos João e Gabriel que andavam a fiscalizar o trabalho dos rendeiros nas muitas terras pertencentes à família, pelo que à ceia só estariam presentes, D. Zinaido, sua esposa D. Epifania Joaquina e ela.

      A conversa versava as maravilhas que os ares proporcionavam e o serão que seguiu à ceia foi curto que a canseira da viagem ainda não desaparecera e os bocejos, ainda que disfarçados pela jovem, não tardaram a aparecer.  O tronco de carvalho aquecia o corpo, a roupa e a cama, Morfeu ditou a sua lei e dormiu até o dia ir alto. Virar a cara para a porta e não encarar com uma criada a perguntar se a menina deseja o almoço foi uma bênção, esquecer que era uma Souza dos Souzas que estiveram sempre ao lado do filho de Henrique e seu filho Sancho, uma Ribadouro, uma Moniz e até quem diga que vai mais além, até João Peculiar metropolitano de Braga.

      O cheiro das compotas de amora silvestre, pêssego e ameixa, do leite acabado de ordenhar e do café bem forte, o frio do sol que enchia de luz a serra em frente, prepararam-na para o dia que aí vinha e ela desconhecia. Um sorriso tímido e: - vamos ver o que o destino nos reserva.

      As apresentações decorreram em conformidade com o estatuto da bela futura condessa e se ainda restava palidez no belo rosto da jovem, a melancolia, essa foi-se desvanecendo mais rapidamente.

      A vénia a Dona Beatriz foi como a manhã, radiosa, aos irmãos mais cerimoniosa. A verdade é que desde que lhes pôs o primeiro olhar sentiu-se retraída quase com vontade de fugir, só a disciplina com que foi educada o não permitiu. Logo a seguir às palavras de circunstância, a conversa e o cálice de porto, o digo eu, eu mostro, os sorrisos com mais ou menos dentes, Cândida estava rendida a estes desconhecidos.

      Gabriel, alto e pesado, era homem das terras, das tabernas e cantares ao desafio, jogo do pau na romaria da Peneda, precisão no tiro à perdiz e ao coelho com o Mosquito ou o Nero sempre por companhia O Mosquito era tudo para ele e quando o deixava de ver por dois ou três dias já sabia que a prole tinha aumentado. Vadio quando farejava cadela saída, morreu a defender o dono dum porco bravo de mais de cem quilos.

      Se num olho, Gabriel, tinha a serra, no outro tinha a ribeira. Sável e lampreia na rede, escalo e truta na cana.

      João, mais jovem, recém formado em medicina em Lisboa, cultivava a arte da galanteria própria da corte e das mais nobres casas do Reino, mas quem olhasse bem os seus olhos via reflectido o verde do seu rincão e não os lustres de salão.

      O jantar, desaparecido o cansaço, mostrou uma Cândida da Luz em toda a sua beleza e breve a timidez começou a desaparecer e a aparecerem uns pontinhos vermelhos no rosto. A comida estava óptima, o arroz doce divinal, a conversa agradável e quando o D. Zinaido lhe ofereceu um cálice de um velho vinho do Porto, sentiu-se no céu.

      João era o guia perfeito nos passeios pela quinta; mostrando-lhe o esforço dos homens que cavavam, semeavam, ensinava-lhe o nome das flores em latim e acabavam o passeio comendo fruta arrancada da árvore.

 

(continua)

 

CRIANÇAS NA RODA NO CONCELHO DE MELGAÇO

melgaçodomonteàribeira, 08.03.13

  

Srª de Lurdes

 

ACTAS DO IV CONGRESSO HISTÓRICO DE GUIMARÃES – DO ABSOLUTISMO AO LIBERALISMO

 

RITUAIS, ENCENAÇÕES E ESTRATÉGIAS FAMILIARES NO ALTO MINHO.

 

 

AS CRIANÇAS EXPOSTAS NA RODAS/HOSPÍCIOS AO LONGO DO SÉCULO XIX

 

Teodoro Afonso da Fonte (1)

 

 

    O estudo dos rituais, encenações e estratégias que aparecem associadas à exposição de crianças reveste-se de um interesse muito particular para a demografia histórica, história social e história das mentalidades. O seu conhecimento ajuda-nos a desvendar um comportamento demográfico que transitou do regime absolutista para o período liberal e atingiu a sua máxima expressão em meados do século XIX, coincidindo com o apogeu das rodas como mecanismos legais de recepção e acolhimento de crianças abandonadas.

 

………......................................

 

    Muitas das crianças expostas entravam directamente nas instituições de acolhimento, depois de expostas no mecanismo da roda e recolhidas pelas rodeiras, após terem sido avisadas da sua presença e de fazerem girar a plataforma onde haviam sido depositadas. Nalguns casos, poderiam ser os gritos das crianças expostas a alertarem a rodeira da sua presença, como aconteceu com um menino, António Oroeste, exposto na Roda de Melgaço, «sem reclamação ou chamamento da rodeira que atendeu aos choros da criança» , **. Seria uma forma de procurar preservar a identidade dos condutores, a partir dos quais se poderia chegar à família das crianças expostas.

    Estes procedimentos revelam que quem expunha as crianças se preocupava com a sua sorte, até pelo facto da generalidade delas serem deixadas em locais que permitissem a sua descoberta imediata, quando não eram entregues nas próprias instituições de acolhimento. Nestes casos, a exposição fazia-se em locais públicos ou privados, onde a presença de pessoas asseguraria a descoberta e acolhimento dessas crianças. Assim o fez o condutor de um menino que o “lançou” no interior da loja de José Maria Soares, da freguesia de S. Paio, concelho de Melgaço, pondo-se imediatamente em fuga, após o dono da casa se ter apercebido da presença da criança. Um outro condutor, que expôs uma criança à porta de Maria Luísa Pereira, da freguesia de Penso, do mesmo concelho, só abandonou o local depois de ter chamado pela “patroa” da casa, certificando-se da sua descoberta e acolhimento.

    Estes cuidados particulares não se justificariam quando os condutores fossem estranhos ao concelho onde se expunham as crianças. Neste caso, a sua entrega poderia ser realizada pessoalmente, como o fizeram dois homens que, ao passarem os Montes de Fiães, no concelho de Melgaço, encontraram Maria Joaquina Durães, residente no lugar de Sobreiro, freguesia de Cristóval, que lhe apresentaram uma menina e a obrigaram a recebê-la e a ficar com ela.

    A origem social dos expostos, as condições em que o parto se havia realizado e a existência ou não de cúmplices condicionavam as circunstâncias e as condições em que eram efectuadas as exposições, não sendo difícil o papel desempenhado pelas parteiras em todo este processo. Elas próprias se encarregariam de entregar ou mandar entregar algumas crianças nas instituições de assistência. Nalguns casos, elas próprias retiravam as crianças recém-nascidas às parturientes, sem a sua autorização, a pedido expresso dos pais ou de outros familiares, mais preocupados com a honra da família do que com a sorte das crianças ou o desespero das mães.

 

……….....................................

 

    Só em casos absolutamente excepcionais é que a exposição se realizou em locais menos frequentados, pondo em risco a vida dos inocentes. Não registámos nenhuma exposição que tivesse sido efectuada em locais completamente isolados ou de fraca acessibilidade. A terem acontecido, estes não deixariam de configurar um cenário de infanticídio. Poderia ser esse caso de quem expôs uma menina na freguesia de Cristóval, concelho de Melgaço, no dia 26 de Agosto de 1862, tendo-a deixado debaixo de uma figueira, sobre um roço de silvas, a qual foi achada na madrugada desse dia, «quasi expirando por estar chovendo e sem agasalho» ***. Todavia, o facto de estar acompanhada por um pequeno enxoval, como vinha descrito no seu registo, afasta a hipótese de se tratar de uma forma de infanticídio deliberado, antes de uma negligência grosseira de quem se encarregou de a expor. Estes crimes seriam passíveis de punição, se fossem conhecidos e identificados os seus autores.

 

……...........................................

 

     A não apresentação de mensagens escritas não significava, necessariamente, que essas crianças fossem expostas sem qualquer referência ou recomendação. Nada prova que as mesmas não tivessem sido substituídas por mensagens orais ****, transmitidas directamente às rodeiras ou às hospitaleiras.

 

    ** A.M.MG, Livro de Registo dos Expostos de Melgaço (1857-1896), fl. 55 v.º.

    ***A.M.MG, Livro de Registos dos Expostos de Melgaço (1857-1896), fl. 39 v.º.

     Esta menina estava «embrulhada em dois panos velhos de algodão que são inúteis e sem préstimo», assim como por um pequeno enxoval, constituído por uma camisa d’elefante e uma outra com as mangas sem pregar.

    ****O escrivão da Câmara de Melgaço registou a informação que os condutores de uma criança que acabavam de expor na Roda do concelho, em 31 de Outubro de 1858, se limitaram a transmitir a informação de que a criança ainda vinha sem baptismo e que se deveria chamar “Ludobina da Glória”.

 

 

(1)    Teodoro Afonso da Fonte – Doutorado em História (Demografia Histórica), Mestre em História das Populações e investigador do Núcleo de Estudos de População e Sociedade (NEPS) da Universidade do Minho.

Este trabalho aborda uma das temáticas desenvolvidas no âmbito da investigação que integrou a tese de doutoramento “No Limiar da Honra e da Pobreza. A Infância Desvalida e Abandonada no Alto Minho (1698-1924)”, defendida na Universidade do Minho, em 2004.

 

CINCO ANOS NA REDE

melgaçodomonteàribeira, 08.03.13

 

 

O TIO EMILIANO

 

  

Emiliano Augusto Igrejas, filho de Félix Igrejas e de Conceição Costa, nasceu e morreu em Melgaço.

 

   Em Melgaço, e creio que noutros concelhos, acontecia o seguinte: a Câmara Municipal tinha o direito de cobrar uma taxa sobre todas as mercadorias que entravam em seu território para comercializar. Um percentual sobre o valor atribuído aos artigos. Por não ter estrutura organizada para cobrar tal imposto, ou porque não lhe interessava, deixava-o a cargo de terceiros. É o que hoje se chama privatização. A iniciativa privada cuida melhor que a oficial até dos assuntos da colectividade.

   Acontecia então que todo o ano (aqui não tenho conhecimento do espaço tempo que envolvia a questão), de tanto em tanto tempo, a Municipalidade leiloava em hasta pública o direito de cobrar o imposto. Os interessados, após apresentarem referências de idoneidade, davam seus lances a partir dum mínimo estipulado. Ou seja: a Câmara calculava em suas receitas uma determinada importância proveniente da comercialização das mercadorias e incluía-a no seu orçamento. Os interessados disputavam entre si o direito de cobrança. Logicamente ganhava o que dava o lance maior e este, tinha que se estruturar e contar com a sorte para não ter prejuízo. Podia acontecer uma fase de decadência e o apurado ser menor que o compromisso com a Câmara. Aquela importância paga à municipalidade não sei se era feita de uma vez (creio que não) ou em prazos determinados.

   Quando eu dei conta do mundo, ou seja, daquilo que me cercava, o tio Emiliano era o arrematante do imposto. Assim o povo o designava. Durante alguns anos manteve essa actividade que lhe garantiu alguns bens com aspecto de fortuna. Eu me lembro, ao ir deitar a tia Ana recomendava: reza para que o teu tio continue a ser o arrematante. Lógico que aquilo era algo fabuloso na minha cabeça, garoto de sete ou oito anos e, por conta própria, na oração eu incluía o meu pai pedindo: « Senhor deixai que o meu pai seja uma vez arrematante do imposto e depois sempre o tio Emiliano ».

   Nos anos trinta, com a convulsão espanhola, Melgaço transformou-se num grande entreposto. Ovos e galinhas, principalmente, e todos os géneros alimentícios passavam em caminhões. Tudo isso pagava imposto, além das mercadorias para o comércio local. O tio Emiliano tinha contratado, como ajudantes permanentes, o António Araújo, de Galvão, conhecido como o Toca ou o Nossa Senhora, e o sobrinho, Artur Garcia, o Pianho. Este, o Pianho, acabou por se aborrecer com o tio, ou vice-versa, e foi trabalhar para o arrematante do concelho dos Arcos. Aqui cabe um facto pitoresco que escutei da boca do velho Pires, o Papá Pires, que na altura era amigo e sócio do tio Emiliano em empreendimentos outros; contava que o Toca enchia os ouvidos do tio Emiliano contra o Pianho. Que este fazia, desfazia, acontecia, negligenciava e até roubava. O Emiliano comentava com o Pires: – O Pianho pode ser tudo isso mas apresenta sempre maior receita que o Toca…

   No lugar do Pianho entrou outro sobrinho: o teu tio Tostas. Em Penso, entrada do concelho, mantinha o Emiliano um posto permanente, 24 horas por dia, onde os ajudantes se revesavam. Camião ou camioneta, carroça, carro de bois, era vistoriado e as mercadorias transportadas sujeitas a taxação eram anotadas e posteriormente cobrado o imposto do destinatário.

   Ainda me lembro, às noites, os ajudantes prestavam contas do movimento do dia. Do seu rascunho mal amanhado ditavam ao tio Emiliano que passava a limpo num caderno especial: um saco de arroz e um fardo de bacalhau para o Hilário; um saco de café cru para o Pereira; uma seira de figos para o Antenor; três esteiras de pregos para o Manuel Castro; duas peças de pano para a Carneira… 

    O imposto das mercadorias destinadas a comerciantes não estabelecidos era pago na portagem. Os sobrinhos, todos, que frequentavam a casa do tio Emiliano apreciavam estas coisas e aproveitavam para fazer chacota. O Tostas tinha uma letra horrível, indecifrável. Às vezes, em vez de ditar deixava a lista para o tio transcrever. Quem era capaz de entender o que estava escrito? O meu irmão Augusto, humorista que só ele, aproveitava para fazer pilhéria com o Tostas, lendo à sua maneira os rabiscos.

   Nessa fase de vacas gordas em Melgaço, as feiras semanais, aos sábados, as Festas e Romarias, regurgitavam de gente. Para cobrar o imposto de tendeiros, vendedores avulsos dos artigos de suas colheitas (lavradores), galinhas, legumes, hortaliças, peixes e doces, valia-se o Emiliano de ajudantes ad-hoc, escalados entre os sobrinhos e vizinhos. Dando uns talõezinhos, rosa, amarelo, azul, conforme o valor, os cobradores recebiam das doceiras, dois tostões por cada cesto de roscas; cinco tostões por cada cabaz de sardinhas, chirelos, carapaus (legionários), etc.; dez tostões por cada pipote de vinho vendido a retalho. (Estes valores são arbitrários, não tenho as importâncias certas, só sei que era na base de tostões.) Nessa época havia fartura. O « Bota p’ra Mula »  teve dias de vender cinquenta sardinhas por uma coroa (cinco tostões). « Bota p’ra Mula » era o nome por que se popularizou um cidadão que na Povoa do Varzim, Viana e outros portos pesqueiros, enchia um camião de sardinhas e ia vendendo pelo trajecto ou ia directo a Melgaço. As ajudantes que iam na carroceria juntas com o peixe, gritavam, anunciando a mercadoria: « Olha a sardinha fresquinha, freguesa, vinte e cinco à coroa. Aproveita! Bota p’ra mula! » Botar para a mula era encher a barriga. No final dos anos quarenta uma sardinha custava um escudo, e o povo continuava a ganhar a mesma coisa.

   Voltando ao imposto: após aquele acontecimento que narro em « Os Pintarroxos » –  publicado aqui no blog em 27/06/2009 tags igrejas, a Voz de Melgaço –, a Câmara não mais leiloou o imposto. Passou a administrá-lo directamente ficando como cobradores os mesmos, Toca e Tostas, agora como funcionários municipais.

   Voltando ao tio Emiliano, eu disse que estava tudo dito mas esqueci este detalhe: após aquele baque que narro em « Os Pintarroxos », a rasteira que a Câmara na pessoa do dr. João Durães lhe passou, ficou perturbado mentalmente. Desde então passou a ter atitudes desconexas. Aquele bilhete ao teu pai, de que me enviaste fotocópia, é bem a prova disso. Eu me lembro de outras atitudes parecidas, sem lógica. Ora, sendo tio com ascendência e autoridade desde criança, aquele tratamento não tem explicação a não ser a dita perturbação.

 

Rio, 31 de Março de 1996

 

Correspondência entre Manuel e Ilídio

 

CONTRIBUTO PARA A HISTÓRIA DO CONTRABANDO-2

melgaçodomonteàribeira, 08.03.13

 

Cela – Galiza


Las vacas no saben, no responden

 

Los riesgos de los contrabandistas no son muy abultados, pese a que ahora planee un posible riesgo de cárcel por tales actividades, amén de la multa económica. Pero el planeo es suave. De cuando en cuando, las fuerzas de orden público cogen algún camión y le imponen una multa no excesiva. En alguna ocasión, se decomisa el ganado que luego es sacado en Vigo a pública subasta..., cuya puja -a la baja- la hacen los proprios contrabandistas, sin que nadie –salvo elles- ose pujar.

 

Para el último salto de la frontera sobre el río Trancoso los contrabandistas, tanto españoles como lusitanos, tienen sus medios de comunicación. Si tal ventana está abierta por el día, o iluminada por la noche, en tina casa determinada del pueblo de enfrente, se sabe que el camino está libre y se puede proceder al trasvase. Si es de noche, en lotes grandes. Si es de día, de dos en dos o de tres en tres.

 

Dado como es la zona, hay españoles que tienen terras y prados en Portugal y lusitanos que tienen tierra en España, y ambos permisos para que eqúis número de cabezas puedan pasar la raya, para pastar en el país vecino. Lo que sucede es que sí un labriego tiene un guía o permiso para cinco o cuatro vacas y las pasa tranquilamente al otro lado de la raya quien sabe si cada día esas cuatro o cinco vacas son las mismas que las del día anterior? Las vacas no saben, no contestan. “Todo”, nos comunica S. F. R., “tiene que ser muy bien programado. Porque, por ejemplo, si tenemos que tener detenidos en las cuadras a cien mamones durante tres días, que sólo pueden ser alimentados con leche, es una ruina. Igual que tener estabuladas tres docenas de vacas a base de pienso...”. “De cualquier forma”, declara R. R. C., “no hay demasiadas complicaciones: algunas multas y, más recientemente, que se nos acusa a algunos de evasión de capitales, pues pagamos, por ejemplo, los terneros en Portugal”. (Al parecer en un café de la plaza principal del pueblecito de Melgaço de nombre La Estrela). En los días, presentes –inicios de 1983-, el paso del ganado solo se hace dos días a la semana: miércoles y jueves.

 

 

Lo nuestro es un trabajo

 

 Cuando el miércoles a primera hora de la mañana llegamos a uno de los puntos del contrabando y pase de ganado ya hay un camión, matrícula de Lugo LU-310 (otro número y otra letra), que va a descargar se mercancía. Ante nuestra presencia no se deciden. Optamos por presentarnos a cara descubierta y decirles: somos de EL PAÍS y venimos a hacer este reportaje. Quedan suspensos. Para convencerles, tenemos que contarles secretos de ese contrabando, contraseñas, cifras, etcétera. Optan,, al fin, por proceder a descargar a una decena de vacas, pero se niegan a que hagamos fotos pasando el puente de madera camiño de Adedela. Encierran las vacas en un establo.

 

Bajamos luego hasta la frontera y tras pasar por Melgaço subimos hacia Adedela (que está situada frente por frente de Cela, cási dándose la mano). Alli podemos fotografiar el paso de las vacas por una anciana que nos confiesa sin rubor su misión.

 

“Si se abre la frontera entre España e Portugal nos hundiremos en la miseria”, confiesa un portugués de ochenta años que tropezamos en Cela. “Aqui desde siempre hemos vivido -malvivido- gracias al contrabando”.

 

Comemos en Portugal y, a la vuelta, nuestra sorpresa es grande cuando vemos a el Rápido e otros seis o siete: contrabandistas tomando café y orujo en el café situado -en la parte española- entre el edificio de la Policía Nacional y el de la Guardia Civil. Se empeñan, en invitarnos a café y orujo. Y al jefecillo, ya varias veces nombrado, el Rápido, se le suelta  la lengua y nos narra su vida.

 

Trasiego de ganado

 

Tiene ahora sólo veinticinco años. A los catorce se fue a Suiza. Regresó a los diechiocho y se ineció en esto de contrabandear poco después: “Antes a mí me mandaban muchos, pero ahora casi todos los que me mandaban están a mis órdenes”, dice sin disimular un ciérto orgullo. Pequeño de estatura, enjuto, tiene un aire casi agitanado. Nos abandona en plena conversación y sale al exterior. Enfrente, junto a la gasolinera, para un jeep, con cuyo conductor habla. El conductor, que bien aparenta ser el capo, charla sin parar. Pasa el tiempo. Optamos por volver al pequeño pueblo de Cela, cuando la luz invernal empieza a declinar y más entre estas abruptas montañas. Volvemos a ver un camión con matricula de Santander que, por lo menos, es hoy a tercera vez que sube cargado de ganado.

 

De pronto, nos adelanta el jeep, y trás él se sitúa un viejo Seat 600 blanco, matrícula de Madrid M 549.24... (y otro número) que conduce el Rápido. Poco antes de Cela nos cierran el paso. El del jeep hace como si se le hubiera averiado el coche y no podemos pasar porque la carretera es tan estrecha que pueste un coche en mitad de la calzada es imposible pasar y menos con un automóvil ancho como el que llevamos.

 

Recurro a todo mi conocimiento de palabrotas en portugués (gallego no sé) para hacer entender – que no vamos a tolerar este atropello. El del jeep, alto, forte, bien trajeado, bigotudo, con coche matrícula de Orense OR-031... (y otro número y letra final), dice que reclamemos a la Guardia Civil. Le contestamos que lo haremos sin duda si no dejan paso franco.

 

El Rápido contemporiza: “Pero si ya esta mañana habéis echo fotos, para qué queréis sacar más? Estais jugando con nuestro medio de vida”. Por fin dejam paso. Legamos ao pueblocito y el camión no ha sido aún descargado. Optamos por no envenenar más el tema. En realidad, ya está todo hecho. Ahora invitamos nosotros, y no sacamos más fotografias. No hacen falta. Les perguntamos que adónde llevan a los terneros que traen de Portugal.

 

 

Los millonarios

 

“De preferencia a Cataluña y Aragón, aunque también servimos a Asturias y Santander”. “Vais contra nosotros”, insisten, y remachan: “Ninguno de nosotros se hace millonario. Acaso personas que no conocemos e programan todo. Nosotros sólo somos meros intermediarios y sacamos para vivir mejor o peor, e mais nada”. Lo cierto es que tienen razón. La raya de Portugal, la maldita raya de Portugal es la región de toda Europa más extensa, pobre y despoblada, semillero de emigrantes, olvidada por los Gobiernos de Madrid y Lisboa, que siguen haciendo una política interpeninsular que en la frontera es de darse la espalda, “de costas voltadas”, que dicen los lusitanos.

 

 

La tela de araña

 

Es terrible, pero es completamente cierto que si no hubiera sido, y sea hoy, por el contrabando de cualquier clase (excepto, y esto es importante, por el de la droga que sigue la línea de Gibraltar y su campo), la supervivencia de los habitantes de una y otra parte de la raya de Portugal, que se estiende a lo largo de 1.231 kilómetros de frontera, sería imposible. Por supuesto, son los habitantes fronterizos quien menos se benefician del tema. Los grandes ganadores son los capos, algunos de cuyos nombres se conocen, pero que es imposible darlos aquí, pues carecemos de pruebas materiales para hacer tales acusaciones. De qué serviría que a un señor que nos enseñó imprudentemente los albaranes de su comercio ilegal de vacas y terneros con Portugal lo sacáramos a la luz pública, si él es sólo un pez pequeño en el entramado de la tela de araña?

 

La realidad es que, sea el caso del tabaco del ganado de la leche, del café, de los muebles o las vajillas, etecétera, nadie hasta ahora ha querido entrar a saco en el espinoso tema, que es controlado por un número pequeño de personas. Este contrabando es, pues, una especie de picaresca ibérica más, que representa una gota de agua en el océano de las fugas de capitales, que se dan en España.

 

A uno, sin nostalgia, al contemplar la pobreza del acogedor pueblo portugués (y del no menos povo galego) se le vienen a la memoria las tristezas de este pueblo y aquelles versos del Pessoa que recitaba: “Ay, mar salgado (salado), cuanta de tu sal, son lágrimas de Portugal”. Como hermanos siameses unidos por la espalda, encadenados el uno al otro sin posiblidad de vivir dándonos la cara.

 

EL PAÍS

Domingo, 23 de enero de 1983

 

http://elpais.com/diario/1983/01/23/economia/412124402_850215.html

 

CONTRIBUTO PARA A HISTÓRIA DO CONTRABANDO

melgaçodomonteàribeira, 08.03.13

 

Nos montes de Fiães

 

 

GANADO DE CONTRABANDO EN LA FRONTERA

 

HISPANO-PORTUGUESA

 

 

Unas 78.000 cabezas de ganado vacuno pasan ilegalmente al año

 

por un solo punto de la raya divisoria

 

 

Eduardo Barrenechea, / Orense/ 23 ENE 1983

 

 

Cerca de 80.000 cabezas de ganado vacuno – en vivo – son trasvasadas anualmente entre España y Portugal al cabo del año. Ello representa un valor no inferior a los 4.000 o 5.000 millones de pesetas, y eso considerando que hemos tenido en cuenta un solo punto de la frontera hispano-lusitana en tierras de Orense. Es un contrabando menos espectacular y conocido que, por ejemplo, el del tabaco rubio – del que se han escrito ya multitud de reportajes –, pero su montante económico es superior. Por otra parte, es un contrabando exclusivamente peninsular, mientras el del Winston procede y pertenece a redes internacionales.

 

ENVIADO ESPECIAL, “Ahora”, nos dice R. R. C., “venimos a pasar unos mil terneros mamones de Portugal a España y llevamos allí entre 250 a 300 vacas, en su mayor parte viejas o enfermas de tuberculosis”. Es decir, se trasvasan de España a Portugal, y viceversa, unas 78.000 cabezas de vacuno en vivo al cabo del año, lo cual representa un valor aproximado y nunca inferior a los 4.000 o 5.000 millones de pesetas anuales. “Nos habían indicado que este tipo de contrabando había casi desaparecido...”. “Al revés. Allá por octubre de 1980 – cuando le conoci a usted – se pasavan unas 30.000 cabezas de ganado, casi en exclusiva viejo o enfermo y sólo de España hacia Portugal. Ahora, ya le digo, cuando se pasa con la peculiaridad de que – al igual que sucedió trás la revolución de los claveles lusitana – se ha incrementado terriblemente el contrabando de terneros portugueses a España.”

 

Se calcula que, por ejemplo, cada año entra pelas rias gallegas tabaco rubio por valor de unos 4.000 millones de pesetas, y que el fisco deja de ingresar casi 2.000 millones de pesetas por este concepto. Asimismo, una cantidad casi imposible de evaluar corresponde a la entrada fraudulenta en España de aparatos de radio, vídeos, magnetofones, etecétera. Y ello, sin contar la compra del fin de semana que los gallegos hacen en las localidades lusitanas de Viana do Castelo e alrededores, cargándose de leche, mantelerías, etcétera, asi como del encargo de muebles artesanos. La cuestión llega a los extremos de que uno encarga una vajilla, una radio, una televisión en Viana o otros pueblos y, a la semana, ese artículo le es llevado al cliente español a su domicilio sin previo pago o señal alguna.

 

Este és el tripede en que se asienta en la actualidad el floreciente contrabando galaico-portugués tras una década (1965-1975) en la que la alegría del desarollo económico a escala mundial parecía haber arrumbado al recuerdo histórico aquellos años célebres en que se traficó con el wolframio, las piedras de mechero, las medias de cristal y el célebre café Jeito en Portugal.

 

Aún restan algunas ancianas en perdidas aldeas orensanas, zamoranas y salmantinas, con la cadera deformada como fruto de transportar aquellos pesados fardos de hasta cincuenta kilos de café de peso conteniendo Sical o Jarruco, calidades de café en grano más apreciadas por los españoles.

 

“Trás la guerra civil” – me cuenta en la localidad portuguesa de Adedela un viejo contrabandiata ya retirado, Zé Francisco (o al menos así dijo se llamaba) – “hacíamos contrabando de gallinas y huevos. Nos daban una peseta por gallina que llevábamos hasta España” (que está situada a menos de trecientos metros de donde estábamos conversando).

 

El 25 de Abril

 

Tras la revolución del 25 de Abril de 1974, para los contrabandistas de la raya de Portugal se inició un nuevo periplo. Gente avispada aprovechó en Portugal el acceso al poder de las izquierdas y el gran predicamento comunista de los mandos militares de entonces para unir sus voces plañideras a la de los padres del norte lusitano, caracterizados por su reaccionárismo, y propalar que con la llegada de los comunistas poco menos que todo iba a ser comunal y repartido, desde los terneros a las mujeres... Y los campesiños minhotos (del Minho) se asustaron. Pronto aparecieron unos personajes que compraban a bajo precio los terneros lusitanos que luego pasaban clandestinamente la frontera para venderse en España. A partir de 1977 fueron las vacas españolas las que hacian preferentemente el camiño hacia Portugal. Y ahora, desde hace año y medio aproximadamente, han sido los terneros portugueses los que han vuelto a pasar clandestinamente la frontera.

 

“Por qué?”

 

“Mui simple”, indica J. C., “los portugueses son pobres y tienen que vender lo poco de rico que tienen, los terneros, y no tienen más remedio que aceptar el ganado viejo, en muchas ocasiones enfermo (lo que no quiere decir que no pueda consumirse en absoluto) que les enviamos. Ellos no pueden permitirse el lujo de comer carne de vitela (ternera)”.

 

Los ‘portillos’ del contrabando

 

Al parecer, ay diversos puntos o portillos clandestinos por los que se pasa o se trae el ganado entre España y Portugal. Algunos señalan que Verín es el punto principal. En realidad, son las provincias de Zamora y Orense donde se centra este tipo de contrabando por no menos de cinco o seis puntos. “No sé por qué tienen ustedes que venir a incomodarnos a nosotros”, nos decía un personaje apodado el Rapido. “Hay otros puntos más importantes. Ustedes van contra nosotros”, y lo único que hacemos es trabajar como ustedes”. “Por qué no escriben sobre los emigrantes clandestinos portugueses que trabajan en toda la raya fronteiriza? Por qué no hablan de que hay todavía nenos, que no tienen escuela ni sus aldeas luz, carreteras, teléfono?”.

 

Lo cierto y verdad es que además de por Verín acaso el punto más importante del contrabando de vacas y terneros se haga por una decena o menos de kilómetros que van desde el puesto fronteirizo hispano-portugués de Puente Barjas-San Gregorio. En concreto, el tráfico se realiza de manera preferente entre el pueblo de Cela y el portugués de Adedela, que corresponden a los municipios de Padrenda, el español, y de Melgaço, en Portugal.

 

Vacas y toros son comprados en España no sólo en terras gallegas, sino en Léon, Salamaca, Zamora, etcétera, e llevados en camiones hasta localidades proximas (Celanova, La Merca, etcétera) y esos camiones van avalados legalmente por unas guías. Desde estes puntos intermedios se acerca el ganado hasta lugares fronteirizos, donde es metido en currales y alimentado con pienso hasta la hora de un trasvase definitivo a Adedela, donde otros camiones lo reparten luego por mataderos clandestinos de Portugal. Los intermediarios de los pueblos cobran unas 3.000 pesetas por vaca y 10.000 por toro, y los encargados de hacerles saltar la frontera (en general rapaces y mujerucas) cuebran quinientas pesetas por vaca y mil por toro, más o menos. El paso es mui fácil. Entre España y Portugal sólo hay el denominado río Trancoso, que no pasa de ser un simple regato de un metro o metro y medio de ancho e sin calado. Además se cuenta con tres o cuatro puentes de madera.

 

El tema es en si bastante grosero y soprende la escasa vigilancia sobre él. Es vox populi, igual que los nombres de los que lo manejan. Bastaría que las autoridades correspondientes se dieran cuenta – lo que no parece entrañe demasiadas dificultades – de que los miles de kilos de carne en vivo que llegan a lugares como Celanova, La Merca, etcétara – semana tras semana –, es totalmente imposible que sean consumidos por los escasos habitantes de estos núcleos rurales. Tocarían a un consumo por cabeza semanal de miles e miles de kilos de carne.

 

(Continua)

 

REVOLTA POPULAR EM MELGAÇO - 2

melgaçodomonteàribeira, 08.03.13

 

 

   Quando não devia já tratar-se senão de se restituírem todos a suas casas, a intriga e a discórdia, inimigos implacáveis da humanidade, que raras vezes podem separar-se destes ajuntamentos tumultuários, principiaram a derramar os seus venenos sobre gentes que não se tinham ajuntado senão para o justo fim de defenderem os direitos do Soberano, a religião e a pátria. Um paisano insolente, ostentando valentias, quando a ideia do perigo se tinha desvanecida, incita os povos para que marchem mais adiante e se façam fortes, enquanto o Capitão mor lhes ordenava prudentemente que se retirassem, prevenindo as desordens que o ajuntamento poderia produzir. O paisano, inculcando patriotismo e valor, chegou a meter as mãos a duas pistolas contra o Capitão mor; mas felizmente o seu orgulho ficou confundido às mãos de outro paisano honrado, que, no meio da sua justa cólera, não pôde conter o transporte de pegar no insolente e o pisar aos pés.

   Sufocado este primeiro sintoma vertiginoso, outro se levanta, que ia tomando um aspecto mais sério. Matias de Sousa e Castro, militar distinto com o posto de Tenente no desorganizado regimento de Valença, correu com os outros ao rebate de uma quinta onde se achava; e vendo arvorada na vila a bandeira encarnada, em sina de guerra, quis persuadir ao Juiz de Fora que a mandasse arrear, não por traição ou fraqueza, pois pelo contrário foi um dos mais activos em dar as previdências de defesa, mas sinceramente porque, dizia ele, a bandeira não aumentava nem diminuía as forças e recursos, e vendo-a, os franceses se irritariam e passariam tudo à espada. O Juiz de Fora não anuiu à proposta, mas houve quem fosse espalhar a voz entre o povo, ainda congregado, que ele tinha feito arrear a bandeira, e foi o mesmo que lançar uma faísca sobre pólvora. Levantou-se um tumulto em que ficou desde logo decretada a morte do Juiz de Fora; e para executarem este projecto, alguns dos amotinados se encaminharam para a vila; pararam e ficaram tranquilos, à vista da bandeira, que existia arvorada como dantes. Soube-se depois o conselho que o militar havia dado, e voltaram-se contra este, que, avisado a tempo, pôde a muito custo salvar a vida nos pés do seu cavalo.

   Por esse tempo recebeu o Juiz de Fora uma daquelas furiosas cartas que Lagarde tinha escrito aos ministros territoriais por ocasião dos movimentos do Porto; ele não a publicou, mostrando-a somente a algumas pessoas da sua confiança, e continuando sempre a animar os progressos da revolução. Como os povos se viam sem tropas, sem armas e sem munições, recorreram ao Bispo e à Junta de Ourense, e não foi debalde, porque das tropas que ali comandava o Marquês de Valadares, se destacaram logo alguns corpos para Milmanda e Celanova, prontos a entrarem em território português em caso de precisão.

 

(Fonte: José Accursio das Neves, História Geral da Invasão dos Francezes em Portugal, e da Restauração deste Reino – Tomo III, Lisboa, Officina de Simão Thadeo Ferreira, 1811, pp. 126-135).

 

 

(Nota original de Acúrsio das Neves) Como nenhum dos escritos que a imprensa tem publicado faz menção destes sucessos de Melgaço, ficando confundidos no quadro da revolução pela distância e pequenez do seu teatro, instruirei os meus leitores dos documentos por onde eles se me fizeram constantes. Além de outras memórias que me foram transmitidas por canais verídicos, tenho em meu poder (uma) certidão de um termo em que se referem sumariamente os ditos sucessos do dia 9, lançado a folha 197 do livro do registo da Câmara daquela vila, que teve princípio em 15 de Março de 1803, e é sobrescrita a certidão pelo respectivo escrivão Joaquim Daniel Torres Salgado. Consta-me que existira outro termo, em que se referiam com mais extensão estes sucessos, mas que fora rasgado quando se aproximaram a Melgaço as tropas do Marechal Soult na 2ª invasão. Tenho mais uma atestação do mesmo escrivão, outra do próprio Caetano José de Abreu Soares, e outra da mesma Câmara, que conferem nos factos essenciais; e finalmente a cópia de um requerimento apresentado à Câmara por um particular, para ela o representasse  aos Governadores do Reino, a fim de se restituir a Melgaço a primazia da Restauração, que se queixava estar-lhe usurpada nos papéis públicos por outras terras do reino, no qual se faz uma miúda exposição dos factos, e se acham um acórdão do teor seguinte: Acórdão em Câmara, que visto serem verdadeiros os recontados factos, que atestamos, se registe este requerimento e se remeta. Melgaço, em Câmara de 4 de Outubro 1808. Com quatro assinaturas.

 

Retirado de: AS INVASÕES FRANCESAS

                     (Episódios e Documentos da Guerra Peninsular)

 

http://asinvasoesfrancesas.blogspot.com/2011/06/aclamacao-do-principe-regente-em.html

 

REVOLTA POPULAR EM MELGAÇO

melgaçodomonteàribeira, 08.03.13

 

 

ACLAMAÇÃO DO PRÍNCIPE REGENTE EM MELGAÇO E CONSEQUENTES

 

DISPOSIÇÕES

 

(9 DE JUNHO DE 1808)

 

   Naquela parte da província do Minho onde o rio deste nome, descendo da Galiza, entra em terras de Portugal, terminam estas num ângulo o mais setentrional do reino, e é aqui que está situada a vila de Melgaço, pequena e pouco considerável em si mesma, que, porém, deve ficar memorável na história. É em Melgaço que prendeu o fogo sagrado em 9 de Junho, para não mais se extinguir, nem mesmo na segunda invasão dos franceses debaixo do comando do Marechal Soult: ficou livre o recanto desta vila e seus contornos da nova corrente assoladora que se espalhou por todo o resto da província e abrangeu uma grande parte da Beira Alta e Trás-os-Montes. Feliz terra! Queira o céu conservar-te o brasão de nunca mais receberes as leis do usurpador, desde que naquele fausto dia abjuraste intrépida o seu nome odioso!

   D. António Maria Mosqueira de Lira, provinciano ilustre do reino da Galiza, e aparentado com alguns grandes de Espanha, apresentou-se em Melgaço em casa do seu cunhado Caetano José de Abreu Soares, e anunciando secretamente ao Corregedor, que servia de Juiz de Fora, Filipe António de Freitas Machado, aí veio este, e tiveram uma conferência. A este tempo concorreu também António de Castro Sousa Meneses Sarmento, descendente ilustre pela linha de primogenitura dos antigos Castros de Melgaço, o qual, tendo servido condignamente o Soberano e a pátria na carreira da magistratura, se achava então retirado em sua casa; do que todos conferiram e trataram, resultou ficar decidida a aclamação.

   Mosqueira tinha vindo prevenido com pouca gente armada, que deixara a pouca distância, e a fez logo entrar. Vieram também incorporados o Corregedor de Milmanda, o Abade de Esteriz e outras pessoas distintas da Galiza; e sendo dia de feira em Melgaço, e por isso de um numeroso concurso, os portugueses se unem aos espanhóis, e em presença do Juiz de Fora, que os observava no próprio campo da feira, soltam alegres vivas ao Príncipe Regente e detestações violentas contra Napoleão e seus delegados. Imediata ao campo da feira está a porta da vila, sobre a qual se achavam cobertas as Armas Reais; o povo as descobre num momento; passa depois a fazer o mesmo às casas da Câmara e da fonte da vila; e para que a obra não ficasse imperfeita, o Corregedor de Milmanda com uma partida dos seus foi também descobrir as fontes de S. João da Orada, que ficavam a alguma distância. Tomás José Gomes de Abreu, Jacinto Manuel da Rocha Pinto, o Capitão mor João António de Abreu e o Doutor Miguel Caetano foram dos primeiros, e mais activos, que trabalharam nesta empresa, mas tiveram muitos outros companheiros que mostraram o maior patriotismo.

   Não contentes os habitantes de Melgaço com o que haviam praticado dentro dos muros e nos subúrbios desta vila, eles quiseram levar a revolução aos povos vizinhos. Com efeito, num dos dias seguintes eles foram aclamar o nosso legítimo Soberano e descobrir as Armas Reais na Ponte do Mouro, termo de Monção, tendo na sua passagem praticado o mesmo no concelho de Valadares.

   Determinou-se para o dia 10 a inauguração solene do estandarte nacional em Melgaço. O da Câmara foi arvorado no revelim do castelo, por entre novos vivas e aclamações, e com repetidas salvas e toques de sinos, antes e depois do Te Deum e sermão que se celebraram nesse mesmo dia; e como eram necessários dois estandartes, para não haver falta nas acções da Câmara, o Juiz de Fora convocou os alfaiates da terra para fazerem um novo, como realmente fizeram numa manhã, e não se afastou deles enquanto o não concluíram. Estas pequenas circunstâncias, que parecem pequenas a quem as lê a sangue frio, são as que melhor manifestam na efervescência dos espíritos os verdadeiros sentimentos que existem nos corações, a fidelidade e o entusiasmo dos que as praticam.

   Até aqui era tudo alegria, mas dois dias depois houve uma terrível comoção, causada pela falsa notícia de que um exército francês havia desembarcada nas costas da Galiza, e tinha já um corpo de tropas em Caniça, povoação fronteira a Melgaço, para entrar nesta vila pela raia seca. A crise era terrível, porque achando-se estes povos absolutamente indefesos, não se lhes oferecia senão a alternativa de se humilharem ou resistirem; e em ambos os casos era muito arriscada a sua sorte: eles escolheram, sem hesitar, o mais heróico. Todos se puseram em movimento à voz dos sinos, e correram para a parte onde se esperava o inimigo com duas peças de artilharia, as únicas que havia montadas, até ao sitio da ponte das várzeas, onde residia o Capitão mor. Quando chegou o ajuntamento, já este sabia por um portador, que tinha mandado a Galiza, que tudo por lá se encontrava tranquilo, não havendo nem o mais leve rumor de inimigos por aquele lado.

 

(continua)


MELGAÇO, CONFLITOS E ÁGUA DE REGA

melgaçodomonteàribeira, 08.03.13

 

 

O AUTOR:

 

 

Fabienne Wateau nasceu em 1965 em Neuville-sur-Oise, nos arredores de Paris. Após dois anos em Sociologia, na Sorbone, continua na Universidade de Nanterre onde se forma em Antropologia, que passa a ensinar, e torna-se membro do Laboratoire d’Ethnologie et de Sociologie Comparative.

Em França, Fabienne Wateau realizou vários trabalhos de campo, designadamente um estudo sobre o mundo fluvial e o modo de vida dos marinheiros, artesãos transportadores de mercadorias pesadas por via fluvial. Em Portugal, dedica-se, desde 1989, ao conflituoso assunto da gestão da água de rega num concelho do Alto Minho – objecto da sua tese de doutoramento revista e aqui apresentada em livro –, trabalhando actualmente em outras regiões do país.

Interessa-se por temas tão diversos como a tecnologia, o económico, o parentesco, os valores e representações dando uma atenção particular às identidades e ideologias actuantes em situações de contacto e de conflito.

Entre 1997 e 1999 esteve ligada à Casa de Velázquez em Madrid, na qualidade de investigadora prosseguindo pesquisas em arquivos e no terreno, na Península Ibérica.

 

 

AGRADECIMENTOS

 

Este livro, uma versão revista da minha tese de doutoramento em Etnologia defendida na Universidade de Nanterre em 1996, deve-se, desde as primeiras hipóteses de trabalho e estadias no terreno até à sua redacção final, a uma multitude de pessoas, amigos, colegas e instituições, as quais me acompanharam e apoiaram ao longo dos anos.

As ajudas financeiras concedidas pelo Ministère de la Recherce et de la Technologie (desde Setembro de 1989 até Agosto de 1991 e em Setembro de 1993), pela Embaixada da França em Portugal e pela Junta Nacional de Investigação Científica e Tecnológica (em Julho de 1993), permitiram-me continuadas e repetidas estadias no terreno, indispensáveis e preciosas, que constituem a base em que assenta a maior parte deste trabalho. Efectiva ou temporária, a minha ligação a várias equipas de investigação como as do Laboratoire d’Ethnologie et de Sociologie Comparative de Nanterre (Equipas nº 4 e nº 5), do Laboratoire de Géographie Rurale de l’Université de Paul Valéry de Montpellier, bem como às equipas do Groupe de Gestion Social de l’Eau (CNEARC, Montpellier) e do Group Anthropologie du Portugal (Maison des Scienses de l’Homme, Paris) proporcionou-me muitas vezes, ao longo da investigação, um fecundo e estimulante espaço de intercâmbio.

Agradeço também a Brian O’Neill e a Armandino dos Santos os convites para participar nos seus seminários, respectivamente no ISCTE e na Universidade Nova, em 1990 e 1991.

A orientação geral deste trabalho deve muito a Michel Drain. Ao convidar-me a focalizar a atenção na natureza dos conflitos criados à volta da água no Mediterrâneo (no seio da qual tive oportunidade de apresentar e publicar, por várias vezes, a minha investigação em curso), sem dúvida alguma contribuiu para estimular a minha própria investigação, abrindo-a a outras problemáticas, a outras disciplinas e a outras escalas. Um agradecimento para ele.

Agradeço igualmente a George Augustins, meu orientador de tese, pelo seu acompanhamento regular a partir da licence, pela sua sensibilidade e flexibilidade na direcção deste trabalho, e pelos seus bons conselhos. Quero agradecer a Eric de Dampierre, em parte responsável pela formação recebida e adquirida no Département d’Ethnologie de Nanterre e, na Sorbonne, a François René Picon cuja força e alcance dos ensinamentos, enquanto eu me iniciava na disciplina, acabaram incontestavelmente por confirmar a minha paixão ainda nascente pela Antropologia. Obrigada, também, a François Manente por me ter incentivado e apoiado.

Em Lisboa, agradeço muito particularmente a Joaquim Pais de Brito o seu estímulo intelectual, e ter-me permitido publicar este livro em português, na sua muito bela colecção Portugal de Perto; agradeço a Graça Índias Cordeiro a sua reconfortante amizade e a minuciosa leitura das provas em português deste livro; a Benjamim Enes Pereira pela ajuda na escolha e composição das fotografias. Em Viana do Castelo, agradeço a José da Silva Lima que, no início da investigação, me passeou de carro pelo Minho à procura de um sítio para ficar.

No terreno, em Melgaço, muitos foram os interlocutores a quem deveria agradecer. Ao verem-me calcorrear os caminhos e os campos do concelho durante vários anos, muitas vezes me convidaram a beber um copo e a descansar à sombra das vinhas de enforcado, quando o calor se tornava sufocante. A todas as pessoas que encontrei no terreno, aqui exprimo a minha calorosa gratidão. Os meus agradecimentos mais particulares vão para Augusto Manuel Gonçalves Durães, guarda-rios, que me deu informações preciosas sobre a rega e as relações de parentesco existentes entre os beneficiários de água; para o Padre Justino de Prado que pôs à minha disposição os registos paroquiais; para os dois presidentes de Junta de Freguesia, José Pinto, de Chaviães, e Rui carvalho, de Remoães, que confiaram em mim, me ajudaram e deixaram consultar os documentos dos arquivos; e a Rui Solheiro, presidente da Câmara Municipal de Melgaço, que compreendeu o meu propósito em Melgaço e permitiu que eu utilizasse os meios materiais e técnicos dos serviços municipais.

Agradeço também aos meus amigos, Frédérique, Nicolas, Isabelle e Rose pela sua presença, a Fatou pelos seus bons pratinhos, a Jean-Marc pela sua leitura lógica e crítica destas páginas, a Manuela pelos cursos de português e pela sua intransigência, a Madalena pelos momentos de descanso que passei em sua casa… e à família, a minha mãe, irmãs e irmãos pelo apoio que me deram quando escrever se me afigurava difícil e desencorajante. Um pensamento especial vai para o Luís, companheiro de caminhada e da vida que durante estes anos deu guarida à maior parte das minhas inquietações e alegrias. E aos «avós» que me acolheram em sua casa.

Ao meu pai.

 

 

CONFLITOS E ÁGUA DE REGA

 

Ensaio sobre a Organização Social no Vale de Melgaço

 

Autor: Fabienne Wateau

 

Edição: Publicações Dom Quixote

 

Lisboa, 2000

 

AS MAMOAS CASTREJAS

melgaçodomonteàribeira, 08.03.13

 

 

REVISTA DA FACULDADE DE LETRAS

 

MAMOAS DO NORTE DE PORTUGAL:


ESTADO DA QUESTÃO EM 1981

 

Por: Vítor Oliveira Jorge

 

Professor Catedrático da Faculdade de Letras da U.P.

 

   O distrito de Viana do Castelo é muito rico em monumentos dolménicos. As concentrações megalíticas iniciam-se aliás junto à fronteira (a respectiva linha passa por alguns monumentos), prolongando para sul as necrópoles da zona meridional da província de Pontevedra.

   No concelho de Melgaço, destaca-se a este respeito a freguesia de Castro Laboreiro, Em finais de 1978, a Unidade Arqueológica da Universidade do Minho realizou o levantamento sistemático das suas mamoas, integrado num trabalho semelhante extensivo a todo o Parque Nacional da Peneda-Gerês, no qual existiriam cerca de 200 monumentos; desses, a maior parte situar-se-ia precisamente no planalto de Castro Laboreiro, a cotas a cerca de 1200 m. Aí teriam sido identificadas  64 mamoas e uma cista. É o que se pode ler num folheto sobre a acção da U.A.U.M. intitulado “ Actividade Arqueológica – 1976 – 1980”, em que se escreve: “ as mamoas formam conjuntos de 3 a 9 unidades, preferencialmente localizados nas chãs do planalto. A maior parte destes conjuntos encontra-se em aparente relação com um monumento isolado no alto do monte mais próximo. São poucas as mamoas que se localizam nas vertentes ou no fundo das corgas. O material usado na construção destes túmulos foi o granito que constitui o substrato de uma larga faixa do planalto de Castro Laboreiro.

   “Grande parte destes monumentos sofreu ao longo de diferentes épocas violação da câmara, verificando-se mesmo, nalguns, o desmantelamento parcelar da mamoa”.

   Todavia, posteriormente, teriam sido identificados mais monumentos (de carácter dolménico e “cistas”) que, no seu conjunto, e segundo uma informação pessoal, atingiriam a cifra de 80.

   Em 1978, e a convite do Parque Nacional, deslocámo-nos a Castro Laboreiro na companhia de diversos arqueólogos, tendo então observado os monumentos seguintes:

   - Mamoas da Corga das Antas (2), nas proximidades do monte chamado da “Paicota”. Trata-se de monumentos de grandes dimensões, muito bem conservados, situados a alguns metros um do outro. Um deles, com 25m de diâmetro, não apresentava sinais de violação, o que é extremamente raro. Segundo o P. Aníbal Rodrigues, no Outeiro da Paicota haveria outra possível mamoa;

   - Mamoa junto da “Pedra Cavalgada”, nas proximidades do marco fronteiriço nº 18. Destaca-se enormemente na paisagem, sendo de grandes dimensões;

   - Mamoas da Pedra Cavalgada (4) – conjunto de quatro monumentos, situados e um e outro lado do caminho;

   - Mamoas da Corga do Porto dos Bois (3);

   - Mamoa do marco geodésico do Giestoso (1337 m de altitude), este marco foi implantado sobre o monumento, que domina inteiramente toda a área visitada;

   - Mamoas a sul do marco fronteiriço nº 25 (2), situadas nas proximidades da “Mota Furada” ou do Alto da Lama da Paz; uma delas contém ainda elementos da estrutura megalítica. Destacam-se nitidamente na paisagem;

   - Dólmen e mamoa da “Mota Furada”- dólmen com corredor (ao que nos informaram, ainda intacto), virado a nascente. A tampa foi partida recentemente em três fragmentos. Laje de cabeceira de grandes dimensões. É notória a forma de alguns esteios da câmara, aparentemente mais largos do que altos.”Mota” é a designação que o povo local dá às mamoas;

   - Mamoa da Cabeça de Meda, nas imediações do marco geodésico do Giestoso;

   - Dólmen de Pio Carneiro (Portos). Com uma mamoa de grandes dimensões. A laje de cobertura foi partida recentemente. Um dos esteios apresenta três concavidades circulares, cuja origem humana é duvidosa.

   Há alguns anos, o Sr. Padre Aníbal Rodrigues publicou uma pequena nótula sobre os Dólmenes de Castro Laboreiro, segundo a qual eles seriam “geralmente constituídos por sete esteios e uma mesa ou chapéu”.

   O conjunto megalítico de Castro Laboreiro é, sem dúvida, um dos mais importantes do Norte do país, impondo-se a publicação do inventário realizado, e a efectivação de escavações cientificas em alguns monumentos. O facto de as mamoas surgirem nuclearizadas, e de algumas assumirem uma posição dominante na paisagem, relativamente às demais, é também de muito interesse, pois, tal como acontece em algumas necrópoles transmontanas, pode representar uma hierarquização tumular em relação com aspectos sociais, cronológicos, ou tão só simbólicos. A presença, ao que parece, de “cistas” nas proximidades de monumentos de maiores proporções, é também um dado que conviria ser investigado.

 

Ler o documento completo em:

 

 

 http://ler.letras.pt/uploads/ficheiros/2095.pdf

 

 

Felizmente o cenário actual é bem diferente, várias foram as mamoas escavadas e estudadas no Alto da Portela do Pau, bem como a mamoa do Batateiro na freguesia da Gave. É de enaltecer o trabalho do Professor Doutor Vítor Oliveira Jorge e das suas equipas que há décadas dirige os trabalhos arqueológicos no Planalto de Castro Laboreiro. E ao grande castrejo Padre Aníbal Rodrigues que nunca esmoreceu com as dificuldades e lutou para que os “seus” monumentos não fossem esquecidos, a minha homenagem – Obrigado Padre Aníbal.

 

CONTRABANDO EM MELGAÇO FIM

melgaçodomonteàribeira, 08.03.13

 

Posto fronteiriço de S. Gregório

 

 

O CONTRABANDO

 

 

    O Sr. António Cândido Rodrigues, natural de Chaviães, morador na Vila, mais conhecido por “Toninho do Talho” diz que começou no contrabando quando tinha 12 anos (1947).

    As fronteiras estavam controladas através dos postos, cada qual com a sua área demarcada “…a minha área era entre o posto de “Portavigo”, em Chaviães e o de Paços, ambos junto ao rio…comprava o café na Loja Nova ao Manuel da Garagem e transportava-o na carroça do “Ronho” e tentava “filtrá-lo” pelos postos…passava o café numa batela pelo rio…ao chegar ao lado espanhol também tentávamos esquivar-nos aos carabineiros…depois da guerra era o café, o sabão, o azeite, o açúcar que iam para Espanha…”.

    No tempo do café o Sr. António recorda “…tinha um sócio e no posto de “Portavigo” um guarda apanhou-me 10 embalagens de café Sical…ele queria uma importância para deixar a mercadoria…eu disse-lhe que essa mercadoria não era só minha e pedi-lhe para deixar passar essa que mais tarde passaria com outra e já lhe deixaria ficar alguma coisa…era o passares…eu sabia que no outro dia esse guarda iria ser transferido para o posto de Cevide…nós sabíamos de tudo…vigiávamos constantemente os guardas…”.

    Conta-nos que noutra altura “…sabíamos que os guardas estavam num coto, então mandamos dois colegas à frente abrir caminho com dois sacos de feno…quando os guardas os avistaram foram atrás deles…era o que nós queríamos…enquanto eles iam por um lado, nós fomos pelo outro…lembro-me que uma vez, em Espanha, havia um carabineiro que nos apanhou um carregamento de sabão e ficou-nos com algumas caixas, mas disse-nos que enquanto ele estivesse de serviço poderíamos passar o que quiséssemos…”.

    O Sr. António diz que os contrabandistas estavam organizados, havia sempre um deles que arriscava o capital, ou seja, que comprava a mercadoria e pagava a outros para efectuar o transporte “…fui apanhado muitas vezes…deixava os sacos e fugia…os guardas de cá alertavam os carabineiros e estes os nossos…por vezes fugíamos ao som dos tiros…”.

    A seguir diz que começou a ser transportada amêndoa de Espanha para Portugal, para ser vendida nas lojas que por sua vez a transportavam para o Porto para embarcar para outros países. Depois veio o cobre, também chamado de “lingotes de cobre”, “chapa de cobre” ou mais corrente “chatarra” transportado para Espanha “…esquivávamos a mercadoria até chegar à linha do comboio na Frieira e Pousa…quem comprava o cobre eram os funcionários da estação que depois o metiam nas carruagens para o Centro de Espanha…”.

     Depois começou o transporte do gado de Espanha para Portugal, geralmente esse transporte era feito pelas zonas de montanha “…o gado vinha a pé até à fronteira, onde era “filtrado” até passar a zona fiscal…passada essa zona o gado estava legal…em Espanha não havia papéis…em Portugal na zona fiscal entre S. Gregório ao Ribeiro de Baixo o gado estava todo registado…a zona fiscal abrangia até 15 km da fronteira…as pessoas que morassem nessa zona e tivessem campos em Espanha tinham que levar um papel da alfândega para o gado, o arado e o carro de bois…quando essas pessoas matassem ou vendessem o seu gado tinham que dar baixa dele…por exemplo se o gado passasse em Pousafoles só estava fora da zona fiscal em Lobiô…o gado chegava a vir de Crespos até Riba de Mouro a pé…a melhor zona para passar o gado era por baixo de Alcobaça pois era difícil os guardas chegarem lá…quando passasse a zona fiscal o gado era como se fosse nossa propriedade…por vezes éramos apanhados e tínhamos que ir responder aos tribunais…mas nós alegávamos que era nosso pois fora comprado nas feiras de Ponte da Barca ou Ponte de Lima…”.

    Como eram conhecidos, às vezes os contrabandistas pagavam muitas injustas, como aconteceu uma vez em que o Sr. António tinha um gado a criar em Pomares “…uma vez as pessoas que me criavam o gado vinham com 6 vacas para a feira de Paderne…o Tenente “Sidre” apreendeu esse gado no Castelo de Sante e levou-o para a Alfândega juntamente com o pai e a filha que o transportava…quando no outro dia fui lá o chefe da Alfândega disse que tinha um papel passado por um veterinário espanhol que provava que esse gado era de Espanha…é uma história longa que acabou no tribunal aduaneiro e que ficou arquivada…mais tarde também começaram a ser transportadas bananas e bacalhau…antes do 25 de Abril o contrabando era mais fácil pois as multas eram mais pequenas e nós arriscávamos…por exemplo 1 kg de qualquer mercadoria alimentar pagava 3,5 tostões…no caso do tabaco a mercadoria perdia-se para a Fazenda Pública e até dava cadeia…depois do 25 de Abril a lei mudou e as multas tornaram-se mais pesadas…já eram menos aqueles que se arriscavam…”.

 

Texto: Gabinete de Apoio ao Desenvolvimento

Recolha de dados: Abel Marques e Cristina Lima (Posto de Turismo)

Agradecimentos: David Barbeitos (Cristóval)

                          Carlos Alberto Marques (Prado)

                          António Cândido Rodrigues (Vila)

 

CONTRABANDO EM MELGAÇO

melgaçodomonteàribeira, 08.03.13

 

 

 O CONTRABANDO

 

    Melgaço ainda hoje é lembrado como um dos lugares míticos da época do contrabando e da emigração a salto. Toda esta região é por si só um museu do contrabando… um museu vivo… feito de histórias que hão-de passar de pais para filhos.

 

 

    Seja qual for o ângulo com que se tente abordar a vida nas regiões raianas, em qualquer parte do País, a narrativa foge, invariavelmente, para aquilo que foi durante gerações o principal sustento das populações no limiar da fronteira: o contrabandismo “…a prática do contrabando já faz parte da cultura dos concelhos raianos…”.

    Na época em que o comércio entre Portugal e Espanha estava restringido ao máximo, todos estes lugares fronteiriços foram importantes na protecção fiscal e económica do Estado. Melgaço não foi excepção.

    Aos guardas era exigido o cumprimento da lei, independentemente dos actos que tivessem de tomar. Qualquer objecto era considerado suspeito e todas as pessoas que passassem a fronteira eram alvo de fiscalização “…bastava trazer um saco para serem logo revistados…”

    A conjuntura política e as necessidades económicas destacam-se como as vias favoráveis que motivaram esta gente a importar e exportar mercadorias proibidas, através de uma fronteira que nos separava de Espanha, por rio ou montanha. Deste mercado negro que se desenvolveu, essencialmente, até ao terceiro quarto do século passado, nasceu outro fenómeno: o da intimidade com o outro lado da fronteira “…aqui todos entendemos e falamos espanhol e a fronteira é apenas uma linha num mapa…”

    Nesta viagem que fazemos ao tempo do contrabando em Melgaço, chegam-nos experiências de vida, contadas por quem viveu de perto este período conturbado da História. Experiências em primeira mão relatadas por alguns dos verdadeiros contrabandistas num regresso ao passado jamais esquecido.

    São algumas destas histórias que aqui vamos descrever, segundo o testemunho e consentimento dos próprios protagonistas.

 

    David Manuel Barbeitos, natural de São Gregório, Freguesia de Cristóval diz que o contrabando não era um crime “…o contrabandista nunca roubou nada a ninguém…sempre comprou a mercadoria que vendeu, fosse café, marisco ou tabaco…além disso, a gente só o fazia para conseguir viver…os tempos a isso obrigavam”. Começou a trabalhar no contrabando aos 13 anos de idade como empregado, principalmente na exportação de café para Espanha “…O café chegava em camiões, junto da fronteira com Espanha, normalmente em sacos de 60 Kg. A partir daqui era transportado às costas, por carro, em “batelas” (no rio Minho), ou até por mulas, atravessando assim a fronteira…

    Certa altura “…eu e mais seis jovens, transportávamos uma carga de café por entre as matas, já em território espanhol, quando fomos surpreendidos pela presença de três carabineiros...apavorado, fugi por entre as matas e campos agrícolas, e, não largando a carga, escondi-me num tanque onde se preparava o sulfato...fiquei dentro desse tanque desde as 16.00 horas às 21.30 horas…não que tinha sido perseguido ao som das balas!... “.

    David foi alvo da perseguição da policia espanhola, muitas vezes ao som dos disparos, e que apenas resultou na apreensão da mercadoria. Com 16 anos, chegou a trabalhar por conta própria, transportando, num carro de matrícula francesa, mercadoria diversa (utensílios agrícolas, peixe, marisco, tabaco…etc.), de Espanha para Portugal. Sem carta de condução, percorria o trajecto desde a fronteira até aos Arcos de Valdevez, o que, na altura, chegava a demorar aproximadamente 3 horas, pois era necessário evitar as estradas principais e, de quando em vez, como ele próprio nos diz: - “…parávamos, saíamos do carro, e falávamos com as pessoas, para fingir que não íamos a nada!

 

    Carlos Alberto Marques, 49 anos, natural de São Gregório, freguesia de Cristóval, mais conhecido por Kekas, começou a sua actividade de contrabando com apenas 3 anos de idade. Nessa altura, Kekas vivia em São Gregório e, enquanto sua mãe ia trabalhar, uma vizinha conhecida por “Teresa das Furnas”, de vez em quando prontificava-se a ficar com Kekas. Este, por sua vez, era utilizado para transportar, no interior das suas roupas, barras de ouro (também chamadas “chatarra” pois o nome “ouro” chamava muito a atenção) “…a dona Teresa fingindo ir a Espanha para comprar cacete galego, servia-se de mim para levar essas barras de ouro…certo dia, já com 5 anos, ao ser despido em Espanha para me retirarem a mercadoria caiu-me uma barra de ouro num pé, o que me magoou muito…quando a minha mãe me foi dar banho, observando tal ferimento, interrogou-me, e eu respondi, inocentemente, foi a chatarra que me caiu no pé!...Foi assim que a minha mãe ficou a saber que era utilizado para transporte de contrabando…

    Com 7 anos veio morar para a freguesia de Prado com seus pais. Aí, distante da fronteira, e já com 12 anos, dono de uma bicicleta, fingia ir jogar à bola e, pedalava, aproximadamente 11 kms, até São Gregório, onde procedia ao trespasse de cargas de café para Espanha “…este serviço rendia-me, na época, 7$50 por carga…

    Terminada esta fase, Kekas seguiu os seus estudos até ao 25 de Abril. Nesta altura, com 22 anos e, sem emprego, recomeça a actividade de transportador de contrabando.

    Após o 25 de Abril surgem em Portugal os novos ricos, começando, assim, a procura do marisco e, como este era raro e mais caro no nosso país, surge a oportunidade de se importar ilegalmente de Espanha. Certa noite, Kekas comprometeu-se a transportar uma carga de marisco que lhe seria entregue na fronteira às 4 da madrugada. Quando chegou, o guarda F da fronteira já tinha recebido o “passe” (comissão concedida para permitirem a passagem das mercadorias), entretanto entra um novo guarda K ao serviço, e apercebendo-se do esquema, pergunta ao guarda F se já tinha recebido a comissão, respondendo este que não. Assim resolve, juntamente com um outro guarda, perseguir o Kekas “…mas eu já fora alertado via rádio, pelo dono da carga (Sr. “D”), que estava a ser seguido…ao chegar à curva do ” bicho fino”, fui ultrapassado pelos guardas que me obstruíram a passagem…entretanto chega o Sr. D e inicia uma discussão com o guarda K, alegando que já tinha pago o respectivo “passe” ao guarda F…não chegando a acordo. O Sr. D, exaltado, dirigiu-se ao interior do seu carro, arrancou o espelho retrovisor e, bruscamente, encostou-o ao ouvido do guarda K, ameaçando-o que, se não lhe retirasse o carro da frente, lhe rebentava os miolos!...este com medo, pensando ser uma pistola, ordenou ao terceiro guarda que desimpedisse o caminho, prosseguindo assim, eu, o meu destino…porém e, após alguns minutos, os fiscais não desistem e continuam em minha perseguição…mais uma vez fui avisado pelo Sr. D…”.

    O peso da carga bem como as características da viatura não permitiram a Kekas distanciar-se o suficiente para evitar ser, novamente, apanhado “…desta vez, encostando a carrinha à berma esquerda, permiti a passagem dos agentes pela direita que, abrandando lentamente, foram surpreendidos pelo impacto intencional da viatura do Sr. D, o que lhe provocou a queda para uma poça aí existente!...

    Kekas, observador de tal espectáculo, prosseguiu a sua viagem sem ser mais incomodado “…os guardas? bem…esses…destruíram o veículo e, quanto a ferimentos, não passaram de uns arranhões…

 

 

(continua)

 

A IGREJA PERSEGUIDA NA 1ª REPÚBLICA

melgaçodomonteàribeira, 08.03.13

  

Gaspar Vaz-Guedes

 

 

CORRESPONDÊNCIA ENTRE GASPAR VAZ-GUEDES E    

 

RAIMUNDO MEIRA

 

 

   Meu excelentíssimo amigo

 

   Recebi a sua carta com os documentos inclusos e apreciei como mereciam o diálogo em verso do Satanaz com o Gaspar Gomes, que não é aliás meu caseiro, e o mais. A questão do arrendamento do passal cifra-se no seguinte: como Vexa sabe as freguesias por aí são muito pequenas e o povo vê-se e deseja-se para pagar aos padres; fiz portanto propaganda na minha freguesia no sentido de convencer os habitantes a que encarregassem um só padre de paroquiar as duas freguesias de Pedreiro, que é a minha e a vizinha de São Tiago de Cendufe. Parece que se convenceram e conseguiram convencer os padres, um dos quais, o de S. Tiago, está expulso da residência; parece que este concorda em se ir embora da freguesia com o que a Republica nada perderá, passando o encomendado de Pereiro a ir residir em São Tiago, o que também lhe dá jeito por causa de uma quinta que ali comprou, mas para ele ir é preciso que lhe permitam arrendar a residência e passal de S. Tiago pagando, é claro maior renda que a actual e evitando-se que esteja a deteriorar-se abandonada a residência de S. Tiago. Creio que seria muito bom conseguir o que deixo dito: lucrava o estado na renda, o povo das duas freguesias na diminuição dos encargos e a instrução, pois ficávamos com a residência do Pereiro, que é boa para a aplicar e suprir a falta essencial de casa para as escolas da freguesia. Peço portanto a Vexa que empenhe para o conseguir todo o seu bom esforço.

   Quanto ao administrador, se o bacharel a que Vexa se refere é como julgo o filho do Dr. Souza, é o pior que pode ser; além de parvo e talvez mesmo por o ser, é criatura completamente do José Guimarães, tendo pedido nas últimas eleições o voto a um meu caseiro afirmando-se Camachista. Isto para além das prendas do pai e dos tios nos Arcos e em Melgaço.

   Queria-se pessoa com tino, critério e um pouco de autoridade, aliás continuaremos na mesma ou pior.

 

   Com muita estima, de Vexa Correligionário e amigo muito dedicado

 

Lisboa 23/01/1914

Queiroz Vaz-Guedes

 

 

João Teixeira de Queiroz Vaz-Guedes, integrou as fileiras do Partido Republicano Português, ocupando, depois da Republica, o cargo de governador civil de Viseu em 1913-1914, ao mesmo tempo que iniciava vida parlamentar como deputado por Pinhel (1913-1915). Fez parte do elenco governativo em 1923. Pertenceu à Maçonaria, tendo sido iniciado, em 1909, na loja Liberdade III, com o nome simbólico de Gambetta.

 

Raimundo Meira, governador civil de Viana do Castelo em final de mandato (23/03/1914). Nomeado em Junho de 1913, governador civil de Viana do Castelo, é destacado durante o mês de Julho para o governo civil de Coimbra, volta em Agosto a Viana, e exerce o cargo até Março de 1914. É eleito senador por Viana nas listas do Partido Democrático em 1919, sendo reeleito em 1923 e 1925.

 

 

Retirado de:

 

Cartas Portuguesas – A primeira Republica por correspondência

 

http://cartasportuguesas.blogspot.com/2005_03_01_archive.html

 

TRABALHOS E PAIXÕS DE BENITO PRADA

melgaçodomonteàribeira, 08.03.13

 

 

TRABALHOS E PAIXÕS DE BENITO PRADA

 

 

   Filemón ouvia-a e percebeu o recado. Em vinte e quatro horas preparou a roda, largando para Melgaço.

   Foi um caminhar aflito e sem vontade. Chovia estupidamente. A moínha na perna direita não o largou a partir de Cortegada, desabrochando num inchaço que cresceu até se transformar num pão de quilo, como disse o endireita consultado em Padrenda que lhe sacou uma pequena fortuna para o esfregar durante meia hora com bálsamo da sardão.

   « Tens para muito tempo, afiador. Se fosse a ti não avançava mais. »

   « Ao certo o que será ? », doeu-se Filemón olhando o trambolho da perna.

   « Vá a gente saber. Mas o sardão é milagroso. »

   Filemón não sentia alívio nenhum. O endireita enxaguou as mãos numa bacia de folha e disse como se estivesse a discursar para os boiões dos unguentos:

   « É caruncho, afiador. Quando pega, nem os cirurgiões de Madrid têm remédio que lhe valha. »

   Arrastou-se em direcção à raia como se transportasse uma caterva de demónios presos à roda de afiar. Em São Gregório os guardinhas, condoídos, prescindiram de ver a cédula. Galegos eram às dúzias todas as Primaveras, os mais deles sem nada de seu que não fosse o sarro das estradas.

   Filemón adivinhou-lhes a alma e sorriu um sorriso fatigado ao lembrar-se das vezes que enchera o bolso de dinheiro. A verdade é que já tudo lhe pesava: ia para os quarenta anos, idade em que morrera o pai, afiador como ele, como ele tolhido de muito caminhar.

   Benito baixava do monte com a ovelha e as duas cabras quando avistou a cena entre todas inacreditável do landau da duquesa da Conquista parado à porta de casa e, tropeçando na perna doente, Filemón que tenteava a rua. Tinha acara branca como um pano de lençol. Nicolasa vira-o do muro do quintal e saiu aos gritos. Sempre gosta dele, pensou Benito largando os animais. Correu também. Filemón desfalecia.

   Triste e magoado foi o relato que o afiador lhes fez ao tempo em que Nicolasa desentrapava o joelho e massajava aquele inchaço de má cara, com mãos tão leves e amoráveis que por momentos imitaram a seda. Sofrera o achaque a um dia e meio de

Casdemundo; aguentara até Pontebarxas, onde a solução foi socorrer-se mais à frente com o endireita ; em Melgaço desistira, e um carro levou-o por caridade, e outro, até Viana do Castelo. Aí a soltura foi tanta que o seu amigo sr. José Martins teve que chamar dois homens com balde e esfregão para lavarem as escadas.

 

 

 Trabalhos e Paixões de Benito Prada

 

Fernando Assis Pacheco

 

Edições Asa

 

Círculo de Leitores

Pag.s 30 – 32

1994

 

PESQUEIRA FOLHETEIRO-COULE-BRANDOURO

melgaçodomonteàribeira, 08.03.13

 

 

 PESQUEIRA FOLHETEIRO-COULE-BRANDOURO

 

CHAVIÃES

 

 

   A pesqueira "Coule" pertencia ao Mosteiro de Fiães que cedia metade do seu domínio útil a consortes que pagavam aos monges um foro de duas lampreias.

   Em 01//05/1875 foi anunciada pelo "Diário do Governo" a venda de metade desta pesqueira por 120$000 réis tendo a hasta pública sido realizada em 5 de Junho daquele ano no Governo Civil de Viana do Castelo, desconhecendo-se quem a arrematou.

   Segundo uma Estatística da Pesca, publicada em 1903, a pesqueira Coule pertencia aos consortes José Cândido Gomes de Abreu e outros.

   É uma zona de perigosa pesca. Tem havido vários acidentes, um deles mortal, ocorrido por volta de 1924, quando um pescador pretendeu utilizar a Brandouro situada no meio do rio e de águas muito agitadas. O barco em que seguia virou-se e ele afogou-se (seg. Depoimento do Sr. José António Pinto de Chaviães).

   Obras nesta pesqueira poderiam ter sido justificadas por "atentado dinamista", que implicou a investigação policial noticiada pelo jornal "O Melgacense" de 19 de Dezembro de 1926.

 

 

Notícia publicada no jornal "O Melgacense" n° 43 de 19 de Dezembro de 1926

 

   "Na penúltima semana regressou a Lisboa, onde é digno Agente da Polícia de Investigação Criminal, o Sr. José Anacleto de Jjesus que entre nós esteve tratando de investigar acerca de um atentado dinamista perpetrado na pesqueira 'Coule' sita no Rio Minho, nos limites da freguesia de Chaviães, de que é proprietário o Sr. Manuel Esteves, residente em Lisboa."

 

Retirado de:

 

ACER – Associação Cultural e de Estudos Regionais

 

http://acer-pt.org

 

VANDALISMO NO PLANALTO CASTREJO

melgaçodomonteàribeira, 08.03.13

ARTE MEGALÍTICA NO PLANALTO DE CASTRO LABOREIRO

 

(MELGAÇO, PORTUGAL)

 

 

  

Equipa arqueológica V. O. Jorge

 

Por António Martinho Baptista

Centro Nacional de Arte Rupestre

Vilanova de Foz Côa

 

 

   Em Abril de 1990, na sequência de uma violação recente, detectámos a presença de gravuras e restos de pintura na Mota Grande, a maior mamoa do planalto de Castro Laboreiro. Tendo em atenção a importância do achado e no sentido de salvaguardar futuros vandalismos no monumento, realizámos de imediato o levantamento das gravuras dos dois esteios decorados que foi possível identificar. Posteriormente e porque o monumento, embora se localize em plena linha de fronteira, está já na mancha galega do planalto, comunicámos estes achados aos responsáveis do Património Histórico da Galiza. Por não considerarmos este levantamento como um trabalho acabado, nunca o publicámos. No entanto, e talvez na sequência do nosso alerta, o Boletín Avriense revelou a presença da arte megalítica da Mota Grande através de um pequeno artigo, com um desenho sumário e imperfeito dos motivos.

 

   Durante as campanhas de 1993-1994, foram descobertos novos restos de arte megalítica noutros dos tumulus da Portela do Pau, a mamoa 2, descoberta que decorreu fruto da escavação. Conhecem-se assim no grupo de mamoas da Portela do Pau dois dólmenes decorados, havendo possibilidades de trabalhos futuros poderem detectar novos restos artísticos. Também o levantamento arqueológico da arte megalítica desta mamoa 2, devido ao tipo de vestígios que ostenta e à interrupção dos trabalhos em 1995, nunca foi convenientemente terminado, sendo passível de pequenos acertos no futuro.

   Pese embora estes factores, são esses dois levantamentos "quase completos" que trazemos à apreciação deste Colóquio.

 

   As datações absolutas a partir de amostras de carvões, atribuíveis ao momento de "condenação" da câmara, deram cronologias da primeira metade do IV milénio A.C. De acordo com a hipótese interpretativa apresentada por Vítor Oliveira Jorge na publicação destas datações (1996), a mamoa 2 teria sido construída "durante a segunda metade do V milénio A.C.". É a este momento que deve ser atribuído o seu "projecto decorativo", que deve ser encarado como uma obra total, realizado num único momento.

   A decoração da Mota Grande, integrada no mesmo conjunto de mamoas, deve ser atribuída "sensu latu" ao mesmo período cronológico.

 

Retirado de:

 

http://www.ctv.es/USERS/sananton/coloqmeg.pdf

 

MELGAÇO, HISTÓRIA E LENDA

melgaçodomonteàribeira, 08.03.13

 

 

José Alfredo Cerdeira

 

    José Alfredo Cerdeira, filho de António Joaquim Cerdeira e de Laura Lopes, nasceu no lugar da Oliveira, em Santa Maria da Porta, Vila de Melgaço, a 12 de Janeiro de 1934.

    Depois de ter frequentado a escola primária concluindo a quarta classe, ingressou no Seminário Patriarcal de Lisboa, a fim de se tornar eclesiástico, o que não viria a acontecer, pois verificando que não era bem essa a sua vocação, desistiu.

    Embarcou em Maio de 1952 para a antiga província de Angola, onde tinha família chegada. Depois de dois anos de trabalho como civil, envergou, aos vinte anos de idade, a farda do exército, que só despiu quando passou à reforma.

    Fez uma comissão na Guiné-Bissau, aquando da guerra colonial, duas comissões em Moçambique, além de mais uma comissão em Angola. Atingiu, nas forças armadas, a patente de sargento-ajudante.

    Na antiga Nova Lisboa, concelho de Huambo, casou com Beatriz Paulo, nascida em Lobito a 23/11/1934, descendente de um senhor transmontano, a qual faleceu a 13/8/80.

    Actualmente reside em Braga com a sua família.

 

O BURACO DA SERPE

Autor: José Alfredo Cerdeira

Edição: do autor

Capa: fotografia tirada na Serra da Peneda-Gerês

Agosto de 2008

 

 

 

 

O TOMAZ DAS QUINGOSTAS

Autor: José Alfredo Cerdeira

Edição: do autor

Capa: Rogério Andrade

Julho de 2007

 

CONTRABANDO DE RESES PELO CONCELHO DE MELGAÇO (FIM)

melgaçodomonteàribeira, 08.03.13

 

 

A ROTA DO CONTRABANDO

 

 

   Com efeito, depois de sacado às Unidades Colectivas de Produção e Cooperativas agrícolas alentejanas e ribatejanas, quer pela mão do ministério de Vaz de Portugal, quer através de assaltos que grupos de terroristas frequentemente ali desencadeiam, o gado inicia a longa e organizada marcha do contrabando.

   Primeiro, é transportado até à zona centro do País, onde se verifica uma transferência para novos camiões. Daqui, nova viagem até localidades mais próximas da fronteira a atravessar; esta segunda mudança, de acordo com pessoas de ambas as vilas minhotas, tem sido detectada em Valença e Vila Verde.

   Nova mudança de veículos e condutores, para aproximar o gado da extrema com o país vizinho. Agora, os condutores são já indivíduos da zona, experientes no serviço, conhecedores do método a utilizar.

   Vão até junto à linha de fronteira, onde largam o gado muito rapidamente. O camião raspa-se logo e o gado atravessa a raia, a pé, até Espanha, onde estão já espanhóis à espera. Afastam-se uma centena de metros e ali está um novo camião que segue com as centenas de animais contrabandeados.

   Estas diversas metas intermédias, numa viagem que dura alguns dias, visam fugir à fiscalização. Isto, porque legalmente não é permitido transportar camionetas de gado sem possuir guias de circulação. Não as tendo, os camionistas não poderão provar a aquisição legal dos animais.

 

“DESDE O VERÃO PASSADO…”

 

   Foi no verão passado, quando começaram os ataques à  Reforma Agrária, que aumentou muito o contingente de camiões de gado a passar, - afirmou-nos um soldado da Guarda-Fiscal.

   Explicou ainda:

   Nesta zona há bastante contrabando e, mesmo de gado, já não é novo! Porém, nunca se viu passar assim tanto…

   Um amigo de Tangil, enquanto percorríamos a estrada do Brejo, dizia-nos, a esse propósito:

   - Há dias, e noites, em que passam, só nesta estrada, cinco e seis camionetas. Ainda na segunda-feira passada foi um desses dias!

   Um talhante de Melgaço, visivelmente indignado, testemunhou aquilo de que intermediários ligados a este contrabando se gabam:

   - A quase totalidade desse gado vem do Alentejo e é quase dado que eles o trazem. Ora, isto não pode continuar. Ainda se fosse pouca quantidade, e trouxesse algumas divisas para o País, vá que não vá… Mas assim…

   Verifica-se ainda, segundo os testemunhos registados nesta zona fronteiriça, que a maioria do gado a passar é ainda bastante novo.

   - Regra geral são vitelos, entre os 16 e 18 meses. A maioria do gado é de raça, galega ou turina. Nem no Norte nem no Centro se produz para alimentar tamanha quantidade a sair diariamente. É bem de ver que ele vem da zonas onde mais se produzem essas raças… adiantou ainda o elemento da GF com quem dialogámos longamente. Aliás, tal gado, portanto novo e de raça, segue para Espanha já encomendado para grandes quintas que o vão alimentar.

 

 

GUARDA-FISCAL ACÇÃO DIFICULTADA

 

Naturalmente, o acompanhamento diário deste contrabando por parte dos habitantes da região, nomeadamente os agricultores, origina a repulsa destes e mesmo interrogações quanto às facilidades com que os camiões passam.

   São-nos sugeridos nomes de dois irmãos de Segude, o Zé e o Aníbal da Quinta, proprietários de camionetas frequentemente utilizadas para o transporte na última etapa da rota. Ou seja, o gado é comprado por outros e eles encarregam-se de fazer a fase mais arriscada – levá-lo até à fronteira.

   Quanto aos mais responsáveis, várias pessoas repetem-nos os nomes de Augusto Pequeno, de Adedela, Melgaço, que se mete em negócios escuros de toda a ordem e ainda recentemente esteve envolvido na transacção de grande quantidade de pesetas falsificadas; e de um tal Reis de Melgaço.

   Porém, a título de exemplo, foi-nos contado o que ainda recentemente sucedeu quando, a esse tal Reis, foi apreendida uma camioneta carregada do gado pela Guarda-Fiscal. Pouco depois, ele foi ao posto da GF dizendo que eram responsáveis por mais de dois mil contos de gado; que era dele e que exigia que lho devolvessem dentro de 24 horas. Passado umas quatro horas, já lhe telefonavam para ir buscar o gado…

 

   Isto tem a ver, naturalmente, com a falta de condições, quer físicas, quer legais com que a Guarda-Fiscal pode contar na sua actuação diária de repressão a esta actividade profundamente dolosa da economia nacional.

   Por outro lado, diz-nos um soldado, enquanto se verifica que estão a ser gastos grandes quantitativos no reapetrechamento quer da GNR quer da PSP, a Guarda-Fiscal continua exactamente com os mesmos precários meios de acção.

 

   Quanto à legislação em vigor, os contrabandistas de gado, mesmo levados a tribunal, têm todas as possibilidades de não serem condenados, a não ser que sejam apanhados em flagrante, o que é praticamente impossível.

   Acresce a este último problema o facto de terem de ser os soldados da GF que fizeram a autuação quem terá de pagar as custas de transporte do gado para o tribunal, sempre onerosas, caso não se verifique condenação!

 

A finalizar, um outro facto nos dá a ideia, quer da facilidade quer da gravidade do crime. Enquanto passa para Espanha todo este contingente de gado novo e das melhores raças, para Portugal, exactamente pela mesma raia, passa gado velho e doente.

   Com efeito, a mesma rede de contrabando introduz no nosso País significativa quantidade de gado que é adquirida em Espanha, praticamente de graça aos agricultores.

   O interesse disto está ligado, por um lado, à existência na região, nomeadamente em Valença, de matadouros clandestinos que enviam para consumo carne muitas vezes em condições impróprias.

   Por outro, verifica-se ainda que o gado tuberculoso não é subsidiado no País vizinho. Em Portugal, os agricultores que tenham gado que tuberculize são indemnizados quase pelo valor real do animal. Daí que em Espanha se queiram desfazer de tal gado por ‘tuta e meia’. Trazido para Portugal, o animal é entregue a agricultores que o declaram aos serviços respectivos…

 

 

Jornal "O Diário", 14 de Dezembro de 1978

 

CONTRABANDO DE RESES PELO CONCELHO DE MELGAÇO

melgaçodomonteàribeira, 08.03.13

 

Planalto do Laboreiro

 

 

MILHARES DE RESES NOS ÚLTIMOS MESES

 

CONTRABANDO DE GADO ROUBADO À R. A.

 

PASSA POR MELGAÇO

 

Melgaço (do nosso enviado  especial) – Milhares de cabeças de gado foram, nos últimos meses, contrabandeados para Espanha por homens de mão de ex-latifundiários do Alentejo e Ribatejo. Presenteados pela parelha Barreto & Portas e, agora, pelo MAP de Vaz Portugal e Ferreira do Amaral com terras e gados, roubados aos trabalhadores, aqueles figurões tratam de contrabandear as reses novas.

 

   “O Diário”, por terras do concelho de Melgaço, nomeadamente na zona acidentada de Castro Laboreiro, palmilhou a rota final do contrabando. Apurou que o gado, numa primeira viagem, chega ao Centro do País. Depois, é transportado para perto da fronteira. Aqui é transferido para veículos pertencentes a indivíduos da região e conduzido por gente conhecedora dos atalhos.

   As pessoas de Melgaço, e das terras vizinhas, falam do escândalo. Apontam os nomes de Zé e Aníbal, dois irmãos de Segude, do Augusto Pequeno de Adedela, ou do Reis, de Melgaço, como alguns dos mais metidos em tal traficância.

   Um elemento da Guarda-Fiscal da região, contactado pelo nosso jornal, mostrou-se conhecedor dos meandros do escândalo, mas queixou-se de peias burocráticas e de falta de meios de acção que, garantiu, impedem a acção eficaz da corporação em que serve.

   O escândalo e os prejuízos para a economia nacional são ainda maiores, porque, as camionetas que passam para Espanha gado novo e em boas condições, regressam carregadas da gado velho e doente.

 

 

O SAQUE CONTINUA

 

Por: Fernando Semedo

 

EX-LATIFUNDIÁRIOS FAZEM CONTRABANDO COM O GADO QUE A REFORMA

 

AGRÁRIA MULTIPLICOU

 

   Ex-latifundiários do Alentejo e Ribatejo, presenteados com terrenos de UCP’s, estão a contrabandear o gado, criado e multiplicado pelos trabalhadores agrícolas e que lhes é oferecido de mão beijada pela actual equipa do MAP, através da raia seca do distrito de Viana do Castelo.

   Milhares de cabeças passaram já, a uma média de centenas por dia, na fronteira do concelho de Melgaço, nomeadamente na zona acidentada de Castro Laboreiro.

   Agricultores, guardas-fiscais, intermediários de gado, talhantes e todo o tipo de habitantes desta vasta zona fronteiriça nortenha repetiram-nos, indignados, a forma como este crime se executa diariamente; deram-nos conta da existência de uma densa e bem planeada rede de contrabando, que garante a segurança deste crime que custou já ao País – e continua a custar! – incalculáveis milhares de contos.

 

   É o seguimento do saque à Reforma Agrária, depois de Barreto, prosseguido pela actual equipa do MAP através de uma feroz repressão!

   - Até admira ainda não ter passado nenhuma camioneta hoje! – diz um morador da freguesia de Tangil, quando chegamos ao inicio de uma estrada florestal que parte daqui e vai até Pomares, conhecida por estrada do Brejo, e que é muito utilizada pelas camionetas dos contrabandistas de gado para fugirem a uma eventual fiscalização.

   È uma estrada que atravessa cerca de dez quilómetros de terreno acidentado e arborizado, sem praticamente nenhum outro trânsito, o que, aliás, se verifica pelos rodados marcados no chão de terra batida.

   Quando as camionetas do gado a contrabandear aqui passam, ou por uma outra estrada idêntica, igualmente florestal, a estrada de Santo António de Vale de Poldros, que liga Riba de Mouro a Lamas de Mouro, apenas uma parte do esquema utilizado pelos contrabandistas está cumprido.

 

(continua)

 

UM ESPIÃO CASTELHANO EM 1797

melgaçodomonteàribeira, 08.03.13

 

Castelo de Castro Laboreiro

 

 

LOS VIAJES DE JOSÉ CORNIDE POR ESPAÑA Y PORTUGAL

 

DE 1754 A 1801

 

 

Introducción a la Memoria sobre el modo de hacer la guerra a Portugal y a la descripción de sus plazas fronteirizas.

 

Por D(o)n J(osé) C(ornide) S(aavedra) año 1797.

 

 

Castro Leboreiro y Lindoso. Siguen por la de Portugal otros dos castillo llamados Castro Leboreiro (Castro Laboreiro) y Lindoso, a quienes hace fuertes su elevasa situación y lo quebrado del país; y por la nuestra, la villa de Milmanda, que en las guerras pasadas tuvo algunas fortificaciones provisionales pero de las que creo que ya no existen sino las ruinas.

 

Melgazo. A la bajada delas montañas de Castro Leboreiro (Laboreiro) y Milmanda, y enfrente de la división de las provincias de Orense y Tuy, se halla por la parte de Portugal y a la orilla del río Barces o Barxas, que sirve de división a los dos reinos, la villa de Melgazo (Melgaço), plaza situada en la confluencia del río Barxa (Barxas) con el Miño; tiene un buen castillo y cae enfrente de la villa de Creciente (Crecente), en el reino de Galicia.

 

 

Juan Manuel Abascal

 

Rosario Cebrián

 

Real Academia de la Historia

 

Madrid  2009

 

Ler mais em:

 

http://www.ua.es/personal/juan.abascal/Cornide_Informes_para_invasion.pdf

 

HOTÉIS DO PESO EM 1934

melgaçodomonteàribeira, 08.03.13

 

Restos do Hotel Ranhada

 

 

TERMAS DE MELGAÇO

 

PUBLICIDADE DE HOTÉIS DO PESO NA IMPRENSA EM 1934

 

 

ÁGUAS DE MELGAÇO

 

 

GRANDE HOTEL DO PEZO

 

– "FIGUEIRÔA" –

 

Novos e importantes melhoramentos, água corrente nos quartos, “apartments” com quarto, banho e wc privativa.

   Apesar de ser o hotel que oferece melhores condições de higiene e conforto, os seus preços são módicos.

Sumptuoso parque, primoroso serviço de mesa, dieta sem aumento de preço na diária, luz eléctrica e telefone. É o mais próximo das nascentes, sendo o ÚNICO desviado do pó da estrada por sua privilegiada situação, já que está instalado na magnífica Quinta do Pezo – Telefone nº7

 

GRANDE HOTEL ÁGUAS DE MELGAÇO

 

– "RANHADA" –

 

   Situado em magnífico local, com belo panorama. Esplanada frondosamente arborizada, luz eléctrica, estação telégrafo-postal e telefone da rede geral do País. Esmerado serviço de cozinha, podendo os Ex.mos hospedes fazer uso de dietas sem aumento de preço. Automóvel na estação de Monção a todos os comboios.

   Sendo a mais antiga casa desta estância, tem sabido acompanhar todos os progressos, nenhuma havendo que reúna todas as condições apontadas sob a gerência dos seus proprietários.

 

Retirado de:

 

RESTOS DE COLECÇÃO

 

http://restosdecoleccao.blogspot.com/search/label/Termas

 

LOS PETROGLIFOS DE ARBO

melgaçodomonteàribeira, 08.03.13

 

 

CAVADA DO REI

 

 

   Un día que prometia ser soleado y resultó frío e invernal; muy frío en la montaña de Arbo, enfrente de Melgaço y viendo la nieve en las partes altas de las montañas de Castro Laboreiro.

   Una nueva excursión guiada por Antonio Fernandez Iglesias. Se trataba de visitar algunos de los petroglifos publicados hace ya muchos años por Castor Perez Paredes y M. Santos Estevez, en la revista “Castrelos”, del museo municipal de Vigo. Antonio hizo en su día un trabajo exhauxtivo pues todos o casi todos de los tal vez mas de 40 rocas com grabados descubiertas fueron por él localizadas y señalizadas perfectamente en un plano.

   En nuestra visita había mucha maleza y camiños o referéncias que podían ser nuevas. Hubo algún extravío, pero finalmente llegamos a los lugares seleccionados para una primera visita, tanto por la entidad de los grabados como por los magníficos emplazamientos.

   Una viña en un lugar recogido y a mucha altura sobre el Miño, donde hay sobretodo un gran forma circular. Y el castro de San Martiño, en la parte alta Stª Marina de Sela donde hay sobretodo varias rocas con grandes coviñas o cazoletas, en muchos casos intercomunicadas por surcos.

 

Retirado de:

 

Rutas y Paisages. El Laberinto Atlántico

 

http://jlgalovart.blogspot.com/2008_12_01_archive.html

 

OS SANTOS DOS CAMINHOS PORTUGUESES

melgaçodomonteàribeira, 08.03.13

 

 

OS CINCO MÁRTIRES DE MARROCOS

 

   Ligados ao Mosteiro de Santa Cruz (Coimbra), estão também os Cinco Mártires de Marrocos. Italianos de origem, estiveram algum tempo no convento de Alenquer e daqui partiram, primeiro para Sevilha, donde foram expulsos, e depois, para Marrocos, onde receberam a palma do martírio, no dia 16 de Janeiro de 1220. Encontrando-se, nessa altura, D. Pedro Sanches, filho de D. Sancho I, ao serviço do Miramolim de Marrocos, a quem tinha ido oferecer os seus serviços, recolheu os seus corpos e, no momento oportuno, enviou-os para Portugal, tendo chegado ao mosteiro crúzio de Coimbra – onde tinham estado em vida – no mês de Novembro desse mesmo ano, sensivelmente por ocasião da morte da rainha D. Urraca, por eles profetizada. O seu culto espalhou-se, mercê da intervenção dos mosteiros da mesma Ordem, celebrando-se ainda, anualmente, em Paderne, Melgaço, a sua festa, com procissão evocativa do seu martírio, desde a capela de Nossa Senhora dos Remédios, sita no lugar de Sante, até à igreja paroquial, que até 1770, foi igreja do antigo Mosteiro de S. Salvador de Paderne, de Cónegos Regrantes de Santo Agostinho, integrado na congregação de que Santa Cruz de Coimbra era casa-mãe.

 

José Marques


Professor Catedrático Faculdade de Letras Universidade do Porto


Revista da Faculdade de Letras


HISTÓRIA


Porto, III Série, Vol. 7,


2006, pp. 243-262

 

http://ler.letras.up.pt/uploads/ficheiros/3415.pdf

 

O TRANCOSO E O LABOREIRO

melgaçodomonteàribeira, 08.03.13

OS NOSSOS RIOS

 

 

Rio Trancoso - desviada da net

 

 

RIO TRANCOSO – O rio Trancoso faz fronteira natural com a Galiza (município de Padrenda) e Portugal (município de Melgaço). Desfruta de um excelente estado de qualidade ecológica e uma boa conservação das suas ribeiras e margens, razão pela qual os planos de gestão de região hidrográfica de Portugal e Espanha propõem a sua classificação como Reserva Natural Fluvial.

Situação: Afluente do rio Minho, decorre pelo extremo noroeste do LIC continental do Baixo Lima e serve de limite entre os municípios de Padrenda (Ourense, Galiza) e Melgaço (Distrito de Viana do Castelo).

Comprimento do rio: 13,6 Km

Superfície da bacia: 1.803,31 hª

 

 

 

Rio Laboreiro - desviada da net

 

 

RIO LABOREIRO – O rio Laboreiro faz fronteira natural com a Galiza (Entrimo) e Portugal (Melgaço). Situa-se na Zona de Especial Protecção de Aves (ZEPA) do Baixo Lima e insere-se no Parque Natural de “Baixa Limia – Serra do Xurés” (Rede Natura 2000). Pela parte portuguesa, o rio Laboreiro está no território do Parque Nacional Peneda-Gerês. Desfruta de um excelente estado de qualidade ecológica e uma boa conservação de ribeiras e margens, razão pela qual os planos de gestão de região hidrográfica de Portugal e Espanha propõem a sua classificação como Reserva Natural Fluvial.

Situação: Pertence à bacia hidrográfica do Lima e serve de limite entre os municípios de Entrimo (Ourense, Galiza) e Melgaço (Distrito de Viana do Castelo).

Acessos: a principal via de Entrimo é a via nacional N-540 (Lugo-Portugal). A estrada provincial O-18, conduz desde a estrada nacional a Terrachán (capital da localidade), passando pelas entidades de Ferreiros e Guxinde, até à fronteira portuguesa de Meixoeira. O rio Laboreiro encontra, ao sul do município, o núcleo de Olelas.

Comprimento do rio: 8,4 Km

Superfície da bacia: 870 hª

 

Retirado de: CARISMA – Calidad ambiental de las reservas naturales fluviales internacionales y del medio acuático

 

www.carisma-fluvial.eu

 

HISTÓRIA, CULTURA E PATRIMÓNIO V (FIM)

melgaçodomonteàribeira, 08.03.13

 

Manuel Igrejas, camisa branca, Casa do Minho, Rio de Janeiro. Ao fundo, painel de azulejos da autoria do Manel.

 

   E os visitantes, ao mesmo tempo que saboreavam aquelas iguarias caseiras e estalavam a língua após cada gole de vinho que emborcavam da malga, iam desfiando o recado que os levara ali.

   — O Joaquim está muito bem. Depois de muitos anos de trabalho, conseguiu comprar uma padaria à sociedade com outro patrício. Casou, não sabiam? É, faz pouco tempo que isso aconteceu.

   O ramo de negócio da padaria toma todo o tempo, não dá para fazer mais nada, nem para escrever. A gente sabe dele porque moramos perto da padaria e sempre damos um dedo de conversa por sermos da mesma terra. Agora o irmão, o Abílio, nunca o vimos e nem sabemos o que ele faz. O Joaquim é que nos diz que ele também está bem. Eles se vêem amiúde, moram em bairros distantes e aquela cidade é um mundo de grande.

   E a mãe, agora mais faladeira, desfiava o rosário de amarguras que o abandono dos filhos lhe causava.

   — Aqueles malandros, depois que enviuvei e mais precisava de homens para amanhar a terra, foram mundo afora buscar fortuna fácil. Diziam que chegando lá no Brasil ficavam ricos e logo voltariam. Pois sim… Pois olhem que, se tivessem ficado por aqui, não lhes teria corrido mal. Mas não, foram para tão longe e já se fez um ror de anos, é sinal que não lhes correu tão bem assim. Se ao menos mandassem duas letras uma vez ou outra… Se tivessem ficado aqui, ainda que arranjassem família grande, por certo que todos viveríamos bem. O Armindo. O marido aqui da Júlia, depois que casou também foi embora, está na França. Que raios de homens que não sossegam no lugar onde nasceram, desde pequenos que o bicho de ir para longe os atormenta. Este ao menos ainda aparece aqui duas vezes por ano e, sempre que vem, dá uma boa ajuda no campo. Eles também não podiam fazer o mesmo? Foram lá para tão longe… Se mandaram lembranças para o Toninho é porque sabem dele, então têm recebido as nossas cartas. O que eles mandaram não precisava, ele tem tudo aqui, do melhor.

   — Que é isso, mãe? Pelo menos valeu o agrado. Mandaram tantas prendas para o sobrinho que não conhecem. E o Toninho ainda não tinha relógio. E, se eles não escrevem, pelo menos já sabemos que recebem as nossas cartas.

   — O que nos está valendo, duas mulheres sozinhas a maior parte do tempo, é esta criança que nos alegra o viver.

   E aquela avó triste faz um afago na cabeça do Toninho que, afogueado, acabara de entrar, vindo das suas brincadeiras solitárias no meio dos pinheiros, como se adivinhava pela caruma que ainda trazia pegada na roupa.

   — Tão esperto, é uma graça de Deus. Com cinco anos já está muito adiantado. Ensinamos-lhe tudo aqui em casa. Já conhece algumas letras e sabe a doutrina toda de cor. No outro domingo fomos à Igreja e o Senhor Abade ficou abismado com o que o Toninho já sabe. Disse que, se for duas vezes ao catecismo, já pode fazer a primeira comunhão. O pai ficou muito contente, quando soube, e mandou dizer que lhe vai trazer a roupa da França.

   São tão espertinhas e caseiras estas crianças, mas, quando ficam gente, alguma os afugenta para longe, e quem os criou fica ao abandono.

 

   E durante duas horas aquelas duas mulheres sofridas com a ausência dos filhos, marido e irmãos, desenrolam o interminável rol de suas amarguras não entendendo por que a vida dá e tira.

   Dava fartura com os produtos da terra para comer e vender, um ou outro pinheiro vendido para madeira ou lenha também deixava um bom resultado, e a transacção de gado, venda de uns boizinhos, também produzia um bom lucro. Mas tirava a presença dos homens moços, ambiciosos, que não se contentam com o que Deus dá e querem mais. Cada vez mais, para se mostrarem e fazerem-se importantes.

   — E aqueles malandros do Brasil nem escrevem…

 

   Feitas as despedidas e a reafirmação de que o Joaquim e o Abílio estavam bem, reafirmação sem convicção, e que, em chegando ao Rio de Janeiro, instariam com eles para que escrevessem.

   Aquelas mulheres ficaram satisfeitas e durante algum tempo talvez se considerassem felizes.

   E aquele casal visitante, após o encontro que pareceu alegre, descia devagar, taciturno, acabrunhado pelas mentiras que haviam dito.

   As mães têm sempre razão: os filhos homens, via de regra, são sempre uns desatinados. Mas os filhos, mesmo não dando notícias, nem sempre são ingratos. É Deus que os impele para longe de suas mães, talvez para lhe poupar outros sofrimentos que não os do abandono.

 

   Como todos os portugueses que abandonam suas terras e suas famílias, por vezes com situação económica razoável, o Joaquim e o Abílio também largaram tudo, na flor da idade, através de uma aventura. É o desconhecido que mais atrai, a ilusão de uma vida diferente onde a fortuna será o resultado final… O lugar onde se nasceu é bonito mas por demais monótono e conhecido. Notícias de outros que se foram alardeiam progressos e riquezas, mas poucos, muito poucos, vêm demonstrar a sua melhoria e, quando vêm, não dizem as amarguras, os flagelos, as humilhações por que passaram para granjear algumas posses. E os moços, mormente os das aldeias, ficam estonteados e ansiosos por demonstrar que são capazes de sobrepujar os outros.

   O Joaquim e o Abílio, depois de trabalharem quase como escravos durante alguns anos para um parente afastado, resolveram tratar de si.

   Com os minguados trocados que conseguiram amealhar durante aquele tempo privando-se de tudo, compraram uma freguesia de pão. Todos os dias, com sol ou com chuva, empurrando o triciclo, sem domingos nem feriados, nos alvores da madrugada, faziam a sua via-crucis entregando o pão, subindo ruas íngremes ou transpondo escadarias.

   Um dia, por qualquer banalidade, se desentenderam e o Abílio separou-se do irmão. Comprou um carrinho e foi ser carregador, transportando pesadas mercadorias entre bairros distantes, trabalho rude que exigia toda a sua força física.

   Os anos rolaram, o Joaquim chegou a sócio daquela padaria, mas, um dia, a violência estúpida prostrou-o com um tiro no pulmão ao tentar evitar um assalto. Meu Deus, como é que alguém trabalhando arduamente e com honestidade anos a fio, privando-se de tudo para conseguir uma futura situação tranquila, vai entregar assim, sem mais nem menos, o produto de seu trabalho a dois vagabundos que nunca fizeram nada para merecer viver, só porque estão com um revólver na mão?

   O Joaquim ficou vários dias entre a vida e a morte, escapou.

   Recuperou-se fisicamente, mas a situação económica teve um retrocesso muito grande. Recomeçou tudo de novo. O Abílio, que já estava com táxi na praça, socorreu o irmão naquele infortúnio.

   E aquele casal, terminando a descida, quase chegando ao lugar onde o automóvel os esperava, ainda meditava.

   O Joaquim realmente ia lutando e novamente progredia. Resolvera não mais escrever. Não podia contar a verdade e não aguentaria ficar mentindo a vida toda. Preferível passar por ingrato e mau filho que dar tanto sofrimento à mãe.

   O Abílio não queria ser um estorvo para o irmão, cabeça dura. Queria levar a sua vida por si mesmo, apesar da adversidade. Ajudado por uma companheira com quem vivia, desde antes do acontecido, andava de porta em porta vendendo vassouras, espanadores e outros pequenos utensílios.

   Fazia algum tempo que também fora vítima de assalto em seu táxi, levou um tiro de raspão na cabeça. Recuperou-se, mas ficou totalmente cego.

 

 

ABALARAM MUNDO AFORA - Histórias e Depoimentos de Emigrantes

 

Colectânea de contos coligidos por M. Félix Igrejas

Supervisão do Dr. José Pereira Torres

 

Capa e ilustrações: M. Félix Igrejas

 

Edição: CASA DO MINHO do Rio de Janeiro

 

1988

 

 

www.minho.com.br

 

HISTÓRIA, CULTURA E PATRIMÓNIO IV

melgaçodomonteàribeira, 08.03.13

 

 

MENTIRAS DO BRASIL

 

 

Manuel Félix Igrejas

 

 

   — Ó tia Maria! Tia Maria dos Pinheiros! Ó tia Maria! Raios, parece que está mouca.

  Quem, esganiçado, gritava para aquela mulher sentada lá em cima daquele penedo era um rapazinho magrote, de aparência humilde, que servira de guia desde o lugar, lá em baixo, até à herdade da tia Maria dos Pinheiros.

   — Ó tia Maria, estão aqui uns senhores que vieram do Brasil e querem ver vomecê.

   Aquela mulher continuou imóvel parecendo não ter ouvido coisa alguma. Ela já vinha distinguindo os vultos daquelas pessoas estranhas, ainda elas vinham lá longe, não era ninguém que lhe interessasse; por isso aquele descaso.

   O rapazote, vendo que não adiantava insistir com a mulher, saiu correndo em direcção à casa mais adiante, deixando aquele casal ali parado, desajeitado, em frente à tia Maria.

   — Não estou aqui e não quero ver ninguém do Brasil, balbuciou finalmente aquela mulher.

   Toda vestida de preto, sentada naquele pedregulho com uma vara na mão, vigiava as galinhas e patos que ciscavam nas redondezas, não fossem entrar nos canteiros das alfaces e nabiças.

   Os forasteiros ficaram tristes com aquelas palavras frias, mas entendiam que deviam ser fruto de muitas amarguras.

   — Bom dia, senhora Maria, trazemos notícias de seus filhos do Rio de Janeiro.

   — Não, eu não tenho filhos… e, se tenho, são uns malandros, uns sem vergonha e não quero saber deles.

  E ao dizer isto, aquela mulher de pouco mais de sessenta anos, mas aparentando muito mais, pegou uma ponta do lenço que lhe cobria a cabeça e enxugou uma lágrima que não conseguiu segurar.

   Bastante robusta, a tia Maria aparentava mais idade no rosto, talvez por tanto chorar pelos dois rapazes que a tinham abandonado.

   — Ah, os senhores vieram do Brasil? Façam o favor de acompanhar-me, vamos até lá em casa.

   Quem assim falava era uma mulher ainda jovem que, avisada por aquele guia, viera ao encontro do casal visitante.

   — Não liguem para a minha mãe, ela está zangada, porque os meus irmãos, já vai anos que não escrevem. Mas os senhores trazem notícias deles, pois não trazem?

   E dizendo isto estacou, fixando ansiosa os rostos daqueles visitantes, como querendo adivinhar a resposta que lhes iriam dar.

   — Trazemos, sim, e também esta maleta com lembranças que o Joaquim mandou.

   Continuaram andando rumo à casa. Chegaram.

   — Entrem, entrem se fazem favor.

   Entraram numa sala bastante espaçosa, simples de mobiliário mas bem arrumada e asseio impecável. A casa era o tipo de moradia dos lavradores abastados do Alto-Minho. No meio de um quinteiro cercado de campos de milho quase na época da colheita, com latadas de uvas à volta de cada campo, árvores de fruto, horta e mais adiante o pinheiral. Não obstante a escassez de mão de obra, tudo se apresentava bem cuidado, fruto do trabalho daquelas duas mulheres.

   No outro lado da sala, aberta de par em par, uma janela deixava descortinar uma maravilhosa paisagem. Os visitantes, não resistindo, dirigiram-se para a janela, enquanto a Júlia, tendo pedido licença e rogado para ficarem à vontade, se preocupava em preparar a mesa.

   Da janela a cena era simplesmente esplendorosa. Campos de milho sobrepostos, descendo em socalcos, contornados de parreiras com as uvas começando a pintar, de quando em quando salpicados de pinheiros e árvores de fruto, num exuberante festival de verdes.

   E naqueles terrenos, colcha de retalhos verdejantes, sempre descendo qual imponente e gigantesco escadório, até chegarem lá em baixo, ao regato: um fio de límpido cristal coalhado de seixos arredondados que ao embate da água se cobriam de espuma transformando aquele plácido fio de água num maravilhoso colar de pérolas e diamantes.

   O murmúrio da água correndo placidamente, chegava aos ouvidos daqueles deslumbrados observadores de mistura com o chilrear dos pássaros, os zumbidos das abelhas e abelhões, o farfalhar das libélulas e o cricri dos grilos, tudo envolto no rumorejar da brisa num celestial concerto estival. E aquele sol de Agosto à viva força tudo querendo dourar.

   Do outro lado do regato a paisagem se repetia como reflexo de espelho, subindo e já em Espanha. A natureza não tem fronteiras. Para alguém desinformado jamais aquele pequeno riacho demonstraria que separava dois países: do lado de cá Portugal, do lado de lá a Espanha. Aves e insectos, no seu rodopiante bailado de louvor à vida, andavam de lá para cá e de cá para lá sem precisarem de passaporte ou qualquer documento inventado pelo complicado animal homem.

   Os olhos daqueles forasteiros, há muito tempo privados de tais cenários, estavam hipnotizados e recusavam-se a olhar outra coisa. Só quando o olfacto percebeu que estavam sendo postos na mesa o presunto, o salpicão, o pão e o vinho, é que foram obrigados a desviar-se.

   É costume daquela gente oferecer aos visitantes do melhor que tiverem em casa. Não importa a hora, tanto faz que seja de manhã cedo, à noite ou logo após as refeições, é a maior desfeita que se pode fazer a um português do Alto-Minho, entrar em sua casa sem comer dos seus melhores petiscos guardados ciosamente para essas alturas. E não basta petiscar; tem de comer bem, a fartar, para satisfação do dono da casa. A tia Maria, conhecida pela alcunha do lugar onde sempre morou, dos Pinheiros, acabava de chegar, lenta e triste. Não era alguém com notícias que ela esperava; era os filhos que há muito acalentava ver surgirem de repente, ainda que fosse isso a última coisa que olhasse na vida.

 

 (continua)


HISTÓRIA, CULTURA E PATRIMÓNIO III

melgaçodomonteàribeira, 08.03.13

 

 

Francisco Augusto Igrejas, filho de Francisco Augusto Igrejas e de Deolinda A. Fernandes, nascido a 30 de Abril de 1916, na Vila de Melgaço.

Após o exame do 2° grau, aos 12 anos, exerceu a profissão de alfaiate, como seu pai, até aos 23 anos, data em que casou com Dinora Rodrigues Nabeiro, a 10 de Abril de 1939.

Foi empossado no Cartório da Santa Casa da Misericórdia de Melgaço no dia 1 de Julho de 1940, cargo que exerceu durante 42 anos.

Em 6 de Novembro de 1959, depois do exame feito na Escola de Enfermagem do Hospital de S. João – Porto –, diplomou-se como Auxiliar de Enfermagem nunca exercendo, porém, essa profissão oficialmente.

Depois do « 25 de Abril », e logo que foram oficializados os hospitais concelhios, passou a fazer parte do quadro dos funcionários do Centro de Saúde de Melgaço com a categoria de 2° oficial.

Influenciado pelas Gazetilhas que o saudoso professor Ribeiro da Silva publicava no semanário « Notícias de Melgaço », sob as suas indicações e seus ensinamentos, lançou, no referido semanário (mas só depois do seu afastamento da nossa terra e com a sua permissão pois era ele o director do referido jornal) as gazetilhas assinadas F.A.I.J, algumas das quais o meteram em sérios apertos. Felizmente tudo passou, tudo esqueceu, e ainda bem !...

Como outro « hobi » não tem, vai fazendo quadras com versos de pé quebrado, pois que para mais não tem « bagagem ».

 

O autor

 

POESIA POPULAR

 

Autor : Francisco Augusto Igrejas

 

Capa : Manuel Igrejas

 

Edição : Cadernos da Câmara Municipal de Melgaço n° 6

 

CÂMARA MUNICIPAL DE MELGAÇO 1989

 

MELGAÇO 1643

melgaçodomonteàribeira, 08.03.13

 

 

    1643 – O capitão mor de Guimarães, Pedro Vaz Cirne de Sousa, certifica que “o cónego Cristóvão Ferraz com a companhia dos privilegiados de Nossa Senhora da Oliveira de que era capitão, se achou com grande ânimo e zelo no serviço de S. Majestade na vila de Melgaço na ocasião em que o general D. Gastão Coutinho mandou conduzir a gente de toda a província, aonde me achei com meu terço para que se viesse o inimigo o rebatesse enquanto a mais soldadesca foi desfazer os redutos de Lamas de Mouro; e o sobredito reverendo cónego cumpriu com muita pontualidade, assistindo todo aquele tempo pessoalmente com a sua companhia; e do mesmo modo noutra ocasião que o mestre de campo Violle de Athis fez na entrada por Castro Leboreiro ordenando ao dito reverendo cónego capitão que com seus privilegiados fosse guardar o castelo e vila de Melgaço, e o fez com grande cuidado, e na dita vila no espaço de 10 dias à sua conta assistiu com cavalos e criados mostrando no serviço de S. Majestade muito zelo e vontade, e em todas as ocasiões e rebates que houve nesta vila, e em toda a parte mostrou a fidelidade e devoção do serviço de S. Majestade, e é merecedor de toda a mercê que lhe for feita.”

 

Retirado de: Pedra Formosa

 

http://pedraformosa.blogspot.com

 

HISTÓRIA, CULTURA E PATRIMÓNIO II

melgaçodomonteàribeira, 08.03.13

 

 

CRÓNICAS DO CONTRABANDO

 

“Apreensão de 16 fanegas de sal a contrabandistas de Castro Laboreiro, no ano de 1686”



    “Por parte de Don Francisco Bermudez a cuio cargo estan por arrendamiento las ventas de salinas de Galizia y Asturias se há dado memorial a V. Magestade en este consejo refiriendo que el dia 27 de Mayo de este año estando Don Diego Rodriguez Guardamor da la Raia de Monterrey com sus Guardas rondando su distrito para obiar y embarazar las fraudes que cada dia se executan de entradas de sal de el Reyno de Portugal para los lugares corraianos como Viana del Vollo, y otros que pretenden eximirse de acopiarse solo con la mira á estas introduçiones y de fraudar la Real Hazenda encontraron a unos vezinos de la Villa de Castro Laboreiro de aquel Reyno cargados de sal çerca de la villa de Carballo Daberea y hauiendo intentado prenderlos se pusieron en fuga dejando mas de diez y seis fanegas del sal y solo se pudo coger a uno de los Portugueses que la conduzian al qual lleuaron presso á un lugar que llaman Reni desando la sal en el de Carballo y el dia 28 que fue el Guarda mayor y sus ministros a poner cobro en la sal les salieron al encuentro mas de çiem Portugueses naturales del lugar de Laboreiro todos armados con chuzos arcabuzes palos y otras armas con tal furia que les obligo a hazerse fuertes en una cassa del mismo lugar de Carballo y en ella los asaltaron los Portugueses maltratando los á arcabuzazos y a chuzazos; y hauiendose retirado e metido en un horno Juan Mendez uno de los ministros de Guardamayor y descubiertole los Portugueses le tiraron un carabinazo y dieron muchas heridas con los chuzos obligandole a salir y atrauesado en una caualleria le lleuaron á Portugal juntamente con los demas guardas maniatados afrentosamente como si fueran publicos malechores y en la mitad del camino ignominiosamente y atropellando los fueros de la humanidad a chuzazos puñaladas piedras y palos acauaron de matar al Juan Mendez retiniendo con el mismo (...) en (...) a los demas Guardas maniatados para executar en ellos lo mismo apretandoles los Portugueses le entregasen su presso con que les fue prezisso por librar la vida despachar persona para que le diesen libertad y con ella el Portugues presso y los demas sus conpañeros les dejaron amenazandoles que si otra vez los cojian los hauian de matar cuio suceso a dejado amedrontada toda la tierra y en especial a los guardas pues no quier ninguno exerzer este ofizio temiendose de otro trabajo semejante y que al exemplar todos los lugares conrraianos como es Viana del Vollo su Jurisdizion y los demas que pretenden eximirse de acopiarse se les habri la puerta para que con mas anchura puedan cometer fraudes pues sin que ellos vaiam por sal á Portugal los mismos Portugueses se la traen con que la Real Hazenda queda disipada generalmente en la contribuzion deste arbitrio y suplica a V. Magestade el arrendador se de á este desorden la prouidenzia conveniente.

    Todo este hecho se justifica por la caussa original y autos que se hizierin para el guarda mayor y demas ministros que se han presentado en este consejo con el memorial referido; y hauiendose visto en el con la particular atenzion que pide la grauedad deste casso á tenido por de su obligazion ponerle en la Real noticia de V. Megestade remetiendo juntamente a sus Real manos copia de los autos firmada de Don Francisco del Vaus y frias por donde no solo consta el graue delito que han cometido los Portugueses da la Villa de Castro Laboreiro en la muerte de un guarda y atropellamientos que executaron en los demas sino en faltar al cumplimento y obseruanzia de los capitulos de las Pazes ajustadas con aquel Reyno en los quales el noueno dispone.

 

Y si contra lo dispuesto eneste tratado algunos

mercadores sin orden ni mandado de los

Reyes respectiuamente hizieren algun daño

se reparara y castigara el daño que hizieren

sido apresados los delinquentes pero no

sera liçito por esta caussa tomar las armas

ni romper la Paz y en caso de no hazerse

justizia se podran dar cartas de marca o

repressallas contra los delinquentes en la

forma que se á costumbra.

 

    Y respecto de ser preciso acudir al reparo destos imcombenientes para que no se repitan es de parezer el censso que V. Magestade se sirua de mandar que por la parte donde toca se partiçipe lo que há passado al ministro de V. Magestade que assite en Portugal remitiendo la copia de autos que vá ao junta y ordenandole que en conformidad de lo dispuesto por los capitulos da las Pazes solicite se de condigna satisfazon destos exzesos y que se castigue seueramente a los que los han cometido como en estos Reynos se há executado y praticará siempre en casos desta calidad dando quenta a V. Magestade de lo que en razon desto consiguiere á fin de que se tenga entendido;

    V. M. Mandara lo que fuere su Real voluntad.

    Agosto 13 de 1686.

   

    Copia de consulta del consejo de Hazenda de 13 de Agosto en que da cuenta de los excesos cometidos por diferentes Portugueses de la Villa de Castro Laboreiro.”

 

José Domingues

 

Jornal: Porto dos Cavaleiros

 

Nº 5   Julho de 2003

 

Jornal de Lamas de Mouro

 

Director: José Domingues

 

HISTÓRIA, CULTURA E PATRIMÓNIO I

melgaçodomonteàribeira, 08.03.13

 

 

Pediu-me o meu amigo José Domingues que escrevesse uma breve nota introdutória para esta publicação, sobre a questão de tentar provar a existência do foral de D. Afonso Henriques a Castro Laboreiro, dispensando quaisquer encómios pessoais.

Não me parece ser necessário salientar a importância deste foral para a historiografia de Castro Laboreiro e, também, para a história nacional em geral, porque ela é latente ao longo de todo o seu estudo. Compreender o presente e preparar o futuro, passam, necessariamente pelo conhecimento do nosso passado, o verdadeiro trampolim que nos projecta para o futuro e para o desenvolvimento como peculiar identidade cultural, que clama pela sua expressão.

O presente artigo tem como ponto de partida e base de reflexão o trabalho "Castro Laboreiro e seus forais", da lavra de um avaliado historiador, originário destas paragens crastejas, o padre Bernardo Pintor, ampliado, sobretudo, com as notas do manuscrito original de Gaspar Álvares de Lousada Machado, escrivão da Torre do Tombo, que não foram consultadas pelo douto investigador crastejo, conforme ele próprio confessa. Mas o presente trabalho vai mais além: servindo-se de uma vasta documentação conhecida, o autor traça conjecturas complexas e aventa várias analogias históricas, subordinadas sempre ao seu peculiar rigor científico, que nos elucidam sobre Castro Laboreiro no recuo medieval do século XII.

Muitas das ideias, juízos e considerações nele expressos são discutíveis e, com certeza, serão objecto de controvérsias próximas. Penso que essa altercação será sempre necessária e oportuna, desde que seja construtiva e concreta, e só pode enriquecer o singelo conhecimento dos antanhos da nossa terra. Descobrir e trabalhar documentos antigos, provocar essa discussão, parecem-me ser as elevadas contribuições da presente publicação e, com certeza, os propósitos do seu autor, para o bem da história e da cultura local de Castro Laboreiro.

Para os eventuais leitores menos relacionados com as eminentes manifestações do autor, em proveito da história local, não posso deixar de salientar, entre outras, a monografia sobre "O Couto de S. João de Lamas de Mouro" (sua terra natal), a fundação do período local "Porto dos Cavaleiros", o estudo dedicado ao "Direito do Padroado da Igreja de Castro Laboreiro na Idade Média", a comunicação multimédia apresentada nas 1ª Conferências de História Local, realizadas no ano transacto em Castro Laboreiro, que impulsionou esta obra, e a recente instituição do "Núcleo de Eestudos e Pesquisa dos Montes Laboreiro", projecto em que tenho todo o prazer de colaborar, desde a criação, em estreita parceria.

 

Aliadas a esta obra, que hoje se imprime, são exemplos claros e iniludíveis da dedicação do Dr. José Domingues ao estudo e investigação do passado da nossa terra natal, só me resta consignar-lhe os votos sinceros de incentivo à continuidade e a promessa de isenta cooperação no incipiente projecto do Núcleo de Estudos e Pesquisa dos Montes Laboreiro, que conjuntamente ombreamos e serve para estreitar e prolongar a nossa amizade recrutada no traquejo das cadeiras do Colégio D. Diogo de Sousa.

 

Castro Laboreiro - 14 de Julho de 2003

 

Américo Rodrigues

 

O FORAL DE D. AFONSO HENRIQUES A CASTRO LABOREIRO, " ÁDITO" PARA O DEBATE

 

Autor: José Domingues

 

Edição: do autor?

 

Julho 2003

 

Núcleo de Estudos e Pesquisa dos Montes Laboreiro

 

E-mail: monteslaboreiro@hotmail.com


LUIZ FILIPE, CARICATURISTA, ANTI-SIDONISTA

melgaçodomonteàribeira, 08.03.13

 

 

LUIS FILIPE GONZAGA PINTO RODRIGUES


(n. Melgaço, 21/03/1887 – m. Viana do Castelo 10/08/1949).

Advogado e caricaturista. Estudava direito em Coimbra, quando sentiu o apelo das artes. Fez parte do grupo de Coimbra, centro germinador e propagador do modernismo em Portugal. Foi director artístico de A Farça, colaborando também em O Povo, Limia, A Águia, Folha de Viana, A Montanha, A Rajada, A Bomba, entre outros.

Findo o curso voltou para o Minho e acabou por dar prioridade à carreira de advogado. Mas nunca deixou morrer o gosto pela ilustração.

Ainda enviou trabalhos para o 2º Salão de Modernistas do Porto e, em 1919, quando foi preso como anti-sidonista publicou no jornal policopiado A Velha.

Mais tarde, depois de ter retomado a sua actividade profissional, desenhou cartazes para as festas da Sr.ª da Agonia. Já na década de trinta realizou uma exposição de caricaturas de figuras vianenses.

 

Retirado de:

 

http://hemerotecadigital.cmlisboa.pt/Fichashistoricas/ASatira.pdf

 

BRANDAS E INVERNEIRAS NOS MONTES LABOREIRO

melgaçodomonteàribeira, 08.03.13

 

 

    Embora concentradas em Castro Laboreiro, em determinados locais da serra da Peneda, da serra do Soajo e no planalto de Castro Laboreiro, existem as denominadas brandas e inverneiras, sendo estes vestígios de um sistema de habitação sazonal e o reflexo da necessidade das populações utilizarem os pastos localizados na serra para alimentar o gado.

A linguagem corrente designa as brandas de “lugares de cima” e de “airosos” e as inverneiras de “lugares de baixo” e “abrigados” (Geraldes, 1996).

   As brandas são os aldeamentos tradicionais habitados durante a Primavera e o Verão. São locais que normalmente se encontram em locais de altitude superior a + 600 m. A primeira fixação de populações nestes espaços fica cronologicamente situada na Idade Média. Nas brandas as populações dedicam-se à pastorícia e à agricultura, efectuando-se aqui as sementeiras, que crescem até ao Verão (Geraldes 1996).

   As condições climatéricas das inverneiras são, bastante mais favoráveis do que as brandas, para passar os invernos: a temperatura não atinge valores tão baixos e a queda de neve, quando ocorre é de fraca quantidade. Nas inverneiras, as populações dedicam-se quase exclusivamente ao pastoreio, pois, a água de muitos dos riachos que cortam o espaço das inverneiras seca durante o Verão, o que causa transtorno na rega das culturas e no consumo diário de água (Geraldes 1996).

   De 12 a 20 de Dezembro, as famílias das brandas efectuam a mudança para os lugares do vale, as inverneiras, logo o Natal é sempre passado na inverneira. Estas transformações são devidamente planeadas, deslocando-se não só a população como o gado e todos os seus bens essenciais. A estadia nas inverneiras termina por volta de fins de Março, sendo a Pascoa a festa que impõe a data limite da chegada às brandas, efectuando-se a transmutação a tempo das casas ficarem preparadas para receberem a cruz pascal (Geraldes 1996).

   Este sistema de mudança de casa tem vindo a diminuir, devido ao acesso das populações à compra de produtos alimentares para o gado (Geraldes 1996).

   Segundo alguns habitantes, os seus antepassados remotos tiveram como primeiro local de permanência as inverneiras e só mais tarde passaram a habitar as brandas, em virtude dos locais onde são implantadas lhes terem oferecido condições mais favoráveis a uma estadia prolongada, nomeadamente o clima menos rigoroso e melhores condições para a agricultura (Geraldes 1996).

 

 Luciana de Jesus dos Santos Peixoto

 

http://www.dct.uminho.pt/mest/pgg/docs/tese_peixoto.pdf

 

A GALIZA NO ROMÂNICO EM MELGAÇO

melgaçodomonteàribeira, 08.03.13

 

 

A GALIZA NO ROMÂNICO EM MELGAÇO

 

 

O estilo românico surge, em Portugal, nos finais do século XI no âmbito de um fenómeno mais vasto de europeização da cultura, que trouxe para a Península Ibérica a reforma monástica clunicense e a liturgia romana. A chegada das Ordens Religiosas de Cluny, Cister, dos Cónegos Regrantes de Santo Agostinho e das Ordens Militares, Templários e Hospitalários, também deve ser enquadrada no processo da Reconquista e da organização do território.

 

Na margem esquerda do Minho, na sua parte mais Oriental, há um grupo de igrejas românicas que acusa influências galegas, entre as quais se destacam a igreja de S. Salvador de Paderne e a capela de Nossa Senhora da Orada, ambas no concelho de Melgaço. No entanto, estes templos apresentam uma escultura muito diversa dos anteriores. Se, por um lado, estas construções tem uma cronologia menos recuada, reportando-se a meados do século XIII, por outro, os influxos que receberam da Galiza, no que diz respeito à tipologia das peças e aos motivos da escultura, foram adoptados profusamente na província de Ourense. As soluções da escultura destas igrejas portuguesas encontram paralelo nos programas adoptado nas igrejas cistercenses da Galiza.

 

Retirado de:

 

 A ARQUITECTURA ROMÂNICA E A PAISAGEM

 

www.rotadoromanico.com/Galeria/Publicações/Monografia/arquitectura

 

CENTRO DE ESTÁGIOS DE MELGAÇO 2012

melgaçodomonteàribeira, 08.03.13

 

 

CENTRO DE ESTÁGIOS DE MELGAÇO

 

Futebol e Atletismo em Estágio

 

   O Centro de Estágios, inaugurado em Outubro de 2001, é um equipamento polivalente, vocacionado para a prática desportiva profissional e de lazer, que já acolheu cerca de 85 estágios, de equipas nacionais e estrangeiras e de diversas modalidades – futebol, andebol, hóquei em patins, basquetebol, atletismo, rugby, taekwondo e Tog Chod.

   O ano de 2012 foi estreado pelos campeões de Angola que, pelo segundo ano consecutivo, escolheram Melgaço para a realização do estágio de preparação para a Liga dos Campeões Africanos – CAF e para o Girabola 2012. Assim, e entre os dias 7 e 23 de Janeiro, a equipa Angolana do Clube

   Recreativo Desportivo do Libolo, treinada pelo ex-treinador nacional Zeca Amaral, preparou a equipa através de diversos treinos e também de seis jogos, frente ao Melgacense; ao Vianense, aos Limianos, ao Rápido de Bouzas, ao Coruxo e ao Chaves.

   Em Abril o destaque vai para o estágio de atletismo, promovido pelo Director desportivo de L’Entente Sud Lyonnais, Daniel Aligne, e no qual participaram 40 atletas de alto nível, alguns deles internacionais, como é o caso de Florian Labourel, vencedor de dez títulos nacionais de salto em altura (2012) e recordista de França, e de Isabelle Bosco, campeã francesa de salto em altura.

   A este estágio que decorreu de 8 a 14, seguiu-se de 11 a 16 o da Escola de Futebol de Hers-Coussa, originária de França, e que conduziu até Melgaço cerca de 90 jovens, com idades compreendidas entre os 6 e os 14 anos, para aqui aperfeiçoarem as técnicas de jogo mas também conviverem e estreitarem laços.

 

MELGAÇO – Revista Municipal nº56

 

Abril, 2012

 

MELGAÇO EM A ILUSTRE CASA DE RAMIRES

melgaçodomonteàribeira, 08.03.13

 

 

A ILUSTRE CASA DE RAMIRES

 

    Gonçalo vergou os ombros, confessou que se ocupara de toda essa heráldica história por um motivo bem rasteiro – por miséria!...

   — Por miséria?

   — Sim, prima Maria, por penúria de moeda, de cobres.

   — Conte! conte! Olhe, a Anica está ansiosa…

   — Quer saber, Sra. D. Ana?... Pois foi em Coimbra, no meu segundo ano de Coimbra. Os companheiros e eu chegamos a não juntar entre todos um vintém. Nem para cigarros! Nem para o sagrado decilitro de carrascão e as três azeitonas do dever… Um deles então, rapaz muito engraçado, de Melgaço, surdiu com a idéia estupenda de que eu escrevesse aos meus parentes de França, a esses Cleves, a esses Tancarvilles, senhores decerto imensamente ricos, e solicitasse, com desembaraço, um emprestimozinho de trezentos francos.

D. Ana não conteve um riso, sinceramente divertido:

   — Ai! tem muita graça!

   — Mas não teve resultado, minha senhora… Já não existem Cleves, nem Tancarvilles! Todas essas grandes famílias feudais findaram, se fundiram noutras casas, até na casa de França. E o meu Padre Soeiro, apesar de todo seu saber genealógico, nunca conseguiu descobrir quem as representava com bastante afinidade para me emprestar, a mim parente pobre de Portugal, esses trezentos francos.

 

 Pag. 225

 

 A Ilustre Casa de Ramires


Eça de Queiroz


Edição «Livros do Brasil» Lisboa


Arquivado em: melgaço história, cultura

 

NÃO ESQUECEREMOS - CASTRO LABOREIRO E O DRAMA DOS REFUGIADOS

melgaçodomonteàribeira, 08.03.13

 

 

GALIZA E PORTUGAL: IDENTIDADES E FRONTEIRAS

 

O DRAMA DOS REFUGIADOS

 

   “Um dos maiores crimes de Salazar foi a entrega de refugiados às autoridades nacionalistas espanholas” (Prof. Emídio Guerreiro)

   Pelos relatos dos interrogatórios da PVDE a oficiais republicanos espanhóis refugiados em Portugal e comunicações da Guarda Fiscal, documentos constantes do Arquivo da PIDE/DGS e outros organismos, ficamos a saber como eram tratados e que resposta davam os refugiados republicanos em Portugal. Transcrevemos extractos de um desses relatórios da PVDE, datado de 27 de Setembro de 1937, pelo conteúdo em si e pela referência a refugiados galegos. Pelos relatórios da PVDE, vê-se que a ordem era de caça aos fugitivos que tentavam, em situação de desespero, internar-se em Portugal. Os relatos demonstram a crueza do tratamento dado aos exilados:

   “Nas regiões montanhosas de Castro Laboreiro encontram-se escondidos nas furnas, em plena montanha, desde princípio da guerra em Espanha, bastantes espanhóis. Esta polícia tem feito algumas surtidas que, dada a configuração do terreno e uma frente de 50 quilómetros, têm sido pouco profícuas. No entanto, graças à coragem de alguns agentes, vários destes indivíduos têm sido capturados e, na realidade, em circunstâncias um pouco bélicas, por vezes. Geralmente, na montanha, estes indivíduos respondem com a fuga, ou com tiros, à intimação de “Alto”. (…) Da refrega com sete meliantes resultou a captura de dois espanhóis, que foram imediatamente entregues às autoridades fronteiriças espanholas. Tem estado em estudo uma batida em forma a fazer naquela região, mas na opinião da GNR e GF tal batida só será profícua se empregarmos pelo menos duas Companhias de Cavalaria, o que seria dispendiosíssimo… (…) O perigo que oferecem estes indivíduos não obriga a tal despesa.

 

 Retirado de:

 

 Galiza e Portugal: identidades e fronteiras


 José Marques Fernandes

 

 Actas do IV Simpósio Internacional Luso-Galaico de Filosofia, Santiago, 2003; pp. 121-130

 

 http://books.google.pt

 

A TIA TINA

melgaçodomonteàribeira, 08.03.13

 

 

ERNESTINA SOUSA, FILHA DE AMÁLIA E ILÍDIO

 

A TIA TINA

 

   Nos bailes frequentados pelos papo-secos de Monção as raparigas caíam dengosas para o lado deles, a Ernestina, que era um espectáculo de mulher, aliás, cabe aqui registar que todas, mas todas as mulheres descendentes do Félix e Conceição eram uns pancadões de tirar o fôlego a qualquer mancebo. Pois a Tina fisgou o Adolfo que se aprumava na vida com uma lojinha de sociedade com outro rapaz, de Monção.

   Aconteceu o casamento e a Tina com seu dinamismo e pendor para o negócio transformou a incipiente loja do marido em poderoso entreposto de contrabando. Tornou-se o membro da família mais abastado só suplantado em curta fase pelo tio Emiliano.

   Houve nesta época uma atitude da Tina, curiosa, que revelou seu afecto aos familiares. Eu era garoto e assisti. A Tina combinando com o tio Emiliano:

   — O meu pai, dizia ela, anda bebendo nesta e naquela taberna umas malguinhas com os amigos; pois eu quero que ele tenha o vinho que quiser para beber a qualquer hora com os amigos.

   A partir daí havia na adega do tio Emiliano uma pipa de vinho comprada pela Tina para o pai beber e oferecer. Não sei quantos anos durou essa euforia ou se só se resumiu àquela pipa que eu assisti.

   O marido, o tal Adolfo, era um mulherengo, putanheiro dos diabos. Aqui cabe uma observação particular: a Tina, não obstante ser uma mulheraça na aparência talvez não o fosse na cama, daí o marido ser obrigado a procurar satisfação com outras…

   Em 1952 já estavam separados, e quando em 1969 fui até aí e à França, com os parceiros de viagem, Emiliano (sobrinho), Gú, Pirata e mais o Zeca Chatice, visitamo-lo no trabalho, uma Casa de Saúde, onde era fachineiro, com aparência deplorável. Fiquei com pena.

   A Ernestina, devido à sua condição de "sem-filhos", sempre se rodeou de sobrinhas e amigas.

 

Rio, 6 de Fevereiro de 1997

Correspondência entre Manuel e Ilídio

 

   A última recordação que tenho da tia Tina remonta a 1981. Na altura eu trabalhava em Viana do Castelo e fim-de-semana era sinónimo de Melgaço. O comboio chegava por volta das 2 horas da tarde e não havendo boleia para Melgaço ou porque tinha assunto em Monção (feminino), ia almoçar a casa da tia, por trás do Palácio de Justiça.

   — Euláááliaaaa, chegou o menino. Faz um bife e dá-lhe de comer.

   O dar-lhe de comer era o que tinha sobrado do almoço terminado há minutos. A minha tia era mulher para pesar os seus cem quilos e apesar de um tumor no cérebro tinha um apetite voraz. Eu sabia e ela sabia o significado das dores de cabeça que a atiravam para a cama.

   Eulália saía da cozinha, a dois passos da mesa onde nos sentávamos, põe o prato à frente do menino, e com a carinha angélica, branca e sarapintada com um toque de tinto nas bochechas, cabeça inclinada sobre o ombro:

   — E a senhora?...

   — Sabes que não posso comer…

   — A tia ainda não almoçou a esta hora?

   — Almocei mas ainda comia uma sopinha – Euláááliaaa

   — Ai diga, senhora, não estou surda…

   O bife a desaparecer e eu a pensar nos restos do almoço, empurra a porta e entra o tio Aprígio. Pela cara, vi logo que havia treta e quando a tia Tina ouviu que a sobrinha e a carga tinham sido apanhadas, levantou-se, deu um murro na mesa e gritou:

   — Caaralho, será que tenho que voltar a trabalhar? Não sabem fazer nada?

   Claro que a sobrinha, o camião e a carga não demoraram a estar na estrada.

   A tia Tina faleceu pouco depois vítima do tumor.

 

Três décadas antes o amigo Vasco descrevia o enredo da Tia Tina  e família, nestes versos:

A tua mãe onde está?

Não sei se é viva se é morta,

Andava a passar p’ra lá

Em companhia do Ná,

Tripa no tempo da ‘Frota’

 

O Tio Ná, Oceano de Sousa, foi sempre um dos braços direitos da irmã Ernestina. O contrabando de tripas, chegou a ser, com o de ovos e café, dos mais procurados pelos nossos vizinhos galegos.

 

Ilídio Sousa

 

AS MULHERES DO CONTRABANDISTA

melgaçodomonteàribeira, 08.03.13

 

 

UMA VIDA SENTIMENTAL PARTICULARMENTE ATRIBULADA

 

   "Águas passadas não movem moinhos." Helena do Ângelo, de 70 anos, resume, assim, as vidas sentimentais atribuladas – a sua, a de Adolfo Vieira e a de outras mulheres que ele conquistou ao longo das décadas de 40 e 50.

   No auge, dono de propriedades, milionário, figura respeitada, Adolfo deitou para trás das costas moralismos ou tradições familiares e tratou de levar a vida à sua maneira. As mulheres terão sido a sua perdição.

   Casado com Ernestina, senhora da vizinha vila de Melgaço, cedo abandonou o lar, deambulando atrás deste ou daquele rabo-de-saia. “Se calhar, porque a legítima nunca lhe pode dar filhos”, recorda Joaquim Brito, presidente da Junta de Freguesia de Monção, que herdou do pai uma alfaiataria, onde Adolfo Vieira mandava fazer os seus fatos.

   De Helena do Ângelo, o homem deixou três filhos  –  Idalina, Luís e Fernando – , da Quinhas outro, mais um da Binda das Sousas e dois da bonita galega Pilar Ramona. Avesso a “falsos moralismos”, conforme relata o dono de um café no centro de Monção, o contrabandista viveu ali todas as suas paixões, fixando residência conforme a senhora amada. Devaneios que nunca escondeu.

   Na vila, não se conhecem desvarios sentimentais, arrufos públicos, dramas conjugais. “O que havia era que, quando íamos à mercearia, ficávamos a olhar umas para as outras, a ver quem comprava mais, para ver a quem ele tinha deixado mais dinheiro”, lembra Helena.

   Adolfo alugou casas, entregava a mesada às companheiras, “amou todos os filhos”, mas deitou tudo a perder. “A Ramona fê-lo perder a cabeça. Gastou todo o dinheiro com as mulheres, mais a Pilar, mas também me deu muito!”, atira.

   Helena, por desgosto, emigrou para Angola e, quando voltou, soube que Adolfo, antes de morrer, tentara voltar para a esposa. “Quem não teve a carne também não quer o osso”, ter-lhe-á dito Ernestina, na versão de Helena.

   Há dias, Pilar Ramona passou por Monção, aonde foi tratar de papelada relacionada com a morte recente dos dois filhos. E quis visitar Helena, por quem nutre um sentimento de amizade…

 

 DIÁRIO DE NOTÍCIAS – QUINTA-FEIRA, 30 DE JANEIRO DE 1997

 

VIDA DE RICO, MORTE DE POBRE

melgaçodomonteàribeira, 08.03.13

 

 

   Dinheiro e mais dinheiro. A movimentação de homens, carroças e sacos no armazém de Adolfo Vieira, por detrás do actual Palácio da Justiça de Monção, significava mais uns contos largos a amealhar ao seu já milionário pecúlio. Os negócios, legais ou ilegais, terão feito dele um dos indivíduos da vila. A acreditar nas histórias de amantes, filhos e de alguns que o conheceram, Adolfo não era do género de correr riscos, andar a saltar de um lado para o outro da fronteira. Raramente conduzia a carroça até à pesqueira do rio.

   Não. O contrabandista sempre terá preferido o recanto do seu armazém para gerir a actividade. Ali recebia e pagava. Apenas algumas vezes ia ao Porto, onde mantinha contactos com os bancos.

   Mas Adolfo Vieira era um esbanjador por excelência. Ninguém lhe conhece uma nega a quem lhe pedia emprestado ou dado. O resto era para as mulheres, que o levariam à ruína. Sem fundo de maneio, o contrabandista, então a deixar o negócio, emigrou para Bologne, perto de Paris, França, em finais da década de 50. Lá, trabalhou como recepcionista e foi doméstico em casa de uma família que alugava quartos.

   Voltou a Monção alguns anos mais tarde. Sem dinheiro. Pouco depois sofria uma trombose que o deixava parcialmente paralítico, para morrer em Março de 1970, com 68 anos. Na miséria.

 

(continua)


SAMARRA, O COMENDADOR

melgaçodomonteàribeira, 08.03.13

 Ponte do Mouro

 

 

A “INICIAÇÃO” DE GOMES

 

  Abastado, Adolfo Vieira caiu no goto de todos pelas manifestações de solidariedade e os actos de generosidade para quem precisava de ajuda. Nem só os seus descendentes enaltecem as qualidades do homem.

   Muitos, amigos, colegas ou simples desconhecidos, safaram-se à custa do saco sem fundo do contrabandista, que não temia qualquer tipo de concorrência. A maioria a ele deve uma vivência sem sobressaltos financeiros, os contactos com o lado de lá do rio Minho.

   À memória daqueles que mais de perto o acompanharam ocorre um nome: Gonçalves Gomes, natural da região, hoje um dos homens de negócios mais afamados do Norte do País.

   “A primeira carga de café que o Adolfo fiou foi ao Samarra”, lembra Helena do Ângelo, uma das conhecidas amantes de Vieira, de quem tem três filhos, ainda a viver na vila de Monção.

   O negócio era simples, conta: o contrabandista cedia o produto ou emprestava algum dinheiro, recebendo, depois, parte do lucro. Outras vezes, explica a antiga companheira, com o ar de condenação, “dava aos 20 ou 30 contos e não o pedia de volta”.

   Terão sido assim os primeiros passos na actividade do comendador. “Foi ele que lhe deu a mão, quem o iniciou”, repete, por sua vez, Fernando Vieira, o filho mais velho de Helena.

 

(continua)


HOMENAGEM À LAURINDA DO MANCO

melgaçodomonteàribeira, 08.03.13

 

 

A 24 DE ABRIL DE 74 ÉRAMOS ASSIM

 

 

   Um dia, princípios de Março ou ainda fins de Fevereiro, o Zé, anafado e risonho, confidenciou à malta que algo se preparava. Que em Lamego “estava tudo sobre rodas” (sic). A Isabel guinchava, a Fernanda saltava e eu nem se fala. Aquelas reuniões fim de tarde prolongavam-se noite fora em casa da Fernanda e do Zé (Ferraz) com a Joana. Ou em minha casa com a João e a Teresa Feijó. Ou no Marco com a Isabel e o Jorge Baldaia. Ou em casa do Manuel Strecht Monteiro e da Lionida. Enfim, andávamos a meio metro do chão, levitantes, sorridentes, a rebentar de esperança, de vida, de juventude. “Agora é que é”, dizíamos. E as actividades conspiratórias paralelas redobravam. Era a edição e venda clandestina de livros proibidos. Eram as “passagens de fronteira” com desertores e emigrados políticos, onde se distinguia, corajosa e lindíssima, a Laurinda Alves, na altura namorada do Manuel Simas que, enquanto estivera de delegado do procurador da república em Melgaço organizara uma verdadeira porta de saída com a ajuda do Zé Ataíde e do Zé Teixeira Gomes, cuja mulher, uma brasileira, doida varrida, animava as hostes estudantis nas lutas académicas portuenses. Estávamos vivos, carago!

   O dezasseis de Março falhou, como se sabe, mas nós nem por isso desanimámos.  …………………..

 

Vosso, sempre

 

d’Oliveira

 

Retirado de:

 

Diário político 19 – Incursões

 

http://incursoes.blogs.sapo.pt/1002392.html?thread=3104152

 

DEVANEIOS DE UM CONTRABANDISTA

melgaçodomonteàribeira, 08.03.13

 

Rio Minho em Monção

 

 

   Adolfo Vieira, de Monção, outro dos nomes referenciados pelos investigadores militares norte-americanos, nunca se envolveu naquele tipo de actividades, a acreditar nos testemunhos escutados pelo DN. Café, sabão, sementes pretas de cereais e amêndoa constituíam o seu negócio.

  Era um dos mais ricos de Monção, mas não se lhe conhecem valores extraordinários. “Teria umas largas centenas de contos. Não mais”, assegura Helena do Ângelo, uma das mulheres com quem viveu maritalmente.

   Uma versão ratificada por filhos e gente da vila que com ele conviveu. “Morreu na miséria, deixando apenas 400 contos no banco”. Adolfo Vieira faleceu em Março de 1970, no hospital, porque não tinha casa…

  Era um esquema simples e muito em voga nas décadas de 1940 e 50, altura em que o contrabando entre o Alto Minho e a Galiza servia de ganha-pão da maioria das famílias. Adolfo possuía um armazém na vila, sede de um negócio rentável, no qual estavam envolvidos dezenas de homens, da sua confiança.

   Ao que nos contaram, uma carrinha Ford bastava para levar a mercadoria até uma pesqueira no rio Minho. Ali, uma batela fazia o transporte para a margem espanhola, onde contrabandistas galegos se responsabilizavam pelo respectivo escoamento.

   Não havia problemas com as autoridades, porque o dinheiro ganho “dava para tapar os olhos à Guarda Fiscal”, ouvimos à boca cheia. Tratava-se de um negócio tão pacífico que Fernando Vieira, um dos seus filhos, hoje com 49 anos, se recorda de “ir em cima dos sacos na carrinha” até ao rio. Tudo se passava junto à muralha ou um pouco mais acima, em Caldas das Termas. Ali, atravessar o rio tornava-se mais seguro, porque “o leito estreitava, o caudal baixava e a corrente não era tão forte”, explica-nos Helena do Ângelo.

   Adolfo Vieira nunca viveu de ostentações, apesar de ter o devaneio de “rasgar os fatos aos amigos para ter o prazer de mandar fazer um novo”, lembra Joaquim Brito, actual presidente da Junta de Freguesia de Monção e proprietário de uma alfaiataria.

 

(continua)

 

OS SERVIÇOS SECRETOS USA E MELGAÇO

melgaçodomonteàribeira, 08.03.13

 

Artur Teixeira

 

 

DIÁRIO DE NOTÍCIAS, QUINTA-FEIRA, 30 JANEIRO 1997

 

 OURO

 

FIÃES SERIA O TRAMPOLIM PARA ESPANHA

 

Carlos Carvalho

 

    Por Fiães, junto à actual fronteira pedestre de São Gregório, alguns quilómetros acima de Melgaço, terá passado ouro e volfrâmio para Espanha, dali para França e com destino à Alemanha. O assunto é abordado em surdina na vila minhota, mas ninguém quer dar a cara, temendo qualquer tipo de represália das autoridades.

   O minério seria proveniente de algumas minas do Norte do País, chegando a Melgaço, onde contrabandistas engendrariam o esquema de fazer passar a mercadoria para lá da fronteira. O DN sabe que Artur Teixeira, natural de Melgaço e entretanto falecido, seria um dos líderes ou mesmo o cabecilha da quadrilha, confirmando a informação dos serviços secretos norte-americanos, que, em 1945, o referenciavam como membro de uma “sociedade de contrabando”.

   Artur Teixeira é um dos muitos nomes apontados em relatórios de espiões americanos, elaborados em 1945 a partir de Lisboa, como o DN revelou no domingo. Um tema também abordado pela revista Visão na quinta-feira.

   Populares da vila, que pediram anonimato, recordam ter sido essa a forma de Artur Teixeira e seus pares enriquecerem – os americanos falam em 24 mil contos na altura. “Ele emprestava aos mil e dois mil contos, comprou inúmeras propriedades. Tinha muitas posses”, garantem.

   Ao que o DN apurou, o homem conseguiu instalar um posto de abastecimento de combustível – único em Melgaço -, montou uma empresa de camionagem, que servia o concelho e terras vizinhas, e abriu uma agência de câmbios, resultado de “importantes contactos em instituições bancárias do Porto”.

   Por razões desconhecidas, perdeu quase tudo. Às duas filhas, uma delas solteira e ainda ali a viver, não se lhe conhecem grandes valores. Sabe-se, apenas, que o Tribunal de Melgaço nomeou um gestor para a empresa de camionagem, depois de ser declarada falência.

   Apenas por Fiães passaria para a Alemanha ouro e volfrâmio, destinado ao fabrico de armas. O negócio terminaria em finais de 1944 ou 45, pouco depois dos Aliados terem libertado a França do domínio nazi.

   Nunca o rio Minho terá sido utilizado para transferir a mercadoria de um lado para o outro da fronteira. A divisão natural dos dois países serviu, isso sim, para o contrabando de pequenos produtos e géneros alimentares, muito em voga na altura.

 

(continua)

 

ESPAÇO MEMORIA E FRONTEIRA

melgaçodomonteàribeira, 08.03.13

 

 

UN VIAJE A LA MEMORIA DEL CONTRABANDO

 

Melgaço cuenta con uno de los pocos museos que hay en la península dedicado a esta actividad

 

Marisol Oliva – 24/08/2009

 

El Museo de la Memoria y la Frontera, en la localidad portuguesa de Melgaço, permite al visitante viajar al tiempo em el que la raia era cruzada por miles de personas dedicadas al tráfico ilegal de mercancías. El espacio recoge también la emigración en el régimen salazarista.

‘El contrabando unió durante siglos los pueblos de la frontera y se convertió en una forma de economía que les ayudaba a sobrevivir en zonas aisladas y sin apenas recursos, salvo la emigración’, explica Angelina Esteves, responsable de los servicios culturales de la Cámara de Melgaço, donde desde hace dos años funciona el primer museo de Portugal.

En sus salas se puede hacer un recorrido por la historia de esta actividad en la que café, cobre y tabaco se fueron alternando para ‘ayudar en las economías familiares’. Entre los objetos que se pueden ver se encuentra un uniforme de la Guardia Fiscal portuguesa, la misma que peinaba las sierras del Alto Minho buscando a los que desafiaban los caminos.

El visitante puede escuchar en la sala voces que narran sus proprias historias. El objetivo, según explica Angelina Esteves ‘es hacer un documental en el que los protagonistas cuenten sus recuerdos, tanto de contrabando como emigración’............

 

Retirado do jornal La Region

 

http://www.laregion.es/noticia/100586

 

O COTO DA MOURA

melgaçodomonteàribeira, 08.03.13

 

 

   Há muitos, muitos anos, no lugar onde hoje existe uma fonte que enche um regato e rega muitos campos, havia uma Moura encantada que todos os dias, ao nascer do sol, saía para estender o seu tesouro no cimo de um penedo, a que chamaram Coto da Moura. Servia este penedo de soalheiro ao tesouro da Moura. Depois de estender o seu tesouro, a moura sentava-se no cimo do penedo e, enquanto cantava, ia penteando os seus belíssimos cabelos louros com um maravilhoso pente de ouro. Refulgia ao longe tal conjunto. Pensava-se que a Moura assim fazia para atrair, com o deslumbramento das jóias, alguém que a pudesse desencantar.

   Os que por ali passavam contavam tal visão, mas a maior parte do povo, ou se mostrava incrédulo, ou temia aproximar-se. Então, um certo dia, um dos homens mais corajosos da aldeia foi ver se o que contavam era verdade.

   Quando chegou junto da fonte, viu uma Moura com o cabelo e pente de ouro. Estava ela sentada sobre o penedo a pentear-se. Aproximou-se lentamente, para a surpreender, de forma a que ela não pudesse escapar. Então ela, pressentindo a presença do homem disse-lhe:

   — Meu caro senhor, tenho um pente e uma “peina”. Qual deles queres?

O homem não esperava tal oferta! Até porque diziam que a Moura guardava com grande cuidado o seu tesouro. Restabelecido da surpresa, mas julgando pouco provável serem de ouro os cabelos da Moura, apesar de brilharem como esse metal, respondeu depois de breves momentos:

   — Quero o pente!

   — Ai homem, que me acabaste de dobrar a “fada”!

A Moura, depois de o fixar com um triste olhar, atirou o pente para o regato. E enquanto o homem o foi apanhar, motivado pela ganância, a Moura desapareceu.

   Em vão o homem procurou o pente. E ainda hoje se julga que o som das águas a cair no regato se parecem com o choro de uma donzela. Por isso se diz que o fado da Moura ainda contínua, já que o encanto só seria quebrado se o homem tivesse pedido a “peina” da Moura, que era a sua bela cabeleira.

 

(in Lendas do Vale do Minho)

 

RETIRADO DE: PORTUGAL A NORTE

 

http://www.nortept.com/lendas.aspx?concelho=melgaço

 

ARBO, A CAÑIZA E MELGAÇO

melgaçodomonteàribeira, 08.03.13

 

 

ARBO, A CAÑIZA Y MELGAÇO PACTAN COMPARTIR


INSTALACIONES DEPORTIVAS

 

   Los tres concellos acercan posturas para firmar el convenio en octubre

 

    L Miguez

    Arbo/La Voz

    17/09/2011

 

   El primer paso de un futuro común. Sur de Galicia y Norte de Portugal estrechan relaciones y las ponen sobre el papel con el objeto de oferecer servicios a sus vecinos que serían impensables de otro modo en la actual crisis. Por eso Arbo, A Cañiza y Melgaço han decidido sentarse a la mesa y compartir. El primer peldaño serán las instalaciones deportivas. De hecho, el concejal arbense Pepe Alvarez se trasladó hasta el municipio luso para conocer de cerca las prestaciones existentes. En la actualidad los 10.000 vecinos portugueses disfrutan de una piscina climatizada, otra exterior, un centro de entrenamiento con campo de hierba artificial y natural, gimnasio, pistas de tenis, area de tratamientos con agua y un polodeportivo. En la actualidad existe una tarifa para los locales y otra para los vecinos de fuera, que se rebajaría para Arbo y A Cañiza. “Ter a uns poucos kilómetros estas instalacións é unha vantaxa da que podemos sair beneficiados”, apuntó el edil de Deportes.

 

   El plán de la Cámara Municipal de Melgaço es aumentar la inversión y construir un edificio dependiente de la Universidad para ofrecer una titulación de monitor deportivo, además de crear um campo de golf, entre otros proyectos. Por eso la búsqueda de usuarios fuera de sus fronteras se ha convertido en un importante reto.

 

   Estas primeras reuniones esperan sentar las bases del acuerdo que se firmaría el mes de octubre y al que no descartan unir otros municipios de la comarca de A Paradanta, aunque de momento no se han iniciado más negociaciones.

 

PARQUE DE BOMBEROS

 

   “Estamos na primeira fase, recollendo datos e información. É un xeito de ofrecerlles aos veciños máis servizos, algo complexo coa crise. A nós o tema que mais nos interesa é o do parque de bombeiros, outro dos temas que se tratou co presidente da Cámara”, relata el teniente alcalde de A Cañiza, Tomás da Silva. En la actualidad la comarca echa mano de los efectivos de Ponteareas, puesto que carecen de un parque proprio. En ocasiones se alerta a los compañeros de Ourense o Portugal, aunque no existe ningún convenio al respecto. “Queremos chegar a un acordo pronto, porque en inverno é a época de maiores incendios. Ali teñen un parque grande e queda moito máis preto que Ponteareas ou O Porriño. Así cambiaria o protocolo para que os avisos de 112 lles chegaran de xeito directo”, recuerdan desde el gobierno de A Cañiza.

 

Retirado do jornal: La Voz de Galicia.es

 

http://www.lavozdegalicia.es/vigo/2011/09/17/0003_201109V17C10991.htm

 

O ALCAIDE-MOR DE MELGAÇO E OS CRIMINOSOS GALEGOS

melgaçodomonteàribeira, 08.03.13

 

 

A FRONTEIRA DO MINHO ESPAÇO DE CONVIVÊNCIA GALAICO-MINHOTA,


NA IDADE MÉDIA

 

 

Por: Prof. Dr. José Marques

Estudos em homenagem a Luís António de Oliveira Ramos

Faculdade de Letras da Universidade do Porto, 2004

 

 

   Anos mais tarde, precisamente, em 1500, era a Câmara de Melgaço que se dirigia a D. Manuel a pedir-lhe que se dignasse confirmar-lhe um acordo ou deliberação por ela tomada no sentido de manter a paz e a concórdia no âmbito deste concelho nortenho. Sabia a vereação melgacense que o ambiente social era perturbado quando alguns “galegos de capa en colo”, que tinham cometido nas suas terras crimes graves, como mortes, roubos, etc., escapavam para Portugal e vinham instalar-se em Melgaço. Afim de evitar que a presença destas pessoas provocasse situações de insegurança na vila e no concelho, foi decidido em reunião camarária que “por se escusarem yso mesmo outros inconvenientes de nosso serviço elles (os juízes e oficiais da Câmara) fizeram acordo em camará que os taaes galegos de capa en colo que os ditos malefícios graves no dicto regnnode Galiza cometessem non fossem consentidos nem acolhidos na dita villa”.

   O alcaide-mor do castelo de Melgaço, Pedro de Castro, que dava acolhimento aos referidos criminosos, opunha-se a esta deliberação camarária, pelo que a vereação expôs o assunto a D. Manuel I, pedindo-lhe que se dignasse confirmar o referido acordo. O monarca, apreciou o pedido e, tendo-o considerado “justo e honesto”confirmou-o e mandou que tais criminosos galegos não pudessem ser acolhidos nem permanecessem na vila nem, obviamente, no concelho de Melgaço.

   Embora o objectivo imediato fosse assegurar a paz e concórdia nesta localidade do Alto Minho, espaço aberto também os galegos que por bem viessem, esta medida visava claramente o combate aos crime e ao banditismo internacionais, que os portugueses do vale do Minho não toleravam, se é permitido usar esta linguagem.

 

Ler em: http://ler.letras.up.pt/uploads/ficheiros/5005.pdf

 

MORREU O JÚLIO

melgaçodomonteàribeira, 08.03.13

 

 

ADEUS JULIO, LÁ NOS ENCONTRAREMOS NA MINHA ÚLTIMA MORADA E PASSAREMOS A PENTE FINO O REBANHO QUE A MARIA CONDUZ JUNTO AO POMODELO E ONDE ANDARÁ O ANSELMO?

EM LAMAS O MELHOR É SEGUIR P’RÁ AVELEIRA,BEBER UMA FRESCA, E PERGUNTAR P’LAS BURRAS.

SALTAR À PENEDA P’RA CUMPRIMENTAR O FOTÓGRAFO AMIGO DE VELHAS TARDES SOALHEIRAS E DISCUTIR O NEGÓCIO; QUESTIONAR O RIO PENEDA NA VINDA E CALCAR A FUNDO ANTES DE LAMAS.

OS DIAS EM QUE EXPLICAVAS À ANA PAULA A DIFERNÇA DAS SERRAS, CHEGAR À CEIDA E APONTAR O FOJO DO LOBO.

ÉSTA É A NOSSA SERRA, A RIBEIRA, A NOSSA FAMÍLIA, O TIO ZÉ CARCEREIRO, NOSSO TIO, MELGAÇO D’OUTROS OLHAR. VER CAVALEIRO ALVO E ESQUECER MÉRTOLA, ALENTEJO DE SEARAS.

UMA VOLTA NA AVENIDA E SUBIR PELO TUNEL QUE ALGÉM HÁ-DE APARECER, NOVO OU VELHO, UMAS GARGALHADAS HÃO-DE SAIR.

AS SUBIDAS DO MINHO LEVARAM-NOS A OLHAR AS GARÇAS, DISCUTIR O EUCALIPTO DA VIZINHA MARIA, A DESGRAÇA QUE ERAM OS ESQUILOS NA PIGARRA, O TER QUE BOTAR O LAÇO À PRAGA DO JAVALI, AS TRUTAS QUE JÁ NÃO PICAVAM, E AOS COZINHADOS DA ZINDA; PATANISCAS DE BACALHAU COM ARROZ DE GRELOS FEITOS PELA AVÓ ZINDA, DE PUTA MADRE.

NOITES PASSADAS EMBALADOS PELA POLÍTICA DA VILA E O ORGULHO DO QUE ESTÁ FEITO. UNS POMBOS E UMAS ROLAS NO DIA DE ABERTURA DE CAÇA E UM QUASE PEDIDO DE DESCULPA POR EU NÃO ESTAR NA ALTURA DAS PERDIZES. UM QUASE QUASE DE TUDO DA NOSSA TERRA QUE ELE AMAVA COMO SÓ ALGUNS SABEM AMAR. COM PAIXÃO.

LÁ NOS ENCONTRAREMOS NA MINHA ULTIMA MORADA.

 

E se está ou não bem escrito, desculpa peço…………

E aos amigos da foto, só falta o Tripa e a cadela, um abraço solidário; são minhas as vossas lágrimas.

 

ILÍDIO DE SOUSA

 

O CORETO DO MESTRE MORAIS

melgaçodomonteàribeira, 08.03.13

 

 

O que buscas orfãozinho

Assim vestido de preto?

Eu, pobre desgraçadinho

Busco, o Morais, o paizinho

E também busco o coreto

 

A tua mãe onde está?

Não sei se é viva se é morta,

Andava a passar, p’ra lá

Em companhia do Ná,

Tripa no tempo da “Frota”

 

Agora não tenho pai

E mãe decerto morreu,

Razão porque ando de preto,

Mas o pequeno coreto

Onde é que ele se meteu?

 

Vasquinho


A PADERNE O QUE É DE PADERNE

melgaçodomonteàribeira, 08.03.13

 

 

Acresce ainda que era na banda lateral, norte, conforme nos garantem inscrições funerárias, que estava a ala dos túmulos pelo que esse portal o requeria. (…). Curiosamente, a epígrafe de uma dessas inscrições obituárias respeita a um “R. Garcia, que fez este templo”, falecido em Dezembro de 1255 – tratar-se-á de um dos mestres da obra? A igreja albergava ainda outras estruturas tumulares, algumas das quais, como as duas tampas de sarcófago que se recolhem hoje no Museu Soares dos Reis, Porto, se podem considerar verdadeiras obras de arte. As duas peças referidas parecem ter sido retiradas da igreja no início deste século (séc. XX), devido a receios de arruinamento das coberturas e paredes. Trata-se de duas estátuas jacentes, uma retratando um cavaleiro, talvez um patrono do mosteiro e outra um membro de uma comunidade religiosa, eventualmente um prior de Paderne. Pelo relativo arcaísmo técnico-estilístico, atribui-se-lhes uma cronologia em torno de meados e segunda metade do século XIII, podendo portanto ser consideradas duas das esculturas mais antigas desse género, em Portugal.

 

Autor: Luís Fonte

 

RETIRADO DE: GeneAll.net

 

http://www.geneall.net/P/forum_msg.php?id=79541&fview=e

 

UM PRESBITERO MELGACENSE NO SEC XIX

melgaçodomonteàribeira, 08.03.13

 

 

MANOEL JOSE RODRIGUES DA COSTA (1846 – 1929)

 

 

   Manoel da Costa foi um dos primeiros oficiais da Igreja Presbiteriana do Brasil. Nasceu no dia 21 de Junho de 1846 em Beleco de Passos, Melgaço (província do Minho), em Portugal, a pequena distância da fronteira espanhola. Em Novembro de 1859, aos treze anos, deixou a pátria, aportando ao Brasil em Janeiro de 1860. Dirigiu-se para Caldas, Minas Gerais, ali chegando no dia 7 de Abril. Quatro anos depois, em Março de 1864, foi residir em S. Gonçalo do Sacupaí, onde se casou a 22 de Abril de 1865 com Florisbela de Azevedo Costa (ele com 19 anos e ela com 13). Em 1866, mudou-se para Águas Virtuosas (Lambari), onde no ano seguinte nasceu o primogénito Guilherme.

   Em 1870, mudou-se para a Serra de Santos, como empregado da São Paulo Railway. Converteu-se em 1874, através da leitura da Bíblia, sendo recebido por profissão de fé e baptismo no dia 6 de Dezembro pelo Rev. George W. Chamberlain na igreja Presbiteriana de São Paulo. Florisbela foi recebida  em 7 de Março de 1875, em companhia do futuro Rev. Eduardo Carlos Pereira. No dia 21, baptizaram os filhos Guilherme, Elisa e Alberto. Manoel deixou o emprego na estrada de ferro por causa do trabalho no domingo e tornou-se comerciante. Teve um armazém na rua Santa Efigénia, transferindo-o em 1879 para a rua dos Andradas.

   Foi eleito diácono da Igreja de São Paulo em Março de 1876, e presbítero em 3 de Outubro de 1880, sendo ordenado no dia 9 de Janeiro de 1881. Tornou-se assim o segundo presbítero dessa igreja histórica, organizada em 1865. O primeiro havia sido o inglês William Dreaton Pitt, ordenado em 22 de Dezembro de 1867, que ingressou no ministério em 1869 e faleceu no ano seguinte.

   Foi somente a partir de Manoel da Costa que a Igreja de São Paulo teve com regularidade o ofício de presbítero.

   O casal Costa teve 19 filhos, quase todos falecidos na infância ou início da idade adulta. Um deles, Guilherme da Costa, foi consagrado pastor metodista (faleceu no Rio de Janeiro em Setembro de 1904, numa epidemia de varíola.

…………………………..

Retirado de Portal Mackenzie

 

Instituto Presbiteriano Mackenzie

 

Http://www.mackenzie.br/10195.html

 

MELGAÇO SÉCULO XII

melgaçodomonteàribeira, 08.03.13

 

 

FRONTEIRAS PORTUGUESAS E LEONESAS NOS FINS DO SEC XII

 

 

Linha da foz do Minho a Melgaço

No Arch. Nac., M. 12 de For. Ant., nº 3, f. 22 v. acha-se o foral de Melgaço datado de 1181, e na carta de repovoação de Lapella de 1208 renovam-se a este logar os foros com que tinha sido povoado “in diebus regis D. Alfonsi”(Liv. 2 de Alemdouro, f. 269). Os povoadores de Melgaço pediram para si os foros de Ribadavia, concelho limitrophe na Galliza. Lê-se no preambulo deste diploma que a nova povoação era fundada na terra ou districto de Valadares, districto que, como hoje vemos da situação desta ultima villa, se dilatava ao longo do Minho para o lado de Monção. Affonso I incluiu nos termos do novo município metade de Chaviães, logar exactamente situado no angulo que a linha de Melgaço a Lindoso fórma com o rio Minho, caíndo quasi perpendicularmente sobre elle.

 

Linha de Melgaço e Lindoso

De dous documentos do cartulario de Feães (Sandoval, Ygles. de Tuy, f. 132 e 137), provavelmente destruido no incendio que devorou aquelle mosteiro no seculo passado, se conhece que pelos annos de 1166 a 1174 este mosteiro era em territorio português; porque, posto aquelles documentos sejam de particulares, nelles se diz que reinava em “Portugal Afonso I”, não mencionando o rei de Leão. Que as cercanias do logar onde depois se fundou Lindoso pertenciam a Portugal pelos annos de 1160 resulta evidentemente do relatorio da transladação das reliquias de Sancta Eufémia, as quaes por essa epocha foram levadas a Orense.

 

 

RETIRADO DE: http://purl.pt/12112/2/hg-26085-p

 

NOSSA SENHORA DA ORADA

melgaçodomonteàribeira, 08.03.13

 

Capela da Senhora da Orada - Melgaço

 

 

NOSSA SENHORA DA ORADA

 

 

É Nossa Senhora da Orada, imagem de muita devoção dos povos d’estas redondezas, e desde o dia da Ascensão do Senhor, até á festa do Espirito Santo, aqui vinham em romaria a maior parte das freguezias dos concelhos de Melgaço, Valladares e Monção, offerecem á Senhora o residuo do cirio paschal, levando os seus respectivos parochos e ao menos uma pessoa de cada casa:isto em cumprimento de um antigo voto, feito por occasião de uma grande peste, de cujo flagello foram estas terras preservadas, tendo sofrido muito as outras.

(…)

É tradição antiga que, pela protecção d’esta Senhora, se livraram muitos captivos que estavam em terras de mouros e que, recorrendo á Santissima Virgem, appareceram ás portas d’este templo, com os grilhões e cadeias com que estavam presos.

 

PINHO LEAL, Augusto Soares d’Azevedo Barbosa de,

PORTUGAL ANTIGO E MODERNO, Lisboa, Livraria Editora Tavares

Cardoso & Irmão, 2006 (1873), p.Tomo V, pp.170-171

 

RETIRADO DE: CEAO

Centro de Estudos Ataíde Oliveira

 

www.lendarium.org/narrative/melgaço

 

PROCESSO 1093 DO SANTO OFICIO

melgaçodomonteàribeira, 08.03.13

 

 

CASTRO LABOREIRO – ROTA COMERCIAL

                                          

                               

PROCESSO 1093 DA INQUISIÇÃO

 

 

   Luís Henriques Julião – processo 1093 – 42 anos, mercador, filho de Julião Henriques e Branca Rodrigues, morador em Orense, Galiza, casado com Filipa Dias. Foi preso em 14/5/1656, em Castro Laboreiro, quando se preparava para passar a fronteira de regresso a Orense, conduzindo um “rocim negro que vale 8 mil reis” o qual lhe foi sequestrado juntamente com 17 arrobas e 3 arratéis de cera que tinha, comprados em Castro Laboreiro e ia levar para Orense. Saiu no auto de fé de 23/5/1660, condenado em 2 anos de degredo para Castro Marim. De seu “curriculum vitae” consta que estivera 5 ou 6 meses em Lisboa onde levara carneiradas para vender; que estivera outro tanto tempo em Lagos, como guarda dos almandravas (armazéns da pesca do atum); que estivera 3 meses em Coimbra, por “demandas do fisco” e em Braga e Porto por razões de comércio. No seguimento da prisão de Lopo Machado fugiu com a mulher para a Galiza e foi para Pontevedra a tomar conta das salinas. Depois fixou-se em Orense viajando por Madrid, Valladolid e outras terras de Castela, em negócios. Na altura que fugiu sequestraram-lhe os bens e entre eles contava-se uma vinha no sítio da Fonte do Olmo “que valia 10 mil reis e levava 16 geiras de cava”.

 

   Retalhos da História de Vila Flor VI

 

   Do site OS JUDEUS EM TRÁS-OS-MONTES

 

………………………………………………………………………………

  

   …Finalmente a 23 de Maio de 1660 foi realizado Auto de Fé.

Luís Julião abjurou então a “Fé Mosaica”, mas foi-lhe imposta várias determinações, que para bem da sua integridade física, deviam ser a partir daí escrupulosamente cumpridas:

- Usar hábito penitencial.

- Ir à missa aos domingos e nos dias santos.

- Confessar-se nas quatro festas do ano: - Natal, Páscoa, Espírito Santo e Assunção de Nossa Senhora, e comungar se o confessor assim o entendesse;

- Jejuar todos os sábados e rezar o rozário de Nossa Senhora;

- Apartar-se da “gente da nação” e cumprir tudo o que prometeu na abjuração.

 Recebeu “Termo de Soltura e Segredo”, e após a sua saída do cárcere, desconhece-se o seu destino.

 

  Foi detido a 14 de Maio de 1656, pelo tribunal do Santo Ofício de Coimbra acusado de judaísmo.

  Cumpriu quatro longos anos de prisão.

 

   Publicado por Carlos Baptista

 

   No site Por Terras de Sefarad, Janeiro de 2011.  

  

AS SETE VIRXES DE ANAMÁN

melgaçodomonteàribeira, 08.03.13

 

Capela da Senhora de Anamão - Castro Laboreiro

 

 

AS SETE VIRXES DE ANAMÁN

 

 

Próxima á Pena de Anamán, a mesma onde se agachaba o sonado bandoleiro Xan das Congostras (Tomás das Quingostas), hai unha capela dedicada a Santa Ana, e un dito:

Eu hei de subir ó ceo

por unha cinta de la;

teño de levar comigo

á Señora de Anamán.

Pois preto desta capela hai unha pena cunha fendedura da que saíron  sete irmás que se convertiron en virxes e residen agora naquela comarca, repartidas da seguinte maneira:

Na provinccia de Ourense quedaron catro: unha é a do Viso, en Lobeira; outra está no Xurés, en Lobios; a outra en Sobreira, parroquia de Ferreiros, O Entrimo (este lugar tamén se ten como berce das sete irmás) e a cuarta é a da Carballeira, en Queguas, O Entrimo. As tres que se foron a terras portuguesas son a de Boavista en Asiera, a Virxe da Peneda e a de Anamàn que é a Santa Ana da capela que dixemos ó comezo.

 

RETIRADO DE: GALICIA ENCANTADA

 

ENCICLOPEDIA DE FANTASIA POPULAR DE GALICIA

 

www.galiciaencantada.com

 

EMPRESA DAS MULHERES

melgaçodomonteàribeira, 08.03.13

 

Rio Minho em Cevide

 

 

   No tempo em que os portugueses disputavam com os castelhanos as terras do Alto Minho, um exército lusitano, composto por quinze mil homens, batalha os galegos nas margens do Minho. De tal forma era bem sucedido o seu empenho, que chegam a provar o delicioso sabor da vitória. Ébrios deste prazer, julgam-se senhores do mundo. Com entusiasmo desmesurado, aventuram-se por terras da Galiza, alucinados de bravura, dispostos a bater o inimigo em sua própria casa. Mas tal esforço não lhes corre de feição, já que, depois de curtíssimas vitórias, os lusos são obrigados a retroceder, ante o vigor do adversário, espicaçado pela vaidade nacional ferida, e supridos de tropas frescas.

   Vindo os galegos no encalço, os portugueses, desorientados, recuam lá para os lados de Castro Laboreiro. Acossados pelo enfurecido inimigo, pronto a corrigir a desfeita sofrida, as tropas portuguesas não encontram forma de o enfrentar, temendo-se uma ultrajante derrota e o risco de perda da soberania pêlos próprios territórios!

   É então que as mulheres daquele lugar, ao verem os seus desnorteados, e perante a afronta desmesurada dos galegos, corajosas e determinadas, resolvem intervir. E se os homens fogem desorganizados e abandonando as armas, elas, depois de se armarem como os guerreiros, cerram fileiras e avançam sem medo, prontas a salvar o país da ignomínia de uma humilhante derrota.

   Perante tal atitude e coragem ficam extasiados e confusos, por sua parte, os castelhanos. É então que os homens lusitanos, provocados pelo exemplo de suas mulheres, resolvem voltar para a luta, envergonhados de suas momentâneas pusilanimidade e defecção. Recuperada a energia e a fé indispensáveis, organizam-se e batem os espanhóis, ainda perplexos pela coragem e força das mulheres de Castro Laboreiro. Esta batalha ficou conhecida por “Empresa das Mulheres”.

(in Lendas do Vale do Minho)

 

RETIRADO DE: PORTUGAL A NORTE

 

http://www.nortept.com/lendas.aspx?concelho=melgaço

 

REAL CONTO DE NATAL

melgaçodomonteàribeira, 08.03.13

 

Antiga "Pensão 27" (1° prédio) na rua Velha - Melgaço

 

 

   Melgaço, 24 de Dezembro de 1973, 22.30 horas.

 

   A vila de Melgaço nunca perecia tanto como naquela noite : os comércios fechavam mais cedo e os cafés trancavam as portas às 8 da noite, o mais tardar. Os habitantes da Vila tornavam-se imperceptíveis até ao dia seguinte.

   O céu estrelado e a temperatura bastante agradável para a estação tinham favorecido a formação de um ligeiro nevoeiro.

   Havia uma dezena de minutos que eu me fora juntar ao Chancas ao cunhal do Hilário (que era um espaço defesa), o ponto de encontro nocturno da juventude melgacense do meu tempo. Eu, ele e o Manel Mareco tínhamos marcado encontro ali, depois de cearmos. Havia muito que nos desabituáramos de ir para a cama antes da meia-noite.

   Para os nossos pais, e consequentemente para nós, o Natal era um dia ordinário ao qual não atribuíamos o carácter festivo que a generalidade, abusivamente, lhe prestava. Os móbeis eram múltiplos e intrínsecos às nossas famílias.

   Apareceu o Manel e, entre cigarradas, continuámos a falar de tudo e de nada. De repente, ouvimos dizer :

   — Com que então também vos aborrecíeis na casa ?

   Era o Júlio, que vinha de Eiró, onde a mãe vivia. Como nós, e, em parte, por motivos análogos, não acordava qualquer importância àquela festividade. Encostou-se.

   Retomámos a nossa conversa estéril serenamente. E ali permanecemos uma trintena de minutos até que o Júlio perguntou :

   — Hoje não há nenhum café aberto, pois não ?

   — Acho que não – respondeu o Manel.

   — Está aberto o « 27 » – afirmou o Chancas.

   — Tens a certeza ? – duvidámos.

   — Ai, eu não sei ? Ando com um pito de Monção que trabalha ali, caraças !

   — Então vamos para lá ! Sempre se está melhor a beber uns copos, não ? – propôs o Júlio.

   Concordámos com ele e dirigimo-nos para o « 27 ».

   Não havia ninguém. Abancámos ao balcão, à entrada. Foi o pito de que o Chancas falara, a Armanda, que nos atendeu. Pedimos uma caneca de tinto e tigelas. Realmente estava-se bastante melhor do que no cunhal do Hilário. À medida que os minutos passavam, mais apreciávamos o tinto e mais nos agradava conversar.

   Pouco faltava para que o badalo do sino da Matriz martelasse as doze pancadas nocturnas quando entrou na pensão um homenzinho que mais parecia um duende. O aspecto simplório contrastava com a cortesia e a afabilidade de que deu prova ao cumprimentar-nos e ao dirigir-se à moça: desejava telefonar para os Arcos de Valdevez. A rapariga pôs o contador a zero e indicou-lhe o telefone ao fundo do balcão.

   Indiferentes, ouvimo-lo falar a uma mulher e a uns rapazes um tempo indeterminado. A família, certamente. Quando acabou, e a jovem, depois de verificar o contador, lhe disse quanto devia, o homenzinho quase gritou :

   — Cento e setenta escudos, minha menina ? Ai, meu Deus, é quase tanto como o que eu ganho no mês ! Nunca pensei que fosse tão caro !

   Virámos o olhar para o homem. A sua saudação tinha despertado o nosso respeito, mas esta jeremiada deixava-nos desconcertados. Silêncio. Continuou a lastimar-se ininteligivelmente. Então o Júlio disse-lhe gentilmente:

   — Venha cá, amigo. Você o que faz ?

   — Sou caseiro da Dona ****** , no Louridal – respondeu, meio confuso.

   — E quanto lhe paga ?

   — Ó meu rico sinhor nim chega a trezentos escudos !

   — Tem família ?

   — Tenho, sim sinhor, uma mulher e quatro filhos nos Arcos qu’ a Dona ***** não quer qu’ os traga.

   Novo silêncio.

   — Quem paga o telefonema sou eu – disse por fim o Júlio, dirigindo-se à empregada – Traga uma tigelinha para o nosso amigo – e deu-lhe duas palmadinhas amistosas nas costas – que vai beber uma pinguinha connosco.

   O Júlio, sentado, era tão grande como ele.

   Transtornado, incapaz de pronunciar uma palavra, o homenzinho tirou um lenço amarrotado do bolso e limpou os olhos.

 

António El Cambório – 2011.

 

INÁCIO SOARES, UM ILUSTRE FILHO DE PRADO

melgaçodomonteàribeira, 08.03.13

 

Prado - Melgaço

 

 

A inovação da introdução das matemáticas nos estudos filosóficos foi louvada por Inácio Soares (Prado, Melgaço, 1712 – Ruffinella, 12.10.1783). Este jesuíta entrou para a Companhia de Jesus em Coimbra a 20.3.1729, onde fez o noviciado e os estudos de Retórica (1731-1732), Filosofia (1732-1736), Matemática (1739-1741) e Teologia (1741-1745). Após ensinar Latim nos Colégios de Braga (1736-1738) e Portimão (1745-1746), foi prefeito dos estudos e lente de Teologia Moral no Colégio de Santarém. De 1751 a 1754 deu, em Braga, um curso de filosofia que ficou célebre quer pela orientação ecléctica quer pelo esplendor dos seus actos académicos e pela actualidade dos assuntos tratados. A GAZETA DE LISBOA (ano de 1754. pp. 191-192) referia-se nestes termos ao curso dado por Inácio Soares: As conclusões foram dedicadas a suas Magestades Fidelíssimas e a suas Altezas, e incluíam toda a Filosofia eclética, racional, natural e moral, ou da eleição das doutrinas de todos os autores antigos e modernos, assim filósofos como matemáticos, com maior vastidão que até agora se tem visto. Posteriormente, encontrando-se no Colégio de Jesus, onde ensinava Teologia Moral, Inácio Soares começou a dar mostras de desarranjo mental, facto que levou ao seu afastamento do ensino. Sebastião José de Carvalho, julgando-o ofendido e queixoso dos superiores, mandou chamá-lo a Lisboa. A atitude de Inácio Soares, ao afirmar perante o cardeal reformador Saldanha e Sebastião José de Carvalho, que iriam parar ao inferno se não desistissem da perseguição aos jesuítas, levou-o a oito anos e meio de prisão, na Junqueira e S. Julião da Barra. Foi preso em 11.1.1759, tendo sido depois exilado, foi para Itália a 6.9.1767. Das suas lições ficaram uma postila de Lógica, e a PHILOSOPHIAM UNIVERSAM ECLECTICAM, EX CUNCTIS PHILOSOPHORUM SECTIS METHODICE SELECTAM AC CONCINNATAM, defendida por António Neto da Fonseca (Coimbra 1754).

 

Retirado de:

 

htpp://nautilus.fis.uc.pt

 

TOCADOR DE AEROFONE EM S. SALVADOR DE PADERNE

melgaçodomonteàribeira, 08.03.13

 

Convento de Paderne

 

 

   A Igreja de S. Salvador de Paderne foi sagrada pelo bispo de Tuy em 1130, sendo que o actual edifício foi consagrado em 1264, por D. Egídio, bispo de Tuy, após reconstrução. Fazia parte do conjunto de mosteiros que concediam apoio e segurança aos peregrinos. Inicialmente teve uma ocupação feminina, passando depois para uma comunidade masculina, no século XIII, pelo menos após 1225, para a Ordem dos Cónegos Regrantes de Santo Agostinho.

   O capitel situado no ângulo nordeste do transepto destaca-se dos outros elementos, não só pela diferença do material de suporte, calcário em vez de granito (provavelmente um reaproveitamento de materiais), mas também pelo tema, apresentando elementos figurativos. No cesto, em forma de trapézio invertido, destaca-se, na face central, um personagem, despido, de braços abertos e com o que parece ser um báculo na mão direita; com a esquerda parece resgatar, da boca de um monstro, um homem. Da esquina para a face esquerda duas serpentes enroladas, sugerindo o carácter demoníaco da representação, mordem um quadrúpede. Na face direita está um arauto, um tocador de aerofone, instrumento de feitura bastante rude e já um pouco danificado. Não se trata de alusão a qualquer prática musical, mas antes uma representação plástica de mensagem sonora, a difusão oral da mensagem cristã, como que chamando à atenção dos fiéis para a meditação sobre esta representação, para os perigos de cair em pecado. O instrumento assume então com um significado simbólico, como veículo de transmissão de uma mensagem aos fiéis, ao mesmo tempo que sinal de alerta. Este tema não é de leitura imediata, mas pode ler-se, também segundo a opinião de A. Miranda, com o significado do episódio “Daniel na cova dos leões”, (Dn, 14, 39-42), (Miranda, 2001:192).

Retirado de:

 

www.fcsh.unl.pt/iem/medievalista

 

GUERRA DA RESTAURAÇÃO EM MELGAÇO E CASTRO LABOREIRO

melgaçodomonteàribeira, 08.03.13

 

Montes Laboreiro

 

 

A GÉNESE DO JORNALISMO

 

JORNAIS PERIÓDICOS DO SÉCULO XVII EM PORTUGAL E NA EUROPA

 

GAZETA, PRIMEIRO PERIÓDICO PORTUGUÊS

 

 

Onze homens de Castro Laboreiro que estavam na trincheira viram no campo doze cavaleiros castelhanos que vinham em missão de reconhecimento e deram-lhes uma carga que mataram sete, aprisionando os restantes, tomando-lhes as armas e os cavalos, e mandaram-nos presos a Valença. Vinham atrás destes cavaleiros trezentos infantes e sem saberem o que tinha sucedido aos batedores atacaram a trincheira, mas os onze mosqueteiros lhes deram cargas com que mataram alguns, e os demais fugiram, (…) deixando mortos e (…) cativos (…) 31. Dos nossos ninguém perigou. (Novembro de 1641)

 

De Entre-Douro e Minho, no primeiro sábado deste mês, veio uma carta em que se avisa que um capitão de infantaria francês, tenente-coronel, enfadado da suspensão das armas e do grande ódio em que os soldados estavam na cidade de Braga, por causa do inverno, deliberou sair em campanha e entrar por terras dos inimigos, ele só com a sua companhia, para o que foi com muito segredo, persuadindo aos seus soldados (os quais eram todos portugueses que vieram da Flandres e da Catalunha); gastou oito ou nove dias em lhes dispor os ânimos e em prevenir pólvora, balas, cordas e tudo o mais que era necessário para reduzir a acto esta generosa deliberação. E um dia antes de amanhecer deu traça com ele, e os seus soldados saíram à desfilada e caminharam para Melgaço e daí foram marchando pela ponte das Varjas até que entraram na Galiza, destruindo e subvertendo e assolando tudo aquilo que com os olhos descobriram. Não ficou gado que não fizessem presa nem encontraram pelo caminho homem nenhum que não rendessem. (Março de 1642).

 

 

RETIRADO DE: htpp://gazeta.ufp.edu.pt

 

PORMENOR DA CAPELA DA ORADA

melgaçodomonteàribeira, 08.03.13

 

 

O JOGRAL DA IGREJA DE NOSSA SENHORA DA ORADA

 

 

Situada perto de Melgaço, junto a via de comunicação para Compostela, a igreja de Nossa Senhora da Orada foi um importante centro de devoção na época. A construção actual remonta a meados de sec. XIII e terá seguido modelos disseminados a partir da Sé de Tuy, a quem estava subordinada (Rosas, 1987:49). Nos modilhões encontramos uma interessante variedade de representações, comuns no românico português: motivos geométricos e ornamentos vegetalistas; cabeças de animais domésticos e figuras humanas. Entre estas temos um musico, certamente um musico ambulante, que toca um instrumento de corda friccionada que, embora a representação seja bastante grosseira, parece tratar-se de uma viola medieval, pela configuração da caixa, indícios de abertura em C e pá de cravelhame em posição frontal. Não é um tema exclusivo da arte portuguesa, em que aparece com relativa frequência, mas também difundido noutras paragens como em Tauriac, numa imagem semelhante, no mesmo suporte, um modilhão, em que o musico aparece acompanhado de uma dançarina. Observando todo o conjunto da Orada, encontramos outros elementos que contribuem para construir um contexto em que a pratica musical profana, como é este caso, aponta para os efeitos perversos da arte dos sons. Embora não existam aqui representações de carácter obsceno, libidinoso ou exaltação dos prazeres físicos, no conjunto dos modilhões encontramos cabeças de caprino, os símbolos mais correntes da luxúria; um individuo sentado em cima de um barril, indicador de uma conduta de vida pouco saudável, de comportamentos desviantes; um personagem sentado, muito gordo, que poderá ser uma referência ao pecado da gula, entre outros.

 

Retirado de:

 

INSTITUTO DE ESTUDOS MEDIEVAIS

 

www.fcsh.unl.pt/iem/medievalista

 

O LAGARTO DE LAMAS DE MOURO

melgaçodomonteàribeira, 08.03.13

 

 

O LAGARTO DE LAMAS DE MOURO

 

 

   Em tempos que lá vão, nas imediações da chã de Lamas de Mouro, existia um monstruoso lagarto que afligia toda a população. O enorme réptil postava-se sobranceiro ao caminho que levava à Senhora da Peneda, e todos os que ali passavam eram engolidos pelo seu apetite voraz. Todos os anos, alguns pastores, perdigueiros e romeiros, que por ali passavam com destino ao Santuário da Senhora, eram vítimas do feroz lagarto.

   Ora ali perto, no coto da meadinha, morava uma mulher que passava o tempo a fiar na roca e assoalhar as suas meadas, aproveitando tão arrumado lugar ao sol. Acontece que um dia esta mulher, em andanças de devota ou de pegureira, passou por perto do lagarto. Ao ver a figura que se aproximava, o terrível sáurio acometeu para a devorar. Num supremo e insuspeito esforço a mulher arrancou da cintura uma arma da defesa, que não era outra coisa que a sua roca! Com extraordinária habilidade desferiu um poderoso golpe no até então invencível réptil, transformando-o em pedra!

   Crê-se que a mulher era Nossa Senhora, e a prova do seu feito pode-se ainda hoje ver no dito lugar de Portela do Lagarto, nome que advém da forma rochosa que encima o penhasco, pois se assemelha ao repugnante réptil.

(in Lendas do Vale do Minho)

 

RETIRADO DE: PORTUGAL A NORTE

 

http://www.nortept.com/lendas.aspx?concelho=melgaço

 

O EXILIO GALEGO

melgaçodomonteàribeira, 08.03.13

 

 

 ACTAS DO CONGRESO INTERNACIONAL "O EXILIO GALEGO"

 

 

    No decurso dos dez últimos días de xullo de 1936, Galicia caeu baixo a bota do terror, converténdose nun dos territorios da República onde a represión franquista amosaría a súa face máis cruel e asañada dende o comezo  mesmo do conflicto……………………….

   Galicia non era zona leal para os franquistas, e en ningún caso se trataba dunha retagarda segura; os sublevados tiñan razóns para considerar que Galicia era, en boa medida, un territorio hostil.

   A fuxida cara a Portugal por via terrestre. Aí os exilalados tiñan pola súa vez que burlar a vixilancia tanto da polícia política (PVDE) como da Garda de Fronteiras do réxime salazarista. Estes corpos tiñan orde de deter a todos os españois “revolucionários” indocumentados e entregarlos á PVDE para proceder á súa expulsión. En troco, os carabineiros e Garda Civil adoitaban facer entrega de esquerdistas lusos radicados en Galicia e expulsos por indesexábeis.

   Os refuxiados galegos en Portugal puideron apoiarse ademais nas redes preexistentes de contactos transfronteirizos por elos de parentela, sociabilidade e reproducción social, cimentados ademais na emigración estacional – coma os existentes, por exemplo, no Couto Misto, entre a aldea de Castro Leboreiro e a zona de Bande, ou entre Monção e Salvaterra de Miño - , na alta cantidade de galegos residentes en Portugal, nos contactos propriamente políticos dos exiliados com opositores antisalazaristas (dende republicanos da Aliança Democrática Portuguesa ata os comunistas, os mellor organizados), na presencia de mestas redes de contrabandistas e colaboradores a ambos os dous lados da raia – do mesmo xeito que se formaron grupos de guerrilleiros arraianos -, ou na existencia na banda portuguesa da fronteira de persoas dedicadas a fornecer papeis e agachadoiro ós refuxiados en troco de diñeiro.

  Todas estas redes adoitaban cruzarse e seren usadas alternativa ou complementariamente por cada refuxiado na medida das súas posiblidades. Amósao así, sen máis, a andaina de Antón Alonso Ríos, entrado pola zona da serra da Peneda como fuxido en Portugal en xullo de 1938, agachado sucesivamente por pastores que mediaban cun comerciante de Melgaço que tiraba proveito da evasión de refuxiados, por coñecidos del en Arcos de Valdevez, por un comerciante de café republicano antisalazarista no Porto, e por un vello amigo seu de Tomiño emigrado en Lisboa. Finalmente, e depois de desbaratarse o plano de embarcar cara a Francia como polisón nun barco mercante, puido arranxar a obtención de papeis nos consulados arxentino e francês e embarcar a Casablanca, e de ali a Bos Aires, gracias a ter recibido dun amigo silledao da Arxentina documentos que lle permitiron suplantar a personalidade dun seu curmán morto no país austral. Alonso Ríos non debeu ser o único que recorreu a esta estrataxema. O diretor da PVDE informaba en Outubro de 1937 ó xefe de gabinete do Ministro luso do Interior “que bastantes foragidos espanhóis que se encontram clandestinamente em Portugal, principalmente nas montanhas de Castro Leboreiro, tem obtido da Argentina certidões de nascimento de outros indivíduos, com que, possivelmente, procurarão documentar-se em Portugal”.

 

RETIRADO DE:

 

htpp://consellodacultura.org/mediateca/extras

 

ENTRE A PENEDA E O BARROSO

melgaçodomonteàribeira, 08.03.13

 

 

 

ENTRE A PENEDA E O BARROSO: UMA FRONTEIRA

 

GALAICO-MINHOTA EM MEADOS DE DUZENTOS.

 

Por Iria Gonçalves

 

……………………………………………………

 

   Mas, para que seja eficaz (fronteira) neste sentido, ela tem que ser bem definida, pelo menos nos pontos estratégicos, que, neste caso, coincidem com os lugares de passagem, os portos, fluviais ou terrestres, com as suas estruturas destinadas à cobrança de tributos.

   Assim também entre a Galiza e Portugal. A Norte ninguém tinha duvidas sobre por onde se corria a divisória. Era o rio Minho que a marcava, um traço suficiente forte e estável da paisagem, para se impor, desde logo, sem reservas. Aliás, do lado português, uma linha de povoações fortificadas, quase sobre a margem do rio, a balizar as vias de comunicação, os locais de passagem para a outra banda, eram, desde Afonso III e seu filho Dinis, a clara afirmação de uma soberania que até aí se dilatava e não merecia contestação. Pelo menos sem a resposta adequada.

   Mas a fronteira óbvia terminava na foz do Trancoso. A partir daí, se esse pequeno rio, com, mais a sul, o Laboreiro, ofereciam ainda alguma possibilidade de um claro registo de demarcação, no terreno, fizeram-no sem a força e a imponência do Minho, e, para lá deles, toda a separação se fez por serras, galgando encostas, caminhando por cumieiras, descendo a precipícios – como na Portela do Homem, o exemplo mais marcante – numa indefinição de linhas que a natureza do terreno, a fraca densidade populacional, o modo de vida dos seus habitantes, largamente dedicado à montaria de ursos, javalis ou cervos, ajudaria a manter. Aliás, os homens de Cabreiro, de Soajo ou de Castro Laboreiro, não perguntariam se era por terras da Galiza ou do Minho que perseguiam a sua presa. Possivelmente ser-lhes-ia quase toda indiferente como a ela, daber de lado da fronteira se encontravam. Esta era uma larga franja de terreno, tão larga quanto o seu distanciamento das estruturas fortificadas que a apoiavam, com os respectivos territórios de controle a envolverem-nas.

……………………………………………………

   É que, se em tempos de paz a fronteira era aberta, amável, convivial, em tempos de guerra fechava-se, eriçava-se de hostilidades, eivava-se de desconfianças.

 ……………………………………………………

  

   No extremo Norte, a praça forte de Melgaço erguia-se, por assim dizer, numa primeira demarcação do território português. Mas Melgaço estava mais virada sobre o Minho.

   Era uma fortaleza do rio.

   Na serra, o castelo do Castro Laboreiro era o que mais a Norte proclamava  a soberania de Portugal e o primeiro a sofrer os embates, numa eventual entrada de Leão por esta fronteira. Isolado e servido por um pequeno grupo de homens, como já disse, precisava do auxílio das populações vizinhas, em caso de perigo.

   Por isso, os homens de S. Pedro de Mou “se ouvirem voz d apelido do Castello de Leboreiro deven li a correr”, mas, em contrapartida, o seu alcaide, “se os vir in coita deve os acoler no Castello e inparal os”. Para isso lá estava a grande cerca, que fora construída, como outras , no século XII.

……………………………………………………

 

 

Para aceder ao texto completo:

 

 http://ler.letras.up.pt/uploads/ficheiros/3995.pdf

 

CONVENTO DAS CARVALHIÇAS II

melgaçodomonteàribeira, 08.03.13

 

Convento das Carvalhiças - Melgaço

 

 

No Convento de Melgaço, nas alas viradas à fachada principal e na que lhe fica perpendicular, situavam-se os dormitórios e, provavelmente, a hospedaria, onde ainda é possível discernir a marcação das primitivas celas, divididas por estrutura de taipa ou tabique, com pavimento em soalho e coberturas de madeira. Surgem evidenciadas, exteriormente, através das janelas quadrangulares, dispondo-se, no enfiamento dos corredores dos dormitórios, as janelas regrais, do tipo varandim, com guarda de cantaria. O número de vãos e as divisórias subsistentes permitem sugerir que o dormitório virado à fachada principal possuía sete celas, não se fazendo conjecturas sobre o virado a Sudeste.

O primitivo foi concluído em 8 de Setembro de 1750, executados por pedreiros e carpinteiros de Lanhelas, desconhecendo-se os seus nomes. Contudo, o trabalho não terá ficado satisfatório e o rigor do Inverno deitou abaixo parte da ala das celas, obrigando os frades a confinarem-se a uma das zonas menos arruinadas, onde passaram esse período rigoroso, em comunidade, numa clara, mas necessária, infracção da Regra, que estipulava a existência de celas individuais. No início de 1751, tiveram que solicitar a presença de mestres provenientes de Viana da Foz do Lima, para executarem os telhados dobrados, devido ao rigor do clima no local. Com Frei Félix de Santa Teresa (? – 1803), procedeu-se à divisão de mais celas e a colocação de soalho no corredor do dormitório em 1756. (56) (75) (76)

56 – A portaria viria a sofrer obras, subsequentes: em 1750, um pedreiro executou as escadas da entrada (4$800), (mil reis), tendo sido caiada em 1755 (5$050), a que se sucedeu a pintura dos caixilhos das janelas, em 1759 (2$400). A obra mais importante foi o seu lajeamento, em 1763 (17$000).

75 – É possível que se trate dos mestres António e Luís de Lanhelas ……

76 – E haja um claustro, onde cada um tenha uma pequena cela para orar e dormir (Fontes Franciscanas …. 2005, p.173).

 

Retirado de:

 

Htpp:/repositório.ul.pt/bitstream

 

Ana Paula Valente Figueiredo

 

Tese de doutoramento em Arte, Património e Restauro

 

FLUL – Lisboa 2008

 

NAS FRONTEIRAS DE PORTUGAL

melgaçodomonteàribeira, 08.03.13

 

 

O OCCIDENTE

 

REVISTA ILLUSTRADA DE PORTUGAL E DO EXTRANGEIRO

 

20 DE OUTUBRO DE 1911

 

Nas Fronteiras de Portugal

 

Alto Minho, Melgaço e Monsão

 

   É entre estas vilas portuguesas, da província do Minho, que se defrontam com Galisa, que se vê a velha ponte romana, compondo o cenário extremamente pitoresco de toda a região do nosso lindo Portugal.

   São estas duas vilas, Melgaço e Monsão, das mais históricas do Minho, por feitos heróicos dos seus filhos nas guerras em defesa da integridade da pátria contra os assaltos de seus visinhos de Espanha.

   Então como agora são as terras de fronteira que despertam as atenções do publico por serem o campo de acção dos que conspiram contra o novo regimen.

   Refugiados na Galisa, mercê do governo de Espanha que lhes dá quartel,  os conspiradores portuguêses tentaram passar as fronteiras pelo Minho, antes de o fazerem agora por Traz-os-Montes, realisando de facto a incursão das suas forças por Vinhaes, entre Chaves e Bragança.

   O insucesso dessa incursão foi noticiado pelos telegramas, mais ou menos contraditorios sobre os resultados da aventura, sendo, todavia, certo que houve recontro com as tropas do governo, em que de parte a parte se deram ferimentos e até mortes.

   Entretanto os conspiradores não lograram seu intento, e debandaram novamente para a fronteira da Galisa, onde parece que se conservam uns, emquanto outros desanimados dispersaram-se abandonando seus camaradas, à frente dos quaes se encontra Paiva Couceiro.

   Agora voltam novamente suas vistas para o Alto Minho, tentando entrar em Portugal por algum destes postos de fronteira.

   Não é fácil prever quanto durará tal situação desde que estas incursões tomaram o caracter de guerrilhas, como em tempos, que já lá vão, aconteceu com os celebres Remichido e Galamba, nas lutas liberaes, que por muito tempo inquietaram e não pouco prejudicaram as provincias do Alentejo e do Algarve, especialmente.

   A Historia vae, infelizmente repetindo-se. É o mesmo povo, é o mesmo país, são as mesmas paixões, e quasi um seculo decorrido, parece tudo encontrar-se na mesma ignorancia e por isso no mesmo fanatismo!

……………………………………………………………………………………

Texto Retirado de: http://hemerotecadigital.cm-lisboa.pt/OBRAS/Ocidente

 

CONVENTO DAS CARVALHIÇAS I

melgaçodomonteàribeira, 08.03.13

 

 

OS CONVENTOS CAPUCHOS DA PROVINCIA DA CONCEIÇÃO À LUZ DA ESPIRITUALIDADE FRANCISCANA E DA REGRA CAPUCHA – ANÁLISE

 

ARQUITECTÓNICA

 

 CONVENTO DA NOSSA SENHORA DA CONCEIÇÃO de Melgaço encontra-se bastante bem documentado, sendo possível determinar as datas de execução de praticamente todo o edifício e as reformas que foi sofrendo ao longo do sec. XVIII, resultando em três campanhas de obras perfeitamente definidas, correspondendo à da sua construção, uma ampliação datada de meados do século e da reforma de alguns elementos da fachada na década de 60 da mesma centúria, a qual se alargaria a várias zonas do Convento.

A primeira pedra da igreja foi lançada em 10 de Outubro de 1748, tendo sido construída conforme planta cedida pela Ordem (-----), desconhecendo-se a sua estrutura primitiva, mas cremos que seria de menores dimensões que a actual………..

Os planos do novo templo iniciaram-se a 29 de Setembro de 1757, com a primeira pedra benzida em Fevereiro de 1758, correndo as obras rapidamente, pois a igreja seria inaugurada a 13 de Abril do mesmo ano. Surge implantado em local distinto do anterior, sobre “ (…) um lajão que servia de eira com sua casa para recolher palhas, que tudo tinha rematado por uma dívida de 30 000 réis o Capitão Manuel Gonçalves Gomes, da Vila de Caminha, e a deu de esmola aos religiosos, como antes disto ficava tão distante se serviam da eira e juntamente do palheiro, não só os vizinhos, e quem se queria aproveitar deles para as suas colheitas, mas também aqueles: quorum Deus vente resto: para nelas fazerem sacrifícios a Baco, e a Vénus, de noite e de dia.

No dia 30 de Maio de 1749, iniciou-se a construção do núcleo conventual, provavelmente térreo. Esta estrutura não chegou  aos nossos dias, uma vez que a ampliação da igreja, obrigou à reconstrução do núcleo conventual anexo, tendo-se iniciado as obras, por iniciativa de Frei Francisco do Rosário, que tomou posse em 13 de Junho de 1765.

……………………………………………………

Assim, a figura de Frei Diogo da Purificação foi essencial nos Conventos de Melgaço e São Francisco de Viana……

Frei Paulo foi o responsável pela remodelação da fachada de Melgaço…….

A Frei Francisco da Trindade, devem-se várias obras em Melgaço……..

 

Htpp:/repositório.ul.pt/bitstream

 

Ana Paula Valente Figueiredo

 

Tese de doutoramento em Arte, Património e Restauro

 

FLUL – Lisboa 2008

 

PORTUGUESES E GALEGOS NO SEC XV

melgaçodomonteàribeira, 08.03.13

 

 

CORTES DE LISBOA EM 1459 …………. Chegava a Valença muito sal oriundo de Aveiro, o qual era vendido aos mercadores galegos. No fundo tratava-se de almocreves que transportavam nas suas montadas cebo, cera, unto e manteiga, levando de retorno o sal. Destas transacções resultava grande proveito para a fazenda que cobrava sisas, portagens e direitos reais.

A grande maioria dos galegos eram originários das terras de Limia e de Ourense, vindo também doutros lugares. Entravam em Portugal por Castro Laboreiro e por Lamas de Mouro “por ser caminho mais direito e mais seguro”.

Na sua exposição o procurador de Valença dizia que durante a regência do Infante D. Pedro o alcaide Melgaço, Martim de Castro, e presentemente seu filho Fernão de Castro, que lhe sucedeu no cargo, acobertavam ladrões “rroubadores” que prendiam almocreves galegos e apoderavam-se das suas mercadorias as quais se destinavam a ser transaccionadas em Valença por permuta com o sal de Aveiro. Este comportamento do alcaide obedecia ao facto de querer obrigar os galegos a pagar portagem em Cubalhão (Porto de Asnos) ou em Ponte de Mouro, locais onde desde sempre os alcaides de Melgaço arrecadavam o referido imposto.

Ora a circunstância destes almocreves terem de se desviar no seu itinerário por causa de serem obrigados a passar por Melgaço, fazia com que deixassem de vir a Portugal e fossem comprar o sal a Redondela e a Pontevedra por troca com as suas mercadorias. Resultava deste estado de coisas graves prejuízos para a cobrança de sisas, portagens e direitos reais.

Para obviar a estes transtornos insistia o alcaide que a via de acesso fosse por Castro Laboreiro e que os alcaides de Melgaço cobrassem a portagem em Cubalhão (Porto de Asnos) ou em Ponte de Mouro.. Na sequência do pedido, o rei (D. Afonso V) determinou a audição do contador e do alcaide para apuramento do lugar mais apropriado para o pagamento.

 

Ler mais em Relações entre Portugal e a Galiza nos séculos XIV e XV por Humberto Baquero Moreno – Revista da Faculdade de Letras

 

Htpp://ler.letras.up.pt

 

MELGAÇO E O CONCÍLIO DE TRENTO

melgaçodomonteàribeira, 08.03.13

 

 

D. João de Melo e Castro

 

   Alcaide de Melgaço, ingressou cedo na carreira clerical e veio a doutorar-se em Cânones, na Universidade de Salamanca, em Espanha. Graças às suas intervenções, foi nomeado Bispo de Silves (1549-1564).

   Em 1564, uma vez obrigado a deixar a arquidiocese de Évora, por ter de assumir a regência em Lisboa (na menoridade do Rei D. Sebastião, seu sobrinho), o cardeal D. Henrique escolheu D. João de Melo para lhe suceder no arcebispado (1564-1574).

   Reuniu ainda sínodos diocesanos em 1565 e 1569, essencialmente para aplicar à sua arquidiocese os trâmites do Concílio de Trento.

 

Retirado de Wikipedia

 

Universidade Lusófona

 

UM SÓ POVO

melgaçodomonteàribeira, 08.03.13

 

Ponte internacional Peso-Arbo

 

 

ARBO ACUERDA LLEVAR A SUS MAYORES AL CENTRO DE DÍA DE MELGAÇO

 

Ambos concellos ultiman un convenio para intercambiar servicios

 

 

Las noches en España e los días en Portugal. No es turismo internacional, será una jornada cualquier de los mayores  del municipio de Arbo, que acaba de llegar a un acuerdo con lá Camara de Melgaço para que sus mayores puedan utilizar su centro de día. A falta de servicios, buenos son los del otro lado del Miño. «Negociamos a césion dun terreo e a construcción dunha residencia para a terceira idade, pero iso é a longo prazo», apunta el regidor, Xavier Simon Rodriguez, que ha mantenido varias reuniones con su homónimo del otro lado de la frontera para llegar a esre acuerdo.

La medida será efectiva a partir del mes de septiembre e implicará que todos los interasados puedan usar las instalaciones del centro Censo, que tiene servicios de centro de día, terapia ocupacional e rehabilitación.

 

El comprimiso permite que los usuarios gallegos puedan entrar en las mismas condiciones que los locales y tengan servicio de transporte directo hats la localidad lusa, a escasos siete kilómetros por el puente internacional. Los interesados deben ponerse en contacto con el Concello, donde recebirán información de los trámites e los precios. Por una atención diaria de lunes a viernes de 9 a 18 horas el precio ronda los 300 euros, que incluye la comida, actividades y el transporte. «Resulta moi útil pola súa proximidade e para a xente sen plaza en centros públicos é moi boa opción», recuerda el alcalde nacionalista.

 

Este avanse promete ser el primero de muchos, puesto que el gobierno ultima un acuerdo más ambicioso para compartir servicios. Se trata, sobre todo, de que los escasos 4.000 vecinos de Arbo puedan cruzar la raia para utilizar las instalaciones deportivas de Melgaço, que roza los 10.000 habitantes. El intercambio también intentará ser cultural, con la celebración conjunta de festivales y actividades de ocio y la presencia de grupos de teatro o baile de los dos países.

 

«Queremos que o protocolo sexa equilibrado, así que nos aspiramos a mellorar a nosa oferta formativa, com cursos de apicultura, micoloxia e outros relacionados co desenrolo do rural, que interesan moito en ambas localidades», apunta Xavier Simón Rodriguez, que apoya la intención de la Xunta de poner sobre el papel, más acuerdos transfronteirizos con un convenio a tres bandas con A Cañiza. En el futuro esperan que las dos localidades tanbién se unan en luchas de defensa del rio Miño o un trabajo conjunto para potenciar sus recursos rurales.

 

la voz de galicia.es

 

27/8/2011

 

L.Míguez – ARBO/LA VOZ

 

HOMENAGEM MANUEL IGREJAS

melgaçodomonteàribeira, 08.03.13

 

Manuel Igrejas diante de uma das suas obras

 

 

   Manuel Igrejas, homem de escrita escorreita no contar das suas histórias da história de Melgaço ou não tivesse como mestre na arte o Vasquinho da Central, cedo se destacou na arte do desenho.

   Partiu para o Brasil na década de 50 do século passado e logo encontrou no desenho sobre azulejo a sua paixão. Melgacense e Patriota empedernido, tem trabalhos que podem ser admirados, por exemplo, na entrada do Convento de Nª Srª da Conceição nas Carvalhiças e outros que pelas ultimas noticias se encontram algures na Casa da Cultura; não existem paredes em Melgaço onde possam ser colocados e admirados pelos seus conterrâneos, ou azulejo é significado de quarto de arrumação.

   Colaborador de A Voz de Melgaço e de Foz do Rio Trancoso 42º 9’15’’ (agora, Melgaço, do monte à ribeira), aqui deixo a minha admiração e homenagem à obra deste ilustre Melgacense.

 

Ilídio Sousa

 

O PELOURINHO DE CASTRO LABOREIRO

melgaçodomonteàribeira, 08.03.13

 

 

O PELOURINHO DE CASTRO LABOREIRO

 

 

   Numa digressão que fizemos pelo Norte em Julho de 1917, depois de termos regressado do sul de Angola, onde estivemos como expedicionário comandando a 10ª  companhia de infantaria nº 20, tivemos a ocasião de ir a Castro Laboreiro. Logo que ali chegámos, feita a viagem desde Melgaço a cavalo e acompanhado de guia, perguntámos pelo pelourinho.

   Fomos então informado de que estava fazendo parte da chaminé duma casa onde residia um professor primário aposentado. Convidado a entrar na referida casinha, ali se nos deparou um esteio de granito de secção octogonal, com dois metros de comprimento, tendo num dos extremos a inscrição que se vê no desenho (não temos o desenho),  0m,22 abaixo da linha, em que devia assentar um ‘’chapéu’’ de pedra, segundo ouvimos referir a um indivíduo de idade avançada, que havia sido encarregado por um antigo pároco de apear o pelourinho, a fim de empregar o fuste na casa que andava construindo. No outro extremo apresentava vestígios de ter estado metido numa cavidade. Por acaso apareceu uma rapariga castreja, que disse ter ouvido a um dos seus falecidos avós que uma pedra fazendo parte da parede exterior duma outra casa da localidade era do pelourinho.

   Dirigindo-nos à casa indicada, deparou-se-nos uma pedra em forma de pirâmide quadrada truncada, tendo na parte superior uma cavidade, onde devia introduzir-se o extremo inferior do esteio. Numa das suas faces, viam-se dois pequenos sulcos paralelos, que talvez tivessem servido de sinais de referência, pois um dos circunstantes disse recordar-se de ter visto na sua infância as mulheres servirem-se do pelourinho para medirem as meadas de linho. As dimensões do tronco da pirâmide eram as seguintes: altura 0m,70; lado da base 0m,43; distância entre a base e o traço inferior de referência 0m,36 (dois palmos); da mesma base ao traço superior 0m,56 (três palmos e meio); dêste traço à aresta superior 0m,14 (meio palmo).

   O esteio tinha tambêm um traço horizontal de referência, 0m,02 acima do extremo inferior. A espessura do esteio era de 0m,15 e cada face da secção octogonal tinha a largura de 0m,05.

   Segundo informações o ‘’chapéu’’, de secção quadrada, tinha umpequeno friso em volta e na parte superior um chanfrado, no qual entrava a base  duma pirâmide de granito, com 0m,60 d altura aproximadamente, e que rematava o pelourinho. Entre a base da pirâmide e o rebôrdo exterior havia a distância aproximada de 0m,15. O conjunto assentava em três degraus de granito, de 0m,30 de altura cada um, e tendo o inferior 2m,5 de lado. O informador foi Melchior Gonçalves, de 85 anos de idade, têndo sido ele quem em 1860 destruíu o pelourinho, como dissemos, por ordem do pároco da freguesia. É oportuno dizer que aquele informador Já não se lembrava que a pedra que nos foi indicada pela rapariga castreja fizera parte do pelourinho, como devia ter feito, segundo a nossa observação.

   Vê-se, pois, do que fica dito dêste pelourinho, que se levantava em frente de uma pequena casa térrea servindo noutros tempos de câmara municipal, esteve no seu lugar durante três seculos.

 

   Setúbal, Novembro de 1920

 

   Fernando Barreiros

 

Retirado de O Archeologo Português

 

1664 - P. ANTÓNIO VIEIRA E O COMETA

melgaçodomonteàribeira, 08.03.13

 

 

PADRE ANTÓNIO VIEIRA

 

O COMETA DE 1664 VISTO EM MELGAÇO

          ……………………………………………

      Esta grandiosidade do cometa assusta e dá-se início a uma onda de prodígios narrados a 4 de Maio de 1665 em carta a D. Rodrigo de Meneses.

      Conta Vieira que “grandes prodígios se referem de perto e de longe.

      De Melgaço vi carta de um notável meteoro que, correndo da parte de Valença do Minho, e durante por muito espaço, se desfez sobre Galiza em raios e coriscos; era de figura de uma espada de cor verde e amarela, que saía de duas nuvens, uma branca e outra vermelha, e com a mesma figura que foi visto em outras partes”.

      Na mesma data Vieira descreve os prodígios ao marquês de Gouveia, com algumas variantes:

      “Outra carta vi, de pessoa digna de fé, escrita de Melgaço em que diz aparecerem naquelas partes muitos sinais horrendos, de dia e de noite, que não especifica; só refere que no dia 16 de Abril, ao sair do sol, aparecera um raio de cor verde e amarela, o qual se remata em duas nuvens pequenas, uma muito branca e outra muito vermelha; e correndo por grande espaço para a parte interior da Galiza, ultimamente se desfizera sobre ela em raios e coriscos de fogo”.

………………………………………………………

Texto retirado de www.scribd.com

 

O NOSSO CÃO

melgaçodomonteàribeira, 08.03.13

 

Castro Laboreiro

 

 

UM CÃO DA NOSSA TERRA

 

   O cavaleiro, que capitaneava estes homens, cavalgava um magnífico e fogoso cavalo murzelo sem mancha, ao lado do qual trotava bizarramente um daqueles gigantescos e valentes cães de Castro Laboreiro, igualmente preto retinto, cuja grandeza faz apavorar os que pela primeira os vêem.

 

   O cavaleiro puxou de uma chave, que trazia consigo, e abriu uma porta falsa, que havia no lado direito do grande portão de ferro. O enorme cão de Castro Laboreiro, que o tinha acompanhado, lançou-se de um salto para dentro.

 

   As nuvens estalejavam em trovões estridentes e prolongados; e os relâmpagos fendiam nelas longos sulcos caprichosos que iluminavam pavorosamente o espaço.

   — Belzebu aqui! – disse então o cavaleiro, em voz surda e dominadora, ao cão, que olhava inteligentemente ora para ele ora para o terraço.

   O gigantesco animal lambeu com humildade e afecto a mão, que imperiosamente apontava para a terra, e, em seguida, deitou-se de barriga e estendeu o focinho sobre as mãos, cravando ao mesmo tempo no amo um olhar cheio de tino e de intrepidez.

 

      Ana Maria dos Santos Matos

 

      O Satanás de Coura

      Memórias do sec. XVII

      Por

      Arnaldo Gama

      (Romance Inédito)

 

      Este cheirinho ao nosso cão de certeza que abriu o apetite ao resto do romance. Vamos viver o que já passou há muito.

http://repositorio-aberto.up.pt/bitstream/10216/18641/3/5252TM02PAnaMariadosSantos

 

TERMAS E NASCENTES

melgaçodomonteàribeira, 08.03.13

 

 

    Identificação – Pinheiral da Rocha

 

   À entrada de Cristoval tomar à esquerda o caminho Canais, a estrada termina em Caneiros, propriedade na margem esquerda do rio Trancoso.

   Indicações – Digestiva e muito leve (ausência de cálcio).

   É semelhante à água do Peso em Melgaço, tem o mesmo sabor, já foi engarrafada.

   A água brota de um maciço rochoso ao qual se anexou uma pequena oficina de engarrafamento.

   Uso particular – encontra-se na propriedade do João Evangelista Pires, morador em Cristoval.

   Analisada por C. Lepierre, esta água teve grande fama e foi mesmo engarrafada e comercializada.

   Bibliografia – Almeida 1988

   “Depois desta recolha tentei saber um pouco mais sobre estas águas, já que se falava em engarrafamento, o que  para mim (só faço a recolha dos textos publicados) significava avultado investimento, ou de outra forma de dizer, ter capitais. Que o João E. Pires tinha cabedal para isso, não sei.”

   Outra fonte fiável de S. Gregório torceu o nariz quando falei no assunto; não via aquela pessoa a investir em água quando havia outras coisas mais rentosas.

   Cheguei a Melgaço e com ela já fisgada, fui falar com o Francisco Pereira. O Francisco ouviu e como eu não abri logo o jogo fechou-se em copas. Insisti…

   Insisti no assunto até que falamos de água e quem era dono da água.

 

   O local onde corria e foi engarrafada a água pertencia ao Sn.r José Pereira e agora a herdeiros; nunca foi pertença de João E. Pires.

   Zé Pereira, nome grande da praça comercial de Melgaço, junto dum Mareco, dum Emiliano Igrejas, dum Manuel da Garagem e outros que durante anos foram o sustento de muitas famílias no concelho.

   Aproveito para dizer que ainda hoje lembro o Sn.r Zé Pereira, o Sn.r Claudino e o Francisco Pereira que enchia cartuxos de café quando estava de castigo.”

 

   Identificação – Pesqueira Longa (Paços)

 

   Saindo da povoação em direcção ao rio Minho, na margem deste entre arbustos encontra-se a nascente. (Almeida 1988)

   Indicações - Digestivas e diuréticas.

   Pesqueira Longa, termo de Melgaço fonte medicinal citada por Reis (1779). Acciaiuoli (1944) repete o texto do autor anterior. Almeida (1988) além de nos dar a sua localização acrescenta: “… tão perto das margens que as cheias do rio facilmente a cobrem, encontra-se a nascente que o povo denomina de água férrea. É grata ao paladar e muita gente a procura por lhe encontrar propriedades digestivas e diuréticas.”

   Bibliografia – Acciaiuoli 1944, Almeida 1988, Reis 1779

 

   Identificação – Caldas de Paderne

 

   Perto do Convento de Paderne, dos Cónegos Regrantes de Santo Agostinho (Aquilegio, 1726).

   Estas caldas segundo o Aquilegio, tiveram grande concorrência, mas já à época da redacção desta obra se achavam “cobertas de terra”.

   Bibliografia – Acciaiuoli 1944, Almeida 1988, Henriques 1726

 

Texto retirado de www.aguas.ics.ul.pt com anexos de Camborio Refugiado

 

GUERRAS E MELGAÇO NO MEIO

melgaçodomonteàribeira, 08.03.13

 

 

GUERRAS LIBERAIS – MELGAÇO 1827

                                       

EXTRACTO

 

O tenente general Marquez de Angeja, escreve de Melgaço, em 9 do corrente, dizendo: “Depois que dirigi a v.ex.ª, hontem, o meu officio datado de Valladares, marchei com as tropas do meu comando para Melgaço, para me assegurar se os rebeldes, haviam, ou não, entrado em Hespanha, e qual era o comportamento que com elles haviam tido as auctoridades hespanhola da fronteira, tendo eu dirigido hontem mesmo um officio ao governador de Tuy para fazer desarmar os rebeldes que haviam entrado no seu districto; ainda não recebi resposta alguma d’elle, mas sei que o marquez de Chaves entrou na Galliza por Fiães acompanhado de alguma infanteria e da maior parte da sua cavallaria, tudo em tal desordem e ruína, que não poderá entrar facilmente em novas operações, não obstante affirmarem os soldados, que se dirigem a Montalegre e Chaves à provincia de Traz os Montes; mandei fazer esta tarde um reconhecimento forte até S. Gregório, ultima povoação portugueza, situada na confluencia do Minho e de um pequeno regato aonde principia a raia secca. As guerrilhas fizeram grande resistencia sendo comtudo repellidas com grande fogo de caçadores e cargas de cavallaria, para o territorio hespanhol, aonde se achavam postadas duas ou tres companhias de melicianos de Galliza, que visivelmente os protegeram, permittindo-lhes fazer fogo por muito tempo. Conto dirigir-me ámanhã ás auctoridades hespanholas, reclamando que estas guerrilhas e soldados sejam immediatamente desarmados, pedindo igualmente uma satisfação pelo comportamento hostil que tiveram hoje para comnosco.

 

Ler mais em http://purl.pt/12101/1

 

Tenente general D. João de Noronha Camões de Albuquerque Sousa Moniz, 8º Conde de Vila Verde e 6º Marquez de Angeja, liberal às ordens de D. Pedro IV, governador da província do Minho, onde estava quando rebentou a revolta absolutista em 1826. Nasceu a 20 de Abril de 1788, faleceu a 23 de Junho de 1827.

 

MELGAÇO, CÁ E LÁ

melgaçodomonteàribeira, 08.03.13

 

 

   Originou-se de uma aldeia dos índios Arycuru, catequizados pelo Padre António Vieira, da Companhia de Jesus.

   Em 1653, foi construída no local uma igreja sob a direcção dos padres Manuel de Sousa e Mateus Delgado.

   A aldeia ficou sob a responsabilidade da Companhia de Jesus até 1759, quando a lei pombalina os expulsou do Brasil.

   Com a expulsão dos jesuítas, a direcção dos índios passou a ser exercida por um director dos índios.

   Em 1758, a aldeia passou a condição de Vila, dada pelo Capitão Geral do Estado Francisco Xavier de Mendonça Furtado, que a denominou de Melgaço, em homenagem aos imigrantes portugueses, que chegaram de uma localidade de Portugal, chamada Melgaço.

   A partir de 1851, Melgaço, por diversas vezes, teve a extinção e restauração de sua chegada de município. Porém em 29 de Setembro de 1961, através da Lei Estadual nº 2.460, foi criado o novo município de Melgaço.

 

   Retirado do site br. Nova Página 1.

 

DO SONHO À REALIDADE

melgaçodomonteàribeira, 08.03.13

 

Jean Loup Passek

 

 

      Sinto-me na Cinna Citá, ao lado do mestre, no alto de uma grua a olhar para  as cúpulas, telhados, jardins suspensos, bairros de lata e ele a dizer, voz rouca, a gritar:

      — Roma, mi cittá.

      Frederico é o nome do meu avô; Fellini é o nome dum génio.

      Conheci Felinni, em 74 ou 75; preto e branco no 8/5; o Ciccio  no Amarcord, o Satiricon, as bichas p’ra entrar no Palácio Foz.

      Em Melgaço naveguei na fonte com a deusa nórdica; em Melgaço encontrei o outro, o nosso, o senhor Fellini, o homem que não precisa de nome; em Melgaço há muito para descobrir.

      E o senhor cinema, décadas depois do Ti Pires e do Sn.r Hilário, Jean Loup Passek, melgacense aprofilhado não contente com o espaço que lhe foi conferido pela C M M  conseguiu que o museu não parasse. E nós agradecemos. O antigo cine Pelicano vai ser reconvertido e o museu alargado.

 

Depois de Fellini é Bergmam!

 

Erros ortográficos são da responsabilidade de:

 

Io volo una dona….io volo una dona

 

Camborio Refugiado

 

LA NAZCA PORTUGUESA

melgaçodomonteàribeira, 08.03.13

 

 

   A una hora de Vigo y muy cerca de la frontera con Portugal, las montañas de la Serra da Peneda, pertenecientes all concello luso de Melgaço, escondían un tesoro arqueológico que hasta ahora había pasado desapercebido para los estudiosos:una veintena de figuras de animales y rostros humanos conformados por alineamentos de monolitos, que algunos casos tienem más 300 metros de largo y que solo pueden ser destinguidos de una posicion elevada. Este tipo de hallazgo arqueológico es totalmente novedoso en Europa y sólo se tienen noticias de restos similares en el continente asiatico y americano.

   La mayoria de estas colosales figuras se encuentran situadas en las laderas de las montañas cercanas al Parque de Lamas de Mouro y el pueblo de Cubalhao. Después de siete años de investigaciones y tras explorar repetidamente la sierra con ayuda de pastores y la guía del Parque, Silvie Amorín, pude determinar que las formaciones de piedras “hincadas” no eran ningún tipo de muros y, tras examinar numerosas ortofotos aéreas y compararlas con las tomadas en tierra, llegué a la conclusión de que dichos restos arqueológicos dibujaban figuras de varias especies: aves, cuadrúpedes y anfibios, así como rostros humanos, cuyo tamaño va desde los 50 a 350 metros de longitud. Muchas de las figuras pueden verse desde lo alto de las montañas viecinas, por lo que no es probable que se hicieran para ser vistas únicamente desde el cielo, lo cual descarta cualquier tipo de especulación en este sentido.

...................................................................................................................

...................................................................................................................

...................................................................................................................

 

Pode ler mais em www.akasic.com de onde este texto foi retirado.

 

UM MELGACENSE NA COMPANHIA DE JESUS

melgaçodomonteàribeira, 08.03.13

 

 

AD MAIOREM DEI GLORIAM

 

 

 

RODRIGO DE FREITAS

 

 

   Português de Melgaço, cavaleiro fidalgo, nascido em 1509, vindo para o Brasil com Tomé de Sousa, foi sucessivamente almoxarife, escrivão do armazém de mantimentos, escrivão da Matrícula em 1522, e, finalmente, Provedor da Fazenda da Bahia, ‘’por estar para casar com uma sobrinha de Rodrigo de Argolo’’, nomeado em 19 de Fevereiro de 1553 e efetivado em 22 de Novembro desse mesmo ano. Em 31 de Novembro de 1555 foi-lhe concedido um alvará de mercê do ofício de Escrivão do Tesouro, também na Bahia. Havia sido também Procurador da Coroa e Tesoureiro das Rendas Reais. Ao tempo de D. Duarte da Costa foi preso e degredado, por ter feito oposição ao governador-geral, guardando as liberdades municipais no exercício das funções de vereador e juiz ordinário. Reintegrado nos cargos e libertado, enviuvou, o que o levou a ingressar em 1560 na Companhia de Jesus, abandonando toda a sua actividade burocrática. Aliás, ainda leigo, já cuidava dos órfãos do Colégio de Jesus. Já com as ordens sacras, em 1568, era reitor do Colégio de Pernambuco, onde ficou até 1572. Procurador geral da Companhia de Jesus em 1573, seguiu com o governador Antônio de Salema para o Rio de Janeiro, afim de visitar os estabelecimentos jesuíticos do sul. Em 1583 estava em Portugal, cuidando dos negócios temporais da Companhia, regressando nesse ano com o Padre Fernão Cardim. Foi Visitador e Provincial, Superior em Pernambuco e S. Vicente. Enfim, foi um dos homens mais activos do seu século. Faleceu na Bahia em 1604, contando 95 anos de idade e 44 de Companhia de Jesus.

   Fontes:- DHBN, 36:129/133e 38:50. – CALMON, Introdução e Notas ao Catálogo de Frei Jaboatão, 1:322 – EDISON CARNEIRO, A Cidade do Salvador, 41/43 – SERAFIM LEITE, Hist. da Comp. De Jesus no Brasil, 1:43/44, 460;461 e 576.

 

Retirado de Alfandega de Salvador

 

 www.receita.fazenda.gov.br/memoria/pessoal-funcionarios.asp.

 

1823 - MIGUELISMO EM MELGAÇO

melgaçodomonteàribeira, 08.03.13

 

 

PEÇAS OFFICIAES

 

 

MINISTERIO DOS NEGOCIOS DO REINO

 

Para o Juiz, Vereadores, e mais Officiaes da Câmara da Villa de Melgaço

 

      "A Sua Magestade forão presentes e muito agradáveis, as expressões de amor e de lealdade Portugueza, com que a Camara da Villa de Melgaço o saúda e felicita pela sua nova elevação ao Throno de Seus Augustos Maiores, em todo pleno e livre exercício de Suas Reaes e Soberanas attribuições, de que o havia privado huma facção de Portuguezes degenerados, impios, e fatuos, imbuidos dos nefandos principios de huma Seita, que nos seus tenebrosos planos se propoe horrivelmente á destruição dos Thronos, e do Altar, tão clara e visivelmente, como o provão a multiplicidade dos factos a todo o Mundo publicos e notorios. Sua Magestade louva e agradece á Camara as demonstrações da sua fidelidade e amor que lhe consagra, reconhecendo em commum com todas as mais do Reino, e pelo consenso unanime de todos os bons leaes Portuguezes, que se não tem deixado corromper felizmente , dos perversos principios de tão execrável Seita, que o Bem Publico, he inseparavel do Bem do Soberano, por serem estes dois interesses, hum unico e só interesse, e hum unico e só o vinculo que une o cidadão á Patria, e ao seu Principe, cuja gloria e prosperidade he sempre inherente á do Estado, como á de hum chefe da grande Familia, de que elle se constitue. Sua Magestade espera que a Camara se continuará a haver com a mesma pureza e igualdade de sentimentos que lhe manifesta, aborrecendo e detestando hum Systema tão maligno e preverso, que envolveo toda a Nação em hum pélago de males e de calamidades, compremettendo a sua honra, a sua dignidade, e a sua propria virtude e lealdade, que por tantos seculos havião constituido o seu timbre, e brioso caracter, e de que os Portuguezes muito se honravão e prezavão"

 

Deos guarde a V. ms. Palácio da Bemposta em 11 de Julho de 1823

 

Joaquim Pedro Gomes de Oliveira

 

LISBOA: NA IMPRESSÃO REGIA.

 

Com Licença da Reál Commissão de Censura.

 

TEXTO RECOLHIDO DA NET em GAZETA DE LISBOA Nº 164