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MELGAÇO, DO MONTE À RIBEIRA

História e narrativas duma terra raiana

MELGAÇO, DO MONTE À RIBEIRA

História e narrativas duma terra raiana

MELGAÇO, CONVENTO DAS CARVALHIÇAS, 1765

melgaçodomonteàribeira, 26.03.22

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DOCUMENTO SOBRE A CONDUÇÃO DA ÁGUA AO CONVENTO DE

NOSSA SENHORA DA CONCEIÇÃO DE MELGAÇO, 5 DE JUNHO DE 1765

CONVENTO DAS CARVALHIÇAS, MARIA, FREI MANUEL DE JESUS, RELAÇÃO SUMÁRIA DA VINDA DOS RELIGIOSOS PARA ESTA VILA DE MELGAÇO E DO MOTIVO QUE PARA ELA HOUVE

 

Duvidas que se moverão sobre o muro que se fez pello meyo do campo chamado Marrocos, o coal da parte do Poente he de Agostinho Fontes e da parte do Norte he de Francisco Alvarez. Fesse, e pediose aos Dous asima ditos Licença para passar a da agoa pello meyo do dito campo e disse-lhe que no fundo do campo chegaria o muro a 7 ou 8 palmos de Altura; mas como o campo nos enganou, porque quanto mais hia para o fundo quanto mayor altura demandava, e pedia a parede, e tendo-nos posto hua cana no fundo demonstrando a altura, que tínhamos ficado atirarão (não sey quem presumisse forão os donos do campo) resultou dali Agostinho de Fontes, querer embragar a obra, causa porque viherão Louvados, e pozerão o dano em doze mil reis, sendo que não algum antes sim muito augmento para o dito campo, como se patenteia aos olhos de todos. Feze papel e lhe conto o Nosso Irmão Síndico 8000 mil reis e hua serventia de hu caminho do carro e pe pello nosso para sempre, pellos 4000 reis. A Francisco Alvarez da parte do norte não fizemos contrato algum somente lhe prometteo esta comunidade hua sepultura para si e seus Ascendentes e o mesmo caminho que o outro assima dito, e pediu mais meya hora de Agoa do que vem de rega para as hortas desta Communidade a coal logo se lhe deo, e se servio na mesma ora della. Depois passados alguns seis mezes, rependeu-se e começou a dizer que não queria estar pelo que se tinha passado, Deus perdoe a quem leve a culpa, nem queria sepultura, nem caminho, nem agoa, que queria o muro dali fora visto estes desbaratos se metterão louvados, ficando com o caminho e a meya hora de agoa, e se lhe deu mais 18$000 reis. Neste mesmo tempo se ajustou bastante madeira para o claustro de carvalho e castanheyro toda pedida pello amor de Deus por o leygo Frei Luis de São Domingos e posta neste convento por todo o povo do monte.

 

5 de Junho de 1765

Frei Diogo da Soledade

 

Ana Paula Valente Figueiredo

Os Conventos Franciscanos da Real Província da Conceição

Análise histórica, tipológica, artística e iconográfica

Volume II

Tese de Doutoramento em Arte, Património e Restauro

Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa

Lisboa, 2008

ESTÁ NA HORA DO REGRESSO A CASA

melgaçodomonteàribeira, 23.03.19

48 a2 - antigo escudo da vila, desaparecido.jpg

antigo escudo de melgaço

 

ACHADOS

 

Não sabendo eu explicar a razão pela qual os arqueólogos portugueses, ou outros, nunca se interessaram por Melgaço, à excepção da freguesia de Castro Laboreiro, que nos últimos anos tem sido palco de investigações nesse domínio, não quero contudo deixar de lado o assunto. E a verdade, apesar dessa ausência, aqui e ali ao acaso, vão aparecendo objectos de antanho, os quais logo desaparecem como por bruxedo!

Escreveu Figueiredo da Guerra no “Correio de Melgaço” nº 31 de 5/1/1913: Da idade do bronze apareceram em (Novembro de) 1906, na Carpinteira, S. Paio, em esconderijo subterrâneo (quando se arrancava um pinheiro numa bouça), cinco machados de cobre, tipo morgeano (…), que nós classificamos como modelo grande do Minho. Da mão do nosso amigo Serafim Neves, onde os vimos, passaram ao Dr. José Leite, indo aumentar a colecção oficial de Lisboa.

No adro da igreja do mosteiro de Paderne existia desde tempo imemoriais uma curiosa lápide ornamentada; os paroquianos admiravam o par, representado toscamente, e o comentavam a seu modo. Era nada menos que um cipo luso-romano agora lajeando o pavimento, e tendo na parte superior um nicho com duas figuras, homem e mulher, dando as mãos; no rectângulo inferior e também abaixo dele, a inscrição, que diz: «Fulana, de cem anos, e seu companheiro Valus, filho de Arda, de 50 anos, aqui estão sepultados. O companheiro Pento mandou fazer este monumento.» Este padrão, tão cobiçado pelo Director do Museu Etnográfico de Belém, acabou por seguir para lá em 1906.)

No “Arqueólogo Português”, volume XII, 1907, o Dr. José Leite de Vasconcelos escreveu: «Junto da igreja de Paderne… existia… uma pedra lusitano-romana… ocupa hoje lugar de honra no Museu Etnológico…»

No Notícias de Melgaço, nº 224, de 4/3/1934, escreveram: «Numa propriedade ultimamente adquirida por Avelino Júlio Esteves, perto da nova avenida em construção, em volta das antigas muralhas desta Vila, e quando se procedia a um desaterro para a construção dum prédio, foram encontrados seis sarcófagos, abertos em Piçarra, saibro duro e espesso, calculando-se uma idade de 700 anos. Naquele local existiu em tempos uma capela, que foi demolida. O achado tem sido muito visitado por curiosos, inventando cada qual, a seu belo prazer, interessantes lendas, que a falta de espaço não nos permite reproduzir.»

Leite de Vasconcelos levou alguns desses achados, e ainda bem, para os museus da cidade, de outro modo ter-se-iam perdido. Na década do 90 do século XX, quando se rasgava a estrada Monção a Melgaço, os trabalhadores encontraram diversos objectos de longa idade. Os curiosos logo apareceram e levaram tudo que viram e tinha, do seu ponto de vista, algum valor comercial. (Sobre este assunto ver Jornal de Melgaço, nº 48, de Maio de 1994, Jornal de Melgaço, nº 55, de Janeiro de 1995, Voz de Melgaço nº 1054, de 1/7/1996, Jornal de Melgaço, nº 114, de Maio de 2000, jornal de Melgaço, nº 123, de Março de 2001).

 

 

Dicionário Enciclopédico de Melgaço I

Joaquim A. Rocha

Edição do autor

2009

pp. 22, 23

 

 

CASTELOS DE MELGAÇO, CASTRO LABOREIRO E A RAIA

melgaçodomonteàribeira, 01.09.18

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castelo de melgaço 1913

 

FRONTEIRA DO MINHO

 

A monte de Valença, e em frente à praça espanhola de Salvaterra de Miño, situava-se a posição fortificada de Monção e, a seguir, o último lugar deste rosário de povoações da “borda-Minho”: Melgaço. Aqui, o rio circula apertado entre vertentes abruptas, ficando o lugar no topo da vertente. Ponto estratégico importante desde os princípios da nacionalidade, na antiga estrutura defensiva, que ainda existe mas sofreu várias obras de remodelação, sobressai uma torre quadrangular no centro de um pátio, a que se acrescentou, no século XIII, uma muralha envolvendo o núcleo urbano. Quatro séculos depois, foi transformada, como outras, numa fortaleza abaluartada, com uma frente alongada, onde se situava o Campo da Feira. Com Valença, Melgaço constituíra o primeiro conjunto de sítios fortificados da margem do Minho, a que acresceriam, nos reinados de D. Afonso III e D. Dinis, Monção, Caminha e Vila Nova de Cerveira, regularmente espaçados. Mas, em finais de Setecentos, perdera já interesse para a defesa da raia e, estando as instalações militares arruinadas, também não se consideraram úteis as despesas que a sua reconstrução implicava.

Depois de Melgaço, os lugares fortificados eram escassos e já nada tinham a ver com os da orla do rio. Castro Laboreiro, em plena serra da Peneda, fica já um pouco afastado da raia (mais de 5 km em linha recta). De origem muito antiga, o castelo localiza-se a sul da povoação, num topo que se eleva a mais de 1000 m, onde se abrigavam homens e gados em caso de ameaça espanhola. Conquistado por D. Afonso Henriques antes de meados de século XII e reformado 150 anos depois, devido à profunda ruína que o ameaçava, o aspecto actual deriva em grande parte dessa reconstrução efectuada no reinado de D. Dinis. Ele testemunha hoje a atenção que, para a defesa do território nacional, a Coroa dedicou então à raia seca.

 

 

Retirado de: FINIS PORTUGALIAE = NOS CONFINS DE PORTUGAL

                    Cartografia militar e identidade territorial

                    Autores: Maria Helena Dias e Instituto Geográfico do Exército

                    2009

 

 

http://www.igeoe.pt

 

A FORTALEZA DE MELGAÇO

melgaçodomonteàribeira, 28.07.18

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Augusto C. Esteves, apostado em prosseguir na busca do «Melgaço de antanho», embrenhou-se naquela zona, onde história e lenda se confundem perigosamente, chegando a afirmar o seguinte:

 

Simplesmente o nome deste povo, a palavra Melgaci não esmalta as páginas do livro de Plínio, porque como ele mesmo confessou, pareceu-lhe fastidiosa a enumeração total desses povos.

Ora o chefe dos melgaceos, o celta Melgacus que os baptisou, baptisou também este querido torrão natal, porque escolheu o planalto onde hoje assenta a vila para aí erguer o seu opidum, que lhe serviu, ao mesmo tempo, de centro de governo da sua civitas, de defesa e de habitação; uma fortalesa com duas ou três ordens de muralhas, à semelhança de Briteiros, Sabroso ou Santa Luzia, com casas redondas ou retangulares para o chefe e servos, estábulos para gados, etc.

 

 

A FORTALEZA DE MELGAÇO: PEDRAS E PATRIMÓNIO

 

Armando Barreiros Malheiro da Silva

 

Câmara Municipal de Melgaço

 

1987

 

O CRUZEIRO DE MELGAÇO

melgaçodomonteàribeira, 14.07.18

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cruzeiro de são julião

 

CRUZEIROS

 

 

No pequeno alfoz da sua freguesia quatro cruzeiros houve outrora Melgaço e embora alguns tenham sido mudados de local, ainda hoje todos se conservam erectos à veneração dos fiéis. Um, e é o principal por mais lindo, mais trabalhado e mais artístico, tem a forma do Piedade, pois numa das faces da cruz está esculpida a imagem de Cristo crucificado e na outra a de Nossa Senhora com o filho morto deitado no regaço. Representa o descimento da cruz. A coluna esbelta, elegante, está lavrada com alguns primores de arte e na base tem esculpida a figura da morte, representada por caveira humana.

Ignora-se infelizmente o nome do artista lavrante e o do quem lhe encomendou ou pagou o primoroso trabalho, pois no referido monumento nem a mais escassa informação se colhe. Em 1779 estava erguido no Campo da Feira de Fora, junto de uma morada de casas, cuja escadaria exterior dificultava a passagem das procissões à sua volta. Depois foi mudado para o Campo da Feira de Dentro e ficou mais ou menos no centro do largo.

Daqui o transferiu a junta de paróquia em 1867 para o adro da capela de São Julião, onde ainda hoje se conserva exposto à veneração de todos os fiéis, tendo sido declarado há anos monumento nacional. É este o cruzeiro da vila.

Assim foi conhecido sempre e ainda hoje essa designação tem e lhe pertence. Vem de longe, do século XVII, se é que não foi trabalhado nos fins do século XVI por qualquer daqueles artistas trazidos à terra pelo juiz de fora Gil Gonçalves Leitão para fazerem muitas coisas aqui não havidas e talvez nem sonhadas.

E isto se avança porque este cruzeiro estava situado no Coto da Pedreira, que era monte baldio pertencente à Câmara do termo, ali à entrada das Carvalhiças, e outro cruzeiro assim não havia. De mais a mais quando em 1703 Frei Domingos Gomes de Abreu quis erguer uma capela em honra de Nossa Senhora da Pastoriza escreveu em requerimento estas palavras, aliás com aparência de serem descabidas ao intento: «…quer este fazer-lhe a capela no Coto da Pedreira desta freguesia por ser lugar público onde costumam irem os clamores desta vila não havendo neste lugar mais do que uma cruz…»

Mas esta cruz era o cruzeiro da vila. Quem o diz nesse processo organizado na Mitra bracarense são os sucessivos párocos da vila então no uso do múnus de cura de almas: o P. João Dias dos Santos e o P. António Soares Falcão.

Aquele fá-lo por estas palavras: «…Digo que ao sítio vamos com as ladainhas aonde está o Cruzeiro desta vila fora da muralha…»

E este assim o diz: «Pretende o instituidor edificar a capela de que fez promessa no sítio chamado o Coto da Pedreira, que fica extra muros desta vila, onde está um cruzeiro ao qual vão em procissão nas ladainhas…»

Ora como a capela da Nossa Senhora da Pastoriza ocupou o sítio do Cruzeiro e as obras da construção, por circunstâncias várias, só vieram a fazer-se entre 1725 e 1727 esta obra nova acabou por impor a mudança do cruzeiro. Foi, possivelmente, por esta época que o Cruzeiro da vila veio das Carvalhiças para o local assinalado por documentos conhecidos, mas muito mais recentes: o Campo da Feira de Fora.

 

Publicado em NM de 18/3/1956

 

Obras Completas: Augusto César Esteves

Nas páginas do Notícias de Melgaço

Volume I Tomo 2

Edição Câmara Municipal de Melgaço

2003

pp. 551, 552

 

CAPELA DA NOSSA SENHORA DA ORADA

melgaçodomonteàribeira, 30.06.18

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A IGREJA DE NOSSA SENHORA DA ORADA

 

(NOTÍCIA HISTÓRICA)

 

Nos derradeiros anos do século XI, quando percorria em longas jornadas de instrução e de posse as terras do seu condado de Portugal, D. Henrique de Borgonha, o mais antigo obreiro da nossa nacionalidade, encontrou êrma e quási totalmente arrasada a povoação que depois devia renascer com o nome de Melgaço. Expulsos os moiros – que o ímpeto irresistível dos sucessores de Plágio continuamente rechaçava para o sul da Província – nenhum novo núcleo de população ali criara raízes; e até o castelo comarcão, que se dizia ter sido construído pelos invasores árabes sôbre os alicerces de um castro romano, apenas negrejava no seu morro como ruína quási informe.

Necessitando de concentrar tôda a atenção e tôda a actividade em emprêsas de maior vulto, o Conde D. Henrique não curou de repovoar aquêles sítios agrestes, que então podia julgar livres de qualquer perigo ou ameaça grave; ordenou apenas que a decrépita fortaleza mourisca fôsse benificiada com as necessárias obras de consolidação, a-fim-de assegurar, como cumpria, a defesa da terra, no caso de lá chegar, em dias futuros, alguma das temerosas contendas que desde os primeiros tempos da Reconquista perturbavam de quando em quando a vida política da Espanha cristã.

Assim esquecido, senão inteiramente abandonado, jazeu ali, durante muitos anos ainda, o alto e áspero chão onde hoje se vê a vila de Melgaço. Depois do falecimento de seu marido, a raínha D, Tareja – sempre atormentada, como êle, por grandes trabalhos de ambição – nada fêz também para remediar ou minorar tam imprudente desamparo; por isso, nem o castelo, a-pesar dos “repairos” com que o Conde D. Henrique firmara as suas muralhas centenárias, logrou afrontar sem renovados danos a incessante e traiçoeira guerra do tempo. Por seu turno, D. Afonso Henriques, só ao cabo de 30 anos de reinado, em 1170, atentou na conveniência de prover de boa e basta gente aquêle recanto da terra hereditária, destinado a converter-se, pela sua situação, em um dos mais úteis baluartes de defesa do novo reino; mas, pronto em remediar o mal que tam tarde havia reconhecido, logo remiu com decisão e acêrto êsse pecado de imprevidência. Pouco depois, os primeiros colonos para ali enviados por ordem régia davam princípio à sua obscura obra de progresso nacional e social. Ao mesmo tempo, para lhes incutir maior fé na própria segurança e na segurança das suas searas, outras providências foram tomadas; e em breve, na terra extrema que ao norte sobranceava o rio, a possante fortaleza sarracena, ampliada e robustecida, reocupava firmemente o seu lugar de sentinela raiana.  A póvoa portuguesa de Melgaço tinha finalmente nascido.

Diminuindo de certo modo a importância de alguns dêstes factos, uma versão corrente, abonada por certas memórias monásticas, persuade entretanto que já em tam remota era se erguia a curta distância do castelo, entre outras construções de grande antiguidade, a Igreja da Nossa Senhora da Orada. Ignorava-se a data da sua fundação e o nome do fundador. Edificada no tempo em que a moral cristã começava a moderar os costumes bárbaros dos visigodos, havia resistido como que por milagre (dizia-se) aos maus tratos da natureza e dos homens, durante o período da dominação árabe – acrescentando-se ainda que depois disso, no reinado de D. Ramiro II de Leão, fôra anexada a um pequeno mosteiro de monges bentos mais ou menos sujeitos à grande casa conventual que anteriormente obtivera para a mesma Ordem a doação de tôda a vizinha terra de Fiãis.

Segundo a tradição que guarda lembrança de tais sucessos, aquêle mosteiro-vassalo, secularizado por motivos que se desconhecem nos longínquos anos do gôverno de D. Tareja, convertera-se afinal (juntamente com a cêrca e outras terras contíguas) em uma simples propriedade particular – que, adquirida pouco depois pelos Templários, dêles recebera o nome de Quinta dos Cavaleiros que lhe é conferido nos documentos do século XII. Se com efeito assim aconteceu, pode afirmar-se que foi da aguerrida milícia do Templo, visto que, volvidos alguns lustros, já a chamada Quinta dos Cavaleiros pertencia in totum a uma dama de grandes haveres, a Condessa D. Frolhe, que no ano de 1166, por meio de uma escritura de doação, a entregou de novo, e com outro nome – o de Quinta da Orada – aos monges negros de Fiãis.

Porque não foi incluída a Igreja nessa doação, a que se podem atribuir em verdade intuitos idênticos aos de um vulgar legado pio? Por não ter existido de-facto, o suposto Convento da Orada? Por se haver estabelecido qualquer distinção entre êste e o templo da Virgem, através de tantas alternativas de posse? Finalmente, por se achar em completa ruína (e, portanto, sem valor) a vélha casa de oração? Ignora-se. Cumpre notar, em todo o caso, que D. Afonso Henriques, ordenando pouco depois, em 1170, a reconstrução do desmembrado edifício, sancionou implìcitamente a inclusão do edifício no rol dos bens da Coroa.

 

BOLETIM DA DIRECÇÃO GERAL DOS EDIFÍCIOS E MONUMENTOS NACIONAIS

 

A IGREJA DE NOSSA SENHORA DA ORADA

Nº 19

Março de 1940

pp. 5-8

 

UMA VISITA ÀS RUINAS DO REAL MOSTEIRO DE FIÃES

melgaçodomonteàribeira, 24.03.18

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PROEMIO

 

Um dia, folheando ao acaso o trabalhoso diccionario de Pinha Leal, intitulado Portugal Antigo e Moderno, n’elle deparei e li, este emocinante trecho:

»Leitor, se tens um coração portuguez, se a luz divina se não apagou totalmente em tua alma; se respeitas a memoria de teus passados – dos que te deram uma patria, um lar, uma família; e se algum dia viajares pelo Alto Minho, não deixes de visitar as tristes ruinas do Convento de Fiães; e alli, qual outro Mario, contempla respeitoso estes restos venerandos da fé e piedade do nossos maiores, e chora sobre as ruinas d’este testemunho de suas crenças inabalaveis.»

  

Alli, onde o incenso se elevava dia e noite em perenne adoração ao omnipotente; onde a toda a hora se ouvia o plangente som do orgão, os cantos sagrados dos religiosos e do povo; alli, refugio predilecto dos que no mundo soffriam attribulações; alli finalmente a casa de Deus, em que a piedade tinha amontoado prodigios sobre prodigios de magnificencia, de fé, de caridade – que vemos hoje?

«Ruinas, devastação, silencio, horror!

«As silvas e os cardos invadem os marmores de suas aras santas.

«Os reptis immundos revolvem as ossadas venerandas de varões illustres.

«As aves nocturnas pairam sobre as abobadas, e fazem seus ninhos sobre os brincados capiteis de suas columnas dez vezes seculares.»

 

Surprehendido com esta suggestiva linguagem, que tocava tão directamente a minha sentimentalidade, - fiz logo, um voto de ir a Fiães, se algum dia visitasse essa zona previlegiada do meu paiz, - por muitos chamada: - O jardim de Portugal.

Iria, não para imitar o proscripto Mario, que sobre as ruinas fumegantes da cidade phenicia, chorava os extremos a que a oratoria implacavel de Catão, a tinha reduzido; - mas, para traduzir n’essas desmoronadas pedras, - uma pagina da historia do passado.

 

UMA VISITA ÀS RUINAS

DO

REAL MOSTEIRO DE FIÃES

Guilh. Oliveira

Livraria Ferreira

1903

pp. 7-9

 

 

ANIVERSÁRIO DO BLOG e O HOMEM E A TERRA

melgaçodomonteàribeira, 11.11.17

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de

MELGAÇO, DO MONTE À RIBEIRA

 

 

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O PELOURINHO DE CASTRO LABOREIRO

 

(…)

Embora Castro Laboreiro fosse erecta Vila e sede de concelho por foral concedido por D. Afonso III, em 1271, o que correspondia ao direito de pelourinho, o actual monumento, desta antiga Vila, data de 1560, tendo-lhes sido concedido novo foral por D. Manuel I em 1513. Constituído por três degraus, uma base, fuste, gola e capitel, rematado por pequena pirâmide, presidiu aos destinos desta região desde 1560 até 1860, data na qual foi apeado do seu legítimo lugar e dispersos todos os seus elementos para naquele local se construir uma casa particular. Os degraus desapareceram para sempre, não havendo possibilidade da sua recuperação. A base consegui descobri-la a fazer parte de um muro de um quinteiro. O fuste encontrei-o a servir de lintel ou padieira na chaminé da casa construída onde ele se encontrava antes de ser destruído. Preocupado com a sua restauração continuei sempre em investigações para descobrir o seu capital. Depois de numerosas pesquisas, fui encontrá-lo a servir de óculo de luz numa casa em ruínas, a uns trezentos metros do local, onde outrora se levantava este monumento. Colocado à altura de uns seis metros num muro dobrado e de alvenaria irregular, dificilmente se poderia verificar se era pertença do pelourinho ou não. Facilitou-me o seu reconhecimento o facto de ser trabalhado a pico fino e de ter a gola circular voltada para fora. Somente em 1978 me foi possível desmontá-lo do respectivo muro com o auxílio dos pedreiros reconstrutores das muralhas do Castelo. Depois do mesmo se encontrar no solo pude averiguar que era verdadeiramente o capitel do antigo pelourinho de Castro Laboreiro, pelo facto de na face interior ostentar uma gola circular com a espessura de 5 centímetros aproximadamente; e na superior um rebaixe de uns 4 centímetros, onde poisava a pirâmide que rematava este pelourinho. Não me foi possível descobrir a pequena pirâmide.

Os trabalhos de investigação para reunir os três principais elementos constitutivos desta preciosa relíquia do passado, prolongaram-se durante vinte e quatro anos. Mas como saber o estilo e forma deste pelourinho para a total identificação dos seus elementos e sua restauração?

Mercê dos trabalhos de investigação do estudante Soeiro de Carvalho no Arquivo Distrital de Viana do Castelo, conseguiu descobrir-se um esboço muito perfeito deste pelourinho, efectuado pelo sr. coronel Fernando Barreiras, em Julho de 1917, data em que fez uma visita de estudo a Castro Laboreiro; e que, servindo-se das preciosas informações de Castrejo sr. Melchior Gonçalves, que ajudara a desmontar e a destruir este antigo pelourinho em 1860, conseguiu com muita precisão representar a lápis este monumento no artístico esboço de todas as peças constitutivas do mesmo, descrevendo com bastante aproximação as respectivas medidas de cada um dos seus elementos, que acompanha este trabalho.

Foi com este referido esboço e memória descritiva de todas as peças de que este monumento constava, que consegui levar a Direcção dos Edifícios e Monumentos Nacionais do Norte a reconhecer como autênticos todos os elementos descobertos podendo assim solicitar àquela entidade a sua imediata restauração.

Quero manifestar publicamente o meu sincero agradecimento a todos os donos das propriedades urbanas, onde as peças em referência se encontravam, pela cedência voluntária das mesmas. Não posso deixar de expressar, como filho de Castro Laboreiro e humilde estudioso destes monumentos, raízes desta região, o meu eterno agradecimento aos meus estimados amigos, sr. dr. Oliveira e Silva, digníssimo Governador Civil de Viana do Castelo; ao sr. engº José Maria Moreira da Silva digníssimo Director do Parque Nacional Peneda-Gerês; ao sr. arquitecto Roberto Leão, do Planeamento do Porto; ao sr. professor Carlos Alves, digníssimo Presidente da Câmara Municipal de Melgaço, e ao sr. Adelino Esteves, digníssimo Presidente da Junta de Freguesia de Castro Laboreiro, por todo o auxílio e apoio que tiveram a bondade de me dispensar, patrocinando uns, a sua imediata restauração; e outros, além do seu contacto com as entidades responsáveis, a oferta do seu auxílio pecuniário. Bem hajam por todo o interesse que me concederam. A imediata restauração de tão belo e histórico monumento será a recompensa bem merecida de todos estes auxílios e trabalhos a bem da cultura nacional, que tão precisada anda de trabalhos de tamanha monta.

 

Castro Laboreiro, 10 de Fevereiro de 1979

Padre Aníbal Rodrigues

 

Retirado de:

http://www.gib.cm-viana-castelo.pt

 

O MOSTEIRO DE S. SALVADOR DE PADERNE

melgaçodomonteàribeira, 30.09.17

 

 

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Quando, há um ano, se procedia à inventariação e catalogação dum acervo precioso de documentos avulsos dos séculos XVII e XVIII existentes na Secção de Manuscritos do Arquivo Distrital de Braga, descobrimos, num maço de prazos de casas sitas em Ponte de Lima, uma «Carta de Sentença» de 1627 e relativa à demanda que opôs, como autor, o Mosteiro de S. Salvador de Paderne ao réu Gregório de Mogueimas Fajardo, senhor da Quinta de Pontiselas e descendente do «primeiro comendatário de Paderne», segundo Felgueiras Gaio.

Testemunho inédito desta demanda até agora ignorada, o documento descoberto possui também outras informações relevantes, que justificam plenamente a sua análise e que podem ser incluídas em três grupos: no primeiro estão os dados de carácter económico envolvidos na descrição do valor e natureza da renda causadora do litígio; no segundo temos as referências à localização e origem das Casas da Quinta de Pontiselas, que ainda hoje existem apesar das grandes alterações sofridas e que constituem na sua singeleza uma peça valiosa do património arquitectónico melgacense e no terceiro encontram-se os nomes, os quais serviram de ponto de partida ao esboço genealógico da família do réu.

Seguindo a peugada dos teóricos da «História Nova» convém defender o uso, no âmbito da historiografia nacional, da análise globalizante dos documentos, que consiste em extrair das fontes a trama de relações, problemas e referências aí contida.

 

PONTES ROMANAS E ROMÂNICAS DE CASTRO LABOREIRO

melgaçodomonteàribeira, 02.09.17

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Ao escolher este tema para o meu primeiro caderno sobre a história e arte das magníficas Pontes que ligam as margens do rio Laboreiro e seus Afluentes, o meu coração de Castrejo bateu mais apressadamente do que é normal: pois tomei uma tremenda responsabilidade perante os meus conterrâneos, quando resolvi soletrar algumas das mais belas páginas do seu rico património histórico e artístico, cujas folhas, constituídas por duro granito da região, continuam a desafiar o tempo e cujas idades se medem por 20 e 8 séculos respectivamente. Apesar da sua já longa existência guardam na sua própria estrutura a mesma grandeza do passado. Por elas passaram os Castrejos de, há já 2.000 anos, e ainda hoje as utilizam para transporem os volumosos cursos de água, no inverno, e os caudais límpidos no Verão. Situada numa grande bacia hidrográfica, esta vetusta freguesia conserva no seu longínquo passado lindas e numerosas pontes que a ligam às civilizações Celta, Romana e Medieval. Embora a sua maior parte haja sido classificada pelo Instituto Português do Património da Cultura, umas como Monumentos Nacionais e outras como Imóveis de Interesse Público, estou certo de que vale a pena descrevê-las em todos os seus pormenores, fazendo o levantamento fotográfico da cada uma, especificando o estilo utilizado na sua construção, com as medidas precisas de altura, comprimento e largura, as vias de comunicação que ligavam e o tempo aproximado da sua construção. É uma tarefa bastante custosa para mim, mas faço-o com o máximo interesse e carinho; pois estas obras de arte e história fazem parte do povo, de quem nasci, e cujo curriculum vitae constitui para mim motivo de orgulho. Os meus defeitos, as suas virtudes estão intimamente ligados ao meu carácter, à minha personalidade. São raízes de um passado, que não volta. Pelo estudo dos seus históricos Monumentos podemos facilmente aquilatar a grandeza e antiguidade da sua civilização. Esperançado em que este meu despretensioso trabalho concorra para um conhecimento mais completo e profundo das antiguidades de Castro Laboreiro, das suas paisagens e das suas gentes, vou iniciar o meu trabalho.

 

Castro Laboreiro, 10 de Julho de 1984

 

Padre Aníbal Rodrigues

 

 

PONTES ROMANAS E ROMÂNICAS DE CASTRO LABOREIRO

 

Autor: Padre Aníbal Rodrigues

 

Edição: Cadernos da Câmara Municipal de Melgaço nº 2

             CÂMARA MUNICIPAL DE MELGAÇO

1985