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MELGAÇO, DO MONTE À RIBEIRA

História e narrativas duma terra raiana

MELGAÇO, DO MONTE À RIBEIRA

História e narrativas duma terra raiana

O DRAMA DE ALVAREDO ou O CRIME DE MELGAÇO III

melgaçodomonteàribeira, 08.08.20

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 igreja de alvaredo

O incêndio não alterou os planos dos cabouqueiros. No dia seguinte, Romão decidiu que era tempo de partirem. Mandou Maria da Piedade chamar Alfredo. Esta foi a Campo de Ourique, direita à obra onde o namorado (os jornais da época referem-nos sempre como amantes, por não serem casados) se encontrava por esses dias a trabalhar, e disse-lhe: “O teu primo João está preso”. Alfredo percebeu logo que estava na hora, porém, mais tarde, Piedade dirá que desconhecia ser uma combinação dos homens.

“Alfredo, para ter dinheiro para a viagem, empenhou uma mala com roupa, um relógio e cadeia de prata, numa casa de penhores em Alcântara, por 15$000 réis. O Guerra empenhou umas argolas e umas contas de oiro da amiga por 3$900 réis; Santiago levou 3$000 réis que tinha em casa; Fonseca levava só um tostão, abonando-lhe Romão o dinheiro para a passagem e João não levava nada, porque ia às ordens de Alfredo”, contou “A Vanguarda”, adiantando que Romão era o que tinha mais “capitais”, ainda lhe sobrava dinheiro de Salamanca.

Conforme tinham combinado, entretanto, para dar tempo às diligências necessárias, encontraram-se os seis cabouqueiros na estação da Avenida (como também se chamava ao Rossio) afim de seguirem caminho. Por segundos, perderam o comboio, e voltaram a perdê-lo mesmo depois da correria que fizeram até Santa Apolónia. Regressaram a casa aborrecidos, sem tenções de desistirem. Na noite seguinte, a 28 de junho, portanto, embarcaram pelas 23 horas, decididos a irem roubar a tia e o padre.

Deviam ter pensado que, por vezes, o destino dá os seus avisos. A viagem correu bem. Fizeram uma paragem em Sacavém para comerem e de manhã já estavam noutro comboio com destino ao Porto, do qual sairiam na cidade Invicta para chegarem a Valença. Não havendo mais hipóteses ferroviárias, foram a pé até à casa do reitor da freguesia de Troviscoso. Percorridos os quase 20 quilómetros de caminho, chegaram ali já de noite, mas nada fizeram, havia gente acordada a regar o cultivo à volta da casa. Refugiaram-se no bosque e, sendo meia-noite, voltaram a tentar, contudo, foram vistos por um criado que agarrou numa espingarda e disparou um tiro que os pôs em fuga.

João Esteves lembrou-se, então, de um rendeiro que morava ali perto e que também devia ter que roubar. Já que ali estavam, pensaram todos, aproveitariam  para não regressarem a Lisboa de mãos a abanar. Lá foram. Muito embora fosse de madrugada, também depararam com dois homens de sachola a trabalhar na horta. Nada feito, quanto menos esperassem levavam com as ferramentas e aparecia gente armada como no Troviscoso.

Escondendo-se na mata conferenciaram. António Fernandes lembrou-se então que não muito longe, no lugar de Vilar, freguesia de Alvaredo, a sua mãe fora criada de um padre que possuía uma razoável fortuna. Mais uma caminhada, estavam com azar mas desta vez conseguiriam. Pelas duas horas da madrugada de 2 de julho, entraram na casa do padre Sousa Lobato. Só Romão não ia armado, dera a sua pistola ao Guerra, já que este emprestara a sua ao João Esteves, de resto Fonseca levava um punhal, Romão uma navalha, Santiago um revólver e um cacete.

 

Quando julgaram que tudo corria como o previsto…

 

Quando entraram, apesar do Santiago ter feito algum barulho, nenhum dos residentes acordou. Mas ao procurarem o dinheiro no quarto do padre, não tiveram a mesma sorte. O religioso ainda deu luta, mas ficou muito ferido. Com os gritos, o irmão e o cunhado acudiram, envolvendo-se todos à pancada, com tal estrondo que acordaram a vizinhança e os cabouqueiros não tiveram outro remédio senão porem-se a andar. Foi uma fuga desordenada, a pé, até Braga. Estavam praticamente sem dinheiro. Romão tinha uma moeda de cinco duros, mas ninguém a trocava; Santiago pensou empenhar o revólver mas as lojas estavam fechadas; o Guerra e o Fonseca decidiram ir a pé até ao Porto…

Maria da Piedade ficara em Lisboa, entregue a si própria, confiando Alfredo que ela daria bem conta do recado e que ainda ganharia algum com isso. Pensou bem. Apesar de ter havido alguma desconfiança quanto à origem do fogo, a companhia de seguros acabou por dar-lhe 114$000 réis, uma boa maquia, embora longe do valor do seguro. Com esse dinheiro, a Aguardenteira foi à casa de penhores buscar os pertences do namorado, e resgatou ainda alguma roupa, umas argolas de nove mil réis, dois anéis, um afagador com medalha, uma pregadeira, tudo em ouro.

Depois disso, a 31 de julho, partiu para a Invicta, onde ainda deu ao Santiago 12 mil réis pelo trabalho, dois mil para alugar uma casa para todos e 300 para a mudança. Todavia, beneficiaria muito pouco com todo este movimento. O padre Sousa Lobato sucumbira aos ferimentos no dia 23 de julho, a partir daí as investigações intensificaram-se, ganhando um impulso com o aparecimento de uma carta anónima que dizia serem os bandidos trabalhadores em Lisboa.

No dia 1 de agosto, Maria da Piedade e Alfredo, que arranjara trabalho nas obras da circunvalação, alugaram uma casa nas Fontainhas. Daí a três dias estarão todos presos, com exceção de João Esteves que só será apanhado, no dia 25, por um carabineiro, muito perto da fronteira, e o Romão Louzada que desaparecerá para sempre. Quando o casal foi detido, já o Fernandes, o Fonseca e o Santiago se encontravam no comissariado de Lisboa. A polícia rondara a casa de Alfredo e Piedade, mas não os detetara, só os vê quando os dois aparecem a espreitar na porta da frente…

 

Provavelmente, irão todos encontrar-se em Angola

 

Maria da Piedade tem algumas manhas. Lê-se no jornal que assumiu que deitara fogo à casa para receber o dinheiro do seguro e que “fez importantes revelações” sobre o “Drama de Alvaredo” ou “O Crime de Melgaço” como o caso ficou conhecido. No dia 8 de agosto, foi ouvida no terceiro comissariado e no Tribunal da Boa Hora. “Interrogada em juízo declarou-se autora do crime, como já o fizera na polícia, sendo depois remetida ao Aljube”, noticiou “A Vanguarda”. O seu processo ficou separado do dos cabouqueiros.

Passado um ano, a 3 de agosto de 1893, os cinco vizinhos presos na Cadeia da Relação do Porto são levados ao tribunal de Melgaço. Milhares de pessoas aguardam à porta a entrada dos assassinos do padre Manuel António de Sousa Lobato. Oito anos de prisão e 20 anos de degredo foi a sentença para quatro, o Guerra seria poupado em oito anos de África porque se provou ter ficado de vigia.

Maria da Piedade, 38 anos, já tivera o seu julgamento e seguira há três meses para África. Fora condenada pelo crime de fogo posto, como mandava o Código Penal de 1886: seis anos de prisão, seguidos de dez de degredo, ou, em alternativa, 25 anos em Angola.

Quando ainda no Comissariado foi acareada com Santiago Rey y Lopez, já que este negava ter recebido “doce duros” para a ajudar e se mostrava renitente em admitir o assalto em Melgaço, Maria da Piedade disse-lhe: “Ande homem, confesse que eu já confessei. Se vocês não tivessem dado com a língua nos dentes, podiam matar-me que eu negava tudo, ainda que me apertassem o pescoço até deitar a língua de fora”.

 

Publicado no jornal EXPRESSO

26-10-2015

 

 

 

 

O DRAMA DE ALVAREDO ou O CRIME DE MELGAÇO I

melgaçodomonteàribeira, 11.07.20

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 a aguardenteira

 

DE AGUARDENTEIRA A INCENDIÁRIA, NAMORANDO UM ASSASSINO

 

Maria da Piedade foi lavadeira mas não se deu bem. Apaixonou-se e passou a trabalhar junto do seu cabouqueiro, vendendo goles de aguardente. Mas o seu amor virou assassino e ela condenada por fogo posto. Este é o décimo caso da série “Crime à Segunda”, que o EXPRESSO está a publicar sobre criminosas portuguesas.

 

Perguntou-lhe se não queria fazer um seguro da casa, pois se esta ardesse ganhavam algum dinheiro, mas Alfredo não quis, andava com outras preocupações, nos preparativos de coisa mais rendosa. Então, Maria da Piedade, meteu mãos à obra e fogo na casa em que habitava às portas da cidade de Lisboa.

Dois anos antes, andava de um lado para outro, de galochas e odre a tiracolo, vendendo goles de aguardente ao pessoal da obra do túnel ferroviário de Lisboa, no lado de Campolide, na zona da Rabicha, a quinta que o caminho de ferro atravessará vindo do Rossio. Chamavam-lhe a Aguardenteira. A primeira ideia seria servir o namorado, mas o grupo de cabouqueiros a que este pertencia fez-lhe criar o negócio.

Maria da Piedade, nascida em São João da Pesqueira, distrito de Viseu, no ano de 1854, vivia com Alfredo Gomes, numa casa abarracada no sítio de Sant’ana, para lá da ribeira de Alcântara, onde hoje se localiza a Vila Ferro, no Bairro da Liberdade. Morava perto das obras do túnel da Rabicha, por isso, quando os homens esvaziavam a borracha, como chamavam ao recipiente que ela trazia ao ombro preso com uma correia, podia rapidamente ir enchê-la.

Piedade andava por ali, entre os trabalhadores, sem temer pelo físico. Não era mulher de se assustar, era valente “e mais temível do que muitos homens”, apesar de franzina. No sítio de Sant’ana, ninguém se metia com ela, “citavam-se proezas, na verdade extraordinárias, praticadas por aquela nova padeira de Aljubarrota”, escreveu em 1897 o jornalista Luiz Silva na “Galeria dos Criminosos Célebres em Portugal” publicada em 1897. E andava com más companhias. O namorado e os cinco vizinhos que hão de entrar no assalto fatídico, eram ali conhecidos como “desordeiros, jogadores e amigos de galinhas”, segundo o jornal “A Vanguarda”.

Na sua folha corrida, constavam duas prisões por ofensas corporais, uma de outubro de 1890 e outra no mesmo mês do ano seguinte. Nada de extraordinário, os jornais traziam diariamente notícias de agressões entre homens, entre homens e mulheres, entre mulheres… Sempre que a polícia intervinha, a prisão efetuava-se. “Maria do Patrocínio foi presa por agredir com socos a Rosa de Jesus. A cena deu-se numa casa da Travessa das Dores, nº 11, à Ajuda”, é apenas um exemplo sucedido no final de 1891. Às vezes bastava uns tabefes, como aconteceu a João Gautier, sapateiro, preso por esbofetear Carlos Leitão, morador no Areeiro do Monte.

Antes de ser Aguardenteira, Maria da Piedade ganhou músculo lavando roupa. Mas não por muito tempo, o mundo das lavadeiras também não corria de forma pacífica. Era um negócio muito competitivo… Veja-se um caso passado em setembro de 1892, quando desapareceu uma saia à lavadeira Maria de Jesus. Decorridos onze meses, a governanta do tanque nº 6, onde se dera o roubo, reconheceu a peça de roupa na mão de Joana Maria, quis tirar-lha e, como a outra não cedesse, agrediu-a, pondo-a fora do tanque que geria.

“A guarda municipal da estação do Pasteleiro, a quem a Joana se queixou, interveio e quis arbitrariamente, fazer com que a Joana continuasse a lavar no tanque, chegando a querer obrigar a governante a acompanhar a parte do ocorrido para o quartel”, noticiou em 12 de agosto de 1893, rematando: “Se o caso se assim deu, parece-nos incorreto o procedimento da guarda e para ele chamamos a atenção do sr. comandante”.

O caso não foi com a Maria da Piedade, aliás, ela já não se encontrava no continente quando se deu o desenlace, mas podia ter sido, dado o seu feitio. Uma agressão, ou mesmo um roubo, poderiam tê-la levado a mudar de profissão, todavia, sabe-se apenas que o negócio de lavadeira e, por isso, pensando no seu Alfredo, virou-se para a venda de aguardente nas obras do túnel que irão proporcionar viagens entre o Rossio e Sintra, ida e volta, a mil réis em 1ª classe, 900 em segunda e 500 em terceira. Por esta época, um operário ganhava cerca de 200 réis por dia.

Os trabalhos começaram em 1887 e terminaram três anos depois, mas o primeiro comboio a testar a circulação no túnel fê-lo em abril de 1889, levou 27 minutos, hoje demora três. Foram escavados 2612 metros de rocha calcária, entre o Rossio e Campolide; com a abertura da estação central, em junho de 1890, ficou a linha férrea de Lisboa a Sintra, Torres e Figueira a Alfornelos com um movimento de 50 comboios diários. E o casal de Sant’ana, assim como os cabouqueiros seus vizinhos, ficaram desempregados, por pouco tempo…

 

(continua)

 

 

ALVAREDO

melgaçodomonteàribeira, 14.05.16

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COROGRAFIA PORTUGUEZA, E DISCRIPÇAM TOPOGRAFICA DO FORMOSO REYNO DE PORTUGAL

 

 S. Martinho de Alvaredo,

que algum tempo se chamou de Paderne, he Curado annual com titulo de Vigairaria do Mosteiro de S. Fins dos Padres da Companhia, com oito mil reis de ordenado, ao todo cincoenta mil reis, & para os Padres cento & vinte mil reis: tem cento & sessenta visinhos. Onega Fernandes senhora principal sendo viúva, & tendo habito de Religiosa, deu a quarte parte desta Igreja a Dom Affonso Bispo de Tuy, & àquella Sé em 13. de Abril da era de 1156. que he anno 1118. na qual confirmaõ seu filho Payo Dias, & sua filha Aragonta Dias. Ha nesta Freguesia duas Torres com alguma renda, chamase a huma de Villar, outra a Torre somente, & de ambas saõ senhores os Marquezes de Tenorio. A que está defrôte de Galliza he Solar dos Marinhos, que se entende haver sido do Dom Froyão, fidalgo Italiano, que veio a este Reyno com o Conde Dom Mendo ajudar a expulsar os mouros delle. Entendese que elle, ou algum filho fez esta Torre, & Casa solariega de sua família, & não faz contra isto o que diz o Conde Dom Pedro, & outros Gallegos, que o segue, que os Marinhos são naturaes de Galliza; porque naquella era andava com ella mistica a nossa Provincia. Casou com Dona Marinha, de que teve Dom Joaõ Frojás Marinho, que de sua mulher houve a Payo Annes, Dom Gonçalo Annes, Dom Pedro Annes, Dom Joaõ Annes, & Martim Annes, que todos se apellidàraõ Marinhos; de hum sahiu o Solar de Olloa, de outro o de Imra, & delles vem os Condes dos Mollares, Adiantados de Andaluzia, os Duques de Alcalá, & por aqui os mayores de Espanha. Outros ficáraõ em Portugal, dos quaes eraõ aquelles dous irmaõs, que serviraõ no Paço a ElRey Dom Affonso o Terceiro, onde lhe succedeu com Dom Vasco Martins Pimentel a pendência, que conta o Conde Dom Pedro. Alguns dos já ditos passáraõ a Galliza por casamentos, de que descendem muitas Casas daquelle Reyno, & nesta ribeira do Minho, Ponte de Lima, & outras partes. Este Solar parece que passou a Pedro Alvares de Sotomaior, por casar com Dona Elvira Annes, filha de Joaõ Pires Marinho, neta de Dom Pedro Annes Marinho, bisneta de Dom Joaõ Frojás Marinho, & terceira neta do dito Dom Froyão, do qual matrimonio nasceo Dona Elvira Pires, mulher de Fernão Gonçalves de Pias, senhor do Solar de Pias, que entendemos ser a Torre de Sobreyra em Santiago de Pias, de que fallamos em Monção, suposto outros o levão ao Reyno de Galliza. Tem os Marinhos por Armas em campo verde cinco flores de Liz de prata em aspa, & por timbre huma serea de sua cor com cabellos de ouro. Alguns trazem em campo de prata tres ondas azues, & de fóra do escudo duas sereas de p´r tendo maõ nelle. Assim estaõ em humas casas na rua de S. Joaõ dentro dos muros de Ponte de Lima, & saõ dos descendentes de Vasco Marinho, filho de Álvaro Vaz Bacellar de Monçam, & por sua mãy dos Marinhos de Galliza, senhor da Casa de Goyannes, junto à Ilha de Salvora no Arcebispado de Santiago, em que fizeraõ Solar, porque desta Provincia pssáraõ para aquelle Reyno, aonde trazem quatro ondas na mesma forma com a serea por timbre, & outros em campo azul cinco meyas flores de Liz de ouro em aspa. A alguns pareceo tomarem este apellido, & Armas por descenderem de huma mulher marinha, ou serea, mas he fabula: o certo foy por trazerem sua origem do Romana Cayo Mário, & desta familia he o nosso Santo Portuguez S. Marino, que em Cesaria padeceo martyrio em 10. de Julho, imperando Juliano.

   He Conde desta Villa de Valladares por mercé delRey Dom Pedro O Segundo Dom Miguel Luis de Menezes, cuja illustre varonia he a seguinte.

  Dom Antonio de Noronha foy filho segundo de Dom Pedro Menezes, primeiro Marquez de Villa Real, & de sua mulher a Marqueza Dona Brites de Bragança; fiou seu pay delle sendo de dezoito annos o negocio de mayor importancia, & foy, que indo fogindo do furor delRey Dom Joaõ o Segundo Dom Alvaro de Ataíde, & seu filho, que eraõ dos mais culpados na conjuraçam do Duque de Viseu, o Marquez movido a lastima os poz a salvo, & mandou pelo dito Dom Antonio de Noronha seu filho seguralos até a raya de Castella, & depois foy dar conta a ElRey do que fizera em satisfaçaõ de sua lealdade; o que o dito Dom Antonio obrou com tal modo, que admirado elRey em sogeito de tam pouca idade  tal prudencia , & valor, o fez de seu Conselho, dandose por satisfeito de sua lealdade, & do Marquez seu pay; & aos que diziaõ, tam poucas barbas naõ eraõ capazes de lugar de tanta confiança, respondeo ElRey: Os filhos da Casa de Villa Real nascem emplumados: & confiou delle o substituir a seu pay no lugar de Ceuta, aonde o succedeo, estando hum dia no campo passeando, dando guarda aos da Cidade, sahirlhe pelas costas hum Leaõ, que dando nas ancas do cavallo, o fez em pedaços, & Dom Antonio pegando nos braços do Leaõ, o sustentou, até que hum flecheiro atirandolhe huma setta, com que lhe deu em huma perna, o fez virar para onde o feriraõ, & deu tempo a que Dom Antonio tirando de hum punhal, o metesse pela barriga do Leaõ, & ganhasse a vitoria de tam espantosa luta. Achouse na tomada, & sítios de algumas praças de Africa, (& em varias Armadas) & lá fez algumas entradas com feliz successo, mas descontouse; porque vindo de huma entrada, deraõ os Mouros nelle, & ficou cativo: resgatouse por Halibarache; ElRey Dom Manoel o fez seu Escrivaõ da Puridade, & foy Procurador do dito Rey para se effeituar o casamento da Emperatiz Dona Isabel, & o fez Conde de Linhares, dandolhe cento & sessenta mil reis de assentamento pelo particularizar mais aos outros Condes, & em lugar do tal assentamento, por lhe fazer mercé inda com mais ventagem, lhe deu em treze de Janeiro de 1502. a dizima nova, & velha do pescado de Atouguia, a qual dizima trespassou a Dom Affonso de Ataíde no anno de 1518. comprou com licença delRey a Affonso de Almeyda a Alcaydaria mór de Linhares; & a Francisco de Caceres de Mello as Villas de Algodres, Penaverde, & Fornellos: casou com Dona Joanna da Sylva, filha de Dom Diogo da Sylva, primeiro Conde de Portalegre, & de sua mulher Dona Maria de Ayala, de que teve, entre outros filhos, a

   Dom Antonio de Menezes, que foy Alcayde mór de Viseu, & morreo na batalha de Alcacere; casou com Dona Joana de Castro, filha de Dom Jeronymo de Castro, Governador da Casa do Civel, & senhor do Paul do Buquilobo, & de sua primeira mulher Dona Cecilia Henriques (que era filha de Rui de Mello, chamado o Punho, Alcayde mór de Evora, & Alegrete, Commendador de Proença, & de sua mulher Donna Joana Henriques, que era filha de Dom Carlos Henriques, & de sua mulher Dona Cecilia de Brito, filha de Artur de Brito, Alcayde mór de Beja, & Dona Catherina de Almada,) teve o dito Dom Antonio de Menezes de sua mulher Dona Joanna de Castro, entre outros filhos, a

   Dom Carlos de Noronha, que foy grande letrado, Presidente da Mesa da Consciencia, & Commendador de Mouraõ na Ordem de Aviz: casou com D. Antonia de Menezes, filha de Dom Miguel de Menezes, Segundo Duque de Caminha, & de Dona Maria de Sousa, mulher nobre, natural de Ceuta, com quem casou, como declara o seu testamento, & a legitimaçaõ feita a sua filha em Abril do anno de 1634. de que teve a

   Dom Miguel Luis de Menezes, que he hoje Conde de Valladares, Commendador de S. Joaõ de Montenegro, de Saõ Joaõ da Castanheira, & da Commenda da Granja junto a Loures termo de Lisboa: casou com Dona Magdalena de Alencastre, filha herdeira de Dom Alvaro de Abranches & Camera, & de sua mulher Dona Maria de Alencastre, de que teve, entre outros filhos, a Dom Carlos de Noronha, & a Dom Alvaro de Abranches, Bispo de Leiria, Prelado de grandes letras, & virtude, & a Dona Francisca Ines de Alencastre, que foy casada com Pedro de Figueiredo, de que ha geraçaõ,

   Dom Carlos de Noronha he herdeiro da Casa de seus pays, casou com Dona Maria de Alencastre, filha de Luis da Cunha de Ataíde, senhor de Povolide, & de sua mulher Dona Guiomar de Alencastre, a quem teve Dom Miguel de Menezes, Dona Guiomar, Dona Magdalena, & Dona Joanna.            

 

 P. Antonio Carvalho da Costa

Na officina de VALENTIM DA COSTA DESLANDES

Impressor de sua Magestade, & à sua custa impresso.

Com todas as licenças necessarias. Anno M. DCC. VI

 

Retirado de: http://books.google.pt

 

AFOGADOS NO MINHO

melgaçodomonteàribeira, 22.03.14

 

Foto colecção particular de iasousa

 

 

RIBEIRO, António. Nasceu a 31/3/1942. No Notícias de Melgaço 1323, de 5/7/1959, lê-se a triste notícia: « O Minho cobrou o seu foro. No rio Minho e na área da freguesia de Alvaredo, pelas 8 horas da manhã de um para dois do corrente mês de Julho, seis rapazes resolveram fazer uma viagem à vizinha Galiza e vá de se meterem todos juntos numa pequena e frágil batela e de remar para a margem espanhola. Mas quer fosse por excesso de carga, quer por esta se deslocar, a meio do rio a batela voltou-se e nas poucas águas do rio desapareceram três dos improvisados marinheiros, conseguindo salvar-se outros três. Os infelizes afogados eram todos daquela freguesia e solteiros, novos ainda e de vida prometedora na sua frente. Chamavam-se os infelizes Carlos Manuel Ribeiro, de 24 anos, António Ribeiro, de 17, irmãos, e Luís Esteves, de 18 anos, lavradores. Os seus cadáveres ainda não apareceram… » Seus corpos foram recuperados dias depois: o do Luís a 4/7; os outros dois no domingo seguinte. Estão sepultados no cemitério de Alvaredo, havendo contudo um desfasamento entre a notícia do jornal e a placa, pois nesta consta que faleceram a 29/6/1959! Por causa deste caso e de outros é que se pensou em construir uma ponte. No Notícias de Melgaço 1374, de 9/10/60, lemos com um certo assombro: - A ponte Peso-Arbo « … há tanto tempo desejada… » O professor Rodrigues, então presidente da Câmara Municipal de Melgaço, deslocou-se a Arbo a 23/9/1960 a fim de conversar sobre esse assunto com os alcaides de Arbo e Creciente. Os três foram falar com o Dr. Amândio Tavares, magnífico reitor da Universidade do Porto, que ali se encontrava em gozo de férias. Agradeceram-lhe os esforços que tinha despendido para que a construção dessa ponte fosse uma realidade e manifestaram-lhe o seu apoio. O Dr. Amândio estava casado em Arbo, e apercebendo-se do perigo que era atravessar o rio, iniciou uma luta, inglória, pois o dinheiro necessário para a obre não chovia do céu (ainda não tínhamos aderido à UE); por outro lado, o governo não estava interessado em “ligações” com o país vizinho (amigos, amigos, ligações à parte). Em reunião da Câmara Municipal de Melgaço de 20/10/60 ainda foi lido um ofício da Direcção de Urbanização de Viana, fazendo várias perguntas com o fim de informar o ministro do Interior sobre o pedido da construção de uma ponte internacional em São Marcos, Peso. A partir daí julgo que nunca mais se falou no assunto. Como se sabe essa obra concretizar-se-ia muito mais tarde, no novo regime político. Muitas vidas foram poupadas desde então.

 

 

Dicionário Enciclopédico de Melgaço

Volume I

Joaquim A. Rocha

Edição do autor

2009

p. 339

 

PESQUEIRA "NOVAS DO BRAÇO", ALVAREDO

melgaçodomonteàribeira, 07.05.13

 

 

Notícia do Jornal de Melgaço, nº 1189, de 05/01/1918

 

   « Selvajaria.

   Alguém de sentimentos baixos e canalhas, cobarde de mais a mais, receando medir forças, frente a frente, com o respeitável cavalheiro de S. Martinho de Alvaredo, Sr. José Manuel Fernandes; que não podendo vingar-se na sua pessoa, o procura atingir pelas costas e feri-lo nas suas propriedades, no dia 21de Dezembro findo, procurou destruir-lhe por meio de bombas de dinamite uma pesqueira "Novas do Braço".

   Felizmente, o criminoso não conseguiu atingir o seu fim pois além de cobarde é ignorante.

   Foi o que felizmente valeu aquele nosso respeitável amigo, porque a bomba colocada em largo buraco não encontrando resistência ao rebentar; e apenas abriu algumas fendas no peal das "Novas do Braço".

   Ataques destes, atentados assim dirigidos, provam apenas uma baixeza de sentimentos, verdadeiramente lastimável e exigem, por parte das autoridades, uma repressão séria e rápida. O caso, porém, foi entregue à Policia Judiciaria. »  

 

 

Notícia do Jornal de Melgaço, nº 1225, de 05/10/1918

 

   « As "Novas", essas pesqueiras da costa de Alvaredo onde duas infâmias foram praticadas, uma a prisão de cinco homens que nelas trabalhavam havia por 3 dias, alcunhando-os de emigrantes e ao nosso amigo Fernandes denunciando-o como engajador; outra o bombardeamento a dinamite praticado nas mesmas a 23 de Dezembro último, as "Novas", repetimos, já se encontram devidamente reconstruídas.

   Ao nosso amigo Fernandes aconselhamos que em ocasiões das cheias do nosso Minho, mande lá postar duas sentinelas, munidas cada uma com um canhão de 42, ordenando que ao estampido do novo dinamite lançado pelos infames, façam ecoar os canhões, soltando as suas granadas. »

 

Retirado de:

 

ACER – Associação Cultural e de Estudos Regionais

 

http://acer-pt.org