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MELGAÇO, DO MONTE À RIBEIRA

História e narrativas duma terra raiana

MELGAÇO, DO MONTE À RIBEIRA

História e narrativas duma terra raiana

ENCONTRO COM INÊS V

melgaçodomonteàribeira, 06.03.13

 

 

    Era noite de Santo António e o bailarico corria.  

    Junto daquelas tábuas que serviam de balcão de bar, no meio de três ou quatro rapazes, estava a loira com o fio de ouro que eu procurava. Deixar mal o “prof.” nem pensar!

    Do coreto saía uma marcha bem esgalhada pela orquestra. Autêntico prego a fundo em Citro-arrastadeira e nós já estávamos bem no meio do arraial. Tudo preparado para a faena, o touro no centro da praça, agora só são precisos dois passes de muleta e é logo entrar a matar.

    O bom e o bonito é que o fio entra pelo meio de dois monumentos que me deixam a pensar em tudo menos no uso das técnicas ensaiadas. O que se passou não sei mas, quando dou por mim, o Chafariz de El-Rei servia de colchão e nem um nem outro se preocupou com os foliões que passavam, olhavam, riam e seguiam, porque é noite de Santo António …

    De regresso ao Castelo, alta madrugada, foi uma rua de Alfama a servir de leito.

    Uma loucura que o “prof.” não previra e que de certeza o obrigou a rever os seus manuais de actuação.

    Péssimo aluno, corpo saciado … mas com o buraco na alma que Inês deixou. Então soube o que era a obsessão, a paranóia.

    Precisava de ver Inês, o seu cabelo, a sua voz, para me encontrar.

    Inês não era a mulher que eu queria, Inês era o meu mundo.

    E Inês sem aparecer. Eu, contra tudo e contra todos, de volta ao “taft-taft” e à mosca.

    Fumo de cigarro, olhar vazio e alma desfeita.

    Outra conheci, companheira, amiga, amor nas horas de homem e de mulher.

    Um dia, subíamos o Parque Eduardo VII, ao cair da noite, com o olhar fixo no relógio porque “recolher obrigatório” era coisa que não faltava, passámos junto a um banco onde estavam sentadas duas pessoas fardadas de FAP. O que os levou a levantar num repente não sei, mas os muitos papéis que lá deixaram tinham uma assinatura: ELP. Arrebanhei tudo e entreguei-os na sede de um partido em que confiava, mas, dentro de mim, o coração batia forte e gritava:

    — Inês, porque não estás aqui?

    Adorava a minha companheira de momento, daria a minha vida por ela … mas era a Inês que desejava a mau lado. Naquele momento a pedra da história era oca, faltava-lhe o amor, o querer, o gozo, faltava-lhe … Inês.

 

(continua)